A invasão do Iraque, em fevereiro de 2003, por uma coalizão anglo-americana, tem provocado grande repercussão na comunidade internacional, sobretudo daqueles que acreditam na paz como o único caminho.
Entre tantas manifestações das mais variadas fontes, destacam-se duas manifestações da Comissão Internacional de Juristas, de 18 e 20 de março de 2003, que pela sua profundidade e importância jurídica merecem exame detalhado pelos estudantes de direito da nossa Universidade.
Resolvi contribuir para a divulgação e discussão da mesma, traduzindo-as para o português, seguidas de notas esclarecedoras para os estudantes que ainda não sejam versados em direito internacional público, sem qualquer pretensão de serventia para os já iniciados. Aqui vão os dois textos por mim traduzidos, seguidos de sua versão original em inglês e as notas ao primeiro deles. As notas ao segundo ainda estão sendo elaboradas.
O primeiro comunicado à imprensa, ocorreu em 18 de março de 2003, com o seguinte conteúdo:
"Hoje, a Comissão Internacional de Juristas – CIJ (3) expressa sua profunda consternação pelo fato de que alguns Estados estejam prontos para empreender uma invasão ao Iraque, o que, à luz do direito internacional, constituiria uso ilícito da força e uma guerra de agressão (4). Estados Unidos, Reino Unido e Espanha indicaram sua intenção de usar a força contra o Iraque, apesar de não contar para isso com uma resolução do Conselho de Segurança (5). Não existe outra base legal admissível para esse ataque que uma resolução. Sem autorização do Conselho de Segurança, nenhum Estado tem o direito de usar a força contra outro estado, salvo em caso de legítima defesa contra um ataque armado (6). "Esta norma foi incluída na Carta das Nações Unidas em 1945 por uma boa razão: para evitar o uso arbitrário da força pelos Estados", comentou o Secretário Geral da CIJ, Louise Doswald-Beck.
Uma guerra empreendida sem mandato inequívoco do Conselho de Segurança chegaria a constituir uma violação flagrante da proibição do uso da força. A Resolução 1441 do Conselho de Segurança não autoriza o uso da força (7). Quando foi adotada essa resolução, três membros permanentes do Conselho de Segurança, França, Rússia e China, declararam que a resolução exclui tal autorização. A realidade é que, para o uso da força, são necessários os votos de noves membros do Conselho de Segurança, incluindo os cinco Estados permanentes: na presente situação, o uso da força carece claramente desse respaldo.
Na opinião do conselheiro jurídico da CIJ, Ian Sederman: "não há dúvida de que o Iraque foi responsável por violações em massa e sistemáticas dos direitos humanos. Apesar disso, essas graves violações não constituem, por si mesmas, base legal para o uso da força. O método apropriado para responder a essas violações em massa e sistemáticas consiste em qualificá-las de crimes internacionais e em fortalecer os mecanismos internacionais, como o Tribunal Penal Internacional" (8).
A competência do Conselho de Segurança para autorizar o uso da força não é ilimitada. Só pode autorizá-la para "manter ou restabelecer a paz e a segurança internacionais". Como bem entendem os Estados que se opõem á guerra, a determinação de uma ameaça à paz e à segurança internacionais deve fundar-se em critérios objetivos mínimos. As provas apresentadas pelos Estados que propugnam pela guerra não são convincentes.
Por isso, a Comissão Internacional de Juristas insta os Governos dos Estados Unidos, do Reino Unido, da Espanha e dos demais países, ainda nesta hora tardia, que reconsiderem suas opções políticas e renunciem ao uso ilícito da força contra o Iraque" (1).
