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A constitucionalidade da contribuição previdenciária patronal do empregador rural pessoa física

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Agenda 28/12/2013 às 11:22

5 - ANÁLISE CRÍTICA DA JURISPRUDÊNCIA

5.1) INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM

Não há falar em bis in idem referente à grandeza econômica albergada pelo art. 195, I, “b”, da CF[18], uma vez que, muito embora seja o produtor rural pessoa física equiparado à empresa pela legislação de custeio da previdência[19], não é contribuinte da COFINS, em função de não ser equiparado à pessoa jurídica pela legislação do Imposto de Renda, forte no art. 1º da LC nº 70/91 e no art. 150 do Decreto nº 3.000/99 (RIR).

Com efeito, importa deixar claro que a contribuição prevista no art. 25 da Lei nº 8212/91, em relação ao produtor rural empregador, é a única contribuição previdenciária incidente sobre a produção agrícola, o que afasta qualquer possibilidade de ocorrência de bis in idem.

Ao contrário do que afirmou o Relator do RE 363.852/MG, o empregador rural pessoa física não é contribuinte da COFINS, uma vez que somente as pessoas jurídicas ou a ela equiparadas pela legislação do Imposto de Renda se submetem a esta contribuição. O afastamento entre a regência tributária do empregador rural pessoa jurídica e pessoa física deve-se à distinta forma de apuração do resultado da exploração de suas atividades.

Anualmente a Receita Federal edita Instruções Normativas[20] para a aprovação de um programa multiplataforma denominado "Livro Caixa de Atividade Rural”, cujas informações servem de complementação àquelas constantes na declaração anual de imposto de renda de pessoa física. As referidas instruções normativas dispõem que gastos com salários podem ser considerados despesas de custeio para fins de apuração do "Livro Caixa de Atividade Rural". Isso comprova que a legislação de imposto de renda não equipara os produtores rurais pessoas físicas empregadores a pessoas jurídicas. Em suma, os produtores rurais pessoas físicas declaram sua renda anual através da sistemática de pessoas físicas, e, devido à sua peculiaridade, prestam informações adicionais ao fisco por meio do programa "Livro Caixa de Atividade Rural”, no qual podem apontar, dentre outros, gastos com pagamento de salário a seus empregados. Por esta razão, a Lei 9.250/1995, que trata sobre o imposto de renda das pessoas físicas, assim dispõe:

Art. 18. O resultado da exploração da atividade rural apurado pelas pessoas físicas, a partir do ano-calendário de 1996, será apurado mediante escrituração do Livro Caixa, que deverá abranger as receitas, as despesas de custeio, os investimentos e demais valores que integram a atividade.

No mesmo sentido, ao dispor sobre a tributação dos resultados da atividade rural das pessoas físicas, reza a IN SRF n.º 83/2001:

Art. 10. As despesas de custeio e os investimentos são comprovados mediante documentos idôneos, tais como nota fiscal, fatura, recibo, contrato de prestação de serviços, laudo de vistoria de órgão financiador e folha de pagamento de empregados, identificando adequadamente a destinação dos recursos.

Outro não foi o entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região ao se debruçar sobre o tema, veja-se:

CONTRIBUIÇÃO INCIDENTE SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. PRODUTOR RURAL PESSOA FÍSICA EMPREGADOR. EXIGIBILIDADE. FATO GERADOR. BASE DE CÁLCULO. COFINS. BIS IN IDEM. INEXISTÊNCIA. 1. A Constituição de 1988 e a legislação posterior mantiveram a contribuição incidente sobre a comercialização da produção rural, prevendo tratamento distinto entre o produtor rural que trabalha em regime de economia familiar, o produtor rural pessoa física empregador e o produtor rural pessoa jurídica. 2. Para o produtor rural pessoa física empregador, a contribuição sobre a comercialização da produção rural é indevida apenas de 25 de julho de 1991 (extinção do PRORURAL) até 22 de março de 1993 (prazo nonagesimal da Lei n.º 8.540/92, que recriou a contribuição), quando então era exigível a contribuição sobre a folha de salários. 3. O fato gerador da contribuição debatida é a comercialização da produção rural e ocorre com a venda ou a consignação da produção rural; a base de cálculo é a receita bruta proveniente da comercialização de tal produção, elementos da hipótese de incidência previstos nas Leis n.º 8.212/91 e n.º 8.870/94. 4. A base de cálculo - receita bruta - é equivalente, para efeitos fiscais, a faturamento, segundo precedentes do e. STF, e representada pela venda ou consignação de mercadorias, no caso, produtos rurais. 5. Ausência de bis in idem, pois o produtor rural pessoa física empregador, porque não atende aos requisitos do art. 1.º da LC 70/91 (ser equiparado a pessoa jurídica pela legislação do Imposto de Renda), não é contribuinte da COFINS, inexistindo suposta indevida cumulação de contribuições. (TRF-4ª Região, AC 2009.71.18.000524-4/RS, Rel. Des. Fed. OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, 2ª TURMA, j. 11/11/2009, DE de 12.11.2009)

