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A necessidade de dar eficácia ao Controle Interno do Município

Agenda 20/03/2014 às 09:33

O controle interno pode evitar que o dirigente incorra em desacertos fatais para a sua carreira política. Estudam-se suas ferramentas neste artigo.

1- Controle Interno é preciso

A legislação constitucional e legal é cristalina ao determinar funcionamento de sistema de controle interno em cada Poder estatal.

Já desde 1964,indica a Lei federal nº 4.320, de 1964 atribuições àquele controle; põe-se aqui o exame de legalidade dos atos financeiros; o acompanhamento da realização operacional; a verificação da fidelidade com que servidores e agentes políticos usam e guardam bens e valores públicos (art. 75 a 80).

Aquela verificação de legalidade é prévia (antes de o ato financeiro produzir efeitos), concomitante (ao longo da execução do ato financeiro) e subsequente (após a realização daquele ato em certo período de tempo). É o que quer o art. 77 da sobredita disciplina.

Em seguida, a Carta de 1967 reafirmou aquela instância de fiscalização, conferindo ênfase à auditoria operacional, muito embora pouco se referisse à apuração de legalidade. De toda forma, lá se ordenava que o nível internalizado devesse garantir, com ênfase,boas condições para o trabalho do Controle Externo, a cargo dos Tribunais de Contas.

Depois, inova a Constituição de 1988 ao dispor que o Controle Interno não é só privativo do Executivo, quer dizer, cada Poder passa a contar com o seu próprio sistema, articulado com o existente nos demais Poderes estatais (art. 74).

De seu lado, a Lei de Responsabilidade Fiscal veio detalhar outras incumbências para o órgão interior de fiscalização, entre as quais a de monitorar as metas fiscais da lei de diretrizes orçamentárias (LDO);averiguar a recondução da despesa de pessoal e da dívida consolidada a seus limites; assinar, junto com outras autoridades,o Relatório de Gestão Fiscal (art. 54, parágrafo único e art. 59).

Nas leis orgânicas dos Tribunais de Contas, vários são os trechos que preveem objetivas funções para o Controle Interno.Exemplo disso, no diploma organizativo da Corte da União (TCU)[1], tal instância possui status de Ministério, devendo emitir parecer sobre tomadas e prestações de contas de todas as entidades do governo federal. Como se sabe, no governo federal, o controle interno está a cargo da Controladoria Geral da União (CGU).

De sua parte, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Mato Grosso estabelece que o não funcionamento do Controle Interno pode ensejar recusa da conta apreciada (art. 10).

Na órbita das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) editou regra específica para o Controle Interno Governamental: a NBC T 16.8.

Em sendo assim, não há de dizer que se ressente sobredito controle de previsão no direito financeiro.

Ao demais e segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, "o controle constitui poder-dever dos órgãos a que a lei atribui essa função, precisamente pela sua finalidade corretiva; ele não pode ser renunciado nem retardado, sob pena de responsabilidade de quem se omitiu"[2].

Diante de todos esses motivos, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, em setembro de 2012, lançou o Comunicado 32, requerendo a pronta regulamentação da estrutura de controle interno municipal, a ser integrada por servidores do quadro efetivo.

De fato, salienta o Comunicado que, à vista do antes comentado fundamento constitucional e legal, “de se esperar que os Municípios, por intermédio de normas e instruções, regulamentem a operação do controle interno e, se tal acontecer de forma adequada, disporá o dirigente municipal de informações qualificadas para a tomada de decisões, além de obter mais segurança sobre a legalidade, legitimidade, eficiência e publicidade dos atos financeiros chancelados”.

Ainda, de se recordar que, nos dias de hoje, os gestores municipais têm à frente novas realidades institucionais, sobretudo as várias alterações no ordenamento administrativo e financeiro, o maior rigor fiscalizatório dos Tribunais de Contas e do Ministério Público, e as recentes decisões de inelegibilidade dos Tribunais Eleitorais.

Nesse passo, abundante têm sido as posições dos Tribunais Eleitorais confirmando os julgados dos Tribunais de Contas, sobretudo quando estes antes alertam os dirigentes estatais sobre possível desvio da boa conduta fazendária.Não é demais dizer que a recusa do balanço anual remete o gestor à impossibilidade de, por ao menos oito anos, pleitear mandatos políticos, ou seja, à inelegibilidade.

