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Dos fundamentos constitucionais do auxílio-reclusão e alguns aspectos legais

Agenda 17/09/2015 às 11:10

Este artigo trata dos fundamentos constitucionais que dão suporte ao auxílio-reclusão, previsto do artigo 201, IV, da Constituição Federal de 1988, quais sejam: a Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Personalidade da Pena ou Instranscendência

Resumo: o presente artigo trata dos fundamentos constitucionais que dão suporte ao auxílio-reclusão, previsto do artigo 201, IV, da Constituição Federal de 1988, quais sejam: a Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Personalidade da Pena ou Instranscendência, bem como o artigo 226, caput, da Constituição, que prevê a especial proteção do Estado à família. É um benefício previdenciário cuja manutenção no sistema jurídico gera insatisfação na sociedade, por se desconhecer que os beneficiários são os dependentes do segurado preso de baixa renda, que não devem sofrer as consequências do ato criminoso do instituidor.

Palavras-Chave: Benefício Previdenciário. Auxílio-Reclusão. Artigo 201, IV da Constituição Federal de 1988. Dependentes do preso de baixa renda. Dignidade da Pessoa Humana. Personalidade da Pena. Proteção do Estado à Família. Sistema Contributivo.


Introdução:

Um dos benefícios previdenciários que mais gera polêmica na sociedade, seja por desconhecimento acerca dos seus fundamentos constitucionais e dos seus contornos legais, é o auxílio-reclusão.

Até mesmo a extinção do benefício em questão foi objeto de enquete no site da Câmara dos Deputados, realizada para se aferir se os internautas eram contra ou a favor de sua manutenção e a criação de um benefício para vítimas dos crimes. 

Isto em razão da Proposta de Emenda à Constituição 304/13, da deputada Antônia Lúcia (PSC-AC), que destina os recursos hoje usados para o pagamento do auxílio-reclusão à vítima do crime, quando sobreviver, ou para a família, no caso de morte. O site da Câmara dos Deputados noticiou, em maio de 2014, que 95% dos cem mil votantes na enquete eram favoráveis à proposta da deputada.

Apesar disso, a análise da Constituição Federal de 1988 revela que o auxílio-reclusão tem suporte na Dignidade Humana e na Pessoalidade da Pena, bem como no artigo 226, caput.


Desenvolvimento:

Com efeito, o auxílio-reclusão é devido aos dependentes do segurado de baixa renda, recolhido à prisão, cuja previsão pode ser vista no artigo 201, IV, da Constituição Federal:

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de da observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

(...)

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998

O benefício em epígrafe tem como fundamentos a Dignidade da Pessoa Humana, o Princípio da Personalidade ou da Instranscendência, bem como a o artigo 226, caput, da Constituição Federal que trata da especial proteção do Estado à família.

A Dignidade da Pessoa Humana (Constituição Federal, artigo 1º, III), é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, que se configura como um valor constitucional supremo. O reconhecimento da dignidade como fundamento impõe aos poderes públicos o dever de respeito, proteção e promoção dos meios necessários a uma vida digna[1].

Já o Princípio da Personalidade ou da Intranscendência é aquele pelo qual nenhuma pessoa é responsabilizada por fato cometido por outrem. Com efeito, o artigo 5º, XLV, da Constituição Federal de 1988 dispõe:

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;”

Nesse contexto, o auxílio-reclusão não se destina a amparar o preso de baixa renda, mas os seus familiares, incluindo filhos menores, nos termos do artgo 16 da Lei 8.213/1991, que dependiam do mesmo para sobreviver, os quais não devem ser penalizados e sofrer as consequências da conduta criminosa, fazendo jus a uma vida digna.

Com efeito, outro ponto a ser observado é que o auxílio-reclusão se insere na noção de sistema contributivo do Regime Geral de Previdência Social, tendo em vista que há necessidade de o preso ter a qualidade de segurado no momento do recolhimento à prisão.  Ou seja, não é um benefício assistencial.

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 Cumpre observar, ainda, que o benefício é pago enquanto o segurado estiver preso sob regime fechado ou semiaberto e não receba qualquer remuneração. Além disso, o recluso deve se enquadrar no requisito da baixa renda, a ser verificada pelo último salário-de-contribuição, que deverá ser igual ou inferior ao valor de R$ 1.025,81, atualizado de acordo com a Portaria Interministerial MPS/MF nº 19, de 10-01-2014.

  Ricardo Castilho defende a existência do benefício no seguinte trecho[2]:

“Por primeiro, é preciso salientar que a função precípua da Previdência Social é proteger não apenas o trabalhador, mas também sua família nos momentos de intempéries. A proteção social representada pelo pagamento do benefício nada mais corporifica do que a solidariedade de toda a comunidade em relação àqueles que, pela própria condição humana, veem-se em situação de vulnerabilidade – passageira, como no caso da gestante e do recluso, ou definitiva, como no caso de doença, morte ou invalidez.

Imaginar que a existência desses benefícios possa incentivar a provocação voluntária de doenças ou a prática de crimes revela, no mínimo, estreiteza de raciocínio. Ainda que isso ocorra em casos obviamente patológicos, trata-se de mera exceção a confirmar a regra e o desvelo da sociedade com toda espécie de vulnerabilidade não pode ser afastado por existirem ocorrências dessa espécie”


Conclusão:

A extinção do benefício de auxílio-reclusão seria um retrocesso no que tange à efetivação das normas constitucionais que lhe dão suporte, quais sejam, a Dignidade da Pessoa Humana e o Princípio da Instrascendência, além da Proteção Estado à família. Deve-se enxergar que os seus beneficiários são os dependentes do segurado preso e não o preso, os quais não devem sofrer as consequências do fato criminoso que não praticaram.


Bibliografia:

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5ª ed. São Paulo: Método, 2011.

AMADO, Frederico. Direito Previdenciário. 3ª ed. Salvador: Juspodivum, 2013.

CASTILHO, Ricardo. “Auxílio-Reclusão: mitos e verdades”. Disponível em www.cartaforense.com.br                                           


Notas

[1] NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5ª ed. Editora Método.

[2][2] CASTILHO, Ricardo. “Auxílio-Reclusão: mitos e verdades”. Disponível em www.cartaforense.com.br

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Marina Fontoura. Dos fundamentos constitucionais do auxílio-reclusão e alguns aspectos legais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4460, 17 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33552. Acesso em: 24 nov. 2024.

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