O segundo comunicado à imprensa da Comissão Internacional de Juristas se deu no dia 20 de março de 2003, assim lançado:
"Agora que o ataque militar começou, é imperativo que os Estados tomem cuidado para não praticarem atos ilegais uns contra os outros. Cada parte tem a obrigação de seguir o direito humanitário e as prescrições de direitos humanos adotados nas Convenções de Genebra de 1949 (9), outros instrumentos internacionais relevantes (10) e o direito internacional consuetudinário (11). No particular, o fato do Iraque ter sido ilegalmente invadido não o exime de respeitar escrupulosamente o direito internacional humanitário e os direitos humanos. Estados que não estão tomando parte nas hostilidades, devem beneficiar-se e respeitar as regras de neutralidade. Neste caso, não podem autorizar uso de seus territórios para fins militares nem podem sofrer ataques (12).
Os beligerantes estão obrigados a tratar com humanidade todas as pessoas em seu poder. Nenhuma pessoa que esteja se rendendo pode ser atacada. As partes envolvidas no conflito devem tomar especial cuidado para distinguir objetivos militares de pessoas e objetos civis, que não podem ser objeto de ataque. A CIJ gostaria de enfatizar que todos os Estados devem observar escrupulosamente regras que proíbem ou limitam uso de certas armas. Nenhuma arma excessivamente cruel ou, por natureza, que não discrimine suas vítimas, pode ser usada, mesmo que não seja objeto de tratado proibitivo (13).
A Comissão está particularmente preocupada com notícias de que algumas partes podem estar admitindo uso de agentes químicos. Para os Estados-parte da Convenção sobre Armas Químicas, uma interpretação restritiva é indispensável. Além disso, o Protocolo de Genebra de 1925 e o costume internacional proíbem terminantemente o uso de armas químicas (14).
O Secretário-Geral da Comissão, Louise Doswald-Beck, disse: "Esperamos que essas regras não sejam objeto de tratamento desdenhoso que alguns Estados participantes têm devotado à Carta da ONU".
Destaca a Comissão a absoluta proibição de crimes de guerra ou crimes contra a humanidade. Crimes que tais ensejam responsabilidade de todos os envolvidos, desde chefes políticos até o soldado raso. Todos os Estados estão obrigados a assegurar que pessoas suspeitas de crimes desse tipo sejam processadas. Estados-parte do Estatuto de Roma que processem essas pessoas, deverão entrega-las ao Tribunal Penal Internacional" (2).
NOTAS
(1)"18 March 2003
The ICJ today expressed its deep dismay that a small number of states are poised to launch an outright illegal invasion of Iraq, which amounts to a war of aggression. The United States, the United Kingdom and Spain have signalled their intent to use force in Iraq in spite of the absence of a Security Council Resolution. There is no other plausible legal basis for this attack. In the absence of such Security Council authorisation, no country may use force against another country, except in self-defence against an armed attack.
"This rule was enshrined in the United Nations Charter in 1945 for a good reason: to prevent states from using force as they felt so inclined", said ICJ Secretary-General Louise Doswald-Beck.
A war waged without a clear mandate by the Security Council would constitute a flagrant violation of the prohibition of the use of force. Security Council Resolution 1441 does not authorise the use of force. Upon its adoption, France, Russia and China, three permanent members of the Security Council, issued a declaration indicating that the Resolution excludes such authority. The bottom line is that nine members of the Security Council, including the five permanent members, need to actively approve the use of force - such support is blatantly lacking.
According to ICJ Legal Adviser Ian Seiderman: "The present regime in Iraq is certainly responsible for widespread and systematic human rights violations over the years. However, this reprehensible human rights record does not by itself provide a legal basis for resort to war. The appropriate method of addressing such gross abuses is to treat them as international crimes and to use and strengthen enforcement mechanisms, such as the International Criminal Court. "
The competency of the Security Council to authorise the use of force is not unlimited. It may only do so to "maintain or restore international peace and security". As States resisting the use of force at this moment understand, the determination upon whether there is a present threat to international peace and security must be based on sufficient objective criteria. The evidence presented by states pressing for war is less than convincing.
The ICJ therefore strongly urges the Governments of the United States, the United Kingdom, Spain and other countries, even at this late hour, to reconsider their policy choices and desist from the unlawful use of force against Iraq".