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO INCIDENTE SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. PRODUTOR RURAL PESSOA FÍSICA EMPREGADOR. EXIGIBILIDADE. FATO GERADOR. BASE DE CÁLCULO. COFINS. DUPLA TRIBUAÇÃO. INEXISTÊNCIA. 1. A Constituição de 1988 e a legislação posterior mantiveram a contribuição incidente sobre a comercialização da produção rural, prevendo tratamento distinto entre o produtor rural que trabalha em regime de economia familiar, o produtor rural pessoa física empregador e o produtor rural pessoa jurídica. 2. Para o produtor rural pessoa física empregador e o consórcio simplificado de produtores rurais, a contribuição sobre a comercialização da produção rural é indevida apenas de 25 de julho de 1991 (extinção do PRORURAL) até 22 de março de 1993 (prazo nonagesimal da Lei n.º 8.540/92, que recriou a contribuição). 3. O fato gerador da contribuição debatida é a comercialização da produção rural e ocorre com a venda ou a consignação da produção rural; a base de cálculo é a receita bruta proveniente da comercialização de tal produção, elementos da hipótese de incidência previstos nas Leis n.º 8.212/91 e n.º 8.540/92. 4. O art. 25 da Lei 8.212/91, na redação da Lei 8.540/92, prevê a contribuição do empregador rural pessoa física como incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção. Tal base ajusta-se ao conceito de faturamento definido para a COFINS no RE 346084, pois o resultado da comercialização da produção rural é, evidentemente, a venda das mercadorias, a atividade desenvolvida pelo produtor rural. A discussão que se travou quanto ao conceito de faturamento diz respeito à inclusão de "outras receitas", como receitas financeiras, royalties, aluguéis, entre outros. Note-se que, a título de "receita bruta proveniente da comercialização da produção rural" jamais se cogitou de tributar referidas "outras receitas" do produtor rural pessoa física empregador, mas somente a venda das mercadorias agropecuárias. 5. Ausência de dupla tributação sobre o mesmo fato, pois o produtor rural pessoa física empregador, porque não atende aos requisitos do art. 1.º da LC 70/91 (ser equiparado a pessoa jurídica pela legislação do Imposto de Renda), não é contribuinte da COFINS. 6. Limitada a pretensão ressarcitória aos fatos geradores ocorridos desde julho de 1993 e sendo a contribuição devida desde março de 1993, nada há a ser repetido. (TRF4, AC 2003.71.00.039228-0, Segunda Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 18/06/2008) (grifou-se)

5.2) INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO À ISONOMIA

Há que se superar, outrossim, a equivocada premissa de que o produtor rural pessoa física com empregados receberia tratamento mais gravoso do que o dispensado ao produtor rural pessoa física que não dispõe de empregados.

Ao afirmar que a tributação do produtor rural com e sem empregados são equivalentes, por incidirem sobre bases similares (resultado da comercialização da produção rural), o STF deixou de ressaltar que a contribuição incidente sobre a folha de salários não mais tem vigência, e que a COFINS não tem incidência sobre a receita proveniente da comercialização da produção do produtor rural pessoa física com empregados, por ausência de sua equiparação à pessoa jurídica, na forma referenciada no item anterior.

