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Crimes de perigo abstrato: a falácia da precaução na sociedade de riscos

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Agenda 02/11/2015 às 09:37

O presente trabalho tem por objetivo mostrar a aplicabilidade dos crimes de perigo abstrato, bem como a facilidade da verificação do risco na sociedade atual e a importância da utilização do princípio da precaução que decorre dos crimes de perigo abstrato

COMPLEXO EDUCACIONAL DAMÁSIO DE JESUS

CENTRO DE ESTUDOS PESQUISA E ATUALIZAÇÃO EM DIREITO

PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL

PATRICIA BURKINSKI

CRIMES DE PERIGO ABSTRATO: a falácia da precaução na sociedade de riscos

Primavera do Leste

2014

PATRICIA BURKINSKI

CRIMES DE PERIGO ABSTRATO: a falácia da precaução na sociedade de riscos

RESUMO

            O presente trabalho tem por objetivo mostrar a aplicabilidade dos crimes de perigo abstrato, bem como a facilidade da verificação do risco na sociedade atual e a importância da utilização do princípio da precaução que decorre dos crimes de perigo abstrato. Para isso faz-se necessário analisar os posicionamentos jurídicos acerca do tema, bem como conflitá-los com os princípios constitucionais além de verificar a sua real importância hodiernamente, demonstrando que é possível a imposição de penas à casos que demonstrem um estado de perigo aparentemente inexistente. Desta forma poderemos obter uma conclusão mais exata sobre a necessidade da utilização dessa modalidade de crime e quais seriam os danos acarretados pela sua não aplicação. A pesquisa proposta basear-se-á na pesquisa bibliográfica, pois as informações analisadas no decorrer foram obtidas por meio de consultas a livros, artigos, periódicos, dentre outros. Quanto ao método de abordagem, utilizou-se o dedutivo, no qual se parte do geral para o específico, objetivando sintetizar o material recolhido. A utilização da prevenção acarreta na punição de indivíduos que pratiquem crimes abstratos, de outro modo sua inconstitucionalidade acarreta um estado de insegurança visto que o Estado tem o dever de zelar pela segurança e vida dos cidadãos.

Palavras-chave: Crimes de perigo abstrato; Princípio da precaução, Sociedade de riscos; Ofensividade.

ABSTRACT

This work aims to show the applicability of abstract danger crimes, as well as ease of check risk in today's society and the importance of the use of the precautionary principle which derives from the abstract hazard crimes. For this it is necessary to examine the legal positions on the topic as well as them conflicts with the constitutional principles and to verify the real importance of its application in our times, demonstrating that it is possible to impose penalties for cases showing a state of danger seemingly nonexistent. Thus we get a more accurate conclusion about the need to use this type of crime and what would be the harm posed by the non-application. The proposed research will be based on the literature search because the information analyzed in the course were obtained by querying the books, article, journals, among others. As to the method of approach, deductive, in which part of the general to the specific, aiming to synthesize the collected material was used. The use of prevention entails punishment of individuals who commit crimes abstract, otherwise its unconstitutionality entails a state of insecurity since the State has the duty to ensure the safety and lives of citizens.

Keywords: Crimes abstract danger; Precautionary Principle, Risk Society ; Offensiveness .

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO_________________________________________________________ 8

1 A SOCIEDADE DE RISCOS NO DIREITO PENAL_________________________ 10

1.1 Conceito____________________________________________________________ 10

1.2 Função do Direito Penal________________________________________________ 10

1.2 A evolução do Direito Penal na sociedade de riscos__________________________ 11

1.3 O direito como instrumento de limitação dos riscos___________________________ 14

2 OS CRIMES DE PERIGO E SUA INCIDÊNCIA NO DIREITO PENAL________ 16

2.1 Conceito____________________________________________________________ 16

2.2 Dos crimes de perigo no Direito Penal_____________________________________ 16

2.3 Conceito de Crimes de Perigo Abstrato____________________________________ 18

2.4 Os crimes de perigo abstrato frente à sociedade de riscos______________________ 20

2.5 A evolução histórica dos conceitos de crimes de perigo abstrato_________________ 22

3 OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO VALOR SUPREMO___________ 26

3.1 Conceito____________________________________________________________ 26

3.2 Conceito de Princípio__________________________________________________ 26

3.3 Da relação ente princípios e crimes de perigo abstrato_________________________ 29

3.4 Princípio da Precaução_________________________________________________ 31

3.4.1 Aplicação do Princípio da Precaução_____________________________________ 33

3.5 Princípio da Ofensividade______________________________________________ 36

3.6 Princípio da Proporcionalidade___________________________________________ 38

3.7 Princípio da Intervenção Mínima_________________________________________ 40

4 DOS CRIMES DE PERIGO ABSTRATO COMO PROTEÇÃO DE BENS JURÍDICOS                43

4.1 Conceito____________________________________________________________ 43

4.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana_________________________________ 43

4.3 Posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários _____________________________ 47

4.4 Da excepcionalidade do uso do perigo abstrato face à sociedade do risco _________ 50

CONCLUSÃO__________________________________________________________ 53

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS_______________________________________ 56

INTRODUÇÃO

         A presente monografia tem por objetivo demonstrar a aplicabilidade dos crimes de perigo abstrato bem como verificar a real necessidade do emprego do princípio da precaução na sociedade de riscos atual.

            Há delitos no ordenamento jurídico que não precisam chegar as vias de fato para se saber qual será o dano decorrente de tal ação, crimes como porte de arma de fogo desmuniciada, ou o mais comum que é o de embriagues ao volante, esses são os chamados crimes de perigo abstrato, o fato da arma estar desmuniciada não diminui o temor da mesma, já que não há como se saber se ela está ou não sem munição, assim como o fato de estar dirigindo embriagado aumenta o risco de possíveis acidentes.

            O Direito é a fonte de segurança da sociedade, é nele que se recorre para buscar saber o que é ou não correto, porém a sociedade muda constantemente, avanços tecnológicos e sociais ocorrem a cada minuto e o Direito não pode ficar estacado diante dessas mudanças, novas situações de perigo surgem, os riscos mudam, os crimes também evoluem e o que os cidadãos querem é que aqueles que ameaçarem a paz social sejam punidos.

            É mas fácil para as pessoas lidarem com situações nas quais o risco que determinada conduta poderá gerar são conhecidos, do que quando se desconhece os possíveis riscos ou consequências, nasce o medo, assim as pessoas preferem lidar com aquilo que conhecem. O princípio da precaução é o caminho utilizado para regulamentar atividades em que o risco seja desconhecido, onde não haja informações sobre os danos que uma determinada conduta poderá causar.

            O direito deve ser um instrumento de prevenção de riscos e tutela de bens jurídicos, tendo em vista trazer segurança para aqueles que compõem o Estado Democrático de Direito, os crimes de perigo abstrato nada mais são do que instrumentos da sociedade de riscos, pelos quais o Estado tutelar os bens jurídicos .

            A Constituição Federal, lei maior do Estado, vem impor barreiras a aplicação dos crimes de perigo abstrato, por meio de princípios como o da ofensividade, proporcionalidade e intervenção mínima, vem limitar a utilização dos crimes de perigo abstrato alegando que os mesmos vão contra os princípio constitucionais e que esses são lei maior e, portanto não devem ser questionados.

            Não há na lei uma vedação direta a aplicação dos crimes de perigo abstrato e na visão de alguns doutrinadores o princípio da ofensividade só pode ser aplicado aos crimes de dano, como não há na lei nada claro sobre como o julgador deve agir diante de um crime de perigo abstrato, em muitos dos casos a decisão fica a cargo do magistrado, são várias as decisões de Supremo Tribunal Federal referentes a assuntos como esses, e nem o próprio Supremo se mantém fiel as suas decisões, prolatando decisões ora à favor ora contra crimes de perigo abstrato.

            Assim este trabalho busca esclarecer as controvérsias jurídicas existentes sobre o tema, a importância da utilização dos crimes de perigo abstrato na nova sociedade de riscos e o papel da precaução na verificação desses delitos.

            O risco é algo agora produzido pelo homem, não são mais os fatores naturais que o geram, e o ser humano como um ser racional pode verificar os riscos de sua conduta mesmo antes de praticá-la.

A dignidade da pessoa humana valor maior preceituado pela Constituição Federal, deve ser assegurado à todos, e a utilização dos crimes de perigo abstrato vem a fortalecer a aplicação desse princípio vez que o que se anseia é tão somente proteger a sociedade de condutas que podem trazer grandes consequências se não forem punidas preventivamente.

Há, portanto, uma ligação entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os crimes de perigo abstrato, resta saber se essa ligação é forte o suficiente a ponto de suprimir todos os questionamento feitos acerca do tema.

            A pesquisa utiliza-se do método teórico-bibliográfico realizada a partir dos registros disponíveis, decorrentes de pesquisas anteriores, em documentos como livros, artigos, teses, e o método de abordagem utilizado será o dedutivo, onde se parte do geral, para o específico.

1. A SOCIEDADE DOS RISCOS NO DIREITO PENAL

            1.1 Conceito

            A sociedade pode ser definida segundo Giddens (2005, p. 57) como “um conjunto de relacionamentos que conectam indivíduos”.[1] A sociedade ou a convivência em sociedade é o meio pelo qual os indivíduos se relacionam, criam laços de amizade e inimizade.

            Para estabelecer um melhor convívio social o Estado criou regras, para que assim cada indivíduo possa saber quais são seus limites, o que pode ou não fazer no ambiente social em que vive, aonde começa e acaba o seu direito.

  1. Função do Direito Penal

            O Direito Penal tem por finalidade a proteção de bens jurídicos, “bem” seria um interesse tutelado juridicamente e a norma é o meio pelo qual se garante a proteção desse bem.

            Para Toledo (1994, p.16) “bens jurídicos são valores ético-sociais que o direito seleciona, com o objetivo de assegurar a paz social, e coloca sob sua proteção para que não sejam expostos a perigo de ataques ou a lesões efetivas.” [2] Em outras palavras o Direito tenta assegurar garantias como honra, liberdade e privacidade, elaborando normas que garantam que esses direitos não serão violados.

            O problema encontrado pelos doutrinadores não reside no fato de como conceituar bem jurídico, mas sim em definir os limites de alcance da norma incriminadora. Günther Jakobs diz que a função do direito penal não é proteger bens jurídicos, mas sim garantir que a norma tenha sua vigência.

            A pena é uma consequência pelo desrespeito à norma, é um meio de coação, mas essa coação deve ser uma espécie de resposta a um fato que foi contra a norma, aos bons costumes, à aquilo que se julga ser correto.

            Uma ação humana para ser considerada passível de ser punida, primeiro deve ser levado em conta o grau de lesividade que a conduta praticada causou e se essa conduta é verdadeiramente reprovável pela sociedade, deve-se levar em conta porém, que nem toda conduta que gera um resultado lesivo deve ser reprovável, pois há casos como evento fortuito ou de força maior que independem de ação humana, ou seja para que uma conduta humana seja considerada reprovável e passível de seu punida faz-se necessário ainda que o autor esteja consciente daquilo que está fazendo ou se negligenciando a fazer.

            Segundo o artigo 1° da Constituição Federal o Brasil constitui um Estado Democrático de Direito, nesse Estado os homens recebem tratamento igualitário, são impostas metas para que se possa construir um ambiente livre, imparcial e solidário, onde as leis estejam adequadas à realidade social vivida.

            A lei não deve ser vista como algo a que todos estão submissos, mas sim como um meio de proteção correspondente a sociedade atual, para o Estado Democrático de Direito a lei somente deve incriminar aquelas condutas que sejam realmente lesivas para a sociedade e essa norma deve estar em consonância com os princípios basilares do direito.

            Para o doutrinador José Afonso da Silva:

Significa dizer: a lei não deve ficar numa esfera puramente normativa, não pode ser apenas lei de arbitragem, pois precisa influir na realidade social. E se a Constituição se abre para as transformações políticas, econômicas e sociais, que a sociedade brasileira requer, a lei se elevará de importância, na medida em que, sendo fundamental expressão do direito positivo, caracteriza-se como desdobramento necessário do conteúdo da Constituição e aí exerce função transformadora da sociedade, impondo mudanças sociais democráticas, ainda que possa continuar a desempenhar uma função conservadora, garantindo a sobrevivência dos valores socialmente aceitos. (SILVA, 2005, p. 121)[3]

            Destaca-se que para José Afonso, é fundamental que em um Estado Democrático as leis estejam de acordo com a realidade social, já que a Constituição está aberta para as transformações que ocorrem no cenário político que assim também deve acontecer com a lei.

