5 PROJETO DE LEI 3.197/12
Está em tramitação na Câmara o Projeto de Lei 3.197/12 que tem como proposta a alteração do art. 16, da Lei 8.213/91, que inclui novamente o menor sob guarda judicial como dependente do segurado da Previdência Social, haja vista que, atualmente não faz parte do rol dos dependentes do segurado.
A proposta tem como objetivo devolver ao menor sob guarda o direito de fazer jus ao que a própria Constituição em seu art. 227 determinou, designando à família, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar ao menor o direito à vida entre muitos outros dizeres, e, dentre estes também, a garantia de direitos previdenciários.
A justificativa para entrada com recurso quanto à reformulação da Lei, é trazer novamente ao conhecimento de todos que a proteção ao menor não está citada apenas na Constituição, mas veio ganhando força diante da Lei 8.069/90 com o Estatuto da Criança e do Adolescente, e mais tarde com a Lei Orgânica da Previdência Social em 1996. Em 1997, com a Lei nº 9.528, esta disposição foi alterada, ficando o menor excluído do rol de dependentes do segurado.
O Projeto coloca que pode haver inconstitucionalidade na nova redação da Lei, enfatizando ainda que um dos princípios constitucionais, o princípio da isonomia, foi descaracterizado, pois, se todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Ao retirar o menor sob guarda judicial da dependência do segurado, deixou claro que há uma contradição de pensamentos, fazendo com que seja totalmente questionável qualquer benefício que ao ser concedido, venha excluir o menor do direito de ser amparado pelos benefícios da Previdência Social.
6 CONCLUSÃO
A família, dentro da ordem social brasileira, engloba mais indivíduos que os fatores sanguíneos podem conferir. Tal realidade pode ser observada quando da inserção de crianças e adolescentes em famílias substitutas, que resguardam aos infantes todo amor e carinho que lhes são necessários para um desenvolvimento sadio.
O legislador, para propiciar a inserção de crianças em famílias substitutas e a fim de efetivar o princípio da convivência familiar, criou três institutos de proteção, quais sejam: a adoção, a guarda e a tutela. Nessas três situações, surge um novel núcleo familiar, que precisa ser igualmente amparado pelo direito, já que são ninhos de afeto, cuidado e responsabilidade.
A igualdade de tratamento das crianças adveio com o art. 227, da Constituição Federal, que estabeleceu uma proteção ampla e irrestrita, inclusive aos infantes que se encontravam em lares substitutos. Ademais, conferiu a garantia de percepção de benefícios previdenciários a toda infanto-adolescência, já que apresentam condições peculiares de vulnerabilidade e fragilidade.
Ocorre que a nova redação do §2º, do art. 16, da Lei 8.213/91, deixou de prever expressamente a figura do menor sob guarda como dependente do segurado. Apesar disso reconheceu a cobertura previdenciária ao menor sob tutela, equiparando-o ao filho do beneficiário.
Neste trabalho, observou-se inexistir razões para essa diferenciação, pois tanto o menor sob tutela quanto a criança sob guarda podem ser equiparadas a situação de filho, já que há uma relação equânime de afeto.
Dessa forma, a previsão previdenciária que restringe a proteção da Constituição Federal conferida às crianças, fere os princípios constitucionais norteadores do novo conceito de família, quais sejam princípio da afetividade, do melhor interesse da criança e do adolescente, da proteção integral, da igualdade entre filhos.
Além disso, ofende postulados do Direito Previdenciário, notadamente o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento e o princípio da proteção ao hipossuficiente, uma vez que as crianças como indivíduos em desenvolvimento, deveriam ser amplamente protegidas, independentemente do meio em que estivessem inseridas.
É sabido que o art. 195, §5º, da Constituição exige a necessidade de fonte de custeio para a concessão de benefícios previdenciários, mas tal exigência não pode sobrepor aos princípios constitucionais protetivos.
Além disso, a aplicação da legislação ordinária precisa respeitar o filtro constitucional e os tratados assinados pelo Brasil, de maneira que as normas de hierarquia inferior não possuem o condão de restringir a aplicabilidade das normas constitucionais. Pelo contrário, as normas inferiores devem conferir os meios necessários para o atendimento das diretrizes da Carta Cidadã. As leis internas também não podem desrespeitar as normas de Direitos Humanos, que buscam a maior amplitude das garantias individuais.
Desse modo, o regime previdenciário deve ser concedido para todas as crianças sob guarda, que comprovem a condição de dependentes, de forma a lhes propiciar os recursos indispensáveis a uma sobrevivência digna.
Vale salientar que a concessão de direitos previdenciários não proporciona uma quebra da regra da legalidade para a instituição de benefícios, já que a redação anterior conferia direito aos menores e a redação atual é eivada de inconstitucionalidade, uma vez que afronta previsão constitucional expressa, constante no art. 227, §3º, II.
Nesse sentido, será importante que o guardião máximo do texto constitucional, o Supremo Tribunal Federal, uniformize a jurisprudência, por meio de Súmula Vinculante ou profira uma interpretação desse artigo conforme a Constituição da República.
A criança e adolescente só receberão a proteção integral quando a vontade do constituinte de assegurar os seus direitos previdenciários for assegurada pelo legislador ordinário ou por decisão vinculante do STF, sendo extensível a todos os infantes, inclusive aos inseridos em famílias substitutas.
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume VI: Direito de Família. 5. ed., rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2008
GONÇALVES, Ionas Deda. Direito Previdenciário. 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2007
IBRAHIM, Fábio Zambite. Curso de Direito Previdenciário. 18ª ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013
PEREIRA, Tânia da Silva. Direito da Criança e do Adolescente: uma proposta interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1996
SANTOS NETO, José Antônio de Paula. Do Pátrio Poder. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1993
SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros Editores, 2005
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: Volume Único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011
Notas
[1] Art. 25, do Estatuto da Criança e do Adolescente: Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.
[2] Art. 33, §4º, do Estatuto da Criança e do Adolescente: [...] o deferimento da guarda da criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.
[3] Art. 227, da Constituição Federal: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[4] Art. 16, §1º, da Lei 8.213/91: “a existência de dependentes de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.”
[5] Art. 16, §4º, da Lei n. 8.213/91: “A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.”
[6] REsp. 464.760-SC, Rel. originário Min. Hélio Quaglia Barbosa, Rel. para acórdão Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 19/04/2005