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A validade jurídica dos documentos digitais

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5. As vantagens e desvantagens do uso dos documentos digitais

Nesse tópico, apresentaremos uma breve síntese sobre as vantagens e desvantagens do uso dos documentos digitais.

Inúmeras são as vantagens oferecidas pelo uso dos documentos digitais em relação aos documentos tradicionais.

Vantagens:

- Maior celeridade em sua elaboração, bem como redução de custos de impressão;

- Arquivamento de forma simples e fácil recuperação de dados;

- Alta capacidade de armazenamento, sendo seu custo reduzido;

- Retorno às exigências ecológicas e de tutela do meio ambiente;

- Duplicabilidade imediata, não havendo a figura da cópia;

- Transmissão imediata;

- Dificuldade de fraude, mediante mecanismos que a impeçam;

- Capacidade de resistência ao envelhecimento e deterioração.

Douglas Leme de Riso salienta acerca das vantagens dos documentos eletrônicos em face à preservação da natureza:

Atrelado aos objetivos da lei americana ou qualquer outro diploma legal de países do globo, atrevemos a citar, também o apelo ambiental positivo provocado pelo uso eletrônico de documentos: a preservação da fauna e flora do planeta, que irá, com certeza, minimizar desmatamentos com a finalidade de abastecimento da indústria de papel e celulose.[12]

Os documentos tradicionais, apostos em papel, não mais correspondem às necessidades rápidas de agilidade na circulação das informações. São evidentes as suas limitações, nos dias atuais, seja no que se refere à simples conservação, transmissibilidade ou segurança.

Como sabemos, o documento tradicional é feito por meio corpóreo, isto é, lançado no papel em forma escrita e assinado pelas partes. Já o documento eletrônico tem várias formas, não podendo ser classificado como escrito. Ele pode ser representado por desenho, som, vídeo ou tudo aquilo que representar um fato e que esteja armazenado em um arquivo digital.

Desvantagens

Uma das principais desvantagens do documento digital é a ligação que ele possui com a tecnologia, computadores e tudo mais que o envolve. A necessidade de intermediação é um dos pontos fracos dessa forma de documentação, uma vez que para que possamos ter conhecimento de determinada informação que se encontra memorizada em forma de bits, faz-se mister a intermediação com o auxilio de um computador.

Também quanto à sua leitura, para que possa ser visualizado o conteúdo de um documento digital, devemos submetê-lo ao computador para a decifragem.

Com o uso constante da informática no quotidiano, mudanças em nossos hábitos serão verificadas, mostrando-nos que somos capazes de nos adequar às situações novas, bem como à tecnologia que a cada dia se aperfeiçoa.

Uma questão que deve ser considerada neste tópico é a insegurança, presente na sociedade, na realização de transações pela Internet. Se houvesse uma campanha nacional de informação sobre o bom uso dos meios informáticos, elaborada por todos os interessados no comércio eletrônico, esse obstáculo poderia ser superado.


6. O tratamento legislativo em outros países

Muitos países, nos últimos anos, criaram normas que disciplinam a validade jurídica dos documentos digitais, dando-lhes, para isso, a segurança de sua autoria e integridade.

Porém, cada país preferiu regular a matéria de sua maneira, visto que alguns simplesmente criaram mecanismos certificadores das assinaturas, enquanto outros, além disso, trataram da qualificação legal dos arquivos digitalmente assinados, atribuindo-lhes, assim, a qualidade documental.

Douglas Leme de Riso aponta o posicionamento da legislação dos Estados Unidos sobre a validade jurídica dos documentos digitais:

Nesse sentido, o governo americano em ato pioneiro e corajoso, por meio de seu presidente Bill Clinton, sancionou recentemente lei sobre assinatura eletrônica com vistas a: (i) estimular o uso deste meio de comunicação, mesmo conhecendo as dificuldades em outorgar às transações desta espécie, a devida segurança; (ii) reduzir drasticamente as despesas administrativas; e (iii) reduzir o tempo consumido nas transações. [13]

Vários estados federados dos Estados Unidos já dispuseram sobre a matéria, como Utah, que atribuiu a mesma validade jurídica tanto aos documentos assinados digitalmente quanto aos assinados manualmente. Diferentemente, o Estado da Califórnia subordinou a validade dos documentos digitais à aquiescência daqueles que o produzirem.

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Já em outros países, como a Itália, pioneira em seu continente, legislou-se sobre a matéria atribuindo-se a mesma validade jurídica dos documentos assinados manualmente aos documentos com assinaturas digitais.

Na Alemanha, a legislação limitou-se a definir a estrutura necessária ao uso das assinaturas digitais, não lhes atribuindo a mesma validade legal que o documento assinado manualmente.