1.3 A sociedade dos riscos e a evolução no Direito Penal

            O direito penal, seus institutos e métodos estão intimamente ligados ao contexto social em que a sociedade vive e a forma com a qual a sociedade é organizada.

            O direito penal é um mecanismo de controle social e para tanto precisa estar adequado a realidade social. A sociedade atual é vista como uma sociedade de riscos, não se deve estender com isso que atualmente temos mais riscos do que há alguns anos atrás, mas que o conceito de perigo mudou, que ele passou a ser percebido de novas maneiras.

            Segundo o Doutor Pierpaolo Cruz Bottini:

É evidente a relação entre risco e perigo, seja lá qual for a definição adotada. Risco é o adjetivo que se coloca ao agir humano diante do perigo ou da possibilidade de perigo. Não há risco sem potência de perigo, sem iminência de perigo. O risco refere-se primariamente ao perigo: logo, a definição do que se entende por perigo é premissa fundamental para a compreensão do risco. (BOTTINI, 2013, p. 23)[4]

            O ser humano para o positivismo é um ser limitado que não conseguem visualizar no todo aquilo que a está a sua volta, as relações existentes e os nexos causais, assim ele não consegue ter a plena certeza do resultado de uma determinada conduta, mas se consegue ter uma probabilidade, e se há uma probabilidade de dano a ação que iria ser praticada passa a ser vista como perigosa.

            Após o pensamento positivista, o perigo passa ser visto como algo real, algo que pode ser previsto e medido quanto as extensões do dano que irá provocar, o risco quem o define é o ser humano quando decide ou não fazer algo tendo a plena consciência dos danos e perigo que irá correr, o risco é visto como uma opção, a pessoa o assume ou não.

            O fato de se viver em uma sociedade de riscos não que dizer que atualmente existem mais crimes do que antes, as pessoas simplesmente ficavam alheias à essas formas de perigo antigamente, atualmente o perigo ganhou novas proporções, o dano existia no passado, o que mudou é que hoje em dia está mais fácil poder medi-lo, antecipar seus efeitos sem que a conduta criminosa tenha que necessariamente ocorrer.

            A revolução industrial é quem desencadeia o surgimento dessa sociedade de riscos, pois com ela surge o sistema da livre concorrência e passa a se buscar inovações tecnológicas, acontece que o avanço das inovações não é acompanhando pela análise dos riscos que esse avanço irá causar, ou seja, não se sabe quais danos essas inovações podem trazer, e isso gera consequentemente uma insegurança, novos riscos passam a surgir.

            Para Anthony Giddens, apud Pierpaollo Cruz Bottini:

[...] a sociedade de risco compreende um período em que as consequências da modernidade se tornam mais radicalizadas e universalizadas do que antes, e podem ser compreendidas, então, como um conjunto de relações econômicas e sociais que se desenham na era pós-industrial, em que o novo modelo de produção determina um novo papel ao risco. (BOTTINI, 2013, p. 26).[5]

            Vale ressaltar que a sociedade não vive um estado de perigo, vez que a ameaça não é concreta, diz-se sociedade de risco justamente pela incerteza do dano, é essa sociedade que necessita de medidas de prevenção, devido a grande probabilidade de uma conduta gerar um dano.

            O risco na sociedade contemporânea passa a ser algo que é produzido pelo homem, e se algo que é produzido pelo homem causa danos ou gera uma perturbação social isso é passível de punição pelo governo, se uma conduta foge do perigo normal que pode existir ao fazer algo, essa conduta pode ser coagida. As tecnologias deixam de ser vistas somente como um avanço, mas como também potenciais produtoras de riscos.

            Ulrick Beck apud Anthony Giddens fala sobre as mudanças dos riscos da seguinte forma:

[...] Como a mudança tecnológica progride de modo cada vez mais rápido e produz novas formas de risco, devemos constantemente responder e nos adaptar a essas mudanças. A sociedade de risco, segundo ele, não está limitada somente aos riscos de saúde e ambientais – inclui toda uma série de mudanças, inter-relacionadas dentro da vida social contemporânea: mudanças nos modelos de emprego, aumento da insegurança no trabalho [...]. Por estar hoje o futuro das pessoas bem menos seguro do que nas sociedades tradicionais, decisões de todos os tipos apresentam riscos aos indivíduos. Casar-se, por exemplo, significa hoje uma proeza muito mais arriscada do que quando o casamento era uma instituição para toda a vida. (GIDDENS, 2005, p. 74). [6]

            A dificuldade encontrada atualmente é em estabelecer um nexo de causalidade entre a conduta e a existência do risco, os novos riscos estão presentes em tudo, independentemente de classe social, de profissão ou de país, eles existem e é o resultado da evolução global, o que todos anseiam é um método de contenção desses riscos para que o dano não se torne efetivo.

            A mídia é um dos meios de se dissipar esse temor, os veículos de comunicação não se intimidam ao tentar provocar esse sentimento nos cidadãos ao veicular cada vez mais noticias sobre esse assunto.

            Para Bottini (2013, p. 33), “a expansão dos novos riscos, os conflitos sociais e econômicos sobre sua admissibilidade e a ausência de diretrizes científicas que fixem pautas seguras acarretam um sentimento de temor social”[7].

            As pessoas perderam seus valores éticos e morais e com isso surgiu uma sensação de insegurança ainda maior, pois antes se conseguia prever quais seriam suas condutas diante de algumas situações pelos valores que eram passados de pai para filho, antigamente a palavra valia mais do que tinta e papel.

            1.4 O direito como instrumento de limitação dos riscos

            Devido ao impasse que surgiu, risco versus desenvolvimento, surge nesse contexto a figura do gestor dos riscos, é ele quem vai dizer o que é perigo e o que não é.

            Aquele que irá gerir os riscos será uma pessoa que passará a ter que sopesar os riscos, o seu alcance e decidir o que se deve fazer, essa figura poderá ser um legislador, um administrador público ou ainda a autoridade judicial.

            O trabalho de gerenciamento dos riscos surge em decorrência de um conflito em torno da base da organização da sociedade atual, o risco é importante para o desenvolvimento, mas ao mesmo tempo é algo que gera uma situação de medo.

            Cite-se novamente Pierpaollo Cruz Bottini para compreender melhor a função do gestor de riscos:

O direito penal, como instrumento de controle social, é afetado por este estado de coisas: afinal seus operadores e aplicadores agem como gestores de riscos em um sem-número de situações. A determinação do cuidado devido nos crimes comissivos por omissão são institutos dogmáticos que lidam com a definição do risco e ficam sujeitos, como nos outros âmbitos de gestão, às ambiguidades e a insegurança que decorrem da própria organização social. (BOTTINI, 2013, p. 41)[8]

            O direito penal está ligado ao sistema de gestão de riscos no tocante à elaboração de leis, é o legislador penal quem vai decidir quais são as condutas que apresentam situações de risco que não podem ser relevadas, ou melhor, aceitais socialmente.

            O gestor de riscos irá analisar e administrar os riscos, pois para decidir qual será a conduta diante de uma situação de riscos primeiro se faz necessário conhecer esse risco e suas implicações, aqui a ciência se faz presente auxiliando o gestor a verificar todos os danos que podem decorrer de certas condutas.

            Para o legislador a dificuldade na elaboração de leis sobre riscos está no fato de que não tem como agradar à todos, ou seja, não há como elaborar uma lei que mantenha nela dogmas e ao mesmo esteja de acordo com as políticas legislativas, e assim acabam surgindo discussões sobre legalidade que perduram por anos até que a lei seja modificada ou que os dogmas das pessoas sejam quebrados.

2. OS CRIMES DE PERIGO E SUA INCIDÊNCIA NO DIREITO PENAL

            2.1 Conceito

            O crime por si só pode ser definido de duas formas, sob o aspecto material, formal e ainda sob o aspecto analítico.

            O aspecto material vem esclarecer o porquê de um fato ser considerado criminoso, nas palavras de Capez (2010, p. 134) “[...] crime pode ser definido como todo fato humano que, propositada ou descuidadamente lesa ou expõe a perigo bens considerados fundamentais para a existência da coletividade e da paz social”. [9]

            Sob a ótica do aspecto formal, crime irá ser tudo aquilo que o legislador tipificar como conduta criminosa, esse modelo não se importa com o conteúdo, ou seja, pra ele não importa se a conduta será lesiva ou não, se o legislador disser que é crime, isso bastará.

            O aspecto analítico vem dizer que crime é todo fato típico e ilícito, ele estabelece essa estrutura como uma forma de melhor avaliar o que é crime ou não, se a conduta for típica e ilícita, por sua vez, irá nascer a infração penal, a fase seguinte será a verificação da culpa do autor, se ele é realmente culpado ou não, seguindo essa estrutura se chegará ao crime.

2.2 Dos crimes de perigo no direito penal

            Como o direito penal é uma matéria vasta e várias são as espécies de delitos a melhor saída foi criar ramificações, o conceito de crime passou a ter diversas classificações como crime dolosos, culposos, preterdolosos, comissivos ou omissivos, dentre essas classificações está a “quanto ao resultado” e dentro dela está “quanto ao resultado jurídico ou normativo” é nesta que se pode encontrar os crimes de perigo.

            O resultado jurídico ou normativo pode ser entendido como a lesão ou ameaça de lesão quem um bem jurídico pode sofrer caso ocorra alguma conduta contra esse bem.

            Ao lado dos crimes de perigo estão os crimes de dano que nas palavras do doutrinador Bitencourt (2008, p. 213) crime de dano “[...] é aquele para cuja consumação é necessária a superveniên cia da lesão efetiva do bem jurídico”.[10]

            Se não houver lesão, não há dano, existindo apenas a tentativa. Os crimes de perigo, por sua vez, têm o seu fim na simples existência do perigo, aqui não se faz necessário que ocorra dano efetivo a algum bem jurídico.

            Crimes de perigo, nas palavras do doutrinador Mirabete (2008, p. 124) nada mais são do que situações em que “o delito consuma-se com o simples perigo criado para o bem jurídico”.[11]

            O perigo ainda pode ser dividido em duas categorias, sendo elas as de crimes de perigo concreto ou real e de crimes de perigo abstrato ou presumido. Os crimes de perigo concreto ou real são aqueles cujo risco deve ser demonstrado, o bem jurídico protegido por lei deve estar em iminência de sofrer um dano.

            Os crimes de perigo abstrato ou presumido não necessitam que a conduta praticada produza um perigo real, se a conduta demonstrar que pode causar um dano à sociedade, ela será considerada presumidamente perigosa, aqui o legislador irá presumir o perigo. O exemplo de mais fácil visualização dessa forma é no caso de porte ilegal de arma de fogo, previsto no art. 14 da Lei 10.826/2003.

            Os crimes de perigo abstrato nada mais são do que o reflexo da evolução da sociedade dos riscos que ela produz fazendo com que se torne necessário a criação de um direito que não seja somente repressivo, mas também preventivo, não é mais possível que o legislador feche seus olhos para condutas que contenham um perigo abstrato e espere que o dano ocorra para poder agir, deve-se prevenir o mal antes dele acontecer.

            O legislador verificando que a perca de um bem jurídico que tem valor normativo seria algo irreparável, criou normas para proteger esse bem de forma antecipada, evitando assim que qualquer dano irreversível ou não, acabe afetando algum bem jurídico protegido constitucionalmente. Os crimes de perigo vêm para proteger de qualquer forma de ameaça alguns bens jurídicos como a vida, a saúde, a integridade física e a segurança, bens estes previstos na lei maior que é a Constituição Federal em seu artigo 5º (quinto).

            Fernando Capez em sua obra traz mais algumas espécies de crimes de perigo e suas respectivas definições:

Crime de perigo: para a consumação, basta a possibilidade do dano, ou seja, a exposição do bem a perigo de dano (crime de periclitação da vida ou saúde de outrem – art. 132 do CP). Subdivide-se em: a) crime de perigo concreto, quando a realização do tipo exige a existência de uma situação de efetivo perigo; b) crime de perigo abstrato, no qual a situação de perigo é presumida, como no caso de quadrilha ou bando, em que se pune o agente mesmo que não tenha chegado a cometer nenhum crime; c) crime de perigo individual, que é o que atinge uma pessoa ou um número determinado de pessoas, como os dos arts. 130 a 137 do CP; d) crime de perigo comum ou coletivo, que é aquele que só se consuma se o perigo atingir um número indeterminado de pessoas, por exemplo, incêndio (art. 250), explosão (art. 251) etc.; e) crime de perigo atual, que é o que está acontecendo; f) crime de perigo iminente, isto é, que se está prestes a acontecer; g) crime de perigo futuro ou mediato, que é o que pode advir da conduta, por exemplo, de porte de arma de fogo, quadrilha ou bando, etc. (CAPEZ, 2011, p. 286 a 287)[12]

            São diversas as classificações dadas por Fernando Capez, mas a classificação que se realmente causa discussões é a que se refere aos crimes de perigo abstrato, estando a mesma presente em diversos tipos penais prescritos pelo legislador.

