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Direito à vida: historicidade e conceituação

Agenda 24/05/2015 às 03:19

Texto que aborda importantes tópicos do Direito à vida, bem como seu enfoque estrutural e sistêmico.

A seguir uma tentativa de compreensão conceitual e histórica a respeito do direito à vida e suas nuances estruturais.

HISTORICIDADE: O RECORTE DO DIREITO ROMANO

Sabe – se que a vida é o nosso bem maior, no entanto nem sempre foi assim. Houve um tempo na história em que a vida era banalizada, inclusive como moeda de troca, instrumento de quitação de dívida e até produto de punição para infrações humanas.

Destaca-se aqui o Direito Romano, que traz importantes referências da época em que a vida pouca importância tinha em termos de direitos ou garantias fundamentais à pessoa e desta época[1] se faz lembrar o conceito de pater famílias, que segundo Venoza (1993, p.44), “é não apenas o proprietário da família, como também o senhor dos escravos, da sua mulher e dos filhos, os quais podia vender, como fazia com os produtos agrícolas”. E mais,

O pater famílias é o juiz, se não em matéria privada onde até então não se distinguiam os direitos, entre as pessoas sob sua guarda, mas em matéria penal, porque podia impor penas aos seus subjugados, até mesmo a pena de morte à mulher, filhos e escravos. Possuía poder absoluto em seu âmbito de ação (VENOZA, 1993, p.44).

Tem-se acima uma demonstração de como a vida deixava de ter importância em algumas situações contextuais. Acredita-se que outro importante instrumento referencial de banalização da vida é o surgimento da Lei das Doze Táboas[2], a qual nos apresenta recortes de como os cidadãos perdiam o direito de viver a partir de situações sistêmicas e consequenciais, a saber [3]:

Tábua Terceira

9. Se são muitos os credores, é permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o corpo do devedor em tantos pedaços, quantos sejam os credores, não importando mais ou menos; se os credores preferirem, poderão vender o devedor a um estrangeiro; além do Tibre.

O que se percebe é que a citação acima refere-se ao direito de crédito instituído na terceira tábua e que nos leva à conclusão, ao traçar uma comparação contextual entre aquela época e os dias atuais, de que havia uma grande injustiça em relação ao direito à vida, pois a vida ligava-se às coisas materiais.

Tanto é verdade que neste momento pós – moderno o direito à vida está sob outra ênfase, consolidado de forma majoritária como um direito fundamental e, quando nos deparamos com nações que adotam a pena de morte por questões estruturais e culturais, a indignação de todos é grande a ponto de se criar organismos sociais e mundiais contra ela.

Outro dado importante fornecido pela Lei das Doze Tábuas é a respeito do pátrio poder e do casamento, o qual nos informa que

1. É permitido ao pai matar o filho que nasce disforme, mediante o julgamento de cinco vizinhos;

2. O pai terá sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e de morte e o poder de vendê-los [4].

Percebe-se que as relações de reciprocidade entre marido e mulher, pai e filhos era de extrema submissão. Facultar ao pai o poder de controle vital, acredita-se, era um exagero, enraizada de forma injusto e desproporcional se considerarmos a organização social do período pós – moderno, haja vista a presença de organismos voltados à preservação e manutenção dos direitos humanos, todavia reconhece-se que há um valor de controle cultural adequado ao contexto histórico.

O ENFOQUE DO NAZISMO

Há de se enfocar o que representou o nazismo de Hitler como instrumento de destruição do direito à vida, como falta de respeito à dignidade da pessoa humana e como marco histórico negativo para a história de toda a humanidade.

A morte era uma sentença correlacionada à raça, isto é, morria-se em função de um estado nativo e não em função de um critério sistêmico estrutural que representasse o sentido da decisão de matar, da sentença de morte. Simplesmente matavam-se, se judeus fossem. Escravizavam – se, se judeus fossem.

Não há maior banalização da vida do que este fenômeno social, político e econômico chamado nazismo, que não pode ser esquecido do ponto de vista histórico em razão de que milhares de inocentes morreram sem a construção de um sentido racional e humano, mas ditatorial e permeado por interesses políticos, haja vista que

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Ao dar entrada num campo de concentração nazista, o prisioneiro não perdia apenas a liberdade e a comunicação com o mundo exterior. Não eram tão só despojado de todos os seus haveres (...) ele era, sobretudo esvaziado do seu próprio ser, de sua própria personalidade (...) o prisioneiro já não se reconhecia como ser humano dotado de razões e sentimentos (...) viviam no esforço puramente animal... (Comparato, 2008, p. 24).

O ódio nazista era tão grande que nem as crianças escapavam das sentenças de morte, assim como idosos e jovens. Chocante é o depoimento de um dos réus do nazismo que colaborou para o genocídio de milhões de judeus no holocausto, sintetizado em uma frase: “eu vou dançar no meu túmulo, rindo, porque a morte de cinco milhões de judeus na consciência me dá uma enorme satisfação” (ARENDT, 2008, p.59).

O DIREITO À VIDA NO SEIO DA SOCIEDADE PÓS-MODERNA

Pode-se afirmar veementemente que o direito à vida é um dos mais violados na sociedades pós – modernas e isto se faz presente no momento em que nos deparamos com a violência urbana, em que pessoas são vítimas de latrocínios, homicídios, infanticídios, violência doméstica, violência contra o idoso, violência contra os portadores de necessidades especiais, enfim, violência de todos os tipos e contra a cidadania em geral.

