RESUMO
Os vernáculos procuram demonstrar ao mundo científico os requisitos fundantes na discussão acerca do julgamento de Nuremberg, dos denominados grandes criminosos de guerra, a seca de 1932 e a guerra de Canudos. Neste sentido parece ser indispensável retroagirmos aos primórdios da história, visando entender as circunstâncias dos referidos julgamentos. Inegável que Nuremberg, se tratou de um tribunal político, com evidências claras. Um tribunal de exceção, criado após o cometimento dos delitos e destinado a julgar fatos anteriores, um tribunal de vencedores, destinado a julgar apenas os vencidos. Criado para o julgamento de fatos pretéritos (ex post fatcto), mesmo assim para muitos, um progresso no âmbito do direito internacional, para outros, um tribunal improvisado e arbitrário, onde foram negados elementares postulados do direito penal, entre eles: princípio da legalidade e da irretroatividade da lei penal.
PALAVRAS-CHAVE: Campos; tribunal; julgamento; legalidade; direito.
RESUME
The vernacular seek to demonstrate the scientific world the founding requirements in the discussion about the Nuremberg trials, the great war criminals called, the drought of 1932 and the War of Canudos. In this sense it seems to be indispensable retroagirmos to the dawn of history, in order to understand the circumstances of such trials. Undeniable that Nuremberg, this was a political court with clear evidence. A special court set up after the commission of the offenses and for judging previous facts, a court of winners for judging only losers. Created for the prosecution of past tenses facts (eg fatcto post), yet for many, progress in the framework of international law, for others, an improvised and arbitrary court, where they were denied basic tenets of criminal law, including: the principle of legality and non-retroactivity of criminal law.
KEYWORDS: Fields; court; judgment; legality; Right.
O HISTÓRICO DE NUREMBERG NA CONCEPÇÃO DOS VENCEDORES
No ano imediatamente ao termino da segunda Guerra Mundial, reuniu-se em Nuremberg, um tribunal militar internacional, com o objetivo de julgar os crimes de guerra praticados contra os milhares de concentrados na sua maioria judeus.
Assim, na data de 20 de novembro de 1945, no palácio da justiça da cidade de Bávara de Nuremberg, sob a presidência de Geoffrey Lawrence, juiz da representação inglesa, foram iniciadas as 403 sessões públicas do julgamento de vinte e três líderes nazistas capturados pelas forças aliadas, dentre os quais vinte especialistas em medicina considerados criminosos de guerra, devido aos experimentos realizados em seres humanos [1].
A cidade de Nuremberg, foi escolhida porque além de representar o ponto de concentração da zona de ocupação norte-americana, foi o centro de divulgação do nazismo, bem como ex-palco das mais gigantescas manifestações do partido nazista.
Deste tempo, três meses foram utilizados pelo Ministério Público para montar a acusação aos réus e organizações, com apresentação vultuosa de prova documental, somando-se, trinta e oito mil documentos, seiscentos e doze contra as instituições.
Ao longo de quase um ano de julgamento em 19 de agosto de 1947, o tribunal divulgou as sentenças, absolvendo cinco réus, condenando quatro organizações criminosas.
Os documentos que tramitaram no tribunal, totalizaram ao final, quatro bilhões de palavras e ocuparam dezesseis mil laudas.
O libelo tinha 25 mil páginas e só a sua leitura consumiu todo o primeiro dia de julgamento.
Desfilaram pelo tribunal duzentos e quarenta testemunhas e anotaram-se trezentas mil declarações sob juramento. Os dias de julgamento foram os mais longos da história, totalizando ao final quase trezentos dias.
O Código de Nuremberg, para muitos historiadores, pode ser considerado como um marco na história, pois pela primeira vez foi estabelecida uma recomendação de alcance internacional sobre os aspectos éticos e humanitários envolvendo pesquisas em seres humanos.
Consoante as cenas que são divulgadas pelo filme, estamos diante de um genocídio sem precedentes até então.
Uma questão que se coloca é que durante o regime nazista foi gerada uma carga enorme de informações sobre fisiologia e reações humanas, infelizmente sob a dor, sofrimento e muito sangue inocente que clamavam por justiça.