         2.3 Conceito de crimes de perigo abstrato

            A lei possui diversas finalidades e dentre elas está a segurança. Segurança não é ter uma pessoa armada na porta de sua casa, segurança é saber que existe um Estado preparado para punir qualquer cidadão que atente contra qualquer bem jurídico protegido por lei.

            Os crimes de perigo abstrato são uma forma de o Estado mostrar que protege o cidadão de qualquer forma de ameaça, seja ela real ou simplesmente algo presumido, não importando se houve ou não um resultado decorrente de uma conduta praticada.

            Roxin, apud Romero (2010, p.1), afirma que o crime de perigo abstrato seria “[...]aquele em que se castiga a conduta tipicamente perigosa como tal, sem que no caso concreto tenha que ocorrer um resultado de exposição a perigo”.[13]

            Essa tipificação penal tem por função, portanto, resguardar um direito, protege-lo, mesmo que ele efetivamente não ocorra, pois em alguns casos o dano resultante pode ser irreparável, um exemplo célere da aplicação dos crimes de perigo abstrato para evitar um dano maior são os crimes ambientais, o que vale mais prevenir uma queimada ou reflorestar aquilo que queimou, esse é um questionamento que mostra a importância da prevenção.

            Embora se visualize a importância desse dispositivo, parte da doutrina e dos entendimentos jurisprudenciais parte para a ideia de que a utilização dos crimes de perigo abstrato fere os princípios constitucionais de direito e que não há como se punir algo que gere uma situação efetiva de perigo.

            André Estefam em sua obra faz menção a não aceitação dessa modalidade de crime:

A doutrina majoritária, em nosso país, considera inconstitucionais os crimes de perigo abstrato ou presumido. Costuma-se afirmar que a caracterização da infração penal deve sempre depender da comprovação de que o comportamento do agente provocou, de fato, algum perigo ou ameaça a bens alheios. Por esse raciocínio, somente seria possível punir alguém por porte ilegal de arma de fogo se o instrumento bélico se encontrasse municiado (ou com munição de fácil alcance ou pronto para uso); caso contrário; diante da impossibilidade de lesão a terceiros, o fato seria considerado irrelevante para o Direito Penal. (ESTEFAM, 2013, p. 98)[14]

            Percebe-se, portanto, que para a maioria dos doutrinadores, se faz necessário que seja comprovada a ameaça ao bem jurídico, não basta para eles a presunção do dano, no caso citado de porte de arma de fogo desmuniciada, somente seria considerado o perigo se a arma possuísse munição ou se a mesma estivesse de fácil alcance, porém como saber que a arma se encontrava sem munição.

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            Qualquer pessoa que se encontre diante de uma situação como a citada não irá perguntar ao agente que está praticando a conduta criminosa se a referida arma possui ou não munição, o subconsciente da pessoa já irá disparar e ver aquele objeto como algo lesivo e o medo será o mesmo com ela estando ou não com a munição, pois não haverá como saber esse “detalhe” no momento da ação dolosa.

            A segurança é um direito que pode ser exigido pelos cidadãos ao Estado e para isso a lei deve estar a frente de tudo, punindo condutas que ocorreram e outras que estão por vim, a ciência e as tecnologias já evoluíram de tal modo que é possível hoje prever um resultado danoso sem que ele efetivamente ocorra.

            Na mesma obra o Mestre André Estefam ainda afirma:

Muito embora seja a questão cercada de polêmica, acreditamos serem válidos os crimes de perigo abstrato ou presumido. Isto porque o legislador age conforme a Constituição quando seleciona condutas socialmente perniciosas e potencialmente lesivas, incriminando-as em seus estágios iniciais. Cuida-se de atividade legislativa, decorrente da soberania estatal, que não ofende a dignidade da pessoa humana ou a presunção de não culpabilidade, pelo contrário, trata-se de agir de modo preventivo, antes que a lesão ao bem esteja consumada. Com efeito, a maneira mais eficaz de prevenir o roubo ou o homicídio não é prender o assassino ou o ladrão, algo reconhecidamente necessário, mas evitar que ele saque a arma e dispare. (ESTEFAM, 2013, p. 98 a 99)[15]

            Aqui se pune o comportamento da vítima e não o resultado, pois se a vítima agir de maneira a produzir um resultado danoso irá ser punida essa conduta, já que para os crimes de perigo abstrato o resultado não existe.

            Os crimes de perigo abstrato descrevem apenas uma conduta sem exigir um resultado danoso como forma de comprovar a prática da ação delituosa, ou seja, basta o agente ter em mãos uma arma para estar praticando um crime, não importa o fato de ela não estar municiada.

            2.4 Os crimes de perigo abstrato frente à sociedade do risco

            A sociedade contemporânea e os riscos que ela apresenta na visão de alguns autores nada mais é do que um clamor da sociedade pela aplicação da figura dos crimes de perigo abstrato.

            Devido as inovações tecnológicas ficou difícil prever o nexo causal existente em algumas condutas, para que o perigo seja real ou concreto se faz necessário a presença do nexo de causalidade, porém com a vasta quantidade de produtos que surgem a cada dia fica difícil saber quais serão os danos decorrentes do seu uso, não há como prever e assim o nexo de causalidade se faz ausente abrindo caminho para a aplicação dos crimes de perigo abstrato.

            Pierpaolo Cruz Bottini cita um exemplo que evidencia as mudanças ocorridas na sociedade:

[...] Antes, o cidadão comprava seus alimentos diretamente do produtor, pessoa física, conhecida. Logo, qualquer dano à saúde do indivíduo em decorrência de defeito no produto alimentício poderia ser imputado ao fabricante ou comerciante por meio de tipos penais de lesão, pois os nexos causais e a responsabilidade estavam claros. Os delitos de lesão eram adequados e garantiam a proteção do bem jurídico. Com o passar do tempo, a complexidade das relações de produção e distribuição de insumos vai obscurecer a linha de imputação nestas hipóteses. A massificação do consumo e as intrincadas estruturas organizacionais formadas, em rede, em torno dessa atividade, dificultam a identificação da relação de causalidade entre uma conduta e um resultado danoso. (BOTTINI, 2013, p.93)[16]

            Com o surgimento de novas tecnologias e o acelerado avanço científico os bens jurídicos protegidos pelo Estado ficam suscetíveis a novas formas de lesão. Com esse avanço ocasionalmente a magnitude do dano pode aumentar e sendo assim para o legislador pouco interessa agir depois que a lesão ocorrer, mas sim prevenir que ela ocorra e é aqui que o perigo abstrato vai atuar.

            Os crimes de perigo abstrato vêm então para antecipar a tutela nessa nova sociedade de riscos que emergem a cada minuto, tutelando setores como meio ambiente, genética, bens de consumo, dentre outros, pois esses setores evoluem muito e necessitam de uma proteção eficaz.

            Os crimes de perigo abstrato seriam na visão de alguns doutrinadores, um instrumento utilizado para prevenir a sociedade dos danos causados pelos novos riscos que surgem diariamente com a globalização, ou seja, a função dessa modalidade de crimes seria tutelar um novo direito, assegurar uma qualidade de vida digna para as gerações futuras, pois a segurança é uma responsabilidade do Estado, e este deve dispor de meios para efetivar essa garantia.

            O que ocorre é o aumento massivo de pessoas na sociedade cotidiana, assim situações que antes eram praticadas por um grupo de três pessoas e não causavam risco algum, hoje sendo praticada por dezenas acaba gerando um ambiente de risco, exemplo disso é o uso de automóveis para locomoção, e para minimizar esses riscos devem ser estabelecidas normas e essas normas irão se basear em perigos abstratos.

            A sociedade não pode mais fingir que esses novos modelos de comportamento existem, e nem os legisladores se negar a estabelecer novas normas, a sociedade evoluiu e esta nova coletividade necessita de novas tutelas.

            Ainda nas palavras de Pierpaolo Cruz Bottini os crimes de perigo abstrato apenas traduzem a necessidade do direito penal em tutelar novas condutas:

Diante do exposto, pode-se entender o porquê da massificação dos delitos de perigo abstrato no direito penal do risco. Os novos âmbitos de periculosidade com suas características inéditas direcionam a atividade legislativa ao emprego desta técnica de tipificação, daí sua presença representativa nos diplomas legais contemporâneos. O perigo abstrato representa o sintoma mais nítido da expansão do direito penal, na ânsia por fazer frente aos temores que acompanham o desenvolvimento científico e econômico da atualidade. (BOTTINI, 2013, p. 98)[17]

            Não há mais como fingir que não se faz necessário que haja alterações legislativas para incluir essa nova modalidade de crime na sociedade hodierna e nem que essa mudança já está ocorrendo, cada vez mais os crimes de perigo concreto perdem sua vez para os de perigo abstrato, porém, talvez uma analise mais aprofundada do seu conceito ajude a entender melhor sua aplicabilidade.

         2.5 A evolução histórica dos conceitos de crimes de perigo abstrato

            O direito penal é o instrumento pelo qual o legislador buscar transmitir para a sociedade os conceitos de crimes e suas respectivas penas, além de estabelecer padrões de comportamentos que os cidadãos devem seguir.

            Para Fernando Capez o direito penal tem a seguinte conceituação:

O Direito Penal é o seguimento do ordenamento jurídico que detém a função de selecionar os comportamentos humanos mais graves e perniciosos à coletividade, capazes de colocar em risco valores fundamentais para a convivência social e descrevê-los como infrações penais, cominando-lhes, em consequência, as respectivas sanções, além de estabelecer todas as regras complementares e gerais necessárias a sua correta e justa aplicação. (CAPEZ, 2011, p. 19)[18]

            A forma do conceito de crime de perigo abstrato nada mais é do que um fruto daquilo que o direito penal preceitua, ele decorre do pensamento penal de proteger a sociedade de comportamentos que coloquem em risco a paz social, é como se fosse um fôlego que o direito tomou em um momento de mudanças em que não se sabia mais como incriminar determinadas condutas.

            O risco e o perigo estão estritamente relacionados, pois o risco nas palavras de Valente[19], nada mais é do que o adjetivo dado a uma situação em que haja perigo, o perigo é fruto da evolução da sociedade, que com a revolução industrial passou a evoluir e a crescente evolução tecnológica, passou a tirar o ser humano de uma zona de conforto e expô-lo a riscos antes inimagináveis, e aos quais não se sabe como tutelar, pois o legislador desconhece as novas modalidades de perigo emergentes na sociedade (VALENTE, 2009).

            Para o direito penal clássico ou positivista punia-se apenas as condutas que ofendiam a norma, a lei descrevia a conduta ilícita e se alguém contrariasse essa prescrição ocorreria o injusto, então os juízes estavam limitados a apenas aplicar a pena nos casos que ofendessem exatamente aquilo que a norma previa, e esse tipo de atitude evitava condutas arbitrarias por parte dos juízes. Como não havia juízo de valor, só se punia ações concretas, os crimes de perigo abstrato não tinham qualquer validade.

            Binding entende que existem que os delitos são divididos em proibições de perigo e proibições de lesão, as proibições de lesão tratam-se do dano efetivo e as de perigo seriam aquelas que proíbem a prática de condutas perigosas concretas (BOTTINI, 2013, p.99).[20] Porém esse autor não aceita a validade dos crimes de perigo abstrato vez que, para ele, esse tipo só se sustenta no fato do descumprimento da norma.

            Outro autor citado no positivismo era RABL e este mantinha a mesma linha de pensamento de Binding, onde a norma abstrata não tinha qualquer valor.

            O cenário começa a mudar com Stubel[21], que passa a desenvolver um estudo sobre os crimes de perigo abstrato na tentativa de demonstrar que havia como aplica essa modalidade de crime aos delitos ocorridos na época, para ele essa espécie decorre dos delitos de lesão tendo por função proteger a integridade das condutas tidas como corretas (BUERGO, 2001, p.91).

            Demosthenes Pinho na mesma linha de pensamento de Stubel acredita que o perigo abstrato deve ser visto como algo real devido aos riscos em que este expõe a coletividade, gerando uma sensação de medo (BOTTINI, 2013, p.102).[22] Para Stubel não importa o resultado lesivo, este é apenas uma consequência que pode ou não ocorrer, o que realmente tem valor nesse caso é o fato de se colocar em risco o bem jurídico tutelado pela norma.