É de se salientar que a contribuição sobre folha de pagamentos do empregador rural pessoa física foi expressamente afastada, conforme a redação atual do art. 25 da Lei nº 8.212/91, conferida pela lei nº 10.256/01, in verbis:

Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 2001). (grifou-se)

Houve, como visto, a substituição da contribuição incidente sobre a folha de salários por aquela incidente sobre a comercialização da produção rural, obrigação tributária idêntica àquela exigida do segurado especial (art. 195,8º, CRFB).

Ressalta-se que a única diferença existente entre o regime de tributação do produtor rural pessoa física com empregados e aquele aplicado ao segurado especial deve-se ao fato de que o primeiro, além de contribuir para o custeio da previdência de seus empregados, também tem a obrigação de contribuir para a seguridade social na condição de contribuinte individual, ao passo que o segundo, por não possuir empregados, logicamente, contribui somente para o custeio da própria previdência.

Em suma, a contribuição sobre a comercialização, instituída em substituição à incidente sobre folha de salários, destina-se ao custeio da previdência dos empregados, enquanto que a contribuição como contribuinte individual destina-se ao custeio da própria previdência do empregador rural pessoa física.

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Portanto, não há falar em duplicidade de incidência tributária, haja vista destinarem-se as contribuições a fins diversos: custeio da previdência dos empregados e custeio da previdência do próprio empregador rural pessoa física, na condição de contribuinte individual.

Por consequência, trazendo-se à baila os argumentos expostos no item anterior, torna-se também insustentável o fundamento suscitado pelo Ministro Marco Aurélio no sentido de que estaríamos diante de tripla incidência tributária (COFINS, comercialização da produção e folha de salários), em função de que a contribuição paga pelo empregador na condição de contribuinte individual, porquanto idêntica àquela estabelecida em face do segurado especial, não acarreta mácula ao princípio da isonomia.

Merece integral transcrição, pela sua precisão didática, o voto proferido pela Juíza Vânia Hack de Almeida, relatora da Apelação Cível n.º 2003.71.00.039228-0/RS[21]:

A contribuição sobre a produção rural representa a parte da empresa no financiamento da seguridade social, complementando a contribuição dos trabalhadores empregados e avulsos. O produtor rural pessoa física, equiparado a empresa por dispositivo legal, está, assim, sujeito a tal tributação, e o faz como equiparado a pessoa jurídica, pois, como visto, há na atividade o traço empresarial. Ademais, de um lado, focando o aspecto individual, tal enquadramento assemelha-se à situação do empregador doméstico, que contribui sobre o salários-de-contribuição dos empregados a seu serviço. De outro lado, considerado o aspecto empresarial, também o empresário urbano é contribuinte individual obrigatório. Porém, todos eles, enquanto pessoas individualmente pretendentes aos benefícios previdenciários, devem contribuir, também singularmente, para o custeio do sistema. Não há, neste mecanismo de financiamento, nenhum traço de confisco, dupla tributação ou tratamento não-isonômico; há, isto sim, eqüidade na forma de participação no custeio da seguridade social, conforme princípio constitucional.

5.3) DESNECESSIDADE DE LEI  COMPLEMENTAR RELATIVAMENTE A FONTE DE CUSTEIO JÁ PREVISTA NO TEXTO DA CF/88.

Muito embora as conclusões adotadas pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do RE 363.852/MG consubstanciem entendimento diverso, é perfeitamente defensável a similitude entre os conceitos de receita bruta proveniente da comercialização da produção rural e de faturamento, base econômica que já se encontrava prevista na redação original do inciso I do artigo 195 da CF/88.

Ab initio, cumpre ressaltar que, em primeiro plano, não se objetiva defender a equivalência entre os conceitos de faturamento e receita bruta, pura e simplesmente. Precipuamente, o que se pretende é equiparar o termo faturamento a um tipo específico de receita bruta, qual seja: aquela proveniente da comercialização da produção rural. Não se deve perder de vista que o conceito de receita bruta é mais amplo do que a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural.

