10 CONCLUSÃO
Não se quis afirmar a existência de juízes que adotem critérios puramente tecnocientíficos ou puramente humanísticos; isso seria impossível diante da própria constituição da razão humana, em sua dupla estrutura intuitiva-discursiva. Entretanto, é possível verificar a existência de julgadores que dão peso maior a um ou outro critério, e é sob essa luz que foi examinado o meio ambiente judiciário.
Não se postulou, por outro lado, a imprestabilidade da razão tecnocientífica no processo de tomada da decisão judicial. Apenas se entende que, dada a teleologia da justiça (voltada para o homem), e a natureza do objeto (as relações humanas), a intuição intelectual, a razão global e hermenêutica e seu desdobramento natural num critério humanístico de julgamento são meios imprescindíveis para que se alcance uma decisão justa.
Em suma: na apreciação da causa o juiz deve utilizar não só sua capacidade lógica, mas também sua intuição intelectual global, orientado pela busca de uma justiça assentada em alteridade, humanização e visão do mundo. Afinal, o ato de julgar não pode ser reduzido a um mero calcular.
REFERÊNCIAS
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LADRIÈRE, Jean. Les enjeux da la rationalité – Le défi de la science et de la technologie aux cultures. Paris: Aubier-Montaigne/UNESCO, 1977.
MORWOOD, James (editor). Oxford Latin Desk Dictionary. New York: Oxford University Press, 2005.
MAC DOWELL, João A.: Investigação Filosófica sobre Deus – Curso de Filosofia da Religião (apontamentos). Belo Horizonte, Departamento de Filosofia da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, 2013.
OLIVEIRA, Bruno Augusto Santos. A erosão do juiz como símbolo nas sociedades contemporâneas e a necessidade de formação ética e crítica do indivíduo-magistrado. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Universidade de Lisboa, Lisboa, ano 1 (2012), nº 11, p. 6859.
OLIVEIRA, Bruno Augusto Santos. O paradoxo do juiz e a necessidade de humanização da justiça. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Universidade de Lisboa, Lisboa, ano 1 (2012), nº 7.
RICOEUR, Paul. A L’École de la Phénoménologie. Paris: Librairie Philosophique J.Vrin, 1987.
SARTRE, Jean Paul. L’être et le néant. Paris: Gallimard, 1943.
TAYLOR, Charles. The Ethics of Authenticity. Cambridge: Harvard University Press, 1991.
VAZ, Henrique C. de Lima Vaz. Escritos de Filosofia IV – Introdução à Ética Filosófica. 4.ed. São Paulo: Loyola, 1999.
Notas
[2] Por alguns também denominada “vida solitária da alma”.
[3] Importante esclarecer que não se trata de uma proposta ética de Taylor, mas de uma realidade comportamental por ele identificada como vigente no ocidente.
[4] TAYLOR, Charles. The Ethics of Authenticity. Cambridge: Harvard University Press, 1991. p.14, tradução nossa.
[5] Id. p. 14.
[6] Id. p. 17.
[7] Evidentemente dentro dos limites constitucionais.
[8] Importante ressaltar que os parâmetros constitucionais e legais, cujo seguimento não se questiona, pertencem ao âmbito externo; aqui se trata da construção autônoma de um critério de julgamento no âmbito da interioridade – ou, em termos filosóficos, da “vida solitária da alma” – do indivíduo-juiz.
[9] V.g., o recurso, julgamentos colegiados, publicação, revisão em artigos científicos.
[10] LADRIÈRE, Jean. Les enjeux da la rationalité – Le défi de la science et de la technologie aux cultures. Paris: Aubier-Mon., o recurso, julgamentos colegiados, publicação, revisão em artigos científicos.
[10] Id. p.15.
[11]LADRIÈRE, Jean. Les enjeux da la rationalité – Le défi de la science et de la technologie aux cultures. Paris: Aubier-Montaigne/UNESCO, 1977, p.185, tradução nossa.
[12] Id. p. 15.
[13] Estabelecida a premissa de que existe um conflito discursivo, a adoção do termo “defesa” discursiva torna-se apropriada.
[14] VAZ, Henrique C. de Lima Vaz. Escritos de Filosofia IV – Introdução à Ética Filosófica. 4.ed. São Paulo: Loyola, 1999, p. 42-43.
[15] Id. p. 13.
[16] Id. p. 39-40.
[17] TAYLOR, Charles. The Ethics of Authenticity. Cambridge: Harvard University Press, 1991. p.5, tradução nossa.
[18] OLIVEIRA, Bruno Augusto Santos. A erosão do juiz como símbolo nas sociedades contemporâneas e a necessidade de formação ética e crítica do indivíduo-magistrado. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Universidade de Lisboa, Lisboa, ano 1 (2012), nº 11, p. 6859.
[19] TAYLOR, Charles. The Ethics of Authenticity. Cambridge:Harvard University Press, 1991. p.5, tradução nossa.
[20] BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2008.