            Entende-se, portanto, que esses autores tentam deslocar o foco do positivismo que é no valor da norma, naquilo que ela prescreve como conduta para o resultado, ou seja, eles querem demonstrar que independente do resultado ocorrer ainda assim a conduta irá gerar um dano quando praticada.

            Para os neokantistas as leis e o legislador não podem se pautar somente na norma escrita como os positivistas costumavam fazer, agora se faz necessário também agregar um valor cultural a norma, valores que foram desenvolvidos pelo ser humano ao longo dos anos, neste momento se faz necessário não somente constatar que a infração está de acordo com a norma vigente, mas que a mesma também afronta valores sociais e qual será o valor social desse delito.

            Mezger, afirma que para o neokanstismo, os delitos de perigo podem sim ser vistos como uma conduta criminosa, mesmo que essa pratica não venha a causar dano algum, o conhecimento e a vivência mostram que algum resultado danoso pode ser gerado (BOTTINI, 2013, p. 103).[23]

            Nos crimes de perigo concreto bastará a demonstração da existência perigo de fato de acordo com cada caso e nos crimes de perigo abstrato, basta que exista a potencialidade lesividade da conduta, para os neokantistas, ainda que a lei descreva a conduta como sendo de perigo abstrato, esta será verificada para que não ocorra injustiças e condutas tidas como não lesivas sejam dadas como criminosas, fazendo assim com que o Estado seja mais justo e adequado a realidade.

            Com o finalismo o direito busca alcançar uma estabilidade, o direito só será usado para coibir atos que forem opostos aos valores sociais e morais descritos pela sociedade.

            Welzel, apud Bottini (2013, p.105), afirma que “a ação penalmente relevante será aquela que carrega consigo uma finalidade, projetada pelo intelecto e dirigida a um acontecer causal.”[24] Então, deduz-se que existiram duas ações, uma que ocorreria internamente por meio do pensamento, onde se calcularia os meios para se atingir o fim e a finalidade da ação e a outra ação seria externa colocando em prática aquilo que foi cogitado pela mente.

            Portanto, para o finalismo, o centro das atenções deixa de ser o resultado e passa a ser a vontade do agente, a sua verdadeira intenção com a prática de determinado ato, é aqui que o direito passa a agir como forma de prevenção, pois para ele não é mais necessário que o resultado ocorra para ele agir, basta que o indivíduo tenha intenção de praticar algo contrário à lei.

            Welzel, no entanto, acredita que o perigo deve abranger tanto elementos objetivos como subjetivos, que seria a intenção do agente em ameaçar bens jurídicos[25] e sendo assim o perigo que melhor se enquadraria nessa situação seria os crimes de perigo concreto, pois nele se pode verificar tanto a conduta quanto o resultado, já os crimes de perigo abstrato, esses são vistos de uma maneira mais complexa pelo finalismo (BOTTINI, 2013, p.105).

            No caso dos crimes de perigo abstrato se consegue visualizar a conduta objetiva que será a prática do ato que pode gerar um dano, mas a conduta subjetiva resta dúbia, pois essa seria ou não a vontade de não querer gerar um dano com a prática do ato, Welzel simplesmente não conseguir definir ao certo qual seria a conduta subjetiva nesse caso.

            Hirsch foi um discípulo de Welzel e este buscou tentar solucionar esse problema com os crimes de perigo. Para Hirsch os crimes de perigo abstrato se fundamentariam na periculosidade, para ele o perigo seria um dado concreto e a periculosidade seria a possibilidade de se produzir riscos, Hirsch então passa a classificar os crimes de perigo abstrato como delitos de periculosidade, para ele a periculosidade ex ante do ato é que definiria a aplicação da lei, ou seja, é necessário que se crie um ambiente de risco para os bens jurídicos tutelados pela norma (BOTTINI, 2013, p.106).[26]

3. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO VALOR SUPREMO

         3.1 Conceito

            Os princípios já foram tidos como ideias abstratas, e durante o positivismo adentraram nos Códigos como fonte normativa acessória. No Brasil ultimamente, os princípios tem sido vistos com status de norma geral valorativa, ou seja, mandamentos nucleares que orientam e norteiam quase todas as decisões tomadas nos dias de hoje, verdades absolutas, porém deve-se ressaltar que eles são um meio para se buscar algo justo.

            Não há como aplicar princípios á algo e deixar de lado as leis, pois se pode dizer que o princípio é um meio para se alcançar um fim imparcial servindo de guia para que a lei seja aplicada de maneira correta e de forma ponderada.

            Princípios existem e devem ser aplicados, porém em concordância com a finalidade do nosso Estado que é promover o bem estar da coletividade, é isto que se deve ter em mente, a promoção de um estado em que as pessoas se sintam confortáveis e seguras.

            3.2 Conceitos de princípios

            Princípios são valores importantes presentes no ordenamento jurídico brasileiro, são a estrutura do direito, ou ainda nos dizeres de Bonavides (2010, p. 256) “[...] princípios são verdades objetivas, sem sempre pertencentes ao mundo do ser, na qualidade de normas jurídicas, dotadas de vigência, validez e obrigatoriedade.”[27]

            Os princípios são a forma pela qual se exprimem os valores fundamentais previstos na Constituição Federal, fornecendo material para a elaboração das outras normas previstas no ordenamento jurídico, os princípios são considerados superiores as regras.

            Gomes, apud Tamada tenta mostrar a diferença de valor entre princípios e regras:

[...] o Direito se expressa por meio de normas. As normas se exprimem por meio de regras ou princípios. As regras disciplinam uma determinada situação; quando ocorre essa situação, a norma tem incidência; quando não ocorre, não tem incidência. Para as regras vale a lógica do tudo ou nada (Dworkin). Quando duas regras colidem, fala-se em "conflito"; ao caso concreto uma só será aplicável (uma afasta a aplicação da outra). O conflito entre regras deve ser resolvido pelos meios clássicos de interpretação: a lei especial derroga a lei geral, a lei posterior afasta a anterior etc.. Princípios são as diretrizes gerais de um ordenamento jurídico (ou de parte dele). Seu espectro de incidência é muito mais amplo que o das regras. Entre eles pode haver "colisão", não conflito. Quando colidem, não se excluem. Como "mandados de otimização" que são (Alexy), sempre podem ter incidência em casos concretos (às vezes, concomitantemente dois ou mais deles). (TAMADA, 2011, p.1)[28]

            Os princípios conseguem alcançar maiores níveis de aplicação se adequando ao momento histórico vivido, são eles a fonte buscada para a solução de dúvidas e fazem com que a atuação do juiz seja menos discricionária, devendo sempre ter por base em suas decisões a fundamentação em princípios.

            A entrada dos princípios nos códigos servem nas palavras de Cañas, apud Bonavides (2010, p. 262) como “válvula de segurança que garante o reinado absoluto da lei.”[29]

            Havendo um conflito entre regras, essa situação só poderá ser resolvida se houver a anulação de uma das regras ou ainda se existir uma norma que solucione o embate, no campo das leis, ou uma lei é válida ou não é (BONAVIDES, 2010, p.279).[30]

            Na falta da lei, ou quando a mesma não for clara quanto a sua finalidade são os princípios que vão atuar buscando suprir essa falha, não agindo de modo a querer ser superior a lei ou se mostrar mais importante que ela, os princípios vem em caráter subsidiário, para cobrir falhas e solucionar conflitos.

            No caso de conflitos entre princípios, esse ocorre quando um dos princípios permite algo que é vedado por outro, assim sendo um dos princípios deverá deixar de ser aplicado, mas não ocorrerá a anulação desse outro princípio nem será usado alguma cláusula de exceção para que isso aconteça.

            A diferença na solução dos conflitos entre regras dos existentes entre princípios, portanto, está no fato de que no caso dos princípios aquele que tiver um valor maior é que irá prevalecer, por outro lado, no tocante as regras, a solução será tomada no campo da validade.

            No caso da ocorrer conflito entre regra e princípio, primeiramente se deve analisar se essa regra se baseia em princípios constitucionais ou não, caso a regra não se baseie em princípios constitucionais, irá prevalecer o princípio, vez que essa regra será considerada inconstitucional, pois como se sabe a interpretação sempre deve ser feita conforme a Constituição Federal que é lei maior, já se a regra for baseada em princípios constitucionais, a análise deverá ser feita caso a caso, aplicando aquele que melhor de adequar ao fato ocorrido.

            Os crimes de perigo abstrato, previstos em diversos artigos do código penal são considerados por vezes inconstitucionais pelo fato de entrarem em conflito com princípios como o da ofensividade, culpabilidade, intervenção mínima, dentre outros, e é esse conflito que faz com que por vezes essa modalidade criminal deixe de ser aplicada, ou que suas discussões se prolonguem no tempo, levando as pessoas a recorrerem a vários graus de jurisdição para tentar ver seu direito ser aplicado.

            Uma das alegações para a inconstitucionalidade dos crimes de perigo abstrato seria a de que o mesmo não teria fundamento constitucional, ou seja, seria um conflito entre princípio e regra inconstitucional e como foi visto, deve-se prevalecer o princípio nesse caso, ocorre que em uma análise mais profunda alguns doutrinadores descobriram alguns princípios que poderiam embasar a aplicação do perigo abstrato, principalmente se for analisado caso a caso, ou melhor, artigo por artigo que tiver fundamento abstrato, e é nesse âmbito que se desenvolve todo esse questionamento e não há nenhuma perspectiva para uma solução geral tão logo.

            Em poucas palavras o doutrinador Nucci (2013, p. 20) diz que a expressão “princípio”, significa “uma base para a interpretação das normas e um horizonte a ser perseguido para a devida realização dos fins e concretização de justiça”.[31]

            Os princípios são os meios pelos quais se busca a justiça e a equidade, atingindo questões morais, sociais, tudo aquilo que pode suscitar conflitos, revoltas, ou ainda problemas para a sociedade, isso faz com que seu aplicador, o juiz, pense e pondere antes de julgar, se orientando por princípios que mais se adequarem ao caso concreto, para evitar que quaisquer injustiças aconteçam e acabem por prejudicar aquele que vê no direito uma forma de compensação pelo dano que sofreu.

           

           

            3.3 Da relação entre princípios e os crimes de perigo abstrato

            Os crimes de perigo abstrato estão descritos em diversos tipos penais, podendo-se citar como exemplo o artigo 14 da Lei 10. 826/ 2003, crime de porte de arma de fogo desmuniciada e o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, crime de embriaguez ao volante que são os artigos que tiveram mais polêmica entorno dos mesmos.

            O crime de porte de arma de fogo desmuniciada é tido como espécie abstrata devido ao fato de que se a arma está sem munição, a mesma não ofereceria qualquer forma de perigo para as pessoas, porém a impossibilidade de a vítima saber se a arma está ou não municiada fará com que se sinta o mesmo tipo de medo, o pânico será o mesmo, aqui não é necessário provar que havia qualquer forma de risco a vida ou a integridade física, basta que a conduta seja praticada para se consumar o crime, mesmo que para alguns a arma não ofereça qualquer espécie de perigo (CAPEZ, 2006, p.89). [32]

            No caso do crime de embriaguez ao volante o perigo abstrato está presente no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro pelo fato de que a lei determina como embriaguez estar com concentração de álcool igual ou superior a 6 (seis) decigramas, só que não determina que deve haver exposição a dano em potencial, ela determinou uma faixa de decigramas de álcool onde se presume haver risco se o agente dirigir desse jeito .

            Esses dois artigos tem em comum a busca pela proteção da incolumidade pública e a tentativa de propiciar para a sociedade um ambiente mais seguro onde se possa viver, ocorre que alguns doutrinadores entendem que essas tipificações penais vêm a ferir alguns princípios norteadores do direito, esses princípios seriam o da ofensividade, proporcionalidade e intervenção mínima, para outros doutrinadores, no entanto, não há que se falar em conflito, vez que esses crimes nada mais são do que derivações da dignidade da pessoa humana, que é princípio maior exposto pela Constituição Federal e protegem um bem de grande valor que é a incolumidade pública. Outro princípio que busca dar base à aplicação dos crimes de perigo abstrato é o da precaução.

            O princípio da ofensividade é o que está mais atrelado aos crimes de perigo abstrato, vez que o referido princípio propõe nas palavras de Roxin, apud Batista:

Só pode ser castigado aquele comportamento que lesione direitos de outras pessoas e que não é simplesmente um comportamento pecaminoso ou imoral: (...) o direito penal só pode assegurar a ordem pacífica externa da sociedade, e além desse limite nem está legitimado, nem é adequado para a educação moral dos cidadãos. (BATISTA, 2007, p.91)[33]

            Ou seja, para esse princípio uma conduta só pode ser considerada criminosa se ela produzir o resultado lesão diferentemente do que propõe os crimes de perigo abstrato.