O professor Kiyoshi Harada destrincha essa interessante distinção entre receita bruta e receita bruta proveniente da comercialização da produção rural, nos seguintes termos:[22]

Interessante notar que, no caso concreto, que a incidência da contribuição social sobre "receita bruta proveniente da comercialização da produção rural" coincide com o conceito de faturamento da produção rural. A receita bruta, sem o qualificativo "proveniente da comercialização da produção rural", é um conceito mais abrangente que o de faturamento, pois abarca as receitas não operacionais. Contudo, com aquele qualificativo constante da decisão sob exame, que reproduz o que está nos incisos I e II, do art. 25 da Lei nº 8.212/91, os conceitos se equivalem. De fato, receita bruta decorrente proveniente de comercialização da produção rural, por implicar exclusão de outros tipos de receitas (juros, alugueres, ágio na venda de ativos financeiros etc.) coincide rigorosamente com o conceito de faturamento da produção rural.

Ainda que não se reconheça essa evidente diferenciação entre a receita bruta em geral daquela proveniente da comercialização da produção rural, é perfeitamente possível defender a constitucionalidade da contribuição previdenciária em questão a partir da jurisprudência dominante nas Cortes Regionais e no próprio Supremo Tribunal Federal, haja vista que tais tribunais firmaram entendimento no sentido que são equiparáveis os conceitos de faturamento e receita bruta, conforme se demonstrará adiante.

Para melhor compreender a quaestio, eis o teor do art. 195 da Constituição Federal, em sua redação original:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I- dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro;

§ 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I

Por sua vez, o art. 154, I, da Constituição Federal dispõe:

Art. 154. A União poderá instituir:

I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição;

As normas constitucionais acima transcritas autorizam o legislador federal ordinário a instituir as contribuições sociais previstas na Lei Maior.

Ao comentar o §4º do art. 195, Paulsen ensina que a menção a “outras fontes” remete ao futuro, ou seja, à instituição de novas fontes, além das já previstas nos seus incisos I a IV[23].

Observe-se que o art. 1º da Lei nº 8.540/92 não criou nova contribuição, mas apenas alterou a fundamentação constitucional de contribuição já existente de folha de salários para faturamento, sob a denominação de receita bruta proveniente da comercialização da produção rural.

Demonstrada a desnecessidade de lei complementar nessas circunstâncias, é preciso ter em mente o significado da terminologia empregada pela Constituição Federal e pela Lei nº 8.540/92: faturamento e receita bruta. Em que pese opiniões em sentido contrário, a interpretação conjugada das definições oferecidas pela legislação, doutrina e jurisprudência dão suporte para as modificações implementadas pela Lei nº 8.540/92, seja pela equiparação entre faturamento e receita bruta proveniente da comercialização da produção rural, seja pela possível equiparação entre faturamento e receita bruta pura e simplesmente, sem o qualificativo “proveniente da comercialização da produção rural”.

Em linhas gerais, o termo “receita bruta” pode ser compreendido como o produto das vendas e serviços vinculados à atividade da empresa, segundo as definições conferidas pelos seguintes dispositivos legais: Decreto-Lei nº 1.598/77[24], Lei nº 6.404/76[25], Resolução BACEN nº 482/78[26], Decreto-Lei nº 1.940/82[27], com alterações introduzidas pelo DL nº 2.397/87.

Na mesma linha, a doutrina contábil empresta ao termo receita bruta o sentido de resultado exclusivo derivado da industrialização dos produtos, da venda de mercadorias ou da prestação de serviços, atividades estas vinculadas diretamente ao objeto social descrito no Estatuto ou Contrato Social da sociedade mercantil. Tal categoria de receitas é composta unicamente do ingresso econômico-financeiro dessa natureza, não agrupando receitas ou ingressos outros que não tenham vinculação exclusiva ao objeto principal do negócio mercantil desempenhado.

De outra banda, merece destaque que “fatura” é o documento relativo à venda de mercadorias, pelo qual o vendedor faz conhecer ao comprador a lista dos produtos vendidos com suas especificações, entre as quais o preço. A emissão de fatura nas vendas é obrigatória, nos termos do art. 1º da Lei nº 5.747/68. Já o faturamento é o somatório das faturas em um determinado lapso de tempo.

Todo produtor rural, por exemplo, ao comercializar a sua produção, deve, obrigatoriamente, emitir as respectivas faturas. O faturamento irá corresponder a sua receita bruta proveniente da comercialização da produção, ou o somatório dos valores faturados.

