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O princípio da transcendência em processo trabalhista

Agenda 01/11/2001 às 01:00

A Medida Provisória n. 2226/01 --com significativa abertura ao direito de defesa, se comparado ao perfil que ele ostenta nos países civilizados-- introduziu o denominado princípio da transcendência para justificar a subida de recursos de revista para o Tribunal Superior do Trabalho.

Tal princípio exterioriza a função que está na essência dos Tribunais Superiores, ou seja, julgar apenas as questões cuja transcendência política, social, econômica ou jurídica ultrapasse o exclusivo interesse das partes, para preservação da ordem jurídica, da Federação e da segurança do Direito, que deve ser aplicado uniformemente no país.

No dia 8 de agosto, vale dizer, antes da edição da referida MP, defendi a adoção desse princípio em audiência pública perante o Senado Federal, com a presença do Presidente da Suprema Corte, do Presidente do STJ, e de Ministro representando o TST, além do próprio Presidente em exercício do Senado, quando fiz exposição sobre a reforma do Judiciário.

Na proposta de emenda constitucional aprovada pela Câmara, o princípio lá está incluído, todavia, apenas para o Supremo Tribunal Federal. Defendi sua extensão para os demais Tribunais Superiores, no mesmo sentido tendo-se manifestado os Ministros Marco Aurélio, presidente do STF, Costa Leite (Presidente do STJ) e Ives Gandra Filho, Ministro do TST.

Senti grande receptividade à tese, que, de resto, qualquer país civilizado adota para seu Judiciário.

Justiça se faz nas duas instâncias inferiores (juízo monocrático e colegiado em Tribunal). Nestas duas instâncias, interessa apenas solver a pendência entre as partes, levando-se em consideração o direito pátrio e o ideal de Justiça. A partir daí, recursos para instâncias superiores, só se justificam aqueles que transcendem o interesse entre as partes, por pertinirem ao interesse de toda a Nação.

O colapso dos Tribunais Superiores reside exatamente na não observância desse aspecto recursal. É que, hoje, todos os recursos terminam subindo, à falta de uma disposição racional própria deste princípio, capaz de permitir que apenas os processos que transcendam o interesse entre os litigantes cheguem àquelas instâncias.

A MP 2226/01, por exteriorizar medida processual ordinária e por ser editada em face da urgência em evitar o colapso da Justiça Trabalhista (num único dia, 14 Ministros receberam a distribuição de 10.000 processos cada um), nada tem de inconstitucional, --como sugere ação direta impetrada pela OAB— parecendo-me adequada e absolutamente justa, por uma série de motivos.

De início, recoloca a Justiça do Trabalho, como uma Justiça eficiente na defesa do hiposuficiente (terminologia de meu saudoso Mestre Cesarino Jr.), isto é, do trabalhador, visto que a grande maioria dos casos será decidida em duas instâncias, com solução rápida das pendências. A morosidade que hoje impera em suas decisões, tem sido mais favorável ao reclamante do que ao reclamado. Com a nova medida, evita-se a excessiva demora dos recursos ao TST, nas questões sem transcendência, que protege mais os empregadores que os empregados.

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Depois, os Ministros do TST poderão aprofundar-se nas questões transcendentes, limitando a atuação de seus assessores ao trabalho de pesquisa, e não a tarefas mais relevantes, como hoje ocorre, por absoluta falta de tempo e de possibilidade material de um acurado exame de todos os processos por parte de cada Ministro, pessoalmente. Por melhor que sejam os assessores, os Ministros é que foram guindados a esta posição, por mérito próprio, notável conhecimento e reputação ilibada.

Por fim, a jurisprudência haverá de se formar com muito maior reflexão, por parte de todos os Ministros, tornando-se mais sólida, coerente e justa do que aquela forjada, sob a pressão do excesso de trabalho, em que, infelizmente, muitas vezes, é conformada.

Acrescente-se que o direito de defesa é assegurado na MP referida, havendo a possibilidade de sustentação oral e obrigatoriedade de decisões públicas dos Ministros que julgarão ou não a admissibilidade do recurso de revista.

Nos países civilizados, o princípio da transcendência é aplicado pelos Tribunais Superiores, independentemente da oitiva ou justificação para as partes envolvidas, sendo, portanto, o sistema brasileiro mais justo, nos termos da MP referida, porque resgata a verdadeira função do Tribunal Superior do Trabalho, sem enfraquecer, em nenhum momento, a ampla defesa assegurada pela Constituição.

Pena que o mesmo princípio não tenha sido estendido para o STF e STJ, por medida provisória.

Sobre o autor
Ives Gandra da Silva Martins

advogado em São Paulo (SP), professor emérito de Direito Econômico da Universidade Mackenzie, presidente do Centro de Extensão Universitária, presidente da Academia Internacional de Direito e Economia, presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Ives Gandra Silva. O princípio da transcendência em processo trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2418. Acesso em: 16 nov. 2024.

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