Sabe-se também que a comunidade científica atualmente está dividida entre usar ou não aquelas informações em suas pesquisas.
A GRAVATA VERMELHA COMO SENTENÇA PENAL NO SERTÃO
Quando Antonio Beatinho é degolado junto com seus companheiros que se entregam confiando na palavra do General Artur Oscar, revela o julgamento sumário, promovido pelos vencedores.
Desde agosto que os jornalistas relatavam casos praticados de forma discreta na calada da noite. Nos últimos dias da guerra, a gravata vermelha como também era chamada a degola, foi larga e amplamente utilizada sem cerimônia, em plena luz do dia, para revelar a capacidade do Estado.
Termina a resistência sertaneja, Canudos estava destruída. Num cenário de fim de mundo, por entre becos e ruelas, uma legião de corpos carbonizados se mistura com as ruínas e as cinzas de aproximadamente 5.200 casas.
A elite política, acadêmica e militar do país estavam em êxtase. Os deputados federais da Bahia congratulam-se com o governo pela completa destruição de Canudos, baluarte de bandidos e fanáticos e o próprio presidente da república, Prudente de Moraes, declara: “em Canudos não ficará pedra sobre pedra”. Sobre o massacre escreveu o estudante Alvim Martins Horcades, num livro publicado antes de “Os Sertões”:
(Descrição de uma Viagem a Canudos), e com uma crueza a que Euclides não chegaria, a degola dos prisioneiros. "Belo exemplo de civismo e progredimento social!", escreve Horcades, com indignação. "Levar-se homens de braços atados para trás, como criminosos de lesa-majestade, indefesos, e perto mesmo de seus companheiros, para maior escárnio, levantar-se pelo nariz a cabeça, como se fora a de uma ave, e cortar-lhes com o assassino ferro o pescoço, deixando cair a cabeça sobre o solo - é o cúmulo do banditismo praticado a sangue frio, como se fora uma ação nobilitante!
Escreve ainda:
Acontecia certas ocasiões estarem muitos daqueles miseráveis dormindo e serem acordados para se lhes dar a morte. Depois de feita a chamada, organizava-se aquele batalhão de mártires, de braços atados, arrochados um ao outro, tendo cada qual dois guardas e seguiam... seguiam para ainda uma vez provar cabalmente a sua coragem intimorata. Caminhavam um pequeno pedaço de terra e lá ia sendo assassinado um após outro. Eram encarregados desse serviço dois cabos e um soldado, a mando do sanguinário alferes Maranhão, os quais, peritos na arte, já traziam os seus sabres convenientemente amolados, de maneira que, ao tocarem a carótida, o sangue começava a extravasar-se, sendo então decepada toda aquela região, de modo a produzir um jorro de sangue, tendo pouco mais ou menos 25 centímetros de espessura, em circunferência [2].
O episódio de Beatinho é doloroso. Na última campanha, já antevendo a derrota total, saiu sozinho e propôs um entendimento com o general Artur Oscar. Tinha um grupo que propunha se entregar em troca da vida. O coronel deu-lhe a palavra: vida garantida.
Beatinho voltou ao arraial, reuniu um grupo superior a mil indivíduos, composto de mulheres, crianças e velhos feridos, enfermos e, horas depois, com toda essa gente, que até as pedras inspiravam compaixão, foi até ao encontro do quartel.
Estavam todos profundamente convencidos de que o compromisso de honra de um general brasileiro seria satisfeito.
O que se passou depois não se qualifica, Beatinho e todos os infelizes que o acompanhavam, sem exceção de um só, foram degolados.
Tem-se explicitamente que naquele arraiá, por ocasião dos últimos momentos, já que foi invadido de forma gradual, na última expedição, um campo de concentração no seio do sertão e que o extermínio dos seguidores do beato, foi a prova cabal da existência de um tribunal formado pelo exército brasileiro, para a execução dos jagunços usando a pena capital.
OS CAMPOS DE CONCENTRAÇÃO E O FLAGELO DO NORDESTE NA SECA DE 1932
Os campos de concentração demonstravam de forma nítida as concepções da política alemã no trato da raça humana de outras casta, ficando evidenciado em todas as publicações acerca do tema, concernente a quantidade de vítimas: “Judeus: pelo menos 1,1 milhão; poloneses: 140 mil; ciganos "sinti" e "roma": 20 mil; prisioneiros de guerra soviéticos: pelo menos 10 mil; outros: (homossexuais, prisioneiros políticos, testemunhas de Jeová): entre 10 mil e 20 mil [3]”.