À guisa de exemplo, a Lei nº 9.037/96, que instituiu o Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições da Microempresa e Empresas de Pequeno Porte - Simples, estabeleceu a contribuição previdenciária patronal incidente sobre o faturamento ou receita bruta.

A propósito, em caso análogo - ADI 1.103-1 -, cuja decisão foi evocada no voto condutor do RE 363.852/MG, embora o Supremo Tribunal tenha declarado a inconstitucionalidade do parágrafo 2º do artigo 25 da Lei nº 8.870/94, reconheceu a constitucionalidade dos incisos I e II do mesmo dispositivo legal, ao admitir que os termos receita bruta e faturamento são equivalentes entre si, nos seguintes termos:

Posta assim a questão, vamos ao caso sob exame, o art. 25, I e II, e o § 2º do art. 25 da Lei 8.870, de 1994. Quanto aos incisos I e II do art. 25, não há falar em inconstitucionalidade, dado que o Supremo Tribunal Federal já estabeleceu que a receita bruta identifica-se com o faturamento. Então, a contribuição está incidindo sobre um dos fatos inscritos no inc. I do art. 195 da Constituição.

Vejamos, agora, o § 2do art. 25:

§ 2º O disposto neste artigo se estende às pessoas jurídicas que se dediquem à produção agro-industrial, quanto à folha de salários de sua parte agrícola, mediante o pagamento da contribuição prevista neste artigo, a ser calculada sobre o valor estimado da produção agrícola própria, considerado seu preço de mercado. (grifei)'

Institui o § 2º do art. 25, está-se a ver, contribuição a ser paga pelas pessoas jurídicas que se dedicam à agroindústria, quanto à folha de salários de sua parte agrícola. Até aí, tudo bem, dado que é possível a instituição de contribuição sobre a folha de salários (art. 195, I, CF). A inconstitucionalidade vem em seguida. É que a base de cálculo da contribuição não é o quantum da folha de salários, mas 'o valor estimado da produção agrícola própria, considerado seu preço de mercado.'

A lei, no ponto, inovou ao estabelecer a base de cálculo ou base imponível da contribuição. (STF - Ministro Carlos Velloso - ADIn 1103-1)

Da mesma forma, assim restou decidido no RE 150.755/PE[28], oportunidade em que o Supremo Tribunal Federal também admitiu a juridicidade da tomada de empréstimo do conceito de faturamento, equiparável ao de receita bruta, revisto na legislação do imposto de renda, para a finalidade de definir-se a base de cálculo da contribuição incidente sobre faturamento, prevista no inciso I do artigo 195 da CR/1988, e assim, dizer da constitucionalidade do artigo 28 da Lei n° 7.738/1989:

III - Contribuição para o Finsocial exigível das empresas prestadoras de serviço, segundo o art. 28, Lei n° 7.738/89: constitucionalidade, porque compreensível no art. 195, I, CF, mediante interpretação conforme a Constituição. (...)

8. A contribuição social questionada se insere entre as previstas no artigo 195, I, CR, e sua instituição, portanto, dispensa lei complementar: no art 28 da Lei n° 7.738/89, a alusão a ‘receita bruta’, como base de cálculo do tributo, para conformar-se ao art. 195, I, da Constituição, há de ser entendida segundo a definição do Decreto-Lei n° 2.397/87, que é equiparável à noção corrente de ‘faturamento’ das empresas de serviço. (RTJ 149/259, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE)

Na mesma esteira, as Cortes Regionais também já haviam sedimentado o entendimento na linha de que os termos faturamento e receita bruta eram equivalentes, como se vê, por exemplo, no AMS - 2000.71.10.002687-8, DJU DATA:26/06/2002, Relator Alcides Vettorazzi, do TRF-4 e no AMS 1997.01.00.043974-1/GO, Relator: Juiz Olindo Menezes, Convocado: Juiz Antônio Ezequiel da Silva, Publicação: 10/09/1999 DJ p.200, do TRF-1.

