Em 08 de novembro de 2012, partia uma pequena equipe do Ministério Público Federal no Amazonas ao Município de São Gabriel da Cachoeira, distante 850 quilômetros de Manaus e situado na fronteira do Brasil com a Venezuela e a Colômbia, com mais de 90% de população indígena, para a realização da 1ª edição do projeto “MPF na Comunidade”.
O projeto foi criado diante da percepção de que, sendo a PR/AM uma unidade com área de atribuição tão grande, não poderia contentar-se em atuar à distância diante dos diversos problemas ocorridos no interior do Estado, notadamente ambientais e ligados a questões indígenas1 e fundiárias, com repercussões nas áreas do patrimônio público e criminal.
Ao mesmo tempo, constatava-se que as dificuldades de comunicação com os Municípios – dada a pouca presença de vias rodoviárias no Estado – impunham uma atuação permanente para atender à forte demanda reprimida2 e às dificuldades de organização da sociedade civil e dos movimentos sociais nessas localidades.
Desse diagnóstico emergiram os três principais objetivos do “MPF na Comunidade”. Em primeiro lugar, busca-se fomentar a cidadania e estreitar os vínculos do MPF com as comunidades. Aliado a isso, procura-se coletar a demanda até então reprimida para o incremento da atuação institucional da PR/AM. Assegura-se, ainda, a atuação concreta dos Procuradores da República e servidores em diligências nesses locais para a instrução de procedimentos existentes.
O “MPF na Comunidade” é realizado por meio do deslocamento físico de uma equipe da PR/AM, por uma semana, para a realização de debates, reuniões, diligências, atendimento ao cidadão e capacitações nos Municípios. É um momento em que a instituição mostra a sua cara em lugares em que a ausência do Poder Público é a regra3, apontando caminhos para a melhoria na qualidade de vida das pessoas e indicando as possíveis soluções de seus problemas.
Hoje o projeto cresceu. A sua institucionalização e consolidação4, mediante o apoio da Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR) e das Câmaras de Coordenação e Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, bem como o envolvimento de movimentos sociais que desenvolvem a luta por justiça mostram que o projeto conseguiu envolver cada vez mais a sociedade amazonense nos seus propósitos. Mais: espraiou-se por outros lugares, como a Procuradoria da República em Volta Redonda.
Pode-se dizer que o grande mérito do projeto reside em permitir, por meio do diálogo e do apoio do MPF, que as comunidades sejam, elas próprias, capazes de veicular suas demandas e enfrentar as mazelas encontradas no maior Estado do Brasil. A passagem do MPF por cada comunidade não constitui, assim, um mero lampejo, um fato isolado em meio a tantos desmandos nessas regiões, mas um convite à luta por justiça.
Nesse ponto, a aposta no empoderamento das comunidades e dos movimentos sociais representa a aproximação não apenas entre órgão público e comunidade, mas entre comunidades e demais atores sociais. Os vínculos crescem, e cria-se uma rede de conscientização e de apoio.
É por meio dessa simbiose que o projeto consegue romper com a passividade dos cidadãos junto ao MPF para dizer-lhes que a transformação social depende da organização da população local, que terá o apoio do MPF sempre que necessário, especialmente quando imprescindível.
Surge assim um estreitamento de vínculo que não coloca o MPF numa posição superior à das comunidades, mas sim como um órgão dotado de institucionalidade para prestar apoio na conscientização de direitos. Em tempos em que, após as jornadas de junho, discutimos o país que queremos, o “MPF na Comunidade” é mais um aliado no fomento à reflexão crítica e à transformação social no norte do Brasil.