            O princípio da proporcionalidade originalmente segundo Estefam (2013, p.137) foi criado “como limite ao poder estatal em face da esfera individual dos particulares; tratava de estabelecer uma relação de equilíbrio entre o “meio” e o “fim”.” [34]

            Portanto, o princípio da proporcionalidade nada mais é do que um instrumento que atua para coibir a atuação estatal desmedida na vida das pessoas, e no caso dos crimes de perigo abstrato ele vem para estabelecer uma pena proporcional para esses crimes, sendo imprescindível que a conduta praticada viole de maneira ao menos potencial algum bem jurídico tutelado.

            O princípio da precaução difere do princípio da prevenção e está diferença foi explicada na obra de Paulo Affonso Leme Machado:

A diferença entre o princípio da prevenção e o princípio da precaução está na avaliação do risco que ameaça o meio ambiente. A precaução é considerada quando o risco é elevado – tão elevado que a total certeza científica não deve ser exigida antes de se adotar uma ação corretiva, devendo ser aplicado naqueles casos em que qualquer atividade possa resultar em danos duradouros ou irreversíveis ao meio ambiente, assim como naqueles casos em que o benefício derivado da atividade é completamente desproporcional ao impacto negativo que essa atividade pode causar ao meio ambiente para o futuro. (MACHADO, 2012. p.100)[35]

            O princípio da intervenção mínima dispõe segundo Greco (2008, p.49) que “o direito penal só deve preocupar-se com a proteção dos bens mais importantes e necessários à vida em sociedade” [36], contrariando assim os crimes de perigo abstrato, vez que para este princípio o direito só deve ser criado para proteger ofensa a bens jurídicos e que deve ser usado somente em último caso, quando nenhuma outra lei for aplicável.

            O direito da precaução é a forma pela qual o Estado se “justificou” ao utilizar os crimes de perigo abstrato, pois o mesmo é uma resposta à necessidade de proteção pela qual os cidadãos clamavam vindo a coibir atos onde há apenas o indício de se tem um perigo.

            Para Marques (1997, p. 235) “[...] as lacunas e as omissões da norma penal não incriminadora devem ser suprimidas, também, com os princípios gerais de direito.”[37] Ou seja, as eventuais “brechas” da lei devem ser solucionadas na falta de outra norma que regulamente, através dos costumes ou princípios gerais de direito, vez que para eles esses são fontes secundárias.

            Os princípios vêm então para suprir as necessidades da lei, e no caso dos crimes de perigo abstrato, tentar demonstrar a sua possibilidade ou não de aplicabilidade, uns vetando, outros dando base a sua utilização no caso prático, cada qual com suas particularidades.

Portanto, para os doutrinadores a lei não é unânime quando ela é promulgada, ela ainda será “testada” pelos princípios gerais de direito, pois caso ela venha a ferir algum, teremos mais um entrave jurídico objeto de discussão até que uma decisão unânime a respeito do caso venha a ser tomada, pois a lei tem que ser justa, clara e objetiva, respeitando os princípios gerais de direito e protegendo os direitos fundamentais.

            3.4 Princípio da precaução

            Precaução tem sua origem no latim precautio-onis que em outras palavras seria a cautela antecipada. O princípio da precaução também pode ser conhecido como princípio da prudência ou cautela.

            Este é o meio utilizado para poder se aceitar medidas que regulamentem atividades no caso de não haver dados ou informações sobre o potencial danoso da utilização de algo novo.[38] Esse princípio vem para atuar em casos onde mesmo com toda essa evolução da ciência, não é possível prever qual será o resultado produzido pela prática de uma determinada atividade, ou pela utilização de algo novo que produzido pela indústria tecnológica.

            O sistema de gestão de riscos está atrelado ao principio da precaução, pois para se poder utilizar a precaução primeiramente deve-se analisar em quais das três situações o risco se encaixa.

            A primeira é aquela situação em que não há risco, aquele em que os bens jurídicos não se encontram expostos a qualquer forma de perigo pois já foi feita uma análise e se constatou essa ausência.

            A segunda tem o perigo comprovado por meio da ciência, que faz uma análise aprofundada e assim consegue saber os possíveis resultados danosos de algo, então o princípio da precaução não encontra aplicação nesse caso.

            Por fim, a terceira, é aquela em que a ciência não consegue comprovar a ausência de riscos em determinados casos. Nesse caso aplica-se a precaução em face da “ignorância humana”, devido ao ser humano não saber os possíveis resultados danosos da conduta.

            Luis Paulo Sirvinskas cita em sua obra a o princípio 15 da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento: de 1992:

De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. (SIRVINSKAS, 2008. p.57)[39]

            Se o resultado danoso pode ser comprovado cientificamente aplica-se a prevenção, se não se tem como saber qual será o resultado aplica-se a precaução, eis a diferenciação básica destes dois princípios e essencial para poder se compreender melhor a aplicação da precaução.

            O princípio da precaução surge por volta de 1960 na Alemanha, sendo utilizado como instrumento de proteção do meio ambiente, atuando em casos de danos ambientais graves onde o risco não foi confirmado, o mesmo era intitulado como Vorsorgeprinzip, ou seja, princípio da precaução (FIORILLO, 2010, p.117).[40]

            Em 1974 ele faz uma nova aparição no Ato de Poluição do Ar punindo aqueles que tiverem indústrias e não usar técnicas avançadas para diminuir a emissão de gases poluentes na atmosfera. Mas recentemente o referido princípio aparece na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento que ocorreu no Rio de Janeiro (WEDY, 2013).[41]

            O princípio da precaução entende-se que está previsto no artigo 225 da Constituição Federal de maneira subentendida. Este princípio é mais comumente emprego em crimes ambientais, pois ele serve para evitar que o meio ambiente sofra qualquer tipo de dano causado pelo uso de alguma técnica sem antes se ter verificado a ofensividade da mesma.

            Ao se utilizar da precaução no caso de crimes ambientais por exemplos, evita-se que a natureza sofra coma aplicação de técnicas não previamente testadas e cujo resultado é desconhecido, assim o bem jurídico ambiental fica protegido, resguardado de possíveis danos por não se ter esperado que a lesão efetiva ocorresse e ter sido punido tão somente o perigo.

            Ao se punir o perigo abstrato em crimes ambientais, protege-se o meio ambiente de ameaças que por vezes são irreversíveis.

            O princípio da precaução está se alastrando aos poucos no ordenamento jurídico do Brasil, já podendo ser encontrado no artigo 1º (primeiro) da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), na Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, na Convenção sobre Mudança do Clima e no Protocolo de Quioto à Convenção Quadro sobre Mudança do Clima.

            O princípio da precaução deixou de ser encontrado, portanto, somente em matérias ambientais, que é o caso dos crimes de perigo abstrato, que agora se valem de tal princípio para justificar sua incidência nos crimes previstos pelo ordenamento jurídico brasileiro.

                        3.4.1 Aplicação do princípio da precaução

            O meio utilizado pelo ordenamento jurídico brasileiro para conseguir gerir os riscos emergentes na sociedade foi o da aplicação do princípio da precaução, a precaução veio então para mostrar que não é necessário esperar pelo dano, podendo-se por meio de métodos preventivos evitar que o mesmo ocorra.

            Havendo ausência de certeza científica ou evidências científicas sobre os possíveis efeitos danosos que algo (produto, ação) possa causar, o princípio da precaução deverá ser aplicado como meio de se evitar que um dano maior por ventura venha a ocorrer.

            É fato que a ciência está muito avançada nos dias atuais, porém, ela nem sempre consegue prever possíveis danos que algumas de suas inovações podem trazer para a sociedade, cite-se como exemplo uma fábrica criar um carro, e mesmo sem testa-lo devidamente o coloca a venda, não se sabe quais são os possíveis problemas que esse carro poderá ter e quais os possíveis danos que ele poderá causar com isso, o mesmo se pode dizer de remédios ou venenos agrícolas, todos precisam ser testados e passar por um rigoroso sistema de avaliação de riscos para ai sim ir para o mercado.

Caso não seja possível ter certeza sobre os possíveis danos que algum deles possa causar, passa então a incidir o princípio da precaução, como instrumento para que sejam adotadas medidas necessárias para barrar ou até mesmo liberar a utilização dessas inovações.

Não há como barrar o surgimento do novo, até mesmo porque isso significaria uma estagnação da sociedade, é necessária essa evolução científica, mesmo que ela signifique maiores riscos, e já que não se pode parar com a evolução, tem-se de evoluir com ela, ou seja, tem-se que diminuir o preconceito existente quanto ao princípio da precaução e consequentemente com os crimes de perigo abstrato, pois estes são a forma pela qual estamos de certa forma protegidos contra possíveis riscos.

Denota-se, portanto, que para a aplicação do princípio da precaução se faz necessário que não haja certeza científica sobre o risco, que não se tenha evidência estatística do risco, que as implicações potencialmente perigosas decorrentes de atividades ou produtos sejam percebidas pela ciência, que a medida adota para punir esses casos seja proporcional e que o ônus da prova seja invertido.

Para Bottini (2013, p. 54) “A certeza científica afasta a precaução porque, nestes casos, a atividade é comprovadamente inócua ou ariscada. [...] A precaução vigora diante da incerteza.” [42] Ressalta-se, porém, que a certeza científica não está presente em nada, ou seja, não há como ter certeza absoluta que determinada atividade ou produto não irá causar risco algum as pessoas, diante disso passa-se a pensar que então a precaução deveria ser aplicada a tudo já que não há certeza sobre nada, porém isso geraria um caos, não haveria como ter inovações se tudo fosse barrado pela precaução.

É nesse sentido que percebemos que a certeza científica deve ser relativizada, tendo sido feito todos os testes possíveis no produto, por exemplo, seguindo todas as regras metodológicas de aplicação obrigatória e percebendo que o produto é inócuo, deve-se presumir também a sua eficiência.

Há casos, em que não há evidência científica do potencial danoso de algo, porém o risco pode ser comprovado baseado em dados estatísticos, tão precisos, que acaba de certa forma gerando uma certeza científica sobre o risco.

Para melhor entender, imagine que determinado produto alimentício tenha causado problemas de saúde em um número “x” de pessoas, todas elas tiveram o mesmo problema depois de consumirem o produto, ocorre que a ciência não conseguiu encontrar nada nesse gênero alimentício que pudesse ter causado tal mal as pessoas, ai é que entra a evidência estatística, pois é ela que vai demonstrar que é esse produto que está fazendo mal para as pessoas.

Para Bottini (2013, p. 59) “A evidência estatística se aproxima da certeza científica que, quando presentes, revelam a periculosidade de um comportamento ou de uma atividade.” [43] Ou seja, a evidência estatística tem o mesmo peso que a científica, ambas são reflexo de muita pesquisa para se chegar ao resultado final.

A avaliação científica do risco parece algo tolo de ser exigido, uma vez que a precaução se aplica quando há incerteza do risco, então como exigir que haja uma avaliação do risco para se aplicar a precaução. No entanto, é necessário que essa suposição do risco tenha um fundamento, tem que se ter uma ideia do perigo a que a sociedade vai estar exposto, ou seja, deve-se avaliar a potencialidade do risco que um produto ou atividade pode oferecer, a ciência deve conseguir ter um mínimo de suposição dos possíveis danos que podem ser causados.

A transparência na precaução se refere ao saber da população quanto as possíveis medidas que irão ser tomadas quando se verificar a incidência do perigo abstrato, e essas medidas devem ser proporcionais ao perigo oferecido.

A inversão do ônus da prova significa que quem produz algo ou oferece uma atividade, deve por meio da ciência, demonstrar que não há risco para a incolumidade pública com o uso do mesmo.

3.5 Princípio da ofensividade

Princípio da ofensividade ou também conhecido como princípio da lesividade, este é o que mais se contrapõe aos crimes de perigo abstrato, se tornando um verdadeiro entrave para a utilização desses crimes.

As regras são criadas com o objetivo de proteger o cidadão contra os conflitos que assolam a sociedade, ou seja, a conduta típica que ofender algum direito será considerada como crime, só que pelo princípio da lesividade deve existir uma verdadeira ameaça para que haja o crime.

Cesar Roberto Bitencourt faz menção ao princípio da ofensividade em sua doutrina:

         Para que se tipifique algum crime, em sentido material, é indispensável que haja, pelo menos, um perigo concreto, real e efetivo de dano a um bem jurídico penalmente protegido. Somente se justifica a intervenção estatal em termos de repressão penal se houver efetivo e concreto ataque a um interesse socialmente relevante, que represente, no mínimo, perigo concreto ao bem jurídico tutelado. Por essa razão, são inconstitucionais todos os chamados crimes de perigo abstrato, pois, no âmbito do Direito Penal de um Estado Democrático de Direito, somente se admite a existência de infração penal quando há efetivo, real e concreto perigo de lesão a um bem jurídico determinado. (JESUS, 2014, p.52)[44]

            O princípio da ofensividade deriva do princípio da dignidade da pessoa humana, e está previsto de maneira subjetiva na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXXIX (trinta e nove) e no artigo 13 (treze), caput do Código Penal.