Em artigo jurídico, Ângela Bittencourt dispõe sobre a regulamentação dos documentos eletrônicos na Alemanha:

Na mesma esteira, a Alemanha já tem a sua" Informations Und Kommunikationsdienste Gesetz Iukdg", lei federal que estabelece condições gerais para o uso das assinaturas digitais, tanto ao seu aspecto de segurança e se baseia no mesmo sistema de criptografia. E assim,outros países,como a Itália e a Bélgica, adotaram procedimentos semelhantes. [14]

A Argentina, pelo Decreto nº 427/98, criou um programa de uso das assinaturas digitais no âmbito da administração pública; porém, para serem utilizadas somente em atos internos que não produzam efeitos jurídicos "individuales en forma directa".

A Lei Modelo expedida pela UNCITRAL, da ONU, que visa a promover a uniformidade das regras sobre o tema entre todos os países, apresenta alguns pontos interessantes a respeito da validade dos documentos digitais.

Em seu artigo 1º, a Lei Modelo trata do reconhecimento jurídico dos contratos eletrônicos, não negando a sua validade e força obrigatória, como um contrato firmado na forma tradicional. No artigo 6º, a Lei discorre a respeito da necessidade do documento digital apresentar-se na forma escrita, quando a lei exigir a forma escrita para aquele negócio, além de ter que permanecer disponível e acessível para consultas posteriores.

O artigo 7º dispõe sobre a assinatura dos contratos eletrônicos, nos quais a assinatura manual, quando exigida pela lei, poderá ser substituída por outros métodos eficazes de identificação das partes contratantes, desde que confiáveis e apropriados para as finalidades do negócio jurídico.

Com relação à formação do contrato eletrônico, a Lei Modelo dá validade à oferta e à aceitação, expressas por meios eletrônicos, desde que as partes não tenham convencionado de maneira diversa.

Ainda, a mesma Lei trata do tempo e lugar de envio e recepção de uma mensagem eletrônica, determinando que se as partes não convencionarem de maneira diversa, a mensagem será considerada enviada quando ela entra em um sistema de informação fora do controle do emissor e recebida nos seguintes casos: se o destinatário designou um sistema de informação para receber mensagens eletrônicas, a recepção acontecerá:

a)no momento em que a mensagem entrar no sistema designado;

b)ou no momento em que a mensagem foi recuperada pelo destinatário, quando esta entrar noutro sistema que não o designado. Caso o destinatário não designou um sistema de informação, a recepção acontecerá no momento de entrada da mensagem no sistema de informação do destinatário.

Concluindo, Paulo Sá Elias pondera que países como Estados Unidos, Canadá, Argentina, Colômbia, e mesmo a União Européia, já criaram leis disciplinando a matéria. Porém, é necessário que tal regulamentação se faça presente o quanto antes, "por se tratar de assunto de interesse universal, que não pode ficar a espera de que o mal aconteça, para só então se tomarem as providências". [15]


7. A validade e a regulamentação dos documentos digitais no Brasil

No Brasil, algumas regras já foram acrescentadas em nosso ordenamento jurídico acerca da validade dos documentos digitais. Essa nova realidade que paira na sociedade mundial e, principalmente, na sociedade brasileira, faz com que busquemos nos adaptar à tecnologia crescente e regulamentar a questão de forma a não permitir a estagnação econômica do País, além de amparar a sociedade com mecanismos jurídicos aptos, nas relações jurídicas tratadas pelos meios eletrônicos.

Alguns foram os casos em que nossos tribunais puderam decidir sobre a validade jurídica de certos documentos digitais. Podemos citar como exemplo o caso do 1º interrogatório em videoconferência do Brasil, realizado pelo juiz de direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Campinas/SP, Dr. Edison Aparecido Brandão, em 27 de agosto de 1996, sendo que tal ato foi julgado válido pelo Supremo Tribunal Federal (RHC 0006272-97/0010034-0).

No Brasil, há três projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, sobre a matéria. O primeiro é o Projeto de Lei do Senado nº 22, que dispõe sobre os documentos produzidos e os arquivados em meios eletrônicos, que tramita desde 1996. O segundo é o recente PL nº 1483, que institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações de comércio eletrônico, que tramita desde 1999. Ainda há o Projeto de Lei nº 1589, proposto em agosto de 1999 pela Ordem dos Advogados do Brasil, Secção São Paulo, dispondo sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, que segue algumas regras da Lei Modelo da UNCITRAL.

Em 29 de julho de 2001 foi editada pelo Presidente da República a Medida Provisória de nº 2.200, que trata da segurança jurídica do comércio eletrônico e do documento eletrônico. Entretanto, tal Medida Provisória foi largamente criticada pela comunidade jurídica pelo fato de que esta não mantinha paralelo com nenhuma legislação de país democrático, nem na proposta da ONU (Lei Modelo da UNCITRAL), nem nos projetos de lei que tramitavam no Congresso. Também se critica a criação do Comitê Gestor da Infra-Estrutura de Chaves Públicas, dominado pelo Poder Executivo, cujas funções, dentre outras, são as de definir os requisitos dos documentos eletrônicos e os modos de certificar as chaves que o assinam, emitindo certificados pelas Autoridades Certificadoras, que serão definidas pelo mesmo Comitê acima mencionado. Tratam-se, para muitos, de funções normativas, completamente inconstitucionais.

