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E quando os ícones envelhecem?

Agenda 15/12/2014 às 15:00

O Brasil não está envelhecendo como dizem os geógrafos. Nosso país já nasceu envelhecido.

Vivemos num país em que o Rei do Futebol não joga bola há décadas, o Rei da Música segue cantando sucessos que não fazem sucesso entre os jovens há 30 anos e a Rainha das Passarelas, uma mulher velha para a carreira fashion, que já é casada e tem filhos, segue roubando o trabalho das jovens modelos [link]. Pelé, Roberto Carlos e Gisele Bündchen são fenômenos de sobrevivência no mundo da propaganda. A sobrevida deles, porém, nunca foi objeto de estudo. 

Renovação no Brasil é uma coisa que nunca chegou a envelhecer, porque de fato nunca se tornou uma realidade. A média etária dos líderes de todos os partidos é 65 anos. Alguns já deveriam ter se aposentado há décadas. Outros só sairão do Congresso no caixão. Com todo respeito ao poder de fogo que ele comanda, sou obrigado a dizer que o venerável general Enzo Peri, comandante do Exército, já parece uma múmia á pelo menos 10 anos. Alguns Ministros do STF que urinam em fraudas geriátricas querem prorrogar sua estada no Tribunal indefinidamente.  Advogados no auge da carreira tem 80 anos, idem para médicos, engenheiros e até financistas (Delfim Neto ainda está em atividade).

O país do futuro não envelheceu. De fato o Brasil sempre foi governado por velhacos envelhecidos. Com a honrosa exceção de D. Pedro I e o desonroso Impedimento de Fernando Collor, todos os timoneiros da nação foram idosos. O primeiro presidente da República era tão velho que não conseguia subir no cavalo para ir saldar as tropas durante o golpe de misericórdia que foi dado ao regime de D. Pedro II. Quando foi deposto, nosso último imperador já era velho, cansado e barrigudo. As únicas coisas que ele conservava de sua juventude eram as pernas finas e o olhar triste.

Boris Casoy parece saído de um filme de terror B dos anos 1950. Mesmo assim segue sendo um agressivo ancora de telejornal. Xuxa já tem mais de 50 anos e ainda não quer ser a rainha dos baixinhos num asilo. Os únicos velhos que se ajustam às suas idades são os artistas globais idosos que fazem papel de velhos em novelas com um formato cada vez mais envelhecido. O tremendão Erasmo Carlos ainda treme, mas provavelmente porque está com Parkinson. Roberto Bolanhos morreu esta semana com mais de 80 anos e foi celebrado no Facebook como se fosse um jovem comediante mexicano.

A CF/88 prescreve que o Brasil adota o regime democrático. De fato, porém, vivemos num verdadeiro regime geriátrico (exceto quando a imprensa coloca o país num hospício porque seu candidato perdeu a eleição). Legislativo, Executivo, Judiciário e até a indústria cultural que produz ícones é controlada ferozmente por velhos que se recusam a dar espaço para as gerações mais jovens e dinâmicas. Este ano em Osasco, município onde envelheço sem ter tido qualquer oportunidade de ascensão sócio-econômica, um político tucano concorreu a um cargo legislativo usando fotos tiradas há quase duas décadas. Apesar da evidente discrepância entre sua aparência envelhecida e as fotos de campanha ele foi eleito. O velhaco parece conhecer melhor do que eu a alma dos eleitores.

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A Ditadura acabou há 29 anos e somente agora que todos os torturadores e assassinos do regime estão mortos ou às portas da morte por idade resolvemos investigar e punir seus crimes.  Nós, os brasileiros, dizemos que amamos tudo que é jovem. Talvez este apego retórico à juventude seja apenas uma compensação neurótica para o fato mais marcante em nossa vida sócio-político-cultural: o Brasil é um país profundamente enraizado no passado.

As disputas políticas recentes entre PSDB e PT sugerem que os herdeiros da Casa Grande seguem querendo molestar os filhos da Senzala como se eles ainda fossem escravos, negrinhos sem cor e sem valor.  Não digo apenas que os velhos não governam nosso Estado, a oposição e nossa indústria produtora de símbolos. Há algo mais profundo: no Brasil a velhice governa a modernização do país. Isto explica o eterno rejuvenescimento dos ícones. Também explica porque a modernização da política, da sociedade, da cultura, da paisagem icônica e até mesmo da indústria é algo sempre diferido para o futuro. Apesar de nossa retórica recalcada em favor da juventude nós,  os brasileiros, estamos fadados a envelhecer sem ter feito algo digno de nota enquanto éramos jovens ou, paradoxalmente, a ser tratados como  se fossemos eternamente jovens em razão de termos ganhado algum destaque num passado distante.*

 

*Não conheço um mito grego que nos ajude a compreender e simbolizar as cavernosas escuridades da alma brasileira. Deixo este campo de pesquisa aberto aos sabichões mais velhos. 

Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

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