(2)"20 March 2003
The ICJ condemns the illegal invasion of Iraq in the clear absence of Security Council authority -this constitutes a great leap backward in the international rule of law.
Now that the military attack has begun in earnest, it is imperative that States take care not to compound one unlawful action with others. All parties are obliged to follow the humanitarian and human rights prescriptions laid in out in the 1949 Geneva Conventions, other relevant international instruments and international customary law. In particular, the fact that Iraq has been illegally invaded in no way absolves it from scrupulously respecting international humanitarian law and human rights law. States which are not taking a part in the hostilities must benefit from, and themselves respect, the rules of neutrality. In particular, they may not allow their territory to be used for military purposes nor may they be made the object of attack.
Belligerents are obliged to treat humanely all persons in their power. They must not attack any persons surrendering. All parties to the conflict must take special care to distinguish between military objectives and civilian persons or objects. The latter may not be made a target of attack. The ICJ would like to stress that all States must scrupulously observe the rules prohibiting or limiting the use of certain weapons. No weapon that is excessively cruel or by nature indiscriminate may be used, even if it is not the object of a treaty prohibition. The ICJ is particularly concerned about reports that some parties may be contemplating using chemical agents. For those States party to the Chemical Weapons Convention, a strict interpretation is indispensable. In addition, the 1925 Geneva Protocol and customary law absolutely prohibit the use of chemical weapons.
" We hope that these rules will not be the object of the same cavalier treatment that participating states have applied to the UN Charter" said ICJ Secretary-General, Louise Doswald-Beck.
The ICJ recalls the absolute prohibition of committing war crimes or crimes against humanity. Such crimes entail the individual responsibility of all involved persons, from the political masters to the foot soldier. All States are obliged to ensure that persons suspected of such crimes are prosecuted. Parties to the Rome Statute that do prosecute these persons, must surrender them to the International Criminal Court. .
(3) A Comissão foi fundada em Berlim, em 1952, composta por sessenta eminentes juristas que representam os diversos sistemas legais do mundo. Sediado em Genebra, o Secretariado-Geral é responsável pela realização dos objetivos e finalidades da Comissão. Para realizar seu trabalho, o Secretariado-Geral recebe a ajuda de uma rede autônoma de sessões nacionais e organizações afiliadas em todos os continentes. O membro brasileiro é o professor Dalmo de Abreu Dallari.
(4) Denomina a Comissão o ataque iminente de invasão e guerra de agressão. Estados de guerra foram mais comuns ao longo da história da humanidade, do que se poderia pensar, ingenuamente, razão pela qual se tem feito grande esforço para impedir ou limitar a sua deflagração, e, ainda, para, uma vez deflagrados, impor restrições a meios e métodos de guerra, garantir o respeito dos prisioneiros e assegurar o exercício dos direitos humanos. Alguns números objetivam a afirmação de que a guerra sempre existiu entre os povos e em todas as épocas: no Sudão, entre 12500 a. C. e 10000 a. C., já há sinais de guerra, e, apenas no mundo moderno, entre 1740 e 1974, ocorreram 366 guerras e morreram 85 milhões de pessoas. Foi paulatinamente se consolidando a necessidade de classificar as guerras em justas e injustas, sobretudo, a partir da Idade Média, pela influência do cristianismo, que evoluiu, desde a aceitação da guerra que visasse reparar um ilícito (Santo Ambrósio e Santo Agostinho), passando pela condenação do Papa Pio XII à guerra de agressão, até a advertência pelo Papa João XXIII de que a guerra não é um meio apto para reparar a violação de um direito. Hoje, guerra justa é guerra legal, segundo os ditames do direito internacional.