Assim, claro está que o gestor municipal deve muito se acautelar ante as várias e muitas exigências legais que norteiam o emprego do dinheiro público; necessita, de igual modo, atentar para o entendimento das Cortes de Contas sobre passagens controversas das leis que regem a Administração.

Ante todo o exposto, razões não faltam para o administrador público logo regulamentar o até então inoperante controle interno, valendo-se de funcionários concursados, honestos, de bom relacionamento com os demais, portadores de boa capacidade de aprendizado.

Em suma, esse nível internalizado de controle pode evitar que o dirigente incorra em desacertos fatais para a sua carreira política, consubstanciados em usuais achados dos Tribunais de Contas, tais quais os a seguir comentados:


2- O que é Controle Interno

Controlar significa fiscalizar pessoas, físicas e jurídicas, evitando que a objetivada entidade se desvie das finalidades para as quais foi instituída na sociedade.

E o adjetivo interno quer dizer que, na Administração Pública, o controle será exercido por servidores da própria entidade auditada, conforme as normas, regulamentos e procedimentos por ela própria determinada, em consonância, óbvio, com os preceitos gerais da Constituição e das leis que regem o setor governamental.

Na verdade, o controle interno, em essência, deve ser realizado por todo servidor público, em especial os que ocupam postos de chefia. Já o instituído sistema de controle interno checa, de forma articulada, a eficiência de todos aqueles controles setoriais, sob estrutura ordenada em lei própria.

Então, controle interno não é a mesma coisa que sistema de controle interno.

No âmbito do Poder Executivo,cada pessoa jurídica dispõe de particular controle interno; então, há um para a Prefeitura, outro para a autarquia, mais um para a fundação ou a empresa estatal.

De fato, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (LC nº 709, de 1993) deixa evidente que cada entidade jurídica conta com o seu próprio controle interno:

Artigo 26 - Para cumprimento de suas funções, o Tribunal de Contas poderá utilizar-se dos elementos apurados pelas unidades internas de controle da administração direta e autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público estadual ou municipal.

Ainda, de se dizer que, no âmbito das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) editou regra específica para o Controle Interno Governamental, a NBC T 16.8,segundo a qual tal instância se desdobra em três categorias:


3- O Controlador Interno

No organograma da entidade municipal, o órgão do Controle Interno deve estar diretamente vinculado ao dirigente máximo: na Prefeitura, o Prefeito; na Câmara dos Vereadores, o Presidente da Mesa Diretora; nas autarquias, fundações e empresas; os titulares dessas entidades, sejam Presidentes, Diretores-Presidentes ou Superintendentes.

Sendo assim, os periódicos relatórios do controle serão remetidos àquelas autoridades superiores.

Ideal que o sistema de controle interno seja instituído por lei municipal, nela previstas as incumbências desse órgão, o perfil e o processo de escolha dos controladores internos, bem como os deveres e, sobretudo,as fundamentais garantias funcionais desses servidores, os quais não poderão ser transferidos ou ter seu trabalho obstado por qualquer agente político.

Nas pequenas Prefeituras e Câmaras Municipais ou, mesmo, nas entidades descentralizadas de pouca movimentação financeira, para elas um único servidor pode responder pela estrutura do Controle Interno, e, sob certas condições, não há necessidade de nova contratação para a lide; bastaria específica gratificação para o funcionário designado, conforme as possibilidades financeiras do órgão ou entidade.

Sob tal cenário, a normatização do controle interno pode dispor que seus componentes devam ter certo tempo de serviço, nele comprovando honestidade, ética, bom relacionamento com os demais colegas, e interesse em aprender o conjunto dos encargos operacionais e financeiros do respectivo órgão ou entidade.

De seu turno, em Prefeituras de municípios com, digamos, mais de 20 mil habitantes, o cargo de controlador interno deve ser provido mediante específico concurso público.

Tal qual expresso no antes referido comunicado do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (SDG nº 32, de 2012), o Controle Interno deve sempre ser integrado por servidores do quadro efetivo.

