8. O estímulo à solução consensual dos conflitos e a indispensável participação dos advogados nas audiências
A prevalência da chamada “cultura da sentença” (a expressão é de Kazuo Watanabe) fez com que por muito tempo os integrantes da comunidade jurídica preferissem a solução imposta pelo juiz à solução amigável dos conflitos.[15] Levando-se em conta as deficiências do Poder Judiciário, mormente, o excesso de trabalho dos magistrados e a consequente demora na prestação da tutela jurisdicional, pode-se afirmar que a pacificação social, um dos objetivos da jurisdição, restava assim muito esmaecida. Por essa razão, a resolução de controvérsias por meio de mecanismos alternativos deve ser constantemente estimulada.
Tais mecanismos, além de alcançarem com maior facilidade o objetivo da pacificação social, uma vez que, a solução por eles obtida tem maior aceitação entre as partes, possibilitam, como apontam Mauro Cappelletti e Bryant Garth, a superação de um dos obstáculos ao acesso à justiça, representado pela inadequação do processo estatal para a prestação da tutela jurisdicional adequada a certos tipos de litígios, especialmente, aqueles travados entre partes que buscam manter uma relação duradoura, como, por exemplo, nas causas entre familiares ou vizinhos.[16]
O Código de Processo Civil de 1973 atribuiu ao juiz a função de tentar a qualquer tempo conciliar as partes (art. 125, inc. IV). Para tanto, ressalte-se, o juiz deve estar capacitado para a prática de tal atividade. Não pode o juiz, por exemplo, fazer ameaças às partes, antecipando, por exemplo, qual será o teor da sua decisão com o firme propósito de impor a conciliação. Tal postura, ao contrário, estimula o litígio e o percurso a outras instâncias e o que é pior, imbui no jurisdicionado uma péssima visão a respeito de um representante do Poder Judiciário. Não é isso, definitivamente, o que se deseja. Esse tipo de postura descaracteriza o instituto da conciliação e o deslegitima perante as partes como método viável para a solução das controvérsias. Por essa razão o Novo Código de Processo Civil prevê que o juiz ao promover a autocomposição deverá contar preferencialmente com o auxílio de conciliadores e mediadores judiciais (art. 139, inc. V). Espera-se que conciliadores e mediadores com a devida formação venham a prestigiar o consenso. Abre-se um novo mercado de trabalho, para o qual o advogado do Século XXI, deve estar preparado, com uma formação interdisciplinar considerando a multiplicidade de conflitos que surgem.
O Novo Código, por sua vez, amplia o rol daqueles que tem o dever de estimular a solução consensual dos conflitos, já que de acordo com o seu art. 3, § 3º “a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por magistrados, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”. Em paralelo ao dever de estimular a solução consensual dos conflitos, os advogados têm também o dever de acompanhar seus clientes quando da realização das audiências de conciliação (art. 335, § 9º).
Tendo como um de seus principais objetivos o estímulo à autocomposição, o art. 335 do Novo Código de Processo Civil estabelece que “se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação com antecedência mínima de trinta dias, devendo ser citado o réu com pelo menos vinte dias de antecedência”. O não comparecimento injustificado a essa audiência será considerado ato atentatório à dignidade da justiça (art. 335, § 8º). Essa audiência apenas não se realizará, se as partes se manifestarem contrárias a solução consensual, ou se a causa versar sobre direitos que não admitam a autocomposição (art. 335, § 4º).
A participação do advogado na realização dessas audiências é indispensável não só para que ele assegure ao seu cliente uma segura orientação a respeito dos direitos a que ele terá de renunciar para se alcançar a autocomposição, mas também para que ele atue como legítimo controlador do comportamento dos mediadores e conciliadores judiciais. Ninguém melhor que o advogado para fiscalizar se no exercício de sua atividade os mediadores e conciliadores judiciais respeitam ou não os deveres que o Código lhes impõem. O art. 166, § 3º do Novo Código, estabelece, por exemplo, que o conciliador poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada, no entanto, a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. Além disso, um dos princípios que informam a conciliação e a mediação é o da decisão informada.[17] Como antes dito, a presença do advogado é indispensável para que as partes tenham pleno conhecimento dos atos de disposição que terão de praticar para que a solução consensual do conflito alcance bom termo.
9. Sustentação oral
O Novo Código de Processo Civil, com sabedoria, amplia o rol de causas em que se admite sustentação oral. De acordo com o art. 950, o advogado poderá sustentar as razões de seu cliente: I – no recurso de apelação; II – no agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória sobre tutela antecipada ou o mérito da causa; III – no recurso ordinário; IV – no recurso especial; V – no recurso extraordinário; VI – no agravo interno originário de recurso de apelação ou de recurso ordinário; VII - no agravo interno originário de agravo de instrumento que admite sustentação oral; VIII – no agravo interno originário de recurso especial ou de recurso extraordinário; IX – nos embargos de divergência; X – na ação rescisória, no mandado de segurança e na reclamação; XI – em outros casos a critério do relator ou previstos em lei ou no regimento interno do tribunal.