(5)O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas foi previsto na Carta da ONU, nos artigos 42 e 43, sendo o responsável pela manutenção da paz, segurança e regulamentação dos armamentos e litígios internacionais, além de tomar as medidas necessárias para o cumprimento das sentenças da Corte Internacional de Justiça, inclusive com o uso da força, como se viu. É constituído por 15 membros, sendo cinco permanentes: China, Estados Unidos da América do Norte, França, Grã-Bretanha e Rússia, e dez membros eleitos pela Assembléia Geral para um mandato de dois anos não renováveis, seguindo critério geopolítico: cinco afro-asiáticos, dois latino-americanos, dois da Europa Ocidental e um da Europa Oriental. O sistema de votação é diferenciado entre questões processuais e outros assuntos, naquele exigindo voto afirmativo de nove membros, e nestes além dos nove votos afirmativos o voto afirmativo de todos os membros permanentes, chamado "poder de veto" ou "unanimidade das grandes Potências". Em questões delicadas o Presidente do Conselho de Segurança pode alcançar consenso não sendo necessária votação. Segundo a Carta, todo os membros da ONU acordam em aceitar e implementar as decisões do Conselho. Enquanto outros órgãos das Nações Unidas fazem recomendações a Governos, o Conselho sozinho tem o poder de tomar decisões que os Estados-membros são obrigados a implementar. Hoje, integram o Conselho como membros não permanentes: Guiné, Paquistão, Síria, Angola, Camarões, México, Chile, Alemanha, Espanha e Bulgária.
(6) A regra geral de direito internacional aponta para a ilegalidade da guerra, salvo exceções estritamente previstas. É o que diz a Carta da Organização das Nações Unidas. Em seu preâmbulo, por exemplo, aponta-se como uma de suas causas "preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que, por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade", e como um de seus fins "praticar a tolerância e viver em paz, uns com os outros, como bons vizinhos, e unir as nossas forças para manter a paz e a segurança internacionais, e garantir, pela aceitação dos princípios e a instituições de métodos,m que a força armada não será usada a não ser no interesse comum".
Não foram meias palavras: a força armada não será usada a não ser no interesse comum, que possuem, na qualidade de preâmbulo, força normativa.
Essa regra preambular vai se tornar verdadeiro princípio, no texto normativo da Carta em seu artigo 2 (4):
"Artigo 2
A Organização e seus membros, para a realização dos propósitos mencionados no art. 1, agirão de acordo com os seguintes princípios:
...
4. Todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os propósitos das Nações Unidas".
É a confirmação expressa de que não se pode fazer ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado.
São três as exceções: a) ações militares de segurança coletiva sob o controle do Conselho de Segurança da ONU; b) guerras de legítima defesa; e c) guerras de libertação nacional.
A autorização para guerras de legítima defesa está no artigo 51:
"Artigo 51
Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva, no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membros das Nações Unidas, até que o Conselho de segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais. As medidas tomadas pelos membros no exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente ao Conselho de Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a autoridade e a responsabilidade que a presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito, em, qualquer tempo, a ação que julgar necessárias à manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais".
Pressupõe, como se vê, legítima defesa, no caso de ocorrer um ataque armado.
Tem-se admitido as guerras de libertação nacional, no âmbito do consagrado direito à autodeterminação dos povos, sendo excluído desta categoria as guerras internas de tipo revolucionário.
As ações militares de segurança coletiva estão previstas no Capítulo VII, da Carta da ONU, envolvendo os artigos 39 a 48, sendo de se destacar os artigos 41, 42 e 48:
"Artigo 41 - O Conselho de Segurança decidirá sobre as medidas que, sem envolver o emprego de forças armadas, deverão ser tomadas para tornar efetivas suas decisões e poderá convidar os Membros das Nações Unidas a aplicarem tais medidas. Estas poderão incluir a interrupção completa ou parcial das relações econômicas, dos meios de comunicação ferroviários, marítimos, aéreos, postais, telegráficos, radiofônicos, ou de outra qualquer espécie e o rompimento das relações diplomáticas.