[21] MORWOOD, James (editor). Oxford Latin Desk Dictionary. New York: Oxford University Press, 2005, tradução nossa.
[22] Antes de iniciar a reflexão acerca da estrutura da razão humana - esse instrumento que nos dá a capacidade de proferir os julgamentos -, é preciso fazer um esclarecimento conceitual preliminar. Os versados no vocabulário jurídico já trazem dos bancos das faculdades o respeito pelos termos técnicos estabelecidos e pela importância de sua plena compreensão. Dificilmente se encontrará um jurista que não tenha estremecido ao presenciar filósofos questionarem o crime de "assassinato" ou jornalistas discutindo a última decisão de um tal "Supremo Tribunal de Justiça" brasileiro.Entretanto, não será difícil encontrar dentre os mesmos aqueles que, diante de termos técnicos de outras disciplinas, incorrem no mesmo e compreensível engano de tomar um termo técnico em sua acepção vulgar. É o caso de um termo filosófico relevantíssimo para nosso exame: intuição, ou "compreensão intuitiva". Apesar de vulgarmente entendido com uma acepção fantástica ou mística, o termo "intuição" ou "compreensão intuitiva" carrega uma carga semântica filosófica histórica, já tendo sido chamada de compreensão de sentido global, pré-compreensão, ou intuição intelectual. É dessa compreensão intuitiva e seu lugar na própria estrutura da razão humana que é preciso falar agora, com base na lição de MACDOWELL.
[23] MAC DOWELL, João A.: Investigação Filosófica sobre Deus – Curso de Filosofia da Religião (apontamentos). Belo Horizonte, Departamento de Filosofia da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, 2013, p. 42, nota 111.
[24] Id. p. 44.
[25] MAC DOWELL, João A.: Investigação Filosófica sobre Deus – Curso de Filosofia da Religião (apontamentos). Belo Horizonte, Departamento de Filosofia da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, 2013, p. 41.
[26] Id. p. 117.
[27] RICOEUR, Paul. A L’École de la Phénoménologie. Paris: Librairie Philosophique J.Vrin, 1987. p. 190, tradução nossa.
[28] Id. p.191.
[29] SARTRE, Jean Paul. L’être et le néant. Paris: Gallimard, 1943. p. 220.
[30] HUSSERL, Edmund. La Filosofía, ciencia rigurosa. Tradutor Miguel García-Baró. Ediciones Encuentro, S.A., 2009 . p. 39, tradução nossa.
[31] FRANK, Jerome. Law and the Modern Mind. New Brunswick, N.J.: Transaction Publishers, 2009. p.7, tradução nossa.
[32] Id. p. 21.
[33] Id. p. 19.
[34] Numa reflexão antropológica interessante, HUSSERL menciona “nossa necessidade de conhecimento concludente e unificador que todo conceitue e compreenda...”, in HUSSERL, Edmund. La Filosofía, ciencia rigurosa. Tradutor Miguel García-Baró. Ediciones Encuentro, S.A., 2009 . p. 66.
[35] OLIVEIRA, Bruno Augusto Santos. A erosão do juiz como símbolo nas sociedades contemporâneas e a necessidade de formação ética e crítica do indivíduo-magistrado. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Universidade de Lisboa, Lisboa, ano 1 (2012), nº 11, p. 6859.
[36] OLIVEIRA, Bruno Augusto Santos. O paradoxo do juiz e a necessidade de humanização da justiça. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Universidade de Lisboa, Lisboa, ano 1 (2012), nº 7.
[37] HUSSERL, Edmund. La Filosofía, ciencia rigurosa. Tradutor Miguel García-Baró. Ediciones Encuentro, S.A., 2009 . p. 68.
[38] HUSSERL, Edmund. La Filosofía, ciencia rigurosa. Tradutor Miguel García-Baró. Ediciones Encuentro, S.A., 2009. p. 68.
[39] Id. p. 69.
Abstract: Answers are looked for to the universal question “how do judge well?” departing from thoughts over the so called judge’s “solitary life of the mind” rather than over extrinsic decision-making criteria. Departing from a diagnosis over the judiciary environment, in which it does not exist an ethics of authenticity as identified by Taylor in contemporary western societies – where each person would be free to adopt his own judgment criteria -, but a false neutrality masking a conflict between technoscientific and humanistic speeches, we state that a progressive atrophy of the humanistic vision of the legal process has been taking place, resulting in a loss of quality in the decision-making process. Based on justice’s teleology, on the need of method-object adequacy and on the intuitive-discursive double structure of human reason, we arrive to the need for the adoption by the judge of the following attitudes: use of his reason in its full capacities; assumption of his own humanity; search for wisdom in the husserlian sense.
Keywords: Judgment. Intrinsic criteria. Ethics of Authenticity. Technoscientific speech. Humanistic speech. Intellectual Intuition. Discursive Reason. Teleologic Reason. Instrumental Reason. Method. Humanity. Wisdom.