4. A Responsabilidade Tributária prevista no art. 135, III, do CTN.
4.1. Considerações Gerais.
De acordo com a redação do art. 135, III, do CTN, os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
Constata-se, pois, que o art. 135, III, do CTN está a indicar a figura do responsável tributário, aquele que, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorre de disposição expressa de lei (art. 121, II, do CTN).
Assim, diretores, gerentes ou representantes de pessoa jurídica de direito privado serão pessoalmente responsável pelos créditos tributários resultantes de atos praticados com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatutos, ou seja, responderão com seus bens pessoais por dívidas da empresa que tiveram origem em sua atuação irregular.
Cumpre lembrar, ainda, que a responsabilidade estabelecida no art. 135, III, do CTN é solidária, uma vez que, como destacado anteriormente, a solidariedade é a regra no que se refere à responsabilidade tributária, já que há sempre o interesse comum (art. 124, I, do CTN) dos responsáveis na situação que constitua o fato gerador. A atuação dos administradores é que gera a dívida tributária e traz benefícios e lucros aos mesmos e à empresa.
Ademais, a redação do art. 135, III, do CTN é no sentido de responsabilizar “pessoalmente” os diretores, gerentes ou representantes de pessoa jurídica e não de responsabilizá-los exclusivamente. Assim, não haveria razão para se entender que tal responsabilidade pessoal excluiria a responsabilização da pessoa jurídica. Esse entendimento encontra amparo na doutrina de Hugo de Brito Machado. (MACHADO, 2002, p. 141-142).
Ricardo Lobo Torres também defende que a responsabilidade tratada no art. 135 do CTN é solidária, pouco importando o fato de o contribuinte ter ou não patrimônio para responder pela obrigação tributária (TORRES, 1998, p. 227-228).
Pois bem, sendo solidária, tal responsabilidade não comporta o benefício de ordem presente na responsabilidade subsidiária. Essa é a interpretação que mais se coaduna com o texto da lei, pois se está a responsabilizar os administradores da pessoa jurídica por sua atuação irregular, não haveria sentido esgotar os bens da pessoa jurídica para só então buscar os bens dos dirigentes faltosos.
Vale lembrar, por oportuno, que o art. 1.016 do Código Civil estabelece que os administradores de pessoa jurídica respondem solidariamente por culpa no desempenho de suas funções. Ora, como admitir que um crédito menos privilegiado que o público tenha uma garantia melhor. Evidente, pois, que a responsabilidade tributária prevista no art. 135, III, do CTN é solidária e não exclusiva ou, ainda, subsidiária.
Extrai-se, assim, que a responsabilidade tributária estabelecida no art. 135, III, do CTN é pessoal e solidária. Resta, no entanto, indicar quando a mesma ocorre, ou seja, quais seriam os atos geradores de tal responsabilidade, assunto esse que será analisado nas linhas que se seguem.
4.2. Atos Geradores da Responsabilidade prevista no art. 135, III, do CTN.
A redação do art. 135, III, do CTN, é clara em estabelecer que a responsabilidade tributária ali prevista é atribuída a pessoa que exerça poderes de administração da sociedade, uma vez que se refere a diretor, gerente ou representante da pessoa jurídica. Dessa forma, como dito alhures, a simples condição de sócio é insuficiente para que se atribua tal responsabilidade e mesmo o não sócio pode ser responsabilizado caso exerça a administração da sociedade.
Além disso, para que se aplique o art. 135, III, do CTN, não basta a condição de administrador da sociedade, é necessário ainda que a responsabilidade resulte de ato praticado com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatutos.
4.2.1. Excesso de Poderes.
Age com excesso de poderes, o dirigente da pessoa jurídica que extrapola os limites da atuação que lhe foi estabelecida, fazendo com que sua responsabilidade passe a ser pessoal. Assim, quando os atos do administrador são praticados dentro de suas atribuições, os mesmos serão imputados à pessoa jurídica, no entanto, quando a atuação do dirigente ultrapassa seus poderes, a obrigação tributária decorrente de tal agir será de responsabilidade do administrador, o qual responderá com seu patrimônio.