Artigo 42 - No caso de o Conselho de Segurança considerar que as medidas previstas no Artigo 41 seriam ou demonstraram que são inadequadas, poderá levar e efeito, por meio de forças aéreas, navais ou terrestres, a ação que julgar necessária para manter ou restabelecer a paz e a segurança internacionais. Tal ação poderá compreender demonstrações, bloqueios e outras operações, por parte das forças aéreas, navais ou terrestres dos Membros das Nações Unidas. "
ARTIGO 48 - 1. A ação necessária ao cumprimento das decisões do Conselho de Segurança para manutenção da paz e da segurança internacionais será levada a efeito por todos os Membros das Nações Unidas ou por alguns deles, conforme seja determinado pelo Conselho de Segurança.
2. Essas decisões serão executas pelos Membros das Nações Unidas diretamente e, por seu intermédio, nos organismos internacionais apropriados de que façam parte.
Desses três artigos conclui-se que, na hipótese de ruptura da paz ou necessidade de preservar a paz e a ordem internacionais, somente a ONU pode adotar meios de forças aéreas, navais ou terrestres (artigo 42), através de resolução do Conselho de Segurança Nacional (artigo 41), precedidos de outros meios coercitivos para o cumprimento de suas ordens (artigo 41), a ser levada a efeito por todos os Membros das Nações Unidas ou por alguns deles, conforme seja determinado pelo Conselho (artigo 48).
(7)A Resolução nº1441 do Conselho de Segurança da ONU, de 8 de novembro de 2002, resulta do descumprimento reiterado por parte do Iraque de inúmeras Resoluções anteriores sobre a necessidade de seu desarmamento e explicações sobre seus programas para desenvolver armas químicas, biológicas e nucleares, mísseis balísticos e outras armas. Aponta inúmeras obrigações para o Iraque, inclusive fixando prazo para sua aceitação, apresentação de relatório discriminado e início dos trabalhos dos inspetores da ONU. O parágrafo 13 da Resolução nº1441 (são 14 ao todo) dispõe:
"Recalls, in that context, that the Council has repeatedly warn Iraq that it will face serious consequences as a result of its continued violations of its obligations".
(8) A controvérsia jurídica sobre a possibilidade da intervenção militar no Iraque pelas forças da coalizão anglo-americana reside na interpretação desse parágrafo 13, da Resolução nº1441. Como se vê, a Comissão Internacional de Juristas sustenta que ela não autoriza a invasão, até porque dependeria de uma resolução específica do Conselho de Segurança. Também manifestaram-se pela ilegalidade da invasão as associações de advogados ingleses, franceses e espanhóis (Le Monde de 20 de março de 2003).
Segundo o jornal francês Le Monde, de 20. 03. 2003, o Primeiro-ministro inglês obteve parecer favorável do Procurador Geral do Reino Unido:
"Tony Blair a eu recours au plus haut magistrat du royaume, Lord Peter Goldsmith, pour lui venir en aide sur le plan juridique. L´attorney general a accédé à ses vœux en reprenant l´argument selon lequel les résolutions menaçant l´Irak de "conséquences graves" (678, 687 et 1441) constituent une base légale suffisante pour l´attaque".
Ainda de acordo com aquele jornal francês, citando o jornal espanhol El País, os conselheiros jurídicos do ministério espanhol das relações exteriores assinalaram em estudo de outubro de 2002, que seria ilegal atacar o Iraque, porque a derrubada de Saddam Hussein ou a legítima defesa não constituíam justificativas aceitáveis.
Finalmente, diz o Le Monde que os Estados Unidos da América do Norte invocaram o princípio da legítima defesa para intervir no Afeganistão contra a rede terrorista Al-Qaida, depois do atentado de 11 de setembro. Esse direito à legítima defesa, que está previsto no artigo 50 da Carta da ONU, não pode se aplicar ao Iraque, e, por isso, os dirigentes americanos passaram a usar o conceito de "ação preventiva", que é contrário a todas as regras internacionais, e jamais foi usado pelos Estados Unidos da América do Norte perante as Nações Unidas.