            O princípio da lesividade busca ainda servir como orientação para a atividade legislar, ou seja, serve como instrumento para garantir que o legislador busque em sua atividade sempre se pautar em condutas que ofendam bens jurídicos de suma importância para o ordenamento, e ainda busca servir como critério de interpretação, para que o interprete da lei encontre no caso concreto o potencial lesivo da conduta que tentou algum bem jurídico.

            Este princípio, portanto, busca evitar que algumas condutas tidas como inofensivas sejam punidas, buscando diminuir o número de processos no judiciário por fatos sem grande relevância, por condutas que não gerem uma efetiva lesão a bens jurídicos. É sabido que o judiciário se encontra atravancado de processos por questões irrelevantes, processos que nas palavras populares “não vão levar a lugar algum”, então o legislador numa tentativa de coibir esses abusos, criou princípios que limitam a busca pelo judiciário por questões menores.

            Nesse sentido Luigi Ferrajoli:

         (O princípio da ofensividade) tem valor de critério polivalente de minimização das proibições penais. Ele equivale a um princípio de tolerância tendencial da desviação, idôneo para reduzir a intervenção penal ao mínimo necessário e, com isso, reforçar a sua legitimidade e fiabilidade, pois, se o direito penal é um remédio extremo, devem ficar privados de qualquer relevância jurídica os delitos de mera desobediência, degradados à categoria de dano civil os prejuízos reparáveis, e a de ilícito administrativo todas as violações de normas administrativas, os fatos que lesionem bens não essenciais ou que são, só em abstrato, presumidamente perigosos. (FERRAJOLI, 1995, p. 479)[45]

            Para Ferrajoli, portanto, o direito penal deve se preocupar apenas com ações que causarem graves violações a direitos, ficando para a área cível cuidar daquilo que não se enquadrar no direito penal como ofensa grave a bem jurídico.

            Observa-se então que o princípio da ofensividade é um verdadeiro entrave para a aplicação do princípio da precaução e é aqui que reside a falha em sua maior utilização, o princípio da ofensividade exige que exista um perigo real, concreto e que viole gravemente um bem jurídico, sendo assim resta inaplicável a modalidade abstrata em que não se exige o dano, basta que exista o perigo de se causar um dano grave, e por consequência a precaução acaba sendo falha.

            O Professor Capez (2011, p.42), é partidário da inaplicabilidade dos crimes de perigo abstrato, “o princípio da ofensividade considera inconstitucionais todos os chamados “crimes de perigo abstrato”, pois, segundo ele, não há crime sem comprovada lesão ou perigo de lesão a um bem jurídico”.[46]

            Denota-se então que não basta a incriminação legal da conduta, pois se não há perigo para algum bem jurídico, não há que se falar em crime, ou seja, qualquer conduta praticada que não coloque em risco valores fundamentais não será considerada como criminosa para esse princípio, lembrando que esse perigo deve ser concreto, comprovado e não abstrato.

            O Estado fica limitado a incriminar apenas as condutas que criem um real perigo de lesão, o juiz tem seu arbítrio limitado, este é um princípio portanto, que vem restringir a atuação do Estado, do legislador e do aplicador da lei penal.

            Nilo Batista, afirma que existem quatro funções para o princípio da ofensividade, uma delas seria proibir que fossem punidas atitudes internas, ou seja, não se deve punir o pensamento, se não há ação, não há crime, não se deve punir ainda a auto lesão, se os atos preparatórios do individuo não constituírem crime e ele não executá-los, não há que se falar em conduta criminosa, também o direito não pode se ocupar de punir as pessoas por condições existenciais, pelo que elas são, podendo somente ocupa-se de punir condutas atípicas e por fim não pode haver punição para condutas que não coloquem em risco bens jurídicos (crimes de perigo abstrato). (BATISTA, 2007, p.91)[47]

            Infere-se então que não havendo conduta criminosa que ofenda a bens jurídicos concretamente, não há que se falar em crime, logo condutas como dirigir sob o efeito de álcool, portar arma de fogo desmuniciada ou ainda vender qualquer produto agrícola que se presuma afetar meio ambiente são condutas que não são consideradas crime por esse princípio, vez que ele repudia crimes abstratos, resta saber se o bem jurídico tutelado por essas condutas merece tal insignificância.

            3.6 Princípio da proporcionalidade

            O princípio da proporcionalidade atua no campo dos direitos fundamentais, atuando como critério valorativo, impedindo que o Estado atue de maneira excessiva ou sem necessidade contra os cidadãos, gerando assim danos desmedidos.

            Em 1789 já havia referência ao princípio da proporcionalidade da Declaração dos Direitos do Homem onde se pedia que a mesma fosse observada para que houvesse proporcionalidade entre a gravidade do delito e pena cominada ao mesmo (BITENCOURT, 2011, p.54).[48]

            O princípio da proporcionalidade está transcrito de forma implícita na Constituição Federal tendo por função restringir a atuação do Estado frente aos direitos e sanções do homem, para que não haja excessos e nem branduras. O referido princípio pode ser encontrado no artigo 5º XLVI, XLII, artigo 98, I dentre outros artigos pertencentes á Constituição Federal.

            Na lição do Professor Damásio de Jesus:

Chamado também de “princípio da proibição do excesso”, determina que a pena não pode ser superior ao grau de responsabilidade pela prática do fato. Significa que a pena deve ser medida pela culpabilidade do autor. Daí dizer-se que a culpabilidade é a medida da pena.[49] (JESUS, 2013. p.53)

            O princípio da proporcionalidade pode ser divido em três regras a serem seguidas, uma delas é a adequação, onde se verifica se a medida adotada é idônea, necessidade para ver se o meio utilizado é mesmo necessário e proporcionalidade em sentido estrito, para ponderar se a pena imposta é correspondente à ofensa praticada (ESTEFAM, 2013, p.138).[50]

            Nas palavras de Humberto Ávila:

O exame de proporcionalidade aplica-se sempre que houver uma medida concreta, destinada a realizar uma finalidade. Nesse caso devem ser analisadas as possibilidades de a medida levar a realização da finalidade (exame de adequação), de a medida ser menos restritiva aos direitos envolvidos dentre aquelas que poderiam ter sido utilizadas para atingir a finalidade (exame da necessidade) e de a finalidade pública ser tão valorosa que justifique tamanha restrição (exame da proporcionalidade em sentido estrito). [51] (ÁVILA, 2011. p. 173)

            Essas regras são consideradas na visão de alguns autores como uma espécie de subprincípio, pois são eles que vão trazer o equilíbrio necessário para a norma. No direito penal sua atuação visa servir como norte na elaboração das leis, buscando diferenciar a aplicação das penas, além de limitar a atuação do legislador.

            Nas palavras de Capez (2011, p. 40), “Com efeito, um Direito Penal democrático não pode conceber uma incriminação que traga mais temor, mais ônus, mais limitação social do que benefício à coletividade”.[52] Percebe-se então que é esse princípio que vai exercer tal função limitadora.

            No campo dos crimes de perigo abstrato, ele também é encontrado, porém um exemplo da sua inaplicabilidade nesses casos é o artigo 273 alterado pela Lei 9.677/1998 (Lei dos Remédios) se tornando crime de perigo abstrato.

            O artigo 273 da Lei 9.677 de 1998 dispõe o seguinte tipo penal (1998, p.1), “falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais: pena- reclusão de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa”.[53]

No caso do referido artigo não houve a aplicação do princípio da proporcionalidade, vez que o mesmo recebeu tipificação de crime hediondo e um relativo aumento da pena que não são condizentes com a nocividade à saúde prescrita no tipo penal, além disso, alega-se não haver um perigo concreto na tipificação, o tipo penal não estabelece claramente qual direito está sendo ferido, e é ai que reside o perigo abstrato.

            Para que os crimes de perigo abstrato não ofendam a proporcionalidade, neles deve estar clara a conduta criminosa, levando sempre em consideração os três subprincípios da proporcionalidade, evitando assim que haja excesso ou omissões na lei.

            Vale ressaltar, que o referido princípio ainda tem por função solucionar conflitos entre princípios, estabelecendo parâmetros do que é mais justo em determinados casos, vez que este é um Estado Democrático de Direito.

            Verifica-se que a proporcionalidade tem grande importância para o direito penal, pois é ela que vai assegurar o cidadão de que a lei não será injusta nem descabida, filtrando todos aqueles artigos que forem abusivos ou omissões e lutando pela sua regularização.

3.7 Princípio da intervenção mínima

            O direito penal é a “ultima ratio”, o último recurso a ser utilizado, se for possível a aplicação de algum outro ramo do direito para se solucionar um conflito, não há o porque de se recorrer ao direito penal.

            O legislador analisando o momento social que se vive, os elementos que compõem a conduta criminosa e que nenhum outro ramo do direito se revela capaz de por um fim ao conflito existente, protegendo os bens jurídicos fundamentais previstos em lei, irá dizer quais condutas são passíveis de intervenção pelo direito penal, ou seja, a intervenção é um princípio assim como o da proporcionalidade que vem atuar como limitador no direito.

            Damásio de Jesus conceitua o referido princípio da seguinte forma:

            Procurando restringir ou impedir o arbítrio do legislador, no sentido de evitar a definição desnecessária de crimes e a imposição de penas injustas, desumanas ou cruéis, a criação de tipos delituosos deve obedecer à imprescindibilidade, só devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito Penal, quando os outros ramos do Direito não conseguirem prevenir a conduta ilícita.[54] (JESUS, 2013. p.52)

            Um exemplo de aplicabilidade do princípio da intervenção mínima aos crimes de perigo abstrato reside na lei de entorpecentes, que é uma lei com tipos penais abstratos, porém que respeita a intervenção mínima ao ser aplicada, vez que o tráfico de drogas e de entorpecentes é crime inafiançável previsto na Constituição Federal no artigo 5º, XLIII.

            A intervenção mínima surge na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão conforme pontua Cleber Masson:

[...] estatuiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em seu art. 8º, que a lei somente deve prever as penas estritamente necessárias. Surgiu o princípio da intervenção mínima ou da necessidade, afirmando ser legítima a intervenção penal apenas quando a criminalização de um fato constitui meio indispensável para a proteção de determinado bem ou interesse, não podendo ser tutelado por outros ramos do ordenamento jurídico.[55] (MASSON, 2011. p. 38)

                Assim como esse princípio se presta a proteger bens jurídicos fundamentais através do direito penal, ele também é responsável pela chamada descriminalização, nesse caso o legislador mais uma vez se prestará a fazer uma analise da sociedade e do momento que ela vive, verificando as mudanças para que assim o direito não se ocupe com bens que não tem mais importância.

            Desta maneira é esse princípio que faz com que a lei se mantenha atualizada, deixando de aplicar direitos que não condizem mais com a sociedade atual, com os novos parâmetros sociais.

            Os crimes de perigo abstrato são uma nova tendência vez que não se tem como ter certeza do resultado em certas condutas como no caso de dirigir embriagado, não há como ter certeza de que essa conduta irá resultar em um acidente, porém é certo que essa conduta acaba por colocar em risco a vida de várias pessoas, portanto, percebe-se que este é um caso de intervenção mínima, é o direito se adequando aos novos delitos e atuando como último meio a ser perseguido.

            A precaução e os crimes de perigo abstrato, não passam de meios dos quais o legislador se valeu para conseguir atuar na sociedade de riscos em que se vive atualmente.

            Denota-se que esse princípio tem dois destinatários, um é o legislador, este deve ter prudência na escolha das condutas que serão consideradas criminosas e de competência do Direito Penal, vez que serão inaplicáveis outros ramos do Direito nesses casos. Outro destinatário é o operador do Direito que deve manter a calma e não agir de maneira indiscriminada aplicando o Direito Penal a casos que podem ser tutelados por outras áreas do Direito (CAPEZ, 2011, p.38).[56]

            Os crimes de bagatela são exemplos de aplicabilidade da intervenção mínima, vez que esse princípio evita que as pessoas que praticaram essa modalidade criminosa, sejam enviadas para presídios, só porque a conduta que eles praticaram uma conduta que estava descrita como crime (furto, roubo), mas cujo valor é ínfimo e pode ser resolvido por outras vias do Direito.

