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A igualdade e a seletividade no Direito Penal

Agenda 26/09/2015 às 09:17

O conceito de igualdade esta diretamente ligado ao sentimento de justiça. E este princípio pode ser analisado sob dois enfoques interligados entre si. Uma igualdade entendida como formal e outra considerada como material.

1. Introdução

Os princípios são normas basilares dentro de qualquer ordenamento jurídico. A constituição federal preconiza no seu artigo 4º: “Quando a Lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”. Enquanto, os princípios constitucionais são considerados os pilares do ordenamento jurídico, orientando o interprete a melhor forma de agir diante das normas jurídicas , tanto na sua formação como na aplicação  e nas situações concretas no cotidiano que regem o Processo Penal. Assim,o princípio da igualdade é de suma importância para concretizar o ideal do Estado Democrático de Direito, devendo ser respeitado na sua integridade. Afinal, se todos os seres humanos são iguais perante a lei e gozam dos mesmos direitos, esta também deverá ser a mesma para todos, seja para proteger e  para punir.

2. O Principio da Igualdade

Este princípio foi consagrado pela Constituição federal no seu artigo 5°, inciso I:

 ’’ Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.’’

O principio da igualdade ou isonomia, é fundamentado no pensamento de que todos os seres humanos, nascem iguais e desta forma devem possuir as mesmas oportunidades de tratamento. Essa preocupação dos revolucionários Franceses, em declarar a igualdade de todos perante a lei , foi assimilada pelas constituições mais modernas, a exemplo da Brasileira, que adota um Estado Democrático de Direito. Portando, é através  da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, criada na França que o princípio da igualdade passou a servir de alicerce do Estado moderno, dando assim grande colaboração a todas as constituições modernas.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas afirma em seu artigo 1°:

"Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade’’

O conceito de igualdade esta diretamente ligado ao sentimento de justiça. E este princípio pode ser analisado sob dois enfoques interligados entre si. Uma igualdade entendida como formal e outra considerada como material.

A formal, refere-se a expressão utilizada de que’’ todos são iguais perante a lei’’ , é a igualdade diante da lei vigente e da lei a ser elaborada, impedindo privilégios a qualquer grupo. E proibindo o tratamento diferenciado aos indivíduos com base em critérios como : raça, sexo, classe social, religião e convicções filosóficas e políticas como consta no artigo 3º inciso IV da Constituição Federal.

Enquanto a material, pressupõe que as pessoas inseridas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual, tratando  igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades. Servindo de instrumento de concretização da igualdade em sentido formal, para aplica-la  ao mundo prático.

Assim afirma, Pedro Lenza:

O art. 5º, caput, consagra que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Deve-se, contudo, buscar não somente essa aparente igualdade formal (consagrada no liberalismo clássico), mas, principalmente, a igualdade material, na medida em que a lei deverá tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades. Isso porque, no Estado social ativo, efetivador dos direitos humanos, imagina-se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa daquela apenas formalizada perante a lei (2009, p. 679).

Esta desigualdade é  necessária, com o objetivo de obter um resultado mais justo , já que as diferenças existentes entre os cidadãos não podem ser ignoradas. O tratamento desigual não tem como finalidade descriminar negativamente , e sim reduzir essas desproporcionalidades na sociedade.

Merece destaque, ainda, que em virtude deste princípio  seja possível o ajuizamento de ‘’ ações afirmativas’’. São políticas públicas ou programas sociais direcionados com o intuito de diminuir as desigualdades em relação às pessoas ou grupos em posição de inferioridade, as classes desfavorecidas e marginalizadas. Visando, colocá-las em um mesmo patamar, equiparando com as demais que não sofreram as mesmas espécies de restrições.

3. O Principio da Igualdade em relação à Justiça Penal

Para Fernando Capez:

"As partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazer valer suas razões, e ser tratadas igualitariamente, na medida de suas igualdades, e desigualmente, na proporção de suas desigualdades. Na execução penal e no processo penal, o princípio sofre alguma atenuação pelo, também constitucional, princípio favor rei, postulado segundo o qual o interesse do acusado goza de alguma prevalência em contraste com a pretensão punitiva. ‘’(CAPEZ, 2008, p. 19)

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Este raciocínio de definição da igualdade material, faz com que seja possível em determinadas situações um tratamento desigual entre os indivíduos embora tenham praticado um fato semelhante , considerando suas desigualdades.

