A Medida Provisória n. 2226/01 --com significativa abertura ao direito de defesa, se comparado ao perfil que ele ostenta nos países civilizados-- introduziu o denominado princípio da transcendência para justificar a subida de recursos de revista para o Tribunal Superior do Trabalho.
Tal princípio exterioriza a função que está na essência dos Tribunais Superiores, ou seja, julgar apenas as questões cuja transcendência política, social, econômica ou jurídica ultrapasse o exclusivo interesse das partes, para preservação da ordem jurídica, da Federação e da segurança do Direito, que deve ser aplicado uniformemente no país.
No dia 8 de agosto, vale dizer, antes da edição da referida MP, defendi a adoção desse princípio em audiência pública perante o Senado Federal, com a presença do Presidente da Suprema Corte, do Presidente do STJ, e de Ministro representando o TST, além do próprio Presidente em exercício do Senado, quando fiz exposição sobre a reforma do Judiciário.
Na proposta de emenda constitucional aprovada pela Câmara, o princípio lá está incluído, todavia, apenas para o Supremo Tribunal Federal. Defendi sua extensão para os demais Tribunais Superiores, no mesmo sentido tendo-se manifestado os Ministros Marco Aurélio, presidente do STF, Costa Leite (Presidente do STJ) e Ives Gandra Filho, Ministro do TST.
Senti grande receptividade à tese, que, de resto, qualquer país civilizado adota para seu Judiciário.
Justiça se faz nas duas instâncias inferiores (juízo monocrático e colegiado em Tribunal). Nestas duas instâncias, interessa apenas solver a pendência entre as partes, levando-se em consideração o direito pátrio e o ideal de Justiça. A partir daí, recursos para instâncias superiores, só se justificam aqueles que transcendem o interesse entre as partes, por pertinirem ao interesse de toda a Nação.
O colapso dos Tribunais Superiores reside exatamente na não observância desse aspecto recursal. É que, hoje, todos os recursos terminam subindo, à falta de uma disposição racional própria deste princípio, capaz de permitir que apenas os processos que transcendam o interesse entre os litigantes cheguem àquelas instâncias.
A MP 2226/01, por exteriorizar medida processual ordinária e por ser editada em face da urgência em evitar o colapso da Justiça Trabalhista (num único dia, 14 Ministros receberam a distribuição de 10.000 processos cada um), nada tem de inconstitucional, --como sugere ação direta impetrada pela OAB— parecendo-me adequada e absolutamente justa, por uma série de motivos.
De início, recoloca a Justiça do Trabalho, como uma Justiça eficiente na defesa do hiposuficiente (terminologia de meu saudoso Mestre Cesarino Jr.), isto é, do trabalhador, visto que a grande maioria dos casos será decidida em duas instâncias, com solução rápida das pendências. A morosidade que hoje impera em suas decisões, tem sido mais favorável ao reclamante do que ao reclamado. Com a nova medida, evita-se a excessiva demora dos recursos ao TST, nas questões sem transcendência, que protege mais os empregadores que os empregados.
Depois, os Ministros do TST poderão aprofundar-se nas questões transcendentes, limitando a atuação de seus assessores ao trabalho de pesquisa, e não a tarefas mais relevantes, como hoje ocorre, por absoluta falta de tempo e de possibilidade material de um acurado exame de todos os processos por parte de cada Ministro, pessoalmente. Por melhor que sejam os assessores, os Ministros é que foram guindados a esta posição, por mérito próprio, notável conhecimento e reputação ilibada.
Por fim, a jurisprudência haverá de se formar com muito maior reflexão, por parte de todos os Ministros, tornando-se mais sólida, coerente e justa do que aquela forjada, sob a pressão do excesso de trabalho, em que, infelizmente, muitas vezes, é conformada.
Acrescente-se que o direito de defesa é assegurado na MP referida, havendo a possibilidade de sustentação oral e obrigatoriedade de decisões públicas dos Ministros que julgarão ou não a admissibilidade do recurso de revista.
Nos países civilizados, o princípio da transcendência é aplicado pelos Tribunais Superiores, independentemente da oitiva ou justificação para as partes envolvidas, sendo, portanto, o sistema brasileiro mais justo, nos termos da MP referida, porque resgata a verdadeira função do Tribunal Superior do Trabalho, sem enfraquecer, em nenhum momento, a ampla defesa assegurada pela Constituição.
Pena que o mesmo princípio não tenha sido estendido para o STF e STJ, por medida provisória.