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A efetividade do direito à cidade e o IPTU progressivo

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4. Considerações Finais

Sabe-se que há diversos instrumentos de política urbana, os quais visam promover o desenvolvimento das localidades municipais – o que não significa reorganizar o espaço urbano tendo em vista uma melhor estética, mas sim buscar adequação dessas modificações às reais necessidades da população – situada na área incluída no Plano Diretor onde se pretende atuar, realizando a democratização da terra urbana tendo em vistas a concretizar os objetivos da República, mormente a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e a erradicação da pobreza e redução das desigualdades sociais.

A Constituição Federal, que vige atualmente, ao elevar a moradia à condição de direito fundamental, quis sem sombra de dúvida conferir aplicabilidade imediata à norma insculpida no art. 6º. De modo que não se justifica qualquer exacerbação do formalismo por parte do legislativo na implementação de medidas referentes à política urbana de desenvolvimento das cidades que visem ao reaproveitamento das propriedades obsoletas, ao argumento de se cercear o direito de propriedade, também direito fundamental. Isto porque, somente caberia tal intervenção nos casos das propriedades que não estejam cumprindo sua função social, quaisquer que sejam seu fundamento.

“Sabemos que o Direito à Moradia é apenas um dos braços do Direito à Cidade, e que a concretização daquele não implica, necessariamente, o respeito a este, visto que existem outros braços do Direito à Cidade sem os quais este não subsiste. Entretanto, a terra urbana que é o elemento primordial na concepção do Direito à Moradia, somente será alcançada por meio dessa política urbana que tanto se fala.”

Atente-se, de todo modo, que o objetivo principal do legislador não foi fazer com que o proprietário perdesse sua propriedade, foi antes fazer com que o mesmo aproveitasse tal imóvel em sua plenitude, seja construindo e utilizando, seja parcelando e alienando.

É notória, no entanto, a retenção dos imóveis com o simples intuito de fazer valorizar a médio e longo prazo, o que não deixa de ser uma prática de intervenção econômica, mas que em nada coaduna com os princípios constitucionais nem eleva o espírito renovador inaugurado pela atual Constituição, a qual pretendeu romper com a antiga roupagem liberal que, infelizmente, ainda se faz presente inclusive no Código Civil de 2002.

A melhor hermenêutica é aquela que atribui às normas infraconstitucionais, interpretação conforme a constituição, para que se possa respaldar a vontade do legislador ordinário ao prever normas que limitem o poder, nos casos de infração às leis.

“Embora não se vislumbre claramente, há clara infração à lei no fato de o proprietário nos prazos dilargados, constante do art 5º, caput do Estatuto da Cidade, descumprir a determinação do parcelamento, edificação ou utilização compulsórios.

Pode-se considerar que não houve boa vontade, por parte do constituinte originário, em ampliar direitos e criar meios para efetivá-los, visto que positivou no art. 182. § 4º, apenas uma faculdade que tem o Poder Executivo Municipal de determinar o PEUC por meio de lei específica, inobstante não restam dúvidas que o que se não impossibilita vem a dificultar sobremaneira tais medidas, ainda mais se levarmos em consideração possíveis interesses que se travestem de óbices legais e a dificuldade que existe ao se aprovar uma lei nas casas legislativas. Desnecessário asseverar a timidez dos Planos Diretores em geral, e especificamente, do Plano Diretor Participativo de Fortaleza (PDPFor).

Não se pretende, é claro, inferir que haja obrigação de determinar uma medida ou outra por parte do Executivo Municipal, até porque é este que verá a necessidade e possibilidade de efetuá-la, o que se critica é a vinculação de se recorrer a uma instância extremamente formal, que é o legislativo, de forma a “atar as mãos” do Poder Municipal, o qual ficará adstrito a uma possível aprovação de determinado projeto de lei que vise ato de política urbana, e é aqui que ocorre o desvio do interesse social.

