[1] Segundo Gloria Origgi (2012), a caconomia [ou “Kakonomia”, palavra que procede de uma voz grega, Kakos (pior, mau), com a que se vem a designar “economia do pior” ou “economia do medíocre”] descreve um estranho tipo de situação em que há uma muito difundida predileção pelos intercâmbios medíocres que se mantêm ao menos enquanto ninguém se queixe da situação: algo assim como uma silenciosa preferência pela mediocridade ou pelas normas que regulam os intercâmbios da pior maneira possível. Os mundos caconômicos são mundos em que a gente não somente convive com o escasso rigor próprio e alheio senão que espera realmente que esse seja o comportamento geral: confio em que o outro não cumprirá plenamente suas promessas porque quero ter a liberdade de não cumprir eu as minhas e, ademais, não sentir-me culpado por isso. O que determina que este seja um caso tão interessante como estranho é o fato de que em todos os intercâmbios de natureza caconômica ambas as partes parecem haver estabelecido um duplo acordo: por um lado, um pacto oficial pelo qual os dois intervenientes declaram ter a intenção de realizar um ou mais intercâmbios com um elevado nível de qualidade e, por outro, um acordo tácito pelo qual não somente se permitem rebaixar essa suposta qualidade senão que coincidem inclusive em esperá-las. Deste modo, ninguém se aproveita do outro, já que a Kakonomia se acha regulada pela mútua assunção de um resultado medíocre (ou serôdio), ainda que alguns se aventurem a afirmar publicamente que o intercâmbio teve em realidade um alto nível de qualidade. Em resumo, uma típica e cotidiana relação jurídica processual.
[2] "El hombre perverso, sin duda, no es uno, sino múltiple, y en el mismo día es otra persona e inconstante. (…) el hombre bueno no tiene que andar haciéndose reproches a sí mismo todo el tiempo, como el incontinente; ni su yo presente nada que reprochar al del pasado, como el arrepentido; ni su yo pasado al del futuro, como el mentiroso." (Et. Eu., 1240B)
[3] “Yo no sé de ningún estudio que haya procedido a un escrutinio informático de las obras completas de Marx y Engels, pero si algún día se lleva a cabo, apuesto a que, al menos en los 10 gruesos volúmenes de su correspondencia, la palabra "filisteísmo" – y otras claramente coextensivas, como spiessbürgerlich, que a veces se traduce un tanto inocentemente como "pequeño burgués"— será una de las que registre más entradas”.(A. Domènech, 2003)
[4] A ética da virtude é atualmente uma das principais teorias normativas em ética, junto com o deontologismo e o consequencialismo. Tem suas origens na Grécia clássica, em Platão, e, sobretudo, em Aristóteles. Foi a teoria moral dominante até a Ilustração. E ainda que durante os séculos XIX e XX a ética da virtude foi progressivamente substituída pelo consequencialismo e o deontologismo, nas últimas décadas houve uma revitalização da ética das virtudes e um crescente interesse na função que cumprem as virtudes na teoria moral. Em lugar dos deveres e as regras (como o deontologismo) ou as consequências das ações (como o consequencialismo), esta ética normativa considera as virtudes como o conceito fundamental na teoria moral. Para a ética da virtude, a moral não afeta somente a relação com os demais, também é uma preocupação pessoal consigo mesmo; se baseia na análise de uma série de propriedades do caráter ou virtudes que explicam a conduta do indivíduo virtuoso e que determinam o curso da ação correta. Em resumo, enquanto o deontologismo e o consequencialismo são teorias morais que tratam de responder à pergunta de que deve um indivíduo fazer, a ética da virtude, à diferença destas teorias, está principalmente orientada a resolver a pergunta de que tipo de pessoa se deve ser; se centra no agente, e não no ato; no caráter, e não na conduta.
[5] Ocorre o mesmo com a dogmática jurídica: constitui, como muito, algo assim como uma “partitura” (muito trágica, por certo) que pode orientar, em maior ou menor medida, a execução da “peça musical”. Mas jamais há que esquecer que a qualidade dessa peça depende, finalmente, “dos músicos e não do papel”.
[6] Supomos que se o Judiciário não se desmorona (se não se desmorona mais) é graças a que os bons juízes fazem seu trabalho e mantêm a maquinaria em funcionamento, apesar da sublime incapacidade intelectual e a escura natureza de alguns de seus congêneres. O único problema é que um edifício em chamas necessita algo mais que alguns bombeiros.
[7] Um bom exemplo seria o de alguns magistrados que têm uma acentuada preferência e facilitam a proliferação do que poderíamos chamar uma jurisdição cosméstica, especialmente dominada pela “jurisprudência simbólica”: grande ênfase nos valores e princípios jurídicos, direitos humanos e fundamentais, decisões espetaculares que os alargam e os enobrecem quando se trata de conflitos entre particulares ou que não afetam aos interesses dos poderes e dos indivíduos que “movem os fios” da política, e tremenda e muito cínica mesquinhez quando os direitos cidadãos chocam com a razão de Estado e o interesse dos supremos governantes. Demagogia judicial praticada por magistrados desprepados, submissos e temerosos, quando não descaradamente venais.