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A socialização do saber jurídico como pressuposto para a formação cidadã ativa

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Agenda 16/04/2015 às 00:29

2. EXPERIÊNCIA DA IMPLEMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO JURÍDICA NA ESCOLA

Em pesquisa feita pela internet, através de endereço eletrônico15, observei que no Município de Araucária - Paraná tornou-se obrigatório o ensino de conteúdo jurídico explanando os direitos e deveres do consumidor em salas de aula. No Currículo do Ensino Fundamental, de acordo com a concepção da Rede Municipal de Educação de Araucária, este conteúdo: “Noções Básicas de Direitos do Consumidor”, já estava presente nas Diretrizes Municipais de 2004, inserido na disciplina de História nos eixos: família, poder, trabalho, cultura, cotidiano e movimentos sociais, os quais contemplam o estabelecimento de relações entre os conhecimentos fundamentais para a formação do cidadão consciente e conhecedor de sua realidade.

Segundo informa o departamento de ensino fundamental da Secretaria de Educação desta cidade, parte-se do pressuposto de que a família atual é inserida numa comunidade social, que estabelece relações de poder, de trabalho e de consumo, tema que é abordado e articulado por conteúdos que promovem a formação do cidadão cônscio de sua história e cultura. Sendo o trabalho atividade humana intencional, material, imaterial, coletiva, individual e que se faz na e pela prática social em tempos e espaços plurais, a disciplina de História, na visão do corpo docente do Município de Araucária, aborda a divisão técnica e social do trabalho, os processos de produção e consumo, a história econômica e social.

Destarte, verifica-se que tais educadores consideram inerentes a este processo trabalhar os direitos e deveres do consumidor, tendo por objetivo fornecer ao aluno elementos fundamentais para que ele possa pensar e compreender-se como um cidadão consciente. Promover o entendimento de como as pessoas vivem e organizam-se numa sociedade capitalista, na qual estão diretamente imbricadas as relações de consumo e relações com o consumidor é contemplado por estar presente na história econômica e de produção social, no currículo da Rede de Ensino das escolas municipais de Araucária, Assim, a fim de desenvolver esta prática, foi atribuído ao Poder Executivo a função de promover o treinamento e a capacitação dos professores, firmando parcerias com órgãos públicos ou empresas privadas, visando a efetivação de palestras em sala de aula ou atividades extraclasse, conforme se observa na lei em anexo do referido município.

Apesar das inúmeras tentativas de contato com esse Munícipio para compartilhar o reflexo dessa experiência na sociedade araucária, através de todos os meios de comunicação possível, não tivemos êxito, razão pela qual, ainda que os resultados sejam desconhecidos, considero válido pontuar neste estudo monográfico a iniciativa deste munícipio em utilizar o Direito como instrumento de formação para a consciência cidadã.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O grande desafio posto às instituições de ensino para a formação de cidadãos conscientes, possibilitando aos mesmos o exercício da cidadania ativa, é o de romper com a cultura escravocrata, clientelista e patrimonialista, que embasa a formação do povo brasileiro, e que permeia as diferentes relações no conjunto das instituições sociais (SILVA, 2001). Concretizar escolas cidadãs requer um trabalho participativo e compartilhado de todos os atores que estão envolvidos neste projeto.

Nesse sentido, torna-se necessária a criação de uma prática pedagógica voltada para a construção da cidadania ativa, garantidora do acesso ao conhecimento necessário para apreender a complexidade e determinações do convívio social. O Direito estréia nesse contexto dando um salto qualitativo na grade curricular das escolas de ensino médio e fundamental, proporcionando aos mesmos o alcance de um novo patamar de aprendizado, haja vista que compartilhar noções jurídicas pode implicar na consolidação da consciência cidadã e democrática, na maior cobrança em relação à atuação de seus governantes e na responsabilidade cívica dos nossos jovens.

A socialização do saber jurídico, através da educação popular, poderá aflorar o senso crítico do estudante e produzir novas visões da realidade, principalmente no que tange ao seu potencial como cidadão, cristalizando posturas e valores. O mais importante é formar um cidadão que saiba identificar os momentos exatos de aplicar tudo que aprendeu na Escola em sua vida prática. Associar a construção do conhecimento ao aprendizado de objetivos sociais, como a cidadania, realizando discussões que não podem ser negligenciadas no atual contexto da sociedade brasileira.

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A proposta não é minorar o domínio do saber sistematizado que constitui a razão de ser da escola, mas tão somente construir uma didática onde a participação do aluno seja eficaz para a construção do conhecimento rumo à cidadania, cujos resultados extremamente positivos não tardarão a transparecer, sob diversas formas, nas mais variadas manifestações do corpo social. Repensar o papel da educação nessa direção é reivindicar a assunção ao papel que é seu por direito, o de cidadão.

No mundo globalizado, pobre da nação que se eximir de investir pesado na Educação de suas crianças e de seus jovens. Como temos visto, somente os países que têm colocado a Educação na ponta de todas as suas prioridades têm conquistado o desenvolvimento econômico, social e ambiental. Vivemos tempos da persistente desigualdade social, da crescente violência urbana e de desrespeito generalizado aos direitos fundamentais da pessoa humana, razão pela qual acreditamos que o principal investidor e incentivador da educação cidadã não poderia deixar de ser o Estado. Mas, ainda que certos e confiantes no que aqui lhes é proposto, eis que surge um dúvida: até que ponto seria interessante para o Estado formar cidadãos atuantes em seus direitos?


REFERÊNCIAS

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. CIDADANIA: do direito aos direitos humanos. São Paulo: Acadêmica, 1993.