            De maneira simplificada, o Direito Penal só será aplicado, quando ficar demonstrado que determinado problema só será solucionado através da aplicação de uma repressão penal, ocorre que se deve tomar cuidado ao utilizar da lei penal vez que a mesma pode ser traumática se aplicável a casos que não merecem tal tratamento e que poderiam ser sanado pela simples imposição de uma lei que não fosse tão coercitiva, como a lei trabalhista ou civil de acordo com o caso concreto.

4. DOS CRIMES DE PERIGO ABSTRATO COMO PROTEÇÃO DE BENS JURÍDICOS

4.1 Conceito

            O Direito Penal é um dos instrumentos responsáveis pela proteção da dignidade da pessoa humana, através da tutela de bens e interesses por meio do qual a dignidade se materializa.

            Bem jurídico nada mais é do que um elemento fundamental para o desenvolvimento livre do cidadão em um ambiente igualitário, dirigido para a autodeterminação, de modo a assegurar a pluralidade e liberdade democrática (BOTTINI, 2013, p.135).[57]

            Na lição de Roxin (2009, p.39) “[...] consistindo a missão do Direito Penal na proteção dos bens jurídicos, então o injusto penal deve manifesta-se como o menoscabo de um bem jurídico, isto é, como lesão ou colocação em perigo de um bem jurídico”.[58]

Entende-se que qualquer bem jurídico é passível de proteção por meio dos crimes de perigo abstrato ou ainda os mesmos bens protegidos pelos crimes de perigo concreto e de dano, pois só o fato de se colocar em risco algum bem jurídico será considerado como crime.

4.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

            O princípio da dignidade da pessoa humana é um dos princípios de maior importância presente no ordenamento jurídico brasileiro atual, ele teve sua origem na Constituição Federal de 1988, pois todo Estado considerado civilizado aderiu a este princípio.

            Este princípio é uma forma da Constituição Federal assegurar que o Estado está comprometido com valores como equidade e justiça, que este é um Estado Democrático de Direito, neste lugar não deve haver distinções de raça, religião ou condição financeira, os direitos dos cidadãos devem ser assegurados e não serão permitidas quaisquer afrontas a direito, são todos pessoas iguais em direitos e deveres.

            Namba (2009, p. 15), afirma que a dignidade da pessoa humana “embora tenha conteúdo abstrato, é de suma importância para a compreensão dos direitos humanos”[59]

            O conteúdo abstrato é uma referência ao fato de que seu conteúdo é indeterminado, abrangendo muita coisa, o conceito de dignidade é diferente para cada pessoa, ele abrange um todo, tudo aquilo que for considerado justo e correto, englobando direitos sociais, econômicos e culturais.

            A dignidade da pessoa humana tem status constitucional e é fundamento da República Federativa do Brasil. José Joaquim G. Canotilho apud André Estefam:

[...] perante as experiências históricas de aniquilação do ser humano (inquisição, escravatura, nazismo, stalinismo, polpotismo, genocídios éticos), a dignidade da pessoa humana como base da república significa, sem transcendências ou metafísicas, o reconhecimento do homo noumenon, ou seja, do indivíduo como limite e fundamento do domínio político da República. Neste sentido, a República é uma organização política que serve o homem, não é o homem que serve os aparelhos político-organizatórios. A compreensão da dignidade da pessoa humana, associada à ideia de homo noumenon justificará a conformação constitucional da República Portuguesa onde é proibida a pena de morte (art. 24º) e a prisão perpétua (art. 30º, I). A pessoa ao serviço da qual está a República, também pode cooperar na República, na medida em que a pessoa é alguém que pode assumir a condição de cidadão, ou seja, um membro normal e plenamente cooperante ao longo da sua vida.[60] (ESTEFAM, 2013. P. 130)

            O titular da dignidade é, portanto, o cidadão, a pessoa humana, a lei deve ser feita para o povo, para protegê-lo, os governantes e legisladores, são apenas instrumentos de exteriorização da vontade do povo, devendo os mesmos assegurar a inviolabilidade do referido princípio, a dignidade é um direito de todos, que não deve ser ferido, ela é fundamento da existência de diversos artigos previstos em lei.

            É função do Direito Penal proteger aqueles bens jurídicos que são forma de exteriorização da dignidade humana.

            Nesse sentido aduz Bottini (2013, p. 134) “o direito penal funcional de um Estado Democrático de Direito tem por missão, em primeiro lugar, proteger a dignidade humana, consubstanciada na tutela de bens e interesses essenciais para sua materialização.” [61]

            O Direito Penal, portanto quando acionado pelo cidadão só poderá agir se for para coibir comportamentos que forem ofensivos a dignidade humana, porém ele terá de agir no limite de que não poderá também ofender a dignidade do causador da conduta. Sendo assim, o Direito Penal atuará de modo a proteger os bens jurídicos através dos quais a dignidade da pessoa humana se materializa.

            O Direito Penal, porém, não pode se ocupar de proteger tão somente os bens coletivos como incolumidade pública e a paz pública, o direito também resguardar direitos individuais, pois na visão de alguns autores os direitos coletivos se desdobram em individuais tais como a vida, a integridade física, a saúde dentre outros.

Luís Greco partilha de tal pensamento em sua obra:

A radicalidade da tese definida pelos inimigos do crime de perigo abstrato levaria, se fosse ela real, a inconstitucionalidade de muitos dispositivos do que eles parecem imaginar. Isso porque é muito fácil recusar globalmente estes crimes, se se continua a trabalhar com aqueles bens jurídicos coletivos [...], como a paz pública, a incolumidade pública, a saúde pública, etc. Mas, uma vez que se recusem tais bens jurídicos, que devem ser decompostos em bens jurídicos individuais que na verdade são ver-se á que muitíssimas incriminações antes incontroversas não passam de crimes de perigo abstrato – e que nada há de errado com isso.[62] (GRECO, 2004. p.123).

            Note-se, que somente aqueles bens coletivos que garantem a existência dos bens jurídicos individuais que são fundamento da dignidade da pessoa humana é que serão tutelados pelo Direito Penal, vez que a função do Direito Penal é garantir a dignidade humana.

            Se o tipo penal criado não tiver por objetivo tutelar algum bem jurídico fundamento da dignidade humana, esse tipo será considerado como ilegítimo, pois é função da lei tutelar bens jurídicos que são considerados base da dignidade humana.

            Nesse sentido Pierpaolo Cruz Bottini:

O direito penal ambiental não existe para proteger o meio ambiente em si, como objeto autônomo e independente dos interesses humanos, mas como fator indispensável à vida e à saúde do homem. A conduta lesiva, nesse caso, somente interessa ao direito penal quando tiver capacidade – ainda que em potencia- de afetar o equilíbrio ecológico, que tem relação mediata com a vida, saúde ou economia humana. Os delitos de trânsito não tem o escopo de tornar o transporte viário mais célere e a circulação de veículos mais fluída, mas objetivam, com a previsão de sanções penais, a proteção da vida e da integridade física de condutores e pedestres. [63](BOTTINI, 2013. p.142).

            Sendo assim, no caso dos crimes de perigo abstrato, somente serão considerados válidos os tipos penais abstratos que tiverem por objetivo a tutela de bens jurídicos fundamento da dignidade humana, o direito está limitado à criação de tipos penais que protejam os bens jurídicos.

            Ocorre que em alguns casos o legislador cria tipos penais sem se prestar a dar a devida atenção ao bem jurídico que está sendo protegido, cria leis apenas para atender ao anseio da sociedade em determinado momento vivido, para tutelar alguma espécie de “risco” novo que surgiu, apenas para acalmar os ânimos do povo e dissipar qualquer sensação de temor, e só depois é que se nota que aquele tipo, não está em conformidade com os princípios gerais de direito e que apesar de ter suprido uma necessidade da sociedade, ele será objeto de discussão e debates até que ele ou se adeque aos princípios, ou seja, derrubado por eles.

            Um caso recente de crime de perigo abstrato que surgiu para atender aos anseios da sociedade é tipo penal do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, a sociedade clamava por uma lei mais rigorosa para os crimes de embriaguez ao volante e o legislador respondeu alterando o referido artigo e criando um tipo penal abstrato, que atualmente é objeto de diversas discussões, devido ao fato de não estar explícito no artigo que é necessário ter o dano em potencial à incolumidade de outrem.

            A dignidade da pessoa humana tenta, portanto, fazer com que o ser humano deixe de ser coisificado, pois todo ser humano tem o direito de ter seus direitos fundamentais protegidos, o Estado tem o dever de propiciar essa proteção por meio de seus instrumentos, tais como o Direito Penal, este não pode ficar de olhos vedados para o que acontece atualmente, a sociedade evolui, novos riscos aprecem, a precaução o direciona para criação de mecanismos de proteção, porém, a lei também tem seus limites e seu objeto de proteção, deve-se agir com calma.

            Alexandre de Moraes define a dignidade humana como aquela que:

[...] concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.[64] (MORAES, 2010. p.22).

            Estado não seja apenas um ente que não enxerga o que ocorre com a sociedade, ou um ditador que apenas impõe suas vontades, a sociedade clama por proteção e pelo respeito à sua dignidade, vive-se uma era em que a palavra falada não tem mais poder, e somente a escrita é que demonstra sua força, lembre-se de que a proteção da dignidade deve ser feita de modo a não ferir aquele que feriu a dignidade de outrem, e que se não há bem jurídico a ser tutelado, não há que se falar em direito penal ou em dignidade humana.

4.3 Posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários

Como dito, o momento social vivido influência muito no julgamento e elaboração dos tipos penais abstratos, são os novos riscos ou até mesmo a atenção que se dá aos velhos riscos que vai determinar o julgamento sobre sua constitucionalidade ou não.

                        Fernando Capez:

         [...] a lei não pode presumir o perigo em qualquer conduta. Senão, vejamos. Na hipótese de arma absolutamente inapta a efetuar disparos, o fato será atípico, não porque não se logrou comprovar a efetiva exposição de alguém a uma situação concreta de risco, mas porque a conduta jamais poderá levar a integridade corporal de alguém a um risco de lesão.[65] (CAPEZ, 2006. p.44).

            Fernando Capez por seu turno mostra que somente algumas condutas podem ser tuteladas pelos crimes de perigo abstrato, pois como já foi dito, o Direito Penal tem por função a tutela de bens jurídicos referenciais da dignidade humana.

            A oitava câmara do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro dispõe que:

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCEDOR QUE MANTEVE A CONDENAÇÃO DO EMBARGANTE PELO CRIME DE PORTE DE ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. A simples conduta de portar uma arma de fogo é suficiente para subsumir a conduta ao preceito primário contido no tipo incriminador do Estatuto do Desarmamento, in casu, o artigo 14, por se tratar de crime de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de efetivo caráter ofensivo. Desprovimento dos embargos. (TJ-RJ - EI: 00076411120098190037 RJ 0007641-11.2009.8.19.0037, Relator: DES. FERNANDO ANTONIO DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 11/10/2012, OITAVA CAMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 05/02/2013 15:08).[66]

            Gomes apud Capez (2006, p.46), entende que, “a presunção do perigo permite a imposição de sanção penal a quem não lesou nem colocou em perigo qualquer bem jurídico, violando, dessa forma, o princípio da ofensividade [...].”[67]

            Para os Tribunais basta a configuração do tipo penal para haver sua aplicação, não restando discussões quanto à sua validade ou não, o direito está atuando nesse caso como resposta ao anseio da sociedade, de quem pleiteou essa ação.

            Se a lei classificou como crime de perigo abstrato determinada conduta, é assim que ela será tratada, como crime. Percebe-se na lição de autores domo Damásio de Jesus que os crimes de perigo abstrato quando aplicados corretamente estão somente tentando proteger a dignidade humana, protegendo bens individuais e coletivos.

            Percebe-se, portanto que não há um posicionamento unânime sobre o assunto, porém deve-se ter em mente que se o crime de perigo abstrato for utilizado de modo a salvaguardar algum bem jurídico, este estará apenas exercendo sua função de proteção, ou seja, atuando como extensão da dignidade humana, que é princípio maior.