Em relação à justiça penal, pode-se observar que este princÍpio  é um dos menos observados , no que diz respeito à aplicação da lei penal, sendo  muitas vezes violado. É nítido que a aplicação da lei penal, principalmente no Brasil, é dirigida a um público alvo, aos pobres e miseráveis.

A seletividade do Direito Penal, é um sinal evidente de que o principio da igualdade não esta sendo observado em muitos países. A todo instante, este principio é quebrado, violado  e consequentemente gera na sociedade um sentimento de revolta e impunidade.

Assim leciona Alessandro Baratta:

"O Direito Penal, como instrumento do discurso de (re)produção de poder, tende a privilegiar os interesses das classes sociais dominantes, imunizando de sua intervenção condutas características de seus integrantes, e dirigindo o processo de criminalização para comportamentos típicos das camadas sociais subalternas, dos socialmente alijados e marginalizados ( BARATTA, Alessandro, 2002, p. 165)’’

De acordo com o que foi anteriormente dito surge os questionamentos. Será que todos são realmente iguais perante a lei? Quantas pessoas de classe média , média alta, ou alta estão presas no sistema penitenciário? Será que essas pessoas não cometem crimes?  

A verdade é que a seletividade atinge aquela camada da população mais frágil, que já possui um estereótipo criado pela própria sociedade, pobres ,negros ,ou seja  os estratos sociais desprivilegiados .Enquanto que aqueles que não condizem com esse estereótipo, não são tratadas da mesma maneira.

Quando o autor da infração pertence às camadas sociais mais baixas , com certeza , a lei será aplicada com todo o rigor. Porém, quando aquele que cometeu o delito pertence às camadas sociais mais elevadas, faz parte de um seleto grupo social, o tratamento que lhe dispensado é completamente diferente, fazendo romper com todo o ideal de justiça.

Uma simples verificação no sistema prisional confirma essa assertiva. Afinal,muitos políticos, empresários e detentores de grande poder, por exemplo, também cometem infrações penais que causam danos irreparáveis a sociedade.Os chamados crimes de ‘’colarinho branco’’ que causam inestimáveis prejuízos à população, sonegam impostos, superfaturam obras publicas,abusam do poder que lhes foi conferido. Enfim, são inúmeras as infrações, porém os autores desses crimes eventualmente são processados criminalmente, e mais raramente ainda, são punidos e levados ao cárcere.

4. Considerações Finais

Portanto, a violação desse princípio ofende não somente a constituição , e sim a essência do próprio ser humano.Estas desigualdades devido a  dominação de classe social, ou até mesmo racial sobre outra faz com que o Direito Penal, muitas vezes se torne um sistema seletivo com base no poder econômico e consequentemente refletindo na aplicação da pena.

Assim, o princípio da igualdade deverá ser aplicado de forma que se alcance a sua plenitude, a ideia de igualdade não só perante a lei, mas a todo o Direito e perante a justiça. Destacando, a necessidade de observância do Direito Penal à luz deste princípio e de um Estado Democrático de Direito. Somente assim, poderá atingir uma real e efetiva igualdade e a verdadeira justiça

Referências

CARPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, vol. 4, São Paulo: Saraiva, 2008

http://re.granbery.edu.br/artigos/MzU1.pdf

http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7039

http://institutoprocessus.com.br/2012/wpcontent/uploads/2011/12/3_edicao1.pdf

BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil; promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Anne Joyce Angher. 6. ed. São Paulo: Rideel, 2008.

GRECO, Rogério. Direito humanos, sistema prisional e alternativas à privação de liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado:Igualdade Formal e Material. São Paulo: Saraiva, 2010.

BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal: introdução à sociologia do direito penal. Tradução de Juarez Cirino dos Santos. 3. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002

Sobre o autor
Irapuan de Souza Mouzinho Junior

Estudante de Direito na Faculdade de Olinda.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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