4.2.2. Infração de contrato social ou estatutos.
A caracterização da violação ao contrato social e estatutos é aferível de plano, já que basta a atuação do dirigente de pessoa jurídica em desacordo com o que for estabelecido nos mencionados atos constitutivos. Diferentemente, é a infração à lei ensejadora da responsabilidade pessoal do dirigente de pessoa jurídica, a qual comporta discussões mais aprofundadas.
4.2.3. Infração de lei.
Toda vez que o administrador da pessoa jurídica atuar de forma contrária à lei poderá ser responsabilizado pelos créditos tributários decorrentes de tais atos. Como exemplos dessa atuação ilegal pode-se mencionar a fraude, a simulação, a prática de crimes etc. Caso bem comum de simulação é a constituição de empresas em nome de terceiros alheios à sociedade.
Há condutas, no entanto, que, em princípio, não seriam contrárias à lei, mas que, a depender do caso, podem ensejar a aplicação da responsabilidade prevista no art. 135, III, do CTN. Podem ser elencados como exemplos dessas condutas: o não pagamento de tributos e o encerramento irregular da sociedade empresária.
Tanto a simulação na constituição de empresas, quanto o não pagamento de tributos e o encerramento irregular da sociedade empresária, serão mais detidamente estudados nos itens seguintes.
4.2.3.1. Simulação na Constituição de Empresas.
Existem sociedades empresárias que são criadas com o firme propósito de lavar dinheiro e praticar outros crimes tributários e financeiros, cujos verdadeiros sócios, para se esquivarem do Fisco ou, ainda, de futura persecução criminal, colocam nos atos constitutivos da empresa o nome de pessoas alheias à sociedade como sendo os administradores “de direito”, os chamados “laranjas”. Nesses casos, mister que os sócios administradores “de fato” sejam identificados e responsabilizados na forma do art. 135, III, do CTN.
A utilização de “laranjas” não pode servir de escudo para impedir a responsabilização e a punição dos verdadeiros administradores da sociedade empresária. Assim, havendo provas da constituição de empresas em nome de terceiros alheios à sociedade, patente estará a fraude e a simulação aptas a responsabilizar os sócios “de fato”, sem prejuízo da competente representação criminal.
Para respaldar o entendimento acima esposado, vale transcrever ementa do acórdão prolatado recentemente pela Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, in verbis:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO. SOCIEDADE DE FATO. FRAUDE E SIMULAÇÃO. PRESCRIÇÃO. INCORRÊNCIA. MULTA DE OFÍCIO. MULTA MORATÓRIA. TAXA SELIC. LEGALIDADE. ENCARGO LEGAL.
1. Não conhecido o agravo retido do embargante, uma vez que não reiterado pedido de apreciação, conforme estabelece o art. 523, § 1º, do CPC
2 Conforme reconhecido na sentença penal proferida nos autos nº 95.6011531-6, a empresa e sua composição social não passavam de mera fachada para encobrir os verdadeiras sócios, no caso, [...], sendo que [...], conforme consignado na decisão criminal não passava de "laranja".
3. Houve, portanto, simulação, dolo, fraude, tudo no intuito de encobrir os verdadeiros sócios da "empresa devedora", bem como, visando a efetiva sonegação fiscal.
4. Não se pode falar em efetiva existência de pessoa jurídica regularmente constituída, mas, sim, de sociedade de fato, pois se houve irregularidade na sua constituição (dolo, fraude e simulação), estamos diante na verdade de uma sociedade irregular, ou, conforme diz o novo Código Civil, sociedade em comum, pois a fraude na composição social considera-se como fato impeditivo à inscrição real e verdadeira dos atos constitutivos.
5. A citação não poderia ser realizada em nome da empresa, como se de direito existisse a sociedade, pois, no caso de sociedade irregular ou de fato, a responsabilidade é do próprio sócio pelas dívidas sociais, inclusive tributária.
6. Quando há fraude ou dolo¸ o próprio Código Tributário afirma que a responsabilidade é do sócio gerente ou administrador, sendo essa responsabilidade, segundo diz a legislação tributária, é pessoal, forte no art. 135 do CTN.