            No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. TESE RECURSAL EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA DESTA CORTE. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARTEFATO DESMUNICIADO. IRRELEVÂNCIA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. 1. Estando a decisão monocrática agravada em conformidade com os atuais julgados da Terceira Seção desta Corte Superior quanto à matéria, aplicável o artigo 557 do Código de Processo Civil. Ausência de violação ao princípio da colegialidade. 2. É irrelevante para a configuração do crime de porte de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei n. 10.826/03) o fato de o artefato não conter munição. 3. Tratando-se de delito de perigo abstrato, cujo objeto jurídico imediato é a segurança coletiva, é prescindível a existência de resultado naturalístico para que se consuma. 4. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no REsp: 1361481 MG 2013/0010421-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 28/05/2013, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/06/2013).[68]

            Jesus (2002, p.16) em sua obra também afirma que o objeto jurídico tutelado no caso de porte de arma de fogo será mediato e imediato, “há um objeto jurídico principal e imediato: a incolumidade pública. E existe a objetividade jurídica mediata e secundária, visando a norma proteger a vida, a incolumidade física e a saúde.”[69]

            Essa era a objetividade jurídica da antiga lei do Sistema Nacional de Armas – SINARM é certo que vários anos se passaram desde a sua edição, mas o objetivo da lei ainda é o mesmo, proteger a incolumidade pública, a segurança do cidadão.

            Para Roxin apud Oliveira (2010, p.2) “a lesão ao bem jurídico é evitada pela antecipação da punibilidade, ao passo que, caso se espere pela ocorrência do resultado, não haveria razão para a intervenção penal em certos casos.”[70]

            Portanto, para Roxin, o direito não deve esperar pelo resultado danoso, tendo como agir antes para evita-lo é o que deverá fazer.

            Havendo perigo para algum bem jurídico tutelado por lei, é legitima na visão dele a aplicação do crime de perigo abstrato como forma de prevenção.

            Tavares apud Capez (2006, p11) alude que “o poder de punir do Estado não pode proibir condutas, senão quando impliquem em lesão ou perigo de lesão a bens jurídicos”.[71]

           

           

            4.4 Da excepcionalidade do uso do perigo abstrato face à sociedade do risco

            Os crimes de perigo abstrato, perante o que foi explanado, terá seu caráter legitimo, quando for empregado para proteger bens que são reverenciais para a dignidade humana prevista Constitucionalmente.

            A conduta delituosa deverá ferir ainda que potencialmente algum bem jurídico individual ou coletivo e de certa maneira respeitar a ofensividade, incidindo apenas sobre condutas que demonstrem ter algum perigo para os bens jurídicos.

            Os crimes de perigo abstrato deverão atuar, porém de modo subsidiário, eles apenas serão aplicados no caso de não haver outro meio de controle eficaz para solucionar o problema, e esse meio não precisa ser necessariamente dentro do Direito Penal, pode-se buscar a solução em outras matérias como Direito Civil ou Administrativo.

            O crime de perigo abstrato deverá ainda respeitar a proporcionalidade, ou seja, o valor, bem que for violado, deverá ter sua sanção aplicada proporcionalmente. A pena deve ser proporcional a lesão.

            No caso do crime de dirigir embriagado já citado, o mesmo foi feito, baseado em dados estatísticos que confirmam a existência do risco para a incolumidade pública ao dirigir alcoolizado embora a mesma não apareça claramente no dispositivo, o maior problema encontrado, portanto nessa questão está na proporcionalidade da pena.

            A sociedade de riscos vem para aumentar a gama de espécies de delitos os quais o Direito Penal deve tutelar, ocorre que o direito não está preparado para essa evolução que ocorre praticamente dia-a-dia. O meio ambiente é um direito que recentemente passou a ter uma tutela mais eficaz, e o direito penal acaba por se valer de tipos penais como os crimes de perigo abstrato para tutelar essas novas questões, é o direito da precaução atuando na sociedade de riscos.

            Não se pode esperar, por exemplo, que a natureza sofra um grande dano para depois se tomar as medidas punitivas cabíveis, porque se esperar pela punição se é possível atuar com precaução, é este o questionamento de se fazem os defensores dos crimes de perigo abstrato, não é necessário ferir princípios jurídicos para ter sua aplicação efetivada, não é preciso de estatísticas para se saber que um cigarro pode causar um incêndio, uma arma sem munição pode não expor a pessoa a um perigo concreto, porém esse indivíduo não tem como imaginar que a referida arma não tem munição, o medo infringido será o mesmo.

            Fernando Capez em sua obra mostra que é possível a aceitação da ofensividade e dos crimes de perigo abstrato, sem que um elimine o outro:

         Presumir o perigo não significa inventar o perigo onde esse jamais pode ocorrer. Perigo presumido não é sinônimo de perigo impossível. Em suma, entendemos que a ofensividade ou lesividade é um princípio que deve ser aceito, por se tratar de princípio constitucional do direito penal, diretamente derivado do princípio da dignidade humana (CF, art. 1º, III). Sua aplicação, no entanto, não pode ter o condão de abolir totalmente os chamados crimes de perigo abstrato, mas tão somente temperar o rigor de uma presunção absoluta e inflexível. A ofensividade deve ser empregada para afastar as hipóteses de crime impossível, em que o comportamento humano jamais poderá levar o bem jurídico a lesão ou a exposição de risco de lesão. No mais deve-se respeitar a legítima opção política do legislador de resguardar, de modo amis abrangente e eficaz, a vida, a integridade corporal e a dignidade das pessoas, ameaçadas com a mera conduta, por exemplo, a de alguém possuir irregularmente arma de fogo no interior de sua residência ou domicílio.[72] (CAPEZ, 2006. p. 47)

                Fernando Capez diz que o perigo é o prognóstico de um mal, portanto este perigo deve ser tutelado antes mesmo que ele ocorra, não deve-se ver a validação dos crimes de perigo abstrato como um retrocesso ou como algo que é incabível no ordenamento jurídico, ele é apenas o reflexo de uma valorização do cidadão, como ser humano de direitos que merece proteção do Estado.

            O crime impossível, aquele em que não há lesão ou ameaça de lesão, esse sim não merece proteção Estatal, vez que não coloca em risco nenhum bem jurídico.

            A falácia da precaução na sociedade dos riscos é um dos motivos que faz com que os crimes de perigo abstrato sejam tão desvalorizados, nesse sentido Pierpaollo Cruz Bottini:

            Nos casos de prevenção, a situação evidente de potência do dano e a certeza científica da periculosidade da conduta permitem identificar o bem jurídico potencialmente afetado e facilitam a aplicação do princípio da proporcionalidade. [...] O mesmo não ocorre nos âmbitos da precaução. Nestas hipóteses, a incerteza que recai sobre os efeitos relacionados à técnica que se quer controlar, e sobre os bens jurídicos eventualmente afetados, dificulta ou impossibilita a aferição dos critérios de proporcionalidade.[73] (BOTTINI, 2013. p.218).

            A precaução é aplicada sempre que não houver dados a respeito dos riscos da ação, ou seja, desconhecendo quaisquer informações aplica-se a precaução, e é aqui que se encontra sua falha nos crimes de perigo abstrato, pois para que os mesmos tenham sua validade alcançada, é necessário que se tenha uma suposição do perigo baseada em fatos já ocorridos.

            Para que os crimes de perigo abstrato não sejam desvalorados em função da precaução, será necessário que os mesmos sejam tratados de maneira separada desse princípio. Porém também se deve levar em conta alguns posicionamentos no sentido de que embora não exista certeza científica na precaução, que a mesma em  alguns casos é baseada em dados estatísticos, que demonstram a potencialidade do dano, como nos casos de crimes ambientais.

            Percebe-se, portanto que existe uma falha na aplicação da precaução devido a discordâncias relativas ao fato da mesma não prescindir de dados científicos para ser aplicado, porém a ausência de dados, não é o mesmo que ausência de quaisquer fontes de informação.

CONCLUSÃO

            Os crimes de perigo abstrato como se percebe são motivo de polêmica e discussão, um embate que já perdura por algum tempo nos Tribunais brasileiros.

            Na tentativa de atender os anseios da sociedade o legislador cria tipos penais para atender o clamor do povo e somente depois é que se nota as divergências e falhas existentes na norma. Os tipos penais abstratos vêm para suprir a necessidade de uma norma que protegesse o cidadão de condutas em que há a possibilidade da ocorrência do resultado lesivo. Chama-se tipo penal abstrato por não ser necessária a ocorrência do dano para o Direito Penal agir.

            Viver em uma sociedade de riscos, não deve ser sinônimo de medo ou insegurança, perigos sempre existiram na sociedade, o que mudou é a forma de identificá-los, riscos que antes passavam despercebidos, hoje com a evolução tecnológica já podem ser deduzidos, nem sempre há uma certeza sobre o risco, mas ainda assim é possível ter uma noção da possibilidade de sua ocorrência.

            A precaução é um princípio aplicado quando não se tem dados científicos a respeito da possibilidade de um dano, porém ela não é aplicada a esmo, sua ocorrência nos dispositivos penais é feita em alguns casos baseada em estatísticas de ocorrência de dano em determinadas situações. Sua incidência é grande no campo do Direito Ambiental, de modo a assegurar que nenhuma técnica degradante ao meio ambiente venha a ser utilizada de maneira discricionária.

            A incidência da precaução nos crimes de perigo abstrato é um dos fatores responsáveis pelo entrave jurídico na sua efetividade, baseado no fato de que sendo desnecessária qualquer demonstração científica da possibilidade da ocorrência do dano, então os crimes de perigo abstrato feririam o princípio da ofensividade, princípio este que decorre da dignidade da pessoa humana e que preceitua que para haver a incidência da tutela penal deve haver um dano concreto a um bem jurídico.

            No entanto, há situações de risco em que são evidentes ou que podem ser demonstradas por meio de estatísticas, nesse caso a precaução está atuando nos crimes de perigo abstrato de maneira a demonstrar a real possibilidade de existência do risco em determinada situação.

            É por meio da dignidade da pessoa humana, princípio previsto constitucionalmente que se protegem os bens jurídicos fundamentais para a existência digna do ser humano. Os crimes de perigo abstrato para justificar sua existência devem observar na sua criação a proteção de algum bem jurídico, pois a principal função do direito penal é a tutela de bens jurídicos sejam eles coletivos ou individuais.

            Dessa forma, aquela conduta que não ofender bem jurídico não pode se classificar essa conduta como crime de perigo abstrato, vez que a mesma não tem um objeto tutelável para proteger, considerando-se atípica a conduta.

            O juiz nos crimes de perigo abstrato, não pode ser um mero instrumento de aplicação da lei, este deve proceder a análise do caso verificando se na época do ocorrido a questão tinha relevância jurídica, se havia um bem a ser tutelado e se não entra em conflito com princípios como ofensividade e proporcionalidade.

            Faz-se mister lembrar que o direito penal é um ramo subsidiário devido ao princípio da intervenção mínima, ou seja, só se deve recorrer ao direito penal quando nenhum outro ramo do direito foi capaz de solucionar o litígio, e é essa linha de pensamento que se deve manter no caso dos crimes de perigo abstrato, este só deve ser usado quando nenhuma outra forma de incriminação puder ser dada a uma conduta.

            Garantir a proteção da incolumidade pública e da segurança é de fundamental importância para o Estado cumpridor das determinações constitucionais. Os crimes de perigo abstrato são meros instrumentos que visam assegurar esses direitos, é cediço que eles possuem algumas falhas em sua elaboração, mas essa não é a primeira lei e nem a última que terá falhas, ocorre que algumas pessoas possuem ainda um pensamento retrógrado, onde somente fatos concretos devem ser passíveis de punição, e a vítima, o cidadão, este também é um ser humano merecedor de tutela, de garantias de que sua vida e sua segurança estão garantidas por lei.

            O Estado não está de olhos vedados para a evolução, o direito mudou assim como a sociedade mudou, a evolução não pode ser deixada de lado, se os crimes de perigo abstrato forem utilizados da maneira correta não há que se falar em conflito de princípios ou inconstitucionalidade.

            A aceitação dos crimes de perigo abstrato pode abrir precedentes para outras condutas criminosas, porém sua não aceitação pode gerar danos bem maiores com a descriminalização de condutas como porte de arma de fogo e embriaguez ao volante, é sabido que o direito entende que essas condutas podem ser tuteladas por outros ramos do direito, mas será que serão tratadas com o mesmo grau de importância e terão o mesmo impacto sobre o cidadão infrator.

            Com todas as mudanças sociais que vem ocorrendo necessita-se de um Direito Penal preventivo para tutelar os novos riscos, as estruturas na qual se baseava o direito, onde somente após a ocorrência do dano concreto é que o direito agiria não podem mais subsistir, é necessária uma evolução, novos parâmetros de incriminação que assegurem a segurança do cidadão. Ainda há um longo caminho a se percorrer para solucionar os conflitos relativos a aplicação dos crimes de perigo abstrato, porém já é cediço que sua utilização pode ser feita respeitando os princípios gerais de direito.

            O que se deve existir é um equilíbrio na aplicação para que o mesmo não seja utilizado de maneira descabida e nem como um mero apoio para o direito enquanto não encontram uma solução melhor para resolver os novos problemas que surgem a cada momento.

           

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