(9)Uma vez deflagrada a guerra, impõe-se, por razões humanitárias, a adoção de regras que submetam o uso da força a limitações e condições destinadas a proteger o ser humano contra as conseqüências da arbitrariedade, a limitar o uso da violência e a reduzir os sofrimentos, evitando perdas e danos humanos e materiais inúteis ou supérfluos. É o princípio máximo do Direito Internacional Humanitário: mínimo de humanidade aplicável em todo tempo, lugar ou circunstância.
Divide-se o jus in bello em duas vertentes: a) o "direito da Haia" relativo à limitação dos "meios e métodos de combate", isto é, à própria condução da guerra – Convenções de 1907; e b) o "direito de Genebra", atinente ao respeito às vítimas de guerra – Convenções de 1949 e 1977.
O "Direito da Haia" é composto dos seguintes tratados:
1.III Convenção da Haia de 1907 relativa ao rompimento das hostilidades;
2.IV Convenção da Haia de 1907 relativa às leis e uso de guerra terrestre com regulamento anexo;
3.V Convenção da Haia de 1907 sobre direitos e deveres dos neutros em caso de guerra terrestre;
4.VI Convenção da Haia de 1907 relativa ao regime dos navios mercantes inimigos no início das hostilidades;
5.VII Convenção da Haia de 1907 relativa à transformação dos navios mercantes em navios de guerra;
6.VIII Convenção da Haia de 1907 relativa à colocação de minas submarinas automáticas de contato;
7.IX Convenção da Haia de 1907 sobre o bombardeamento por força navais em tempo de guerra;
8.X Convenção da Haia de 1907 para a adaptação à guerra marítima da Convenção de Genebra;
9.XI Convenção da Haia de 1907 relativa a certas restrições ao exercício do direito de captura em caso de guerra marítima.
O "Direito de Genebra", denominado, Direito Humanitário, é composto por:
1.Convenção de Genebra de 1949 para a melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha ;
2.Convenção de Genebra de 1949 para a melhoria da sorte dos feridos e enfermos e náufragos das Forças Armadas no Mar;
3.Convenção de Genebra de 1949 relativa ao tratamento de prisioneiros de guerra;
4.Convenção de Genebra de 1949 relativa ao tratamento dos civis em tempo de guerra;
5.Protocolos I e II de 1977 às Convenções de Genebra de 1949;
6.Convenção de Genebra de 1977 sobre a proibição de utilizar técnicas de modificação ambiental com fins militares ou outros fins hostis;
7.Protocolo de Genebra de 1996 modificado sobre a interdição ou a limitação do emprego de minas, armadilhas e outros dispositivos.
É a essa convenções de Genebra de 1949 e seus Protocolos que se refere a Comissão Internacional de Juristas.
Há, ainda, quem fale no "direito de Nova York", formado por:
1.Convenção de Nova York de 1981 sobre a interdição ou a limitação do emprego de algumas armas clássicas que podem ser consideradas como produzindo efeitos traumáticos excessivos ou como ferindo sem discriminação;
2.Convenção de Nova York de 1993 sobre interdição de aperfeiçoamento, de fabricação, de estocagem e de emprego de armas químicas e sobre sua destinação. Esta que se conjuga com a Convenção assinada em Londres, Moscou e Washington de 1972 proibindo a fabricação e o aperfeiçoamento de armas bacteriológicas ou tóxicas, e estabelecendo normas para sua destruição.
(10)Outros instrumentos jurídicos internacionais seriam aqueles que compõem o Direito da Haia e o Direito de Nova York, ainda no campo do Direito Internacional Humanitário, bem assim aqueles que dizem respeito à proteção dos direitos humanos mesmo em tempo de guerra, que é o caso dos tratados que compõem o Direito Internacional dos Direitos Humanos.
(11)O costume é importante fonte de direito internacional. Um princípio consuetudinário sempre citado é aquele dac imunidade civil e seu corolário que requer às partes combatentes que distingam entre civis e militares.
(12)Neutralidade é a situação jurídica e política de um Estado que, em presença de uma guerra entre dois ou vários países, permanece fora dessa guerra, abstendo-se de assistir esse ou aquele, e, por isso mesmo, merecendo ser respeitado. Violada as normas internacionais de neutralidade o Estado beligerante responde pela violação.