O nordeste brasileiro sofria com as consequências da estiagem, mas também vivia um momento histórico próprio na era de Getúlio Vargas, lampião e seu bando centralizavam as atenções dos políticos, as oligarquias políticas do nordeste mudavam de nomes: padre Cícero ainda tinha influência política e milagrosa para os sertanejos e a irmandade do Caldeirão de Santa Cruz, atraia centenas de flagelados para Fortaleza-arredores do Crato, Ceará.
Com o temor da intensa invasão de flagelados para Fortaleza e para outras grandes cidades do Ceará - a estratégia dos currais do governo mais uma vez foi implantada só que desta vez não somente em Fortaleza, mas também em cidades com alguma estrutura básica e com estações de trens.
Além dos campos de concentração na capital, alagadiço e outro no noroeste, no Pirambu, foram instalados outros, em Quixadá e Quixeramobim.
Os sertanejos ali alojados recebiam algum cuidado e comida e podiam trabalhar nas frentes de obras, sempre sob a vigilância de soldados.
Estima-se que cerca de 73.000 flagelados foram confinados nesses campos, onde as condições eram desumanas, como narra a senhora Luiza Pereira, dona Lô, sobre as lembranças do holocausto: “Tenho muita coisa pra dizer não. Minha mãe não deixava nós desgrudar dos pé dela. Era muita gente. Ela tinha medo de alguém carregar eu e meu irmão. Do resto todo mundo já sabe. Perdi a conta de quantas vez já repeti tudo isso. O sofrimento foi medonho... Quando chegamos neste lugar, após caminhada de 16 léguas, deitamos ali mesmo, no chão. Exaustos, sem ter o que comer, minha mãe ferveu água para passar a fome. Era apenas o começo dessa miséria que nunca esqueci... Desesperado, meu pai resolveu carregar a gente de Tauá para cá (Senador Pompeu) à procura do que comer e beber. Mas se estava ruim ficou pior [4]”.
O Senhor Cantídio, um morador da comunidade de Poços que conviveu com a seca de 1932 expõe sua experiência:
[...] Dia de feira poucos compravam alimentos. Naquela época era tudo aberto não havia tantas cercas, hoje os bichos são presos em pequenas roças, comem o pouco que elas oferecem e depois acabam morrendo. Agente comia o bró tirado do licurizeiro. Era preciso escolher a planta certa. Derrubava, desgarrava, cortava, laçava em quatro partes, batia numa lage. Levava para ser secada, ia ao pilão e depois era peneirada. Era uma farinha vermelha, depois fazia um cuscuz vermelho que só. Era comida ruim, menino chorava pra não comer, era só para encher a barriga. Uma comida muito braba e saborosa era produzida com a mucunã. A semente era assada no fogo feito com palhas, era quebrada, tirava um bago bem branco, como castanha de caju. O bago era levado ao pilão, fazia uma massa, peneirava, depois era lavada em nove águas para tirar o veneno, era como tapioca. Depois se fazia o beiju. Agente comia o inhame de mato, ele tem folha larga, é uma batata. Para comer é descascada e cozinhada como o aipim. Tinha o palmito do licuri, uma comida para encher a barriga, logo agente tava com fome [5]”.
A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA EM NUREMBERG E O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Com o exercício físico diário os acusados de Nuremberg tinham apenas direito a passear num pátio de 30 metros durante 20 minutos, sendo obrigados a estarem distanciados uns dos outros, 10 passos, e, sendo proibida qualquer troca de palavras, mesmo em voz baixa.
O Estado de Direito possui dupla responsabilidade, a primeira é a de cumprir a lei, a segunda é assegurar os direitos e garantias fundamentais e não basta apenas existirem as leis para a efetividade da justiça. É preciso garantir aos delinquentes o mínimo de dignidade.
Os prisioneiros de Nuremberg assim como os prisioneiros da guerra de Canudos eram tratados sem o mínimo de dignidade, os prisioneiros de Nuremberg eram obrigados a dormir sempre para o lado direito, para que estivessem sempre virados para o guarda de serviço.