Não é preciso ser especialista em Antropologia ou Pedagogia, por exemplo, para percebermos que os índices de latrocínios e homicídios nos centros urbanos não param de crescer, que o desemprego, a falta de educação e ausência de ocupação do tempo livre com atividades saudáveis são uma das causas do aumento da violência.

Há de se destacar que algumas ações consolidam cotidianamente o desrespeito ao direito à vida, tais como os profissionais mal preparados na área médica, que injetam leite na veia de pacientes e outros erros semelhantes, médicos que esquecem instrumentos cirúrgicos no interior do corpo dos pacientes como se fosse um ato de normalidade, a morosidade no atendimento ao cidadão em pronto socorro, os atropelamentos sem primeiros socorros tão presentes em nosso dia a dia, entre outros.

Neste sentido, quer-se enfatizar que numa proporção diferente da do Direito Romano enfocado anteriormente, a vida na sociedade pós – moderna se desenha como algo banal, como algo que se “coisificou” dotando – se de desvalorização total.

CONCEITUAÇÃO DO DIREITO À VIDA

O direito à vida é um direito fundamental que está sacramento no texto constitucional, no caput do Artigo 5º:

(...) Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...).[5]

O trecho acima é importante na medida em que enfatiza que o direito à vida é um elemento jurídico que guarda relação imediata com o direito a uma existência digna e humana e essa dignidade é ratificada pelo artigo 1º, inciso III da Constituição Federal ao explicar que

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III - a dignidade da pessoa humana;

A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, aspecto que está novamente reforçado no artigo 170 da Carta Magna, o qual no ensina que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (...)”.

Há outras normais jurídicas qualificam o direito à vida, mesmo que de forma indireta, como no caso do Estatuto da Criança e do adolescente e o próprio Estatuto do Idoso, assim como há outras leis que protegem a vida direta ou indiretamente.

Portanto, pensa-se que quando se enfatiza o direito à vida, se faz importante compreender que não se trata apenas do direito de sobreviver, mas a uma existência digna, já que o direito à vida é um dos mais importantes dentre os direitos fundamentais.


[1] Em termos gerais, a história do direito romano abarca mais de mil anos, desde a Lei das Doze Tábuas (Lex Duodecim Tabularum, em latim449 a.C.) até o Corpus Iuris Civilis por Justiniano I (c. 530 d.C.). Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_romano. Acesso em 24 de outubro de 2012.

[2] A Lei das Doze Tábuas (Lex Duodecim Tabularum ou simplesmente Duodecim Tabulae, em latim) constituía uma antiga legislação que está na origem do direito romano. Formava o cerne da constituição da República Romana e do mos maiorum (antigas leis não escritas e regras de conduta). Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_das_Doze_T%C3%A1buas. Acesso em 24 de outubro de 2012.

[3] VENOZA, 1993, p. 47 – 50.

[4] IDEM.

[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em 15 de outubro de 2012.

Referências

FERNANDES, J.R.O. Revista Brasileira de História – v.13 nº 25/26, pág. 265-276. São Paulo, 2003.

Referências da Internet

FALCÃO, Joaquim. O emprego e a nova lei do voluntariado. http://www.rits.org.br/legislacao_teste/lg_testes/lg_mat01_ma03a3_rlegis.cfm. Acessado em 17 de dezembro de 2005.

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www.institutoterceirosetor.org.br 03/13/2004.

http://www.youtube.com/watch?v=FwEZsvvmTWM&feature=related. Acesso em 18 de outubro.

http://portal.mj.gov.br/sedh/biblioteca/revista_dh/dh1.pdf. Acesso em 20 de outubro de 2012.

http://pt.wikipedia.org. Acesso em 20 de outubro.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_das_Doze_T%C3%A1buas. Acesso em 20 de outubro de 2012.

http://jornaluni.blogspot.com.br/. Acesso em 20 de novembro de 2012.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em 15 de outubro de 2012.

http://www.aacd.org.br/conheca-a-aacd.aspx. Acesso em 21 de setembro de 2012.

http://www.net4help.org/gerenciador/confirmacaopin/consultar/1384/1322597893. Acesso em 24 de setembro de 2012.

http://www.apaesp.org.br/Institucional/Paginas/Sobre-a-organizacao.aspx. Acesso em 8 de outubro de 2012.

https://www.graacc.org.br/. Acesso em 13 de outubro de 2012.

http://hope.org.br/casa-hope/. Acesso em 14 de outubro de 2010.

http://www.doutoresdaalegria.org.br/conheca/sobre-os-doutores/. Acesso em 15 de outubro de 2012.

Bibliografia

LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1991.

BIELEFELDT, H. Filosofia dos direitos humanos. São Leopoldo: Unisinos, 2000.

BOBBIO, N. A Era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

BRASIL. Plano nacional de educação em direitos humanos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação, 2003.

DALLARI, D. A. Um breve histórico dos direitos humanos. In: CARVALHO, José Sérgio (org.). Educação, cidadania e direitos humanos. Rio de Janeiro: Vozes, 2004.

COMPARATO, F. K. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

MATOS, F. de C. Organizações do Terceiro Setor Fomentadoras do Turismo Receptivo na cidade de São Paulo. Dissertação de Mestrado. Universidade Anhembi Morumbi. São Paulo, 2005.

VENOSA, S. de S. Direito Civil – Parte Geral. 2.ªed. São Paulo: Atlas, 1993.

Sobre o autor
Francisco de Castro Matos

Graduado em Letras, Matemática, Educação Especial, Gestão do Turismo, Pedagogia, Direito, Técnicas Legislativas e Redação Forense, Mestre em Hospitalidade.

Informações sobre o texto

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