Referente, ainda, ao IPTU progressivo existem alguns empecilhos que o impedem de ser eficaz na política, do qual podemos citar o limite da alíquota que não deverá, conforme legislação em vigor, ultrapassar os 15%. Ainda, embora incidindo a alíquota máxima, há casos de pessoas que verificam vantagens ao reter seus imóveis, violando a função social da propriedade, tendo em vista que os valores auferidos pela especulação em cima daquelas propriedades serem bem maiores que a incidência daquela tributação municipal, fator este que desestimula o cumprimento da lei, devido ao fato da sanção ser significativamente branda. Outro indicador de ineficácia é o prazo com que os atos da referida política fiscal se efetuam, tais prazos são benevolentes, isto significa que uma medida que poderia levar no máximo dois anos, percorre seus mínimos dez anos quando existem esforços para que aconteçam, podendo inclusive deixarem se surtir os efeitos benéficos para a sociedade.

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“Caracteriza-se assim verdadeira via crucis, a mera tentativa de se implementar qualquer medida de regulação do espaço urbano, sobretudo quando se trata de fazê-lo em prol das classes menos privilegiadas.”

Não obstante toda crítica tecida anteriormente, entendemos ter, os instrumentos jurídicos da política urbana de desenvolvimento, em especial o IPTU progressivo, o condão de desestimular as práticas previstas no art. 2º, inciso VI, além de outras que afrontem contra os princípios da Dignidade Humana e os direitos fundamentais, o qual ainda urge ser reestruturado e sistematizado.

Faz-se necessária urgente reforma legislativa, a começar por Emenda Constitucional no sentido de operacionalizar os institutos trazidos nos diplomas legislativos das três ordens, a saber, Constitucional, Federal e Municipal, sem a qual se torna impossível conceder eficácia aos planos de desenvolvimento urbano e consequentemente restarem infrutíferos o Diploma Constitucional, o Estatuto da Cidade e o Plano Diretor.


5. Referências bibliográficas

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

COSTA, Nelson Nery. Direito Municipal Brasileiro. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

DA SILVA, José Afonso. Direito Urbanístico Brasileiro. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

____________________. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

JÚNIOR, Nelson Saule (org). Direito Urbanístico: vias jurídicas das políticas urbanas. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris. 2007.

JÚNIOR, Sérgio Alexandre de Moraes Braga. Direito Urbanístico e Direito Ambiental: Planejamento, Zoneamento e Parcelamento, instrumentos jurídicos fundamentais às suas atuações. Fortaleza, 1998.

LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3 ed. Tradução de José Lamego. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa. 1997.

MEIRELES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

SCHOUERI, Luis Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011.


Notas

3 LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3. ed. Tradução de José Lamego. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa. 1997.

4 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro. Forense, 2006. p.87

5 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Malheiros, 2004 p.64

6 SCHOUERI, Luis Eduardo. Direito Tributário. São Paulo. Saraiva, 2011, p. 293-294.

7 Sigla utilizada na doutrina e legislação que significa: Parcelamento, edificação e utilização compulsórios.

8 DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. ed. São Paulo. Malheiros, 2005 p.816

9 JÚNIOR, Nelson Saule. Direito Urbanístico: vias jurídicas das políticas urbanas Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris. 2007. p.28.


Abstract: Starting from a general concept on taxes, we come to an exception to the rule regarding the non-sanction of the same, when we realize that based on our constitutional legal system provides for the imposition of property taxes are progressive over time as a means of coercion to the taxpayer exercise his right of ownership by attending to their social function, as this study aims to establish the link between the instruments of tax policy and the right to the city, within an appropriate methodological approach.

Key words: Social Function of Property. Urban Policy. Progressive property tax in time. Right to the City.

Sobre os autores
Emanuel Vieira

Advogado. Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Graduado pela Universidade Federal do Ceará.

Jorge Ulisses e Silva Ferreira Lima

Advogado, formado pela Universidade Federal do Ceará.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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