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Assistência privada à saúde: planos de saúde

Agenda 26/03/2015 às 14:55

O presente artigo pretende fazer uma rápida e relevante abordagem a respeito da atuação dos planos de saúde, bem como analisar de qual forma o legislador de 1988 abriu caminho para que o setor privado atuasse de maneira complementar ao SUS.

  1. Embasamento constitucional

Para que se possa falar em plano de saúde é necessário entender primeiro o que é saúde, sua previsão constitucional e a quem compete o dever de proporcioná-la.

Nesse sentido, saúde é o estado de completo bem estar físico, mental e espiritual do homem, e não apenas a ausência de afecções e doenças. Acompanha a saúde a nutrição, ou seja, o complexo processo que vai da produção de alimentos até a absorção qualitativa indispensável à vida humana[1].

A Constituição Federal de 1988 elevou a saúde à condição de direito fundamental, e dessa mesma forma entende o STF que “O direito à saúde – além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas – representa consequência constitucional indissociável do direito à vida”[2]. O artigo 196 da Carta Magna diz que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.

Tendo em vista o artigo 196 da CRFB, podemos concluir que ao abordar o tema saúde o constituinte pautou-se no princípio da universalidade de cobertura e do atendimento, ou seja, o dever do Estado abrange todas as etapas: promoção, proteção e recuperação além de garantir a todos, indistintamente, o direito e o acesso igualitário às ações e os serviços de saúde.

O legislador de 1988 fez a atribuição constitucional do Sistema Único de Saúde no artigo 198 da Carta Magna. Desse modo, o SUS consiste numa rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços públicos de saúde, financiado com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes (CF, ART. 198, § 1°).

Essas considerações são importantes, pois fica mais fácil para entender o que realmente nos interessa que seria o artigo 199 da Constituição Federal, onde ao lado do SUS a Carta de 1988 também determinou que a assistência à saúde é livre a iniciativa privada.

É nesse ponto que o presente trabalho pretende fazer uma rápida e relevante abordagem a respeito dos planos de saúde, pois foi nesse momento que o legislador de 1988 abriu caminho para que o setor privado atuasse de maneira complementar ao SUS e consequentemente a criação dos planos de saúde que são regidos pela Lei n. 9656, de 3 de junho de 1998.

  1. Âmbito de atuação

Os planos de saúde devem atuar de maneira complementar, ou seja, o poder público ainda precisa prestar diretamente todos os serviços. Os planos de saúde possuem natureza jurídica de contrato de adesão, ou seja, é previamente confeccionado pela operadora do plano sem poder o segurado modificar as cláusulas, aceita-as ou rejeita-as, de forma pura e simples, e em bloco, afastada qualquer alternativa de discussão[3].

O fato de não ter uma adequação das cláusulas com relação ao que o plano oferece e o que o segurado quer realmente receber de cobertura é o que vem deixando os planos cada vez mais caros, pois acaba-se pagando mais do que realmente se usa. Atualmente os planos de saúde fixam os seus valores baseados nos procedimentos e eventos oferecidos, que por sua vez seguem um rol elaborado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que consiste em uma liste de tratamentos, exames e procedimentos com cobertura obrigatória pelos planos de saúde.

  1. Dificuldades em adequar os interesses e a função da ANS

O rol de procedimentos que a ANS elabora é periodicamente revisto, a agência possui um grupo técnico composto por representantes de entidades de defesa do consumidor, de operadoras de planos de saúde, de profissionais de saúde que atuam nos planos de saúde e de técnicos da ANS.

Em 02/01/2014 entrou em vigor a nova versão do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde. A partir dessa data, todos os beneficiários de planos regulados pela ANS terão direito a 37 medicamentos orais para tratamento de câncer; 28 cirurgias por videolaparoscopia (menos invasivas e com menor risco aos pacientes); radioterapia com IMRT (modulação da intensidade do feixe) para tumores da região de cabeça e pescoço (com diretriz de utilização); introdução de medicamento por via subcutânea para tratamento de artrite reumatóide, ampliando uma diretriz já existente (que contemplava medicamentos endovenosos) e alguns outros procedimentos (cirúrgicos, laboratoriais, entre outros). Para a segmentação odontológica houve a incorporação dos procedimentos “enxerto gengival livre”, “enxerto pediculado” e “tunelização”. A obrigatoriedade do fornecimento de bolsas coletoras para pacientes ostomizados, já regulamentada pela ANS desde maio de 2013, também passa a fazer parte do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde[4].

