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Biopirataria: análise das sanções penais e administrativas aplicadas aos agentes do tráfico de animais silvestres

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4. DISCUSSÃO

4.1. Da análise da legislação frente à atual posição dos Tribunais

O que se verifica nessa análise é a clara flexibilização das sanções aplicáveis, incentivando a perpetuação do tráfico de animais silvestres que não encontra na legislação atual qualquer barreira para obter lucros, já que em geral, os valores aplicados de multa não chegam se quer próximo dos lucros obtidos pelos traficantes.

Como se observa, a Lei 9.605/98, apesar de tentar endurecer a penalização do crime de tráfico, impossibilitando o pagamento de fiança para os crimes previstos na lei, esta acabou por diminuir as penas restritivas de liberdade que eram de 2 a 5 anos, para no máximo 1 ano de reclusão, o que acaba se refletindo na própria jurisprudência, que como demonstras as Ementas colecionadas, acabam por converter a pena privativa de liberdade em multa ou prestação de serviço à comunidade.

4.1.1. Do estudo de caso

Um exemplo clássico que vêm acontecendo hoje em dia, é a aplicação da Lei especial de tráfico de animais (mais brando), frente ao Código Penal (mais rigidido), o que permite que os agentes do tráfico saiam impunes.

PENAL - PROCESSUAL PENAL - APELAÇÃO CRIMINAL DOS REÚS - CRIME DE TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTES - ARTS 29 CAPUT, § 1º, INC. III, E ART. 32 DA LEI 9.605/98 - OPERAÇÃO OXOSSI - MATERIALIDADE E AUTORIA CONFIRMADAS -DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE RECEPTAÇAO PARA O CRIME AMBIENTAL - ESPECIALIDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO - CONDENAÇÃO MANTIDA. I. Os fatos narrados na inicial se inserem dentro do expediente que ficou conhecido como “Operação Oxossi”, que teve como objetivo investigar e estancar o tráfico internacional deanimais silvestres, alguns deles ameaçados de extinção. II - Comprovadas a materialidade e autoria do crime de maus tratos, descrito no art. 32 da Lei 9.605/98. Os elementos trazidos aos autos não deixam dúvidas de que a intenção dos réus de afetarem os bens jurídicos lesados foi definitivamente comprovada nos autos e bem articulada pelo Juiz sentenciante. III - Alterada a capitulação com fulcro no art. 617, do CPP, que autoriza a emendatio libelli no Tribunal. O apelante integra a massa da organização, juntamente com outros agentes, atuando na compra e venda de animais, ora com fim religioso, ora para a venda em feiras de animais, enfim, não se trata da cúpula da organização, razão pela qual se deve aplicar à conduta descrita no art. 29 da Lei especial, em lugar do art. 180 do CP. IV - Recurso parcialmente provido. 6

Sendo assim, a pena que seria aplicada de 1 a 4 anos cai para de 6 meses a 1 ano, permitindo a realização da suspensão do processo através da assinatura de termo circunstanciado, o que nada evite nem combate o tráfico, pelo contrário, só reafirma a impunidade que reina nessa atividade.


5. Considerações finais

Diante da principal falha apresentada presente na legislação atual, pretende-se então propor uma tese que vem sendo discutida entre os doutrinadores da área.

Tais especialistas entendem necessária a criação de um tipo penal específico para o tráfico de drogas.

5.1. Da necessidade da criação de um tipo penal específico

Pessoas que cometem infrações contra o meio ambiente, ou até mesmo os crimes já tipificados em legislação, facilmente livram-se de maiores consequências de seus atos pela forma branda que o tema é tratado juridicamente. Diante disso se vê a necessidade de maiores estudos penais sobre o assunto, já que esses efeitos geram maior coercibilidade com sua tipicidade preventiva pelo estigma que gera seu processo contra o agente infrator.

Isso seria possível com a tipificação especializada para os delitos ambientais. Por exemplo, a tipificação do tráfico de animais silvestres, coisa que inexiste na tipificação atual do art. 29 da Lei nº 9605/98 e que possibilitaria uma ação mais apropriada em face de tal conduta lesiva ao meio ambiente, principalmente com o comércio de tais espécies, que acaba aumentando a procura por animais exóticos e em ameaça de extinção. O comerciante não tem preocupação com a função ecológica que os espécimes capturados cumprem no ecossistema ou com o desequilíbrio que a retirada desses animais irá causar nesse ecossistema, por exemplo, por que a punição em geral nunca chega até ele.

Os caçadores não respeitam os ciclos de reprodução dos animais e nem mesmo suas etapas de desenvolvimento. Existindo a procura, existirá também a oferta.

Logo, o advento de tipos penais específicos para a conduta de traficantes e comerciantes de animais seria o grande avanço necessário na proteção do meio ambiente e suas espécies. O ato de trazer tal responsabilidade da punição desses infratores para a ultima ratio do Estado demonstraria a séria preocupação do ente público em proteger os sistemas da fauna e flora, colocando maior importância na prevenção dessas práticas pela seara penal, sempre aliada com as sanções administrativas e fiscais.