7. A partir do momento que o Poder Judiciário reconhece que o verdadeiro sócio da suposta empresa [...] é a pessoa do embargante, surge a pretensão para o direcionamento da execução fiscal. Da data do redirecionamento (2004), à data da citação (2006), não transcorreu prazo superior a 5 (cinco) anos.
8. A taxa SELIC se aplica aos débitos tributários, não existindo vício na sua incidência.
9. Reduzida as multas de ofício para o percentual de 75%, forte no art. 44 da Lei nº 9.430/96. nos feitos executivos citados, por ser mais benéfico.
10. No caso da multa moratória, não é caso de aplicação do art. 106, inc. II, "c", do CTN, considerando que já foi aplicado o percentual mínimo previsto em lei (20%).
11. o encargo legal de 20% previsto no Decreto-Lei nº 1.025/69, o qual substitui, nos embargos, a condenação em honorários advocatícios, como já pacificado pela Súmula nº 168 do Tribunal Federal de Recursos. [Sem grifo no original].
(TRF 4ª REGIÃO, 2010)
Importante destacar, ainda, que o próprio Código Tributário Nacional prevê que a autoridade fiscal efetivará o lançamento, identificando o sujeito passivo, podendo, ainda, diante da ocorrência de fraude ou simulação, rever de ofício o lançamento (art. 142 e 149, VII, do CTN). Assim, na oportunidade do lançamento, caso não tenha sido possível para a autoridade administrativa identificar a simulação, ainda será possível a responsabilização dos sócios de fato no âmbito da respectiva execução fiscal, nos termos do art. 135, III, do CTN.
4.2.3.2. Não pagamento de tributos.
Atualmente, o entendimento majoritário no Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o mero inadimplemento da obrigação tributária não constitui infração à lei capaz de caracterizar a responsabilidade do administrador, com fulcro no art. 135, III, do CTN.
Entretanto, tendo em mente os ditames constitucionais (construção de uma sociedade justa e solidária e observância do princípio da função social da propriedade), é de se concluir que o Superior Tribunal de Justiça, ao defender que o mero inadimplemento da obrigação tributária não caracteriza infração à lei, refere-se ao ato daquela empresa que, momentaneamente, deixa de recolher tributos, em razão de dificuldades financeiras ocasionadas pelo risco natural da atividade empresarial.
Tal entendimento pode ser extraído do julgamento do REsp 1.674/GO, mais especificamente do voto do Ministro Ari Pargendler, que, embora vencido na ocasião, foi um dos precursores da posição hoje defendida no STJ no sentido de que o mero inadimplemento dos tributos não caracteriza infração à lei, confira-se:
A teor do artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional, são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
A responsabilidade aí decorre de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, e, para caracterizá-la, deve-se distinguir entre o que é infração de lei praticada pela sociedade e infração de lei praticada pelo sócio-gerente.
A falta de pagamento de tributos é, em princípio, infração da sociedade à obrigação legal de pagar tributos. O sócio-gerente pode ser pessoalmente responsável pelos tributos se a falta de pagamento resultar de ato seu praticado com infração à lei.
Quer dizer, não basta, para tipificar a responsabilidade do sócio-gerente, o inadimplemento da sociedade, porque este pode decorrer do risco natural aos negócios — risco, aliás, pressuposto na própria natureza da sociedade por quotas de responsabilidade limitada.
[...]
Até essa data, a responsabilidade que o Recorrente lhe quer imputar decorre de não ter a sociedade pago o Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias, responsabilidade inexistente, porque — como visto — a falta de pagamento de tributos, quando resulta da álea natural aos negócios, não pode ser assimilada à infração prevista no artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional; esta é modalidade restrita de infração à lei, aquela em que o sócio-gerente da pessoa jurídica, através de procedimentos ilícitos, visa a encobrir a própria obrigação tributária (v.g., falta de escrituração regular) ou a diminuir as garantias do crédito tributário (v.g., dissolução irregular da sociedade). [Sem grifo no original]. (STJ, 1995, p. 37558).
Como se vê, segundo as palavras do Ministro Ari Pargendler, o não recolhimento de tributos, quando resultar da “álea natural aos negócios”, não pode ser considerado a infração prevista no art. 135, III, do CTN.