Quando a meio do sono o corpo dava uma volta, eram despertados pelo postigo com um pau comprido. É o relato da história.
Juntando a isto a constante utilização de potentes focos para os interrogatórios, levou ao esgotamento físico dos acusados e à sua quase total cegueira.
Recebiam amiúde a visita de psicólogos americanos que os estudavam com o mesmo entusiasmo como o bacteriólogo estuda seus bacilos.
Transportando o tema para nosso ordenamento jurídico, verifica-se que a dignidade: Na Constituição Federal brasileira de 1988 foi criado um título específico reunindo as três primeiras gerações direitos humanos, cada uma em capítulo próprio, já no início do texto constitucional. [...] Nas Constituições anteriores tais direitos inerentes às pessoas constavam topograficamente ao final das disposições. O objetivo deste deslocamento feito na Constituição de 1988 foi o de transmitir uma mensagem, o ideal de que os direitos das pessoas precedem aos do Estado, prestigiando o jusnaturalismo e a referida premissa de “contrato social [6]”.
Deste modo, partindo da premissa da dignidade que tem íntima relação com o direito penal garantista, faz-se necessário entender que no Estado Democrático de Direito, um fato punível deve ser encarado tendo em vista a finalidade do direito penal, que é a proteção de bens jurídicos.
Um dos fundamentos do Estado brasileiro é a dignidade da pessoa. Na democracia, todos os princípios devem se basear no respeito, pois estes funcionam como algo estruturante, representando o arcabouço político fundamental constitutivo do estado e sobre o qual se assenta todo o ordenamento jurídico.
A sentença correspondeu logicamente aos pedidos do Ministério Público, em Nuremberg, a máquina estava montada para o enforcamento e em Canudos, pela degola.
CONCLUSÃO
Ao longo do presente estudo, procuramos descrever os campos de concentração, onde foram eliminados seres humanos em consequência de diversas atrocidades.
Dos locais onde eram depositados os judeus e outros, no nordeste na grande seca ou os jagunços nos últimos dias de batalha, em Canudos.
Tem-se a certeza inequívoca, diante dos relatos introduzidos que os campos de concentração existem nos tempos atuais.
Pode-se vislumbrar diversos tribunais, onde existem sentenciados e sentenciadores.
Nesta leitura é de suma importância lembrar que a influência dos episódios ultrapassam a seara jurídica, devendo ser observada como o olhar de outras ciências, procurando entender e contribuir com a história recente da humanidade.
Nunca foi intenção deste artigo o esgotamento do tema, mas sim, demonstrar as penalidades produzidas nas cortes, contribuir intelectualmente, pressuposto indispensável ao estudo dos grandes temas.
Na fria madrugada de 16 de outubro de 1946, numa velha sala do ginásio municipal de Nuremberg, forma enforcados dez dos principais dirigentes nacional-socialistas que, depois da maior paródia do século, passaram a história como criminosos de guerra.
A sentença final dos que resolveram se entregar em Canudos, antes garantida a preservação da vida e que foram executados de forma covarde e fria, revela que a história é escrita pelos vencedores.
Referências/Notas:
[1] Filme: https://www.youtube.com/watch?v=MoWuvmaSnIw Julgamento dos Nazistas em Nuremberg.
[2] Citação/Fragmentos retirados do texto: Os astros da degola: um banho de sangue coroou a campanha
em que o Brasil defrontou o Brasil, publicado em “O Berrante Online”. Copyright © 1997, Abril S.A. http://berrante.orgfree.com/textos/veja/p_084.html
[3] Texto: Carlos Ferreira, da Redação, em São Paulo Fonte: Com informações da agência EFE e da Enciclopédia Ilustrada da Folha. http://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/holocausto
[4] Texto extraído do site: http://www.redebrasilatual.com.br/revistas
[5] Texto: Jasson de Oliveira Ferreira http://professorjassonoliveira.blogspot.com.br/2012/12/a-seca-de-1932.html
[6] Texto extraído do artigo A dignidade da pessoa humana de Artur Francisco Mori Rodrigues Motta, publicado em http://www.ambito-juridico.com.br/.