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A eficácia do direito fundamental da proteção em face da automação previsto no inciso XXVII, do art. 7°, da Constituição Federal de 1988

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Agenda 11/09/2016 às 14:08

Considerações finais

Como visto, o direito fundamental da proteção em face da automação envolve uma série de questões para o devido trato das relações trabalhistas. A análise da multidimensionalidade de elementos abrangidos pelo processo de automação pode levar ao estabelecimento das grandes linhas do que deve vir ser a política de proteção do trabalho em face dela.

As mudanças tecnológicas e as novas técnicas de gestão dos negócios têm acarretado uma maior competitividade de mercado, levando à extinção de postos de trabalho e à substituição do homem pela máquina. Assim, em primeiro plano, o direito previsto no inciso no inciso XXVII, do art. 7º, da Constituição Federal, está calcado na proteção dos postos de trabalho e na tentativa de redução dos índices de desemprego e subemprego.

Tal proteção demanda uma rigorosa atuação por parte do Ente Estatal, quer na criação de uma legislação infraconstitucional que possibilite a eficácia irradiante e salutar do mandamento constitucional, quer na instituição de políticas públicas de capacitação profissional e empregabilidade.

Por outro lado, a ambiência laboral espelha uma grande preocupação do Constituinte. O meio ambiente do trabalho faz parte do conceito mais amplo de ambiente, de forma que deve ser considerado como bem a ser protegido pelas legislações para que o trabalhador possa usufruir de uma melhor qualidade de vida.

Daí desponta outro aspecto do referido amparo constitucional. A saúde e segurança no trabalho devem também ser protegidas de forma direta e imediata dos influxos da automação abusiva, tudo em respeito aos valores sociais do trabalho, tidos como fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1°, inciso IV, da CF).

Como se pode notar, ao se tratar de proteção em face da automação, lida-se com um direito fundamental multidimensional. O mandamento contido no art. 7°, inciso XXVII, da Constituição, implica em reconhecer dois tipos de direitos fundamentais ali legiferados. O primeiro, como mencionado, correspondente ao emprego, destina-se à proteção do mercado de trabalho em razão do crescente uso de tecnologias, o que, sem sobra de dúvidas, classifica-se como um direito prestacional, já que exige lei e iniciativa do Aparelho Estatal para o correto cumprimento do plano constitucional ali instituído. De outra parte, o segundo direito extraído do comando, dedica-se ao amparo da saúde e segurança do trabalhador em relação ao maquinário empreendido na produção, o que significa tratar-se de nítido direito de defesa do meio ambiente do trabalho, justamente por produzir como consequência um dever de abstenção do empregador no uso de tecnologias nocivas.

O fato de que o ordenamento trabalhista tenha sido e continue sendo especialmente receptivo à ideia da polivalência dos direitos fundamentais não é meramente acidental. Explica-se pela nota de subordinação intrínseca na prestação do trabalhador, parte mais frágil da relação.

Nesse passo, sobreleva a noção de Trabalho decente, que é o estímulo de trabalho produtivo e adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade, e segurança, sem quaisquer formas de discriminação, e capaz de garantir uma vida digna a todas as pessoas que vivem de seu sustento.

A relação de emprego é uma relação desnivela e assimétrica, na qual o empregado encontra-se vinculado na dinâmica empresarial, segundo os comandos advindos do poder diretivo de seu empregador. Surge daí, então, a eficácia diagonal dos direitos fundamentais dos trabalhadores, que diz respeito à forma como o trabalhador deve, no âmbito empresarial, ter respeitados os seus direitos mínimos garantidos pelo ordenamento constitucional vigente.

Como se vê, a aplicabilidade direta e imediata da norma atinente à proteção em face da automação, além de estar em consonância com a ideia de trabalho decente, é condição fundamental para a superação da pobreza, da redução das desigualdades sociais, da garantia de governabilidade democrática e do desenvolvimento sustentável.

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Por fim, longe de apontar soluções estanques para a problemática da eficácia do direito fundamental à proteção em face da automação, o presente trabalho tenciona garantir ao intérprete da norma constitucional um maior aporte axiológico no trato das relações trabalhistas, no sentido de tornar mais eficaz e efetivo o mandamento contido no art. 7°, inciso XXVII, da Constituição Federal.


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Notas

[2] HOLANDA, Aurélio Buarque de. Novo dicionário da língua portuguesa. 12a. impressão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975. p. 163.

[3] GALLINO, Luciano. Dicionário de sociologia. México: Siglo Veintiuno, 1995. p. 63.

[4] CATTANI, Antonio David. Trabalho e tecnologia: dicionário crítico. 2. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1999, pp. 25-6.

[5] BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: O princípio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 305.

[6] SILVA NETO, Manoel Jorge. Notas Sobre a Eficácia da Norma Constitucional Trabalhista. São Paulo. LTr, 1998.

[7] BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Trabalho decente. Análise jurídica da exploração do trabalho – trabalho forçado e outras formas de trabalho indigno. São Paulo: LTr, 2004, p. 61.

[8] RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1993. p. 28.

[9] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2009, p. 398.

[10] OLIVEIRA SILVA, José Antônio Ribeiro de. A saúde do trabalhador como direito humano. In Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, n. 31, jul./dez. 2007.

[11] SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 2 ª ed., rev. São Paulo : Malheiros, 1998. p. 5.

[12] MARMELSTEIN, George. Curso de direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2008. p. 289.

[13] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 622.

[14] MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à tutela jurisdicional efetiva na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 378, 20 jul. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/5281>. Acesso em: 19 jul. 2011.

[15] TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 434.

[16] ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 2.ª ed. Madrid: CEPC, 2007. p. 214.

[17] TRT24, Recurso Ordinário nº 0048300-40.2005.5.24.0061; Juiz Relator: André Luís Moraes de Oliveira, publicado no DOE/MS N.º 169 de 10/10/2007.

[18] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Malheiros, 2009. pp. 163-4.

[19] MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à tutela jurisdicional efetiva na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 378, 20 jul. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/5281>. Acesso em: 19 jul. 2011.

[20] SARMENTO, Daniel. Direitos Fundamentais e Relações Privadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 124.

[21] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 273.

[22] GAMONAL, Sergio. Cidadania na empresa e eficácia diagonal dos direitos fundamentais. São Paulo: LTr, 2011. p. 24.

Sobre o autor
Wagson Lindolfo José Filho

Juiz do Trabalho Substituto do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região. Ex-Juiz do Trabalho Substituto do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região. Ex-assistente de Gabinete de Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região. Ex-Professor da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região. Ex-Professor da Escola Superior de Advocacia do Estado de Rondônia. Professor de cursos de Pós-graduação. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás. Pós-graduado em Direito do Trabalho pela Universidade Católica Dom Bosco-MS. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Goiás. Mestre em Ciência Jurídica pela UNIVALI-SC. Máster Universitario en Derecho Ambiental y de la Sostenibilidad pela Universidad de Alicante-España. Autor de artigos científicos e obras jurídicas. Criador do Blog Magistrado Trabalhista (www.magistradotrabalhista.com.br).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JOSÉ FILHO, Wagson Lindolfo. A eficácia do direito fundamental da proteção em face da automação previsto no inciso XXVII, do art. 7°, da Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4820, 11 set. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35702. Acesso em: 5 mai. 2024.

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