Com relação à validade dos documentos digitais, a Medida Provisória obrigou que este deva ser assinado com chaves certificadas por uma Autoridade Certificadora credenciada pelo Comitê. Neste ponto, difere-se, p. ex., das leis da Diretiva Européia e do Projeto de Lei da OAB/SP, que dão valor jurídico e probatório aos documentos digitais mesmo que a assinatura eletrônica não se baseie em um certificado reconhecido ou expedido por um certificador credenciado. A crítica feita pelos membros da OAB está no sentido de que o credenciamento obrigatório das autoridades certificadoras dos documentos digitais no Comitê foi elaborado para gerar "lucro fácil" às certificadoras credenciadas. Ainda, nada mais oportunista ao Governo Federal do que manter em seu poder um cadastro geral (banco de dados) de todas as pessoas que utilizam tais serviços, além de poder interceptar e ler as mensagens, mesmo que cifradas, retirando-lhes a segurança, ao invés de garanti-la.

Em 27 de julho de 2001, o Presidente da República reeditou a MP 2.200 com algumas alterações, numa tentativa de "corrigir" os abusos apontados pela OAB/SP. Dentre outras mudanças, admitiu mais um representante da iniciativa privada no Comitê Gestor da ICP-Brasil, esclareceu e consignou que a privacidade da pessoa certificada estará garantida; estipulou que ninguém será obrigado a obter certificados, pois "a validade jurídica é um atributo ligado a qualquer meio de prova, seja eletrônico ou não, desde que obtido por meio lícito"; previu que haverá presunção de veracidade dos documentos digitais, com a possibilidade de utilização de meios comprobatórios diversos para se demonstrar a sua autoria e integridade.

Dando continuidade à regulamentação do tema, em 25 de setembro de 2001, o Comitê Gestor de Infra-estrutura de Chaves Públicas - ICP-Brasil editou a Resolução nº 2, que aprova a Política de Segurança da ICP-Brasil. Foram estabelecidas diretrizes que devem ser adotadas pelas entidades participantes da ICP-Brasil, entre elas a segurança humana, física, lógica e segurança dos recursos criptográficos na Internet.

Inovando na ordem jurídica, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, pelo Provimento GP nº 07, de 10 de agosto de 2001, criou o SIPE – Sistema de Petição Eletrônica. Estabeleceu que as petições poderão ser enviadas pela Internet, exigindo o cadastramento prévio do advogado e a escolha de sua senha, que funcionará como uma assinatura eletrônica (por criptografia). A petição será certificada pelo TRT através do SIPE, que funcionará como uma Autoridade Certificadora. Ficou estipulado que a petição assinada digitalmente terá validade jurídica, não necessitando de ratificação posterior, nem de remessa de cópia com assinatura física. A tempestividade deste documento digital ficou determinada pelo horário de recebimento da petição pelo SIPE, observados os limites do artigo 172, § 3º, do CPC.

A normatização da questão indubitavelmente traz segurança nas relações negociais, possibilitando uma maior demanda nos negócios virtuais, gerando uma maior celeridade para os vários setores, além de provocar a captação de novos investimentos para o país.

Concluindo, citamos os ensinamentos de Ângela Bittencourt Brasil:

Tomando-se a Internet como uma realidade e compreendendo-se as facilidades que ela traz a todos que a utilizam como instrumento de trabalho e negocial, vimos que está reservado ao Direito uma importante parcela dos seus resultados, pois incumbe a ele a tarefa de estabelecer regras para essa relação, reprimir o abuso prejudicial dos contratos e, acima de tudo, encarar a rede como um meio eficaz e rápido para o crescimento econômico. E é entre os atos jurídicos que podem ser efetuados pela Web e que já estão sendo feitos, é que surge a necessária segurança para o estabelecimento completo dessas relações. Se o Brasil ainda não tem as chaves necessárias para a concepção da Assinatura Digital, essa é a hora de faze-la através dos seus técnicos. Se ainda não possui uma Autoridade Certificante para dar credibilidade aos documentos, que reúna os nossos matemáticos para que possam se transformar em Ciber Notários. E finalmente, que os nossos legisladores entendam a premência do estabelecimento das normas reguladoras do espaço virtual e ponham as mãos à obra. [16]

Sobre os autores
João Agnaldo Donizeti Gandini

juiz de Direito em Ribeirão Preto (SP), mestrando pela Unesp, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Ribeirão Preto

Diana Paola da Silva Salomão

advogada em Ribeirão Preto (SP)

Cristiane Jacob

acadêmica de Direito pela Universidade de Ribeirão Preto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GANDINI, João Agnaldo Donizeti; SALOMÃO, Diana Paola Silva et al. A validade jurídica dos documentos digitais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3165. Acesso em: 22 nov. 2024.

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