Peço vênia para consignar os fundamentos adotados no voto da Desembargadora Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère, quando do julgamento Apelação Cível nº 0002422-12.2009.404.7104/RS, que bem sintetizam a quaestio:

A equivalência entre os termos faturamento, inscrito na Constituição, e receita bruta, inserida na legislação ordinária, já foi reconhecida pelo STF no julgamento da ADC 01/95. Também no julgamento da ADIN nº 1.103-1/96 restou tacitamente confirmada a correspondência entre tais termos, pois a inconstitucionalidade atingiu apenas a base de cálculo pretendida pela agroindústria (valor estimado da produção agrícola própria, considerado seu preço de mercado). Embora não tenha sido conhecida a ação de inconstitucionalidade quanto ao caput do art. 25 da Lei nº 8.870/94, por falta de pertinência temática entre os objetivos da requerente (Confederação Nacional da Indústria) e parte da matéria impugnada (contribuição do produtor rural pessoa jurídica), observa-se não haver divergência quanto ao entendimento de serem equivalentes as expressões faturamento e receita bruta, em especial o voto do eminente Ministro Ilmar Galvão, do qual transcrevo o seguinte trecho; 'Para obviar o problema, urgia uma providência, de ordem legislativa, que foi concretizada por via do art. 25, caput e parágrafos, da lei ora impugnada, mediante a substituição da folha de pagamento dos empregadores rurais pelo valor da receita bruta proveniente da comercialização da produção, com base de cálculo da contribuição social por eles devida, reduzida a respectiva alíquota de 20% para 2,5%. É fora de dúvida que, ao assim proceder, laborou o legislador ordinário em campo que lhe era franqueado pelo art. 195, I, da Constituição, como já reconhecido por esta Corte nos precedentes invocados pelo eminente Relator, os quais foram categóricos no entendimento de que se compreende no conceito de faturamento, previsto no mencionado texto, a referência a 'receita bruta'.

Na verdade, não há falar em inconstitucionalidade do referido art. 25 da Lei nº 8.870/94. inc. I e II, por haverem mandado calcular a contribuição social devida pelo empregador rural sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção.

O problema surge, conforme acentuado pelo eminente Relator, no que concerne à produção dos empregadores rurais organizados sob a forma de agroindústria, em relação aos quais a lei impugnada (art. 25, § 2º) mandou calcular a contribuição, não sobre a receita bruta, posto não haver como se falar, no caso, em receita, se não há operação de venda da produção, mas 'sobre o valor estimado da produção agrícola própria, considerado seu preço de mercado'.

Este reconhecimento ocorreu no âmbito da EC nº 20/98, portanto somente após esta data afigura-se correta a definição da base de cálculo da exação debatida como sendo a receita proveniente da comercialização da produção rural.

Em decorrência, é desnecessária a instituição da exação em comento por lei complementar, porque já tem fonte de custeio constitucionalmente prevista (art. 195, I e § 8º), somente sendo exigida a instituição de contribuição para a seguridade social por meio de tal instrumento normativo para a criação de novas fontes de financiamento, consoante o disposto no artigo 195, § 4º. Assim, não está condicionada à observância da técnica da competência legislativa residual da União (art. 154, I)” (Apelação Cível nº 0002422-12.2009.404.7104/RS, TRF da 4ª Região, 1ª Turma, Relatora: Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, julg. 05.05.2010, DE 12.05.2010).

Como visto, é perfeitamente possível a instituição da contribuição previdenciária prevista no artigo 1º da Lei nº 8.540/92 por lei ordinária, já que a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural se amolda perfeitamente ao conceito contábil de faturamento, inserido no inciso I do artigo 195 da CF/88 – em sua redação original - não constituindo, por tal razão, nova fonte de custeio da Seguridade Social, a exigir sua instituição mediante a edição de lei complementar, nos termos do artigo 195, § 4º, combinado com o artigo 154, I, ambos da CF/88.

Sobre a autora
Mariana Ruschel Wierzchowski

Procuradora da Fazenda Nacional Mestre em Direito pelo Centro Universitário Ritter dos Reis Pós-Graduada em Direito Tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WIERZCHOWSKI, Mariana Ruschel. A constitucionalidade da contribuição previdenciária patronal do empregador rural pessoa física. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3832, 28 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26242. Acesso em: 27 dez. 2024.

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