Logicamente, não há que se olvidar que as sanções penais devem ser aliadas com a prevenção promovida pelo Estado não só para quem comete o ato de capturar, traficar e vender as espécies silvestres, mas para com as pessoas que praticam o ato de encomendar, comprar e manter em sua posse tal “mercadoria”. Políticas de educação e conscientização para o público em geral das consequências que tais atos causam, tanto no sentido ambiental tanto quanto no sentido penal, são formas de reprimir tais ações lesivas à coletividade ambiental.

O objeto do Direito Ambiental é a harmonização da natureza, garantida pela manutenção dos ecossistemas e da sadia qualidade de vida para que o homem possa se desenvolver plenamente. Restaurar, conservar e preservar são metas a serem alcançadas através da integração do direito penal com as políticas públicas de prevenção e a cooperação da coletividade em trazer tais debates para o seio da sociedade e do Estado, criando o ambiente propício para tal harmonização entre o interesse privado e o interesse coletivo ambiental.

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É nessa realidade que deve o intérprete da legislação penal ambiental buscar o método que melhor se enquadre na busca da Justiça, sem querer ferir os direitos dos acusados, mas, ao mesmo tempo, buscando uma efetividade na aplicação da norma penal ambiental. É a busca do ponto de equilíbrio entre esses dois ramos.


6. CONCLUSÃO

Como se pode observar no presente trabalho, o impacto do tráfico na sociedade precisa ser estudado de forma mais detalhada e seus atores mapeados. A captura de animais a natureza faz parte da tradição e cultura popular e é um dos principais meios de vida das pessoas pobres em algumas regiões do Brasil. Entretanto, já observa-se que em muitas regiões as pessoas estão usando o comércio ilegal de animais apenas como fonte adicional de renda.

Assim, mecanismos de controle do uso e comércio de vida silvestre devem ser elaborados, levando-se em consideração as condições étnicas particulares de cada região. Em uma escala global, recomenda-se uma abordagem diversificada incluindo educação em escala comunitária e fortalecimento dos moradores locais para a valorização da vida silvestre, regulação internacional coordenada e maior alocação de recursos nacionais para a área de fiscalização e controle efetivo do comércio ilegal e tráfico.

Mas não basta apenas uma fiscalização e controles de qualidade, é preciso fazer as alterações legais necessárias para que a proteção passe a ser integral e efetiva, permitindo que o Estado aplique o jus puniendi frente a esse crime bárbaro, que cresce demasiadamente em nosso território.


7. BIBLIOGRAFIA

RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres). 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre. 2001. Disponível em https://www.renctas.org.br/wp-content/uploads/2014/02/REL_RENCTAS_pt_final.pdf (último acesso em 10/11/2014).

Machado, Renato de Freitas Souza. Tráfico de Animais Silvestres, Artigo. 2013https://4ccr.pgr.mpf.mp.br/atuacao/encontros-e-eventos/encontros/encontros-estaduais/encontro-em-minas-mg-go-e-df-2013/Trafico_Animais_Silvestres_Dr.%20Renato%20de%20Freitas.pdf (Último acesso em 10/11/2014).

MACHADO, P.A.L. (1992) Direito ambiental brasileiro. Malheiros Editores, São Paulo, 4ª ed.

HEMLEY, G. e FULLER K.S. (1994) International Wildlife Trade: a CITES Sourcebook. WWF/Island Press, Washington, p. 166.

FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a Natureza. 6a ed., São Paulo, RT, 2000.

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente, 2ª ed, São Paulo, RT, 2001.

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Direito ambiental, fauna, tráfico e extinção de animais silvestres. Revista Jurídica, São Paulo, v. 50, n. 298, ago. 2002.

IBAMA - Esforços para o combate ao tráfico de animais silvestres no Brasil (Publicação traduzida do original “Efforts to Combat Wild Animals Trafficking in Brazil. Biodiversity, Book 1, chapter XX, 2012” - ISBN 980-953-307-201-7) https://www.ibama.gov.br/sophia/cnia/periodico/esforcosparaocombateaotraficodeanimais.pdf - Disponível em 12/11/2014.


Notas

1 RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres). 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre. 2014 Disponível em https://www.renctas.org.br/wp-content/uploads/2014/02/REL_RENCTAS_pt_final.pdf (último acesso em 10/11/2014).

2 Machado, Renato de Freitas Souza. Tráfico de Animais Silvestres, Artigo.2013 – https://4ccr.pgr.mpf.mp.br/atuacao/encontros-e-eventos/encontros/encontros-estaduais/encontro-em-minas-mg-go-e-df-2013/Trafico_Animais_Silvestres_Dr.%20Renato%20de%20Freitas.pdf (Último acesso em 10/11/2014).

3 RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres). 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre. 2014 Disponível em https://www.renctas.org.br/wp-content/uploads/2014/02/REL_RENCTAS_pt_final.pdf (último acesso em 10/11/2014).

4 MACHADO, P.A.L. (1992) Direito ambiental brasileiro. Malheiros Editores, São Paulo, 4ª ed.

5 HEMLEY, G. e FULLER K.S. (1994) International Wildlife Trade: a CITES Sourcebook. WWF/Island Press, Washington, p. 166.

6 APELACAO CRIMINAL 2009.51.01.807277-0, 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO, 03/11/2008.

Sobre os autores
Leticia Mayumi Hokama Fogaça

Acadêmica de Direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie, cursando o 10º semestre com previsão de conclusão do curso em 2015.

José Corrêa Neto

Acadêmico de