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A Lei 9656/98, que regula os planos de saúde, nos incisos do seu artigo 10 elege, numerus clausus, as exclusões de cobertura que pode licitamente ser realizada pelos planos de saúde, e em contrapartida no caput do referido artigo 10 menciona genericamente as que são obrigatórias de serem prestadas pelos planos. Dessa forma o legislador procurou dá mais garantia ao segurado, pois deixou o rol ampliado.

Quando o assunto é plano de saúde não podemos voltar nosso olhar apenas para o consumidor, é correto afirmar que esse, baseado nos postulados do CDC, faz parte do lado mais fraco da relação e por isso merece ser coberto de um certo grau de proteção, mas do mesmo modo, também existe a atividade empresarial envolvida, logo essa relação tem que ser pautada no contrato que foi firmado, não excluindo a possibilidade de revisão contratual, pois esse na maioria das vezes é um contrato de adesão e admite a anulação de cláusulas abusivas.

  1. Posicionamento jurisprudencial

 O STJ tem firmado entendimento no sentido de que o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada uma. Além disso, declara abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento domiciliar quando essencial para garantir a saúde e, em algumas vezes, a vida do segurado[5].

Diante disso, o que vem acontecendo é o aumento do número de processos judiciais que visam conseguir decisão favorável em relação a cobertura de determinados tratamentos. Em muitos casos, os médicos indicam um certo tipo de tratamento, mas o plano não quer fornecer, pois diz que no contrato não consta a cobertura daquele procedimento ou quando oferece é o de baixa qualidade. Desse modo, o segurando não vê outra alternativa a não ser ingressar no judiciário na esperança de obter uma medida liminar em sede de tutela antecipada.

No entanto, o problema é mais complexa do que parece e a situação é muito desgastante, pois a pessoa além de descobrir que tem uma doença, ainda precisa enfrentar uma batalha judicial para conseguir o tratamento. Esse fato muitas vezes é angustiante, já que mensalmente parte do orçamento é destinado ao pagamento de um seguro e nutrição de um sentimento de conforto, pois o que aparenta é uma falsa sensação de segurança em um possível momento de enfermidade.

Segundo o entendimento do STJ, embora geralmente o mero inadimplemento contratual não seja causa para ocorrência de danos morais, é reconhecido o direito à compensação dos danos morais advindos da injusta recusa de cobertura de seguro saúde, pois tal fato agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, uma vez que, ao pedir a autorização da seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada[6].

  1. Conclusão

No cenário atual, a sensação que se tem é que o modelo implantado pelos atuais planos de saúde não está agradando nem ao consumidor, tampouco aos médicos que deles fazem parte. Constantemente o rol de médico que atendem pelos planos de saúde vem diminuindo, e quem perde mais com isso é o segurado, pois apesar de pagar altíssimas prestações para o plano, muitas fezes precisam desembolsar mais ainda para custear consultas particulares, que estão longe de serem acessível para boa parte da população.

Conclusão, quem tem boas condições financeiras, tem o plano, o dinheiro para pagar a consulta particular e o dinheiro para pagar o advogado em uma possível judicialização da demanda. Em contra partida, as classes mais abastadas da sociedade, muitas vezes não tem nem plano de saúde então a única solução é esperar nas intermináveis filas de espera do SUS, ou quando fazem sacrifícios e até mesmo milagre com os seus rendimentos mensais conseguem pagar o plano e ter até mais um pouco de conforto, mas quando se deparam com problemas como o citado a cima, são altamente prejudicados, em função da falta de informação de como proceder.

[1] BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional – 6. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2011, p. 1536.

[2] STF, RE 241.630-2/RS. Rel. Min. Celso de Melo, DJ, 1, de 3-4-2001, p. 49

[3] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 3: Contratos e Atos Unilaterais – 7. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2010. p. 97.

[4] Espaço do Consumidor. Obtido via internet. Disponível em http://www.ans.gov.br/index.php/planos-de-saude-e-operadoras/espaco-do-consumidor/737-rol-de-procedimentos. Visitado em 26/08/2014.

[5] STJ, AgRg no AREsp 368748 SP 2013/0219073-0. Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe 20-06-2014.

[6] STJ, AgRg no AREsp 161056 SP 2012/0063154-2. Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 14-02-2013.

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