Não se pode admitir a existência de “álea natural aos negócios” no início das atividades de uma empresa. Assim, não há como a posição do STJ aproveitar também àquelas sociedades que, desde o seu surgimento, não recolhem qualquer tributo e concorrem no mercado com outras empresas cumpridoras de suas obrigações tributárias. O modus operandi dos sócios administradores dessas sociedades evidencia a clara intenção de sonegar tributos, não podendo, pois, ficar isentos da responsabilidade tributária prevista no art. 135, III, do CTN.
Dessa forma, conclui-se que o mero inadimplemento de tributos que não gera responsabilidade social para o dirigente sócio ou não da pessoa jurídica só pode ser aquele inadimplemento decorrente da “álea natural aos negócios” ou de uma impontualidade ocasional no pagamento dos tributos.
Importante acrescentar que o fato dos administradores de pessoa jurídica auferirem ganhos significativos com o desenvolvimento da atividade empresarial, receberem lucros e pro labore, embora a empresa esteja inadimplente com o Fisco, caracteriza, inequivocamente, ato ilícito capaz de ensejar a aplicação da responsabilidade tributária prevista no art. 135, III, do Código Tributário Nacional.
Esse posicionamento foi adotado pelo Ministro Luiz Fux, inicialmente no julgamento do Recurso Especial nº 332.082 – RJ, mas vem sendo repetido em diversos julgados do E. Superior Tribunal de Justiça. Embora o douto Ministro mantenha o entendimento do STJ no sentido de que a ausência de recolhimento de tributos não gera a responsabilidade dos administradores de pessoa jurídica, faz a ressalva de que o sócio que aufere os lucros da empresa, mas não recolhe os tributos, locupleta-se e comete o ilícito que faz surgir a sua responsabilidade.
Para melhor esclarecer esse entendimento, vale transcrever trecho do voto do Ministro Luiz Fux, proferido no âmbito do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 746.345 – BA, no qual faz referência ao julgado inaugural de seu posicionamento (REsp n.º 332.082/RJ), in verbis:
Concordemente, o entendimento da Primeira Seção é de que ‘A ausência de recolhimento do tributo não gera, necessariamente,a responsabilidade solidária do sócio-gerente, sem que se tenha prova de que agiu com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa.’ (EREsp 374.139/RS, Relator Ministro Castro Meira, publicado no DJ de 28.02.2005).
Ressalto, todavia, que tenho ressalvado o meu posicionamento, no sentido de que a ciência por parte do sócio-gerente do inadimplemento dos tributos e contribuições, mercê do recolhimento de lucros e pro labore, caracteriza, inequivocamente, ato ilícito, porquanto há conhecimento da lesão ao erário público.
Neste sentido, o aresto prolatado pela E. Primeira Turma deste Sodalício, no julgamento do REsp n.º 332.082/RJ, de minha relatoria, que recebeu a seguinte ementa:
‘TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL – RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - SÓCIO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCESSO DE MANDATO, INFRAÇÃO À LEI OU AO REGULAMENTO.
Pacificou-se no E. STJ a tese de que a responsabilidade do sócio não é objetiva. Para que surja a responsabilidade pessoal, disciplinada no art. 135 do CTN é necessário que haja comprovação de que ele, o sócio, agiu com excesso de mandato, ou infringiu a lei, o contrato social ou o estatuto.
Não havendo tal comprovação, não há como a execução fiscal ser redirecionada para ele.
Em princípio o sócio que recolhe os bônus lucrativos da sociedade mas não verifica o adimplemento dos tributos, locupleta-se e a fortiori comete o ilícito que faz surgir a sua responsabilidade. Ressalva do voto com submissão à jurisprudência dominante, à luz da função precípua do E. STJ. Precedentes.Recurso improvido.’ (DJ de 25/03/2002).” [Sem grifos no original] (STJ, 2006).
De fato, não há como validar a atuação do administrador de pessoa jurídica que, ciente do inadimplemento tributário da empresa, locupleta-se com o recebimento de maiores lucros e pro-labore. Portanto, o entendimento esposado pelo Ministro Luiz Fux, que vem se reiterado ao longo de vários anos no sentido de que o dirigente que assim age comete o ilícito ensejador da responsabilidade tributária do art. 135, III, do CTN, é o que mais se coaduna com os ditames constitucionais e tributários, devendo prevalecer.