Ponto importante é admitir a sustentação oral nas decisões que versem sobre deferimento ou indeferimento de antecipação de tutela. Em muitos casos, a decisão que dispõe sobre a antecipação de tutela constitui verdadeiro projeto de sentença e aponta, muito provavelmente, como será decidida a causa. Por isso, é importante que o advogado possa levar as razões de seu cliente aos integrantes do colegiado, já que muitas vezes se trata da primeira oportunidade em que o julgador toma ciência da causa.
Outro aspecto relevante é admitir a sustentação oral nas decisões que tenham deliberado sobre o mérito. Na verdade, esse dispositivo deve ser interpretado com amplitude para se referir a todas as decisões do juiz que tenham aptidão de fazer coisa julgada material. Como se sabe, o juiz poderá decidir com resolução do mérito e sem que tal ato venha a ser disciplinado em sentença, mas em decisão interlocutória, tal como ocorre no julgamento parcial de mérito, no fim da fase de liquidação de sentença e na rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença. Se o juiz em decisão interlocutória cindir o julgamento de mérito ou mesmo deliberar sobre questão prejudicial (que faz coisa julgada material no Novo CPC), caberá sustentação oral no julgamento do agravo interposto contra decisão interlocutória que tenha disposto a respeito de tal matéria. A mesma disciplina se aplica no julgamento de agravo interno interposto contra decisão de relator que extingue o processo nas causas de competência originária (na ação rescisória, no mandado de segurança e na reclamação), cabendo defesa oral (ex vi, § 3º do art. 950).
Mas não é só. Por sua importância na interpretação do direito e no julgamento de futuros casos similares, a intervenção do advogado com defesa oral também tem cabimento no incidente de resolução de demandas repetitivas. A causa que deu ensejo a tal incidente, embora individual, dispõe sobre direitos individuais homogêneos e por isso, merece um conhecimento vertical, pois a decisão a ser proferida influenciará inúmeras pessoas.
Sustentação oral, no entanto, é instituto a ser utilizado com parcimônia pelo advogado, já que tem a missão de esclarecer em quinze minutos apenas os pontos mais relevantes da causa e que são essenciais para o correto julgamento da controvérsia. Resumo do processo e recapitulação de todo o conjunto probatório são aspectos que, na imensa maioria dos casos, não interessam à turma julgadora e por isso, devem ser extirpados da defesa oral, sob pena de haver deturpação do instituto e sua consequente utilização indevida.
10. Férias dos advogados
Grande reivindicação da classe dos advogados é a previsão de férias. Não há sentido o advogado não ter um dia de descanso ao longo de todo o ano. Com o espírito de atender a essa antiga reivindicação, é suspenso o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e 20 de janeiro, inclusive (NCPC, art. 220, caput). Durante a suspensão do prazo, não serão realizadas audiências e julgamentos por órgão colegiado (NCPC, art. 220, § 2º).
Melhor seria haver a previsão, no próprio Código, de um verdadeiro recesso forense, com a orientação clara de que medidas urgências que pudessem aguardar sua efetivação, fossem deixadas para depois de 20 de janeiro. É sabido que muitas medidas de urgência decididas nesse período conseguem encerrar as férias dos advogados, sendo certo que muitas delas poderiam muito bem esperar o fim da suspensão fixada no art. 220 do Novo CPC.
O § 1º do art. 220 do Novo CPC estabelece que “ressalvadas as férias individuais e os feriados instituídos por lei, os juízes, os membros do Ministério Público, da Defensoria Pública e da Advocacia Pública, e os auxiliares da Justiça exercerão suas atribuições durante o período previsto no caput”. Melhor seria que fossem também fixadas nesse período férias forenses para os integrantes da Magistratura, Ministério Público, Defensoria Pública e Advocacia Pública. Com isso, somente o regime de plantão funcionaria durante esse período e apenas para situações de comprovada urgência.
11. Contagem dos prazos somente nos dias úteis
É sabido que a demora na prestação jurisdicional é fator de grande angústia para o jurisdicionado. Mas é sabido também que os prazos cumpridos pelas partes nenhuma responsabilidade tem sobre tal demora. A origem do atraso invencível do exercício da jurisdição tem causas múltiplas, mas se deve essencialmente pelo tempo de espera em que nada ocorre com o processo. É o denominado tempo de prateleira dos autos reais e tempo virtual dos autos eletrônicos em que nada acontece no processo.