Indispensável o eficaz treinamento dos controladores internos, podendo valer-se a entidade dos seminários ofertados pelo órgão do Controle Externo, e de seus comunicados, cartilhas e manuais.

Segundo pesquisa desenvolvida por duas técnicas do Tribunal de Contas de Minas Gerais [4], “conclui-se que os recursos humanos qualificados e capacitados tecnicamente, com experiência em administração pública, atualizados, comprometidos com a Instituição, independentes em sua atuação profissional, que tenham um bom relacionamento com os demais servidores e que tenham, acima de tudo, uma postura ética e moral são os principais responsáveis pelo sucesso de um Sistema de Controle Interno”.

Ainda, dizem aquelas autoras, “constatamos também que o êxito das atividades exercidas por responsáveis pelos setores de Controle Interno na área pública, em especial nos Municípios, está diretamente relacionado ao grau de conhecimento da legislação e das normas que disciplinam suas atividades”.


4- Normas Aplicadas ao Controle Interno

Após vários debates, encontros e seminários entre técnicos dos Tribunais de Contas do Brasil, da Controladoria Geral da União (CGU), do Conselho Federal de Contabilidade e, também, com vários especialistas em auditoria pública e privada, após essa intensa discussão, o Instituto Rui Barbosa e a Associação dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) publicaram, em 16 de novembro de 2010, as Normas de Auditoria Governamental (NAGs).

Tendo em conta aquele trabalho coletivo, sintetizamos certas regras que bem poderiam ser aproveitadas pelo sistema de Controle Interno do Município:


5- O Relatório do órgão do Controle Interno

Preliminarmente, o sistema de controle planejará a extensão dos exames, valendo-se de seus anteriores relatórios, bem como dos produzidos pelo Controle Externo; de igual modo, a unidade de controle interno se balizará nos votos do Tribunal de Contas sobre contas pretéritas; nos alertas dessas Cortes e, ainda, em denúncias e representações apresentadas por cidadãos ou Vereadores.

Após os exames, conferências, entrevistas, inspeções físicas, circularizações, as observações serão anotadas no relatório do controle interno.

Segundo as já mencionadas Normas de Auditoria Governamental (NAG), o relatório de auditoria governamental deve contar uma redação:

Tendo em mira que o Relatório de Gestão Fiscal é produzido quadrimestralmente, revelando fundamentais indicadores de gestão financeira, além de ser também assinado pelo responsável da unidade de controle interno, ante tais razões o relatório desse órgão poderia ser elaborado a cada quatro meses.

De mais a mais, ao final do quadrimestre é também apresentado outro instrumento de suma importância para avaliar a execução programática anual: o Relatório Resumido da Execução Orçamentária, apesar deste, não é demais recordar, ser elaborado a cada dois meses.

No tocante à Prefeitura Municipal, o relatório do Controle Interno poderia finalizar-se com um quadro-resumo, ofertando, ao dirigente, visão panorâmica da execução operacional, orçamentária, financeira e patrimonial do quadrimestre.

Em tal síntese do apurado, o controlador poderia evidenciar:


Notas

[1]Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União :Lei federal nº 8.443, de 1992.

[2] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.Direito administrativo. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 1998.

[3]§ 1º A disponibilidade de caixa vinculada aos Restos a Pagar, considerados para fins do mínimo na forma do inciso II do caput e posteriormente cancelados ou prescritos, deverá ser, necessariamente, aplicada em ações e serviços públicos de saúde. § 2º Na hipótese prevista no § 1º, a disponibilidade deverá ser efetivamente aplicada em ações e serviços públicos de saúde até o término do exercício seguinte ao do cancelamento ou da prescrição dos respectivos Restos a Pagar, mediante dotação específica para essa finalidade, sem prejuízo do percentual mínimo a ser aplicado no exercício correspondente.

[4]Ana Christina Vieira Magalhães e Elen Ribeiro Guimarães

Sobre o autor
Flavio Corrêa de Toledo Junior

Professor de orçamento público e responsabilidade fiscal. Autor de livros e artigos técnicos. Ex-Assessor Técnico do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TOLEDO JUNIOR, Flavio Corrêa. A necessidade de dar eficácia ao Controle Interno do Município. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3914, 20 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27042. Acesso em: 5 mai. 2024.

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