(13)Merecem destaque, a título de exemplo, algumas normas do direito da guerra terrestre. É proibido o uso de: a) projéteis de peso inferior a 400 gramas, explosivos ou carregados de matérias fulminantes ou inflamáveis; b) balas dundum; c) armas envenenadas; d) gases asfixiantes, deletérios ou tóxicos; e) armas bacteriológicas; f) armas de fragmentação, de granada à bomba de avião; e g) minas, armadilhas e outros dispositivos que não podem ser usados se atingem também os civis.
Cita Mello os autores Mirimanoff-Chilikine que têm salientado que a classificação em armas convencionais e armas de destruição de massa está caduca, tendo em vista as bombas com bilhas, com flechas (pequenas), etc., que atingem a todos indiscriminadamente, usando males supérfluos. Estas e outras armas foram usadas pelos EUA no Vietname, assim como usaram guerra meteorológica, provocando chuvas.
O desarmamento e o controle de armas têm, de um modo geral, objetivado: a) a segurança internacional; b) defender a economia estatal; e c) preservar as instituições democráticas que são corrompidas pelo militarismo. A Carta da ONU não se refere a desarmamento, mas criou, no seu primeiro mês de funcionamento, em 1946, a Comissão de Energia Atômica, e, em 1952, a Comissão de Desarmamento. A título exemplificativo, vale a pena lembrar que, em 1987, foi concluído tratado entre EUA e URSS para eliminação de foguetes de curto e médio alcance; em 1991, novo tratado sobre redução e limitação de armas estratégicas ofensivas; e, em 1993, previsão de um máximo de 3. 500 ogivas nucleares para cada um. Em 1996, a AG da ONU aprovou tratado para a interdição completa dos ensaios nucleares. O senado dos Eua não aprovou esse tratado.
É, ainda, de se lembrar que a Convenção da Haia sobre guerra terrestre proíbe, entre outras condutas: a) matar ou ferir à traição indivíduos pertencentes à nação ou ao exército inimigo; b) matar ou ferir um inimigo que tenha deposto armas; c) declarar que não dará quartel; d) destruir ou apreender propriedades inimigas, salvo os casos em q ue a destruição ou a apreensão forem imperiosamente recomendadas pelas necessidades de guerra.
Na guerra aérea, por outro lado, é preciso lembrar não se bombardeará cidade que não esteja sendo defendida e o bombardeio deverá ser previamente informado.
Por fim, os alvos só podem ser militares.
(14)A Convenção de Haia sobre leis e usos na guerra terrestre (1907) proíbe o emprego de veneno e armas envenenadas. Em 1919, o Tratado de Versalhes também reconheceu essa proibição. Em 1925, o Protocolo de Genebra, referido pela Comissão, proibiu os "meios químicos ou bacteriológicos", mantido em vigor por resolução da ONU, de 1982, reafirmada a proibição em 1932, por resolução da Conferência Geral de Desarmamento e em resoluções do Conselho e Assembléia da Sociedade das Nações. Em 1972, foi concluída Convenção que proíbe o aperfeiçoamento e fabricação de armas bacteriológicas (biológicas) ou tóxicas e estabelece regras para sua destruição. Em janeiro de 1989 reuniu-se, na sede da UNESCO, conferência com 149 países para proibir o uso de armas químicas, aprovando uma declaração nesse sentido. Apesar desse aparato jurídico internacional, as armas químicas continuam a ser usadas: a) pelo Egito contra o Yemen (anos 60); b) pelos EUA no Vietname; c) pelo Vietname no Camboja; d) pela URSS no Afeganistão; e) pela África do Sul contra a SWAPO; f) por Cuba contra a UNITA, em Angola; g) pela Líbia no Chade; h) na guerra do Irã contra o Iraque; i) na Guerra do Golfo; j) pelo Iraque contra os curdos.