Por tudo isso, a contagem dos prazos em dias úteis, constante do art. 219 do Novo Código de Processo Civil, apenas contribuirá para que o advogado cumpra a contento seu mister, sem nada prejudicar o andamento do processo.
12. Ordem cronológica de julgamento
Medida voltada para respeito ao tratamento isonômico e à probidade processual é a ordem cronológica para julgamentos. Não será mais admitido furar fila. Tanto o juiz de primeiro grau, como o tribunal, deverá observar a ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão (NCPC, art. 12). Para evitar fraudes, a lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores (NCPC, art. 12, § 1º). Evidentemente que existem exceções a essa ordem cronológica, mas que estão sabiamente previstas em lei. São elas (NCPC, art. 12, § 2º): I – as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido; II – o julgamento de processos em bloco para aplicação da tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos; III – o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; IV – as decisões proferidas com base no art. 945; V – o julgamento de embargos de declaração; VI – o julgamento de agravo interno; VII – as preferências legais.
A lista, uma vez elaborada, poderá ser alterada em situações excepcionalíssimas, quando a parte se manifestar e acarretar a reabertura da instrução ou conversão do julgamento em diligência (NCPC, art. 12, §§ 3º e 4º). Decidido o requerimento, o processo retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista (NCPC, art. 12, § 5º).
13. Carga rápida
Quem advoga diuturnamente por vezes tem dificuldades de ter acesso aos autos quando há prazo comum correndo. A fim de corrigir essa dificuldade, existente apenas no processo real, já que no virtual não há esse inconveniente, o Novo Código de Processo Civil avançou ao prever uma carga rápida eficaz de até seis horas (art. 107). Assim, sendo o prazo comum às partes, os procuradores poderão retirar os autos somente em conjunto ou mediante prévio ajuste, por petição nos autos (NCPC, art. 107, § 2º) ou ainda, nessa hipótese, é lícito ao procurador retirar os autos para obtenção de cópias, pelo prazo de duas a seis horas, independentemente de ajuste e sem prejuízo da continuidade do prazo (NCPC, art. 107, § 3º).
Evidente que abusos não serão admitidos e a nova legislação prevê a perda do direito à carga rápida ao procurador que não devolver os autos tempestivamente, salvo se o prazo for prorrogado pelo juiz (NCPC, art. 107, § 4º).
14. Intimação pela sociedade de advogados
É uma tendência mundial a advocacia se organize em sociedades de advogados. Muitas contratações se operam em relação à pessoa jurídica e não em relação à figura de um ou outro advogado. Um dos pontos que tem criado embaraços é a intimação de advogados que integram a sociedade de advogados. Muitas intimações ocorrem nas pessoas de advogados que não estão diretamente atuando no caso concreto, não obstante constarem da procuração. Por vezes, essas intimações redundam em prejuízo ao cliente. Não é incomum nos dias de hoje os advogados requererem que as intimações sejam feitas nas pessoas de certos advogados sob pena de nulidade, já que o controle de intimações é feito de forma centralizada.
Ciente dessa nova e moderna advocacia, o Novo Código de Processo Civil permite que as intimações sejam feitas no nome da sociedade a que pertencem os advogados, desde que, evidentemente, estejam elas regularizadas por registro na Ordem dos Advogados do Brasil (NCPC, art. 272, § 1º).
15. À guisa de conclusão
Embora a eficácia de uma norma dependa muitas vezes de fatores externos ao universo jurídico e portanto, insuscetíveis de serem previstos a priori, pode-se afirmar que o Novo Código de Processo Civil, que se aproxima da sua aprovação definitiva, contém, de fato, alguns dispositivos que podem alterar a dinâmica do tão combalido Poder Judiciário brasileiro.
Com relação aos dispositivos que mais diretamente influenciam a advocacia, pode-se constatar que o Novo Código procura por um lado preservar os interesses da advocacia enquanto função pública essencial à Administração da Justiça (CF, art. 133), com a fixação, por exemplo, de patamares objetivos para a fixação de honorários nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, com a revogação da Súmula 453 do Superior Tribunal de Justiça, e com a vedação à compensação de honorários sucumbenciais, e ao mesmo tempo, acertadamente procura desestimular a litigância infundada, tão prejudicial ao nosso sistema, com a imposição de ônus sucumbenciais também na fase recursal. Além disso, o Novo Código andou bem ao estabelecer como um dos deveres dos advogados o estímulo à autocomposição, sem descurar da indispensável participação destes nas audiências que se realizarem com esse propósito.
A par disso, há de se reconhecer que o Superior Tribunal de Justiça tem desempenhado também uma relevante função ao consagrar entendimentos como aquele mencionado de que os honorários contratuais também integram à indenização devida a título de perdas e danos, e de que devido a sua natureza alimentar os honorários advocatícios devem merecer o mesmo tratamento dispensado às outras quantias que possuem essa mesma natureza.