BALESTRERI, Ricardo Brisolla. O que é “educar para a cidadania”. In: BARCELLOS, Carlos Alberto. (Org.). Educando para a cidadania: os direitos humanos no currículo

FEIX, Virgínia. Educação e acesso à justiça: capacitação legal como condição de construção da diversidade de sujeitos de direitos. In: RIO GRANDE DO SUL. ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. COMISSÃO DE CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS. Garantias e violações dos direitos humanos. 10. anos, edição comemorativa. Porto Alegre: CORAG, 2004.

FERREIRA, Nilda Tevês. Cidadania: uma questão para a educação. 4ª ed. Nova Fronteira. Rio de Janeiro, 1993.

FREIRE, Aline Lima. A inserção de matérias jurídicas nas escolas de ensino básico. Publicado 16.05.2011. Disponível em: https://www.abcdodireito.com.br/2011/05/insercaomateriasjuridicasescolasensinob.html Acesso em: 08 agos 2011.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

______. Educação e mudança. Paz e Terra. 11ª ed. Rio de Janeiro, 1986

PINSKY, Jaime. Cidadania e Educação. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 1998.

ROCHA SOBRINHO, João. Uma história do exercício da cidadania no Brasil. 1ª ed. Salvador, 2010.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Cortez, 2007.

SILVA, Aida Maria Monteiro. O Papel da Escola na Construção da Cidadania. In: Boletim de Capacitação 02. Coord. idem. Recife : RBEDH, 2001.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

SILVA, João Batista Costa da. A Internet Enquanto Recurso Pedagógico Na Formação Do Cidadão Contemporâneo. Publicado 15.08.2010. Disponível em: <https://dmd2.webfactional.com/media/anais/A-INTERNET-ENQUANTO-RECURSO-PEDAGOGICO-NA-FORMACAO-DO-CIDADAO-CONTEMPORANEO.pdf>Acesso em: 05 jun 2011.


Anexo

LEI Nº 2.240/2010

“Dispõe sobre a inclusão do conteúdo programático “Noções Básicas de Direitos do Consumidor” no currículo do ensino fundamental das escolas municipais, e dá outras providências”.

A CÂMARA MUNICIPAL DE ARAUCÁRIA, Estado do Paraná, aprovou, e eu, Prefeito Municipal, sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º. A Secretaria Municipal de Educação definirá em qual disciplina o conteúdo disposto na súmula será apresentado e também a respectiva carga horária.

Art. 2º. O Poder Executivo, para desenvolver o conteúdo programático previsto nesta Lei, promoverá o treinamento e a capacitação de pessoal docente próprio, bem como firmará parcerias com órgãos públicos ou empresas privadas, visando a efetivação de palestras em sala de aula ou atividades extraclasse.

Art. 3º. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Prefeitura do Município de Araucária, 12 de julho de 2010.

ALBANOR JOSÉ FERREIRA GOMES, Prefeito Municipal

GENÉSIO FELIPE DE NATIVIDADE, Procurador Geral do Município


Notas

1 Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/programas-de-a-a-z/infancia-e-juventude/justica-nas-escolas>. Acesso em: 20 jul 2011.

2 Disponivel em: <https://www.miniweb.com.br/biblioteca/artigos/oab_vaiaescola.pdf>. Acesso em: 18 agos 2011.

3 Idem.

4 Estatuto da Criança e do Adolescente.

5 Disponível em: <https://www.ufmg.br/congrext/Direitos/Direitos22.pdf>. Acesso em: 17 agos 2011.

6 International Council on Archives- Conselho Internacional de Arquivos

7 International Council on Archives- Conselho Internacional de Arquivos., Pró-Reitoria de Extensão da Pontifícia Universidade Católica)

8 Disponível em: <https://www.ufmg.br/congrext/Direitos/Direitos22.pdf>. Acesso em: 17 ago 2011.

9 Disponivel em: <https://www.promotoraslegaispopulares.org.br/promotoraslegaispopulares/quem_somos.php>. Acesso em: 23 jul 2011.

10 Idem.

11 Disponível em: <https://www.juspopuli.org.br>. Acesso em: 20 jul 2011.

12 Disponível em: <https://www.aatr.org.br/site/>. Acesso em: 21 jul 2011

13 Disponível em: <https://www.aatr.org.br/site/01/index.asp>. Acesso em: 21 jul 2011

14 Idem.

15 Disponível em: <https://smedaraucaria.blogspot.com/2010/08/lei-torna-obrigatorio-o-ensino-de.html >. Acesso em 20 jun 2011.


Abstract: Despite the relevance of the theme unfolds from the examination that even though we are living in a democratic state, are few existing studies on the necessity of realization of the constitutional principle, that which attaches to education be responsible for preparing for citizenship, perhaps on entering law matters for improvement. This work sheds reflections on the role of schools, the law and the state in the lives of Brazilians, from a bibliographical and documentary review, using the inductive method, stressing the importance of socialization of legal knowledge to the formation of citizens participatory in Brazilian society, making knowable certain rights and duties minimally necessary to living within the parameters of democracy. Within this analysis, this was listed experiments carried out in Brazil by various institutions in popular legal education as a means to demonstrate the contribution of this proposal for active citizenship. One hopes that readers rethink the extent to which the current pedagogical practice leads the students to the construction and consolidation of democratic and citizen awareness critical to the development of a participatory social reconstruction, settling the fundamental conditions for a more harmonious and more fraternal social life.

Key words : active citizenship; Popular legal education; Democratic state

Sobre a autora
Roberta Santos Dias

advogada, exerceu cargo de Chefe da Divisão de Apoio a Família da Secretaria de Prevenção a Violência e Promoção dos Direitos Humanos do Município de Feira de Santana

Informações sobre o texto

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