4.2.3.3. Encerramento Irregular das Atividades da Empresa.
Inúmeros julgados dos tribunais pátrios defendem que a dissolução irregular da sociedade, sem que seja providenciada a quitação dos tributos por seus representantes, é ensejadora da responsabilidade prevista no art. 135, III, do CTN. Confira-se, abaixo, o elucidativo julgado do Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região, in verbis:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INCLUSÃO DE SÓCIO GERENTE NO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO FISCAL. LEGITIMIDADE. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. ARTIGO 135 DO CTN.
[...]
3.Dispõe o inciso III do artigo 135 do Código Tributário Nacional que os diretores, gerentes ou representantes das pessoas jurídicas são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei.
4.Gestão com excesso de poderes ou infração à lei ou contrato, é a gestão fraudulenta com intuito de lesar o credor tributário deliberadamente, ou a dissolução irregular da sociedade, sem a devida quitação dos tributos pelos representantes legais da empresa.
5.Conforme entendimento do C. STJ e desta Turma Julgadora, a dissolução irregular da sociedade somente autoriza a desconsideração da personalidade jurídica e a conseqüente substituição da responsabilidade tributária, desde que haja documentos que indiquem o encerramento da empresa.
6.Da análise das peças trazidas aos autos, verifica-se que a sociedade teria sido dissolvida irregularmente (fls.23 e 34), eis que a empresa não foi localizada no endereço constante do cadastro na Receita.
7.Havendo indícios de paralisação das atividades da empresa de maneira irregular, configuram-se as hipóteses a ensejar a responsabilidade dos sócios, nos termos do art. 135 do Código Tributário Nacional, autorizando a desconsideração da pessoa jurídica e a conseqüente substituição da responsabilidade tributária. Precedentes do STJ.
8. A responsabilidade tributária dos sócios da empresa executada tem origem no momento da ocorrência do fato gerador, sendo ineficaz perante a Fazenda Pública qualquer alteração posterior que retire dos mesmos a obrigação relativa aos tributos, nos termos do art. 123 do CTN.
9. Do exame dos autos, constata-se que os débitos objeto de execução datam de 1995, época em que o agravante ocupava o cargo de sócio gerente da sociedade, o que o torna parte legítima para responder pela execução, independentemente da posterior dissolução. Eventuais fatos capazes de afastar a sua responsabilidade pelo não recolhimento do tributo poderão ser alegados futuramente, por ocasião de embargos.
10.Agravo de instrumento a que se nega provimento. [Sem grifo no original].
(TRF 3ª REGIÃO, 2009, p. 510).
Vale lembrar que a jurisprudência pátria exige para a caracterização da dissolução irregular da sociedade a presença tão-somente de indícios, quais sejam: a empresa não estar estabelecida no endereço que consta de seu contrato social e dos registros perante órgãos públicos; a empresa não estar habilitada junto aos órgãos que controlam sua atividade (por exemplo, apesar de ser sociedade comercial, a mesma está “não habilitada” no sistema do ICMS do Estado); estar “inapta” ou “baixada” nos sistemas da Receita Federal e demais indícios que apontem para um encerramento das atividades sem a quitação dos tributos.
Frise-se: a jurisprudência pátria não exige prova cabal do encerramento irregular, mas apenas de indícios. Exigir a demonstração plena da dissolução da sociedade seria inviabilizar a responsabilização dos seus dirigentes e conseqüentemente a recuperação dos créditos tributários.
Recentemente, foi editada a Súmula 435 do STJ que confirma a presunção de dissolução irregular da empresa quando a mesma deixa de funcionar em seu domicílio fiscal, sem comunicar os órgãos competentes, eis o seu teor:
Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.
Com a edição dessa súmula, demonstrado nos autos que a empresa não está exercendo suas atividades no endereço por ela informado como sendo seu domicílio fiscal, caracterizada estará a dissolução irregular da sociedade.
Pois bem, configurado o encerramento irregular da empresa, resta definir quais dirigentes seriam responsabilizados pessoalmente pelas obrigações tributárias não quitadas: os gerentes da época do fato gerador ou aqueles presentes no encerramento irregular da empresa.
Como é o encerramento irregular da empresa que possibilita a responsabilização do administrador, o entendimento predominante é no sentido de responsabilizar àquele dirigente presente à época da dissolução da sociedade, uma vez que, mesmo tendo conhecimento do passivo tributário da empresa, encerra suas atividades sem a devida quitação. No entanto, há julgados que atribuem a responsabilidade tributária tanto ao administrador da época do fato gerador quanto àquele presente no encerramento das atividades da empresa.
Esse segundo entendimento é o que mais se coaduna com a justiça fiscal e os ditames constitucionais e tributários, pois, havendo dissolução irregular da empresa, o mais adequado é responsabilizar não só o dirigente responsável pelo encerramento das atividades sem a quitação do passivo tributário, mas também aquele presente na época do fato gerador, uma vez que, com sua ação ou omissão (no caso de não pagamento dos tributos) contribuiu para que a empresa fosse dissolvida de maneira irregular.
Destaca-se que o fato do administrador não fazer mais parte da direção ou do quadro societário da empresa não pode ser utilizado como forma de eximir a responsabilidade do dirigente da época do fato gerador, uma vez que o art. 123 do CTN é claro em estabelecer que as convenções particulares não podem ser opostas à Fazenda Pública com o escopo de afastar a responsabilidade pelo pagamento de tributo.
Para respaldar esse entendimento, vale transcrever ementa de acórdão prolatado pela Sexta Turma do E. Tribunal Regional Federal da 2ª Região, in verbis:
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – NEGATIVA DE SEGUIMENTO – REDIRECIONAMENTO DE EXECUÇÃO PARA SÓCIO-GERENTE, CUJO NOME NÃO CONSTA DA CDA – RETIRADA DA SOCIEDADE APÓS A OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR – CARACTERIZADA A DISSOLUÇÃO IRREGULAR.
1. O fato do agravante não integrar o quadro societário da empresa na ocasião de sua dissolução irregular não o isenta da co-responsabilidade, uma vez que a obrigação tributária já havia surgido, ou seja, sua retirada se deu após a ocorrência do fato gerador.
2. A responsabilidade do agravante advém do fato de à época do fato gerador (1999/2000) ocupar o cargo de sócio-gerente (1997/2000), de acordo com certidão da Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro – JUCERJA às fls. 51.
3. Agravo Improvido. [Sem grifo no original].
(TRF 2ª REGIÃO, 2009, p.:112).
Assim, em que pese prevalecer nos Tribunais Pátrios a tese de que o dirigente da empresa da época do fato gerador somente pode ser responsabilizado pessoalmente pelo inadimplemento dos tributos caso também esteja presente ao tempo da dissolução irregular, o mais acertado é responsabilizar o dirigente da época do fato gerador independentemente de sua permanência na sociedade até o encerramento das respectivas atividades.
Como demonstrado, não há como deixar de imputar a responsabilidade ao administrador da pessoa jurídica que encerra suas atividades sem a quitação do seu passivo tributário, bem como não se deve eximir de responsabilidade o dirigente que deu origem às obrigações tributárias em cobrança.
Importante lembrar, por oportuno, as palavras de Aldemário Araújo Castro, em seu artigo Aplicação no Direito Tributário da Desconsideração da Personalidade Jurídica Prevista no Novo Código Civil, no sentido de que o Direito Tributário não deve ser encarado somente como um sistema de limites e óbices à ação do Fisco, é essencial que as normas tributárias sejam alçadas à condição de um dos instrumentos de transformação ou modificação da realidade social, fazendo com que nada ou ninguém fuja de suas responsabilidades constitucionais de concorrer para o atingimento dos fins do Estado brasileiro. (TORRES, 2005, p. 495).
Destarte, buscar a interpretação do art. 135, III, do CTN, de maneira a responsabilizar o dirigente de pessoa jurídica que, por meio de artifícios ou ilegalidades, deixa de recolher os tributos devidos aos cofres públicos, além de prestigiar o bom contribuinte, é uma forma de trazer maiores benefícios à sociedade, já que, com uma arrecadação mais efetiva e eficiente, o Estado terá mais receita para financiar suas atividades essenciais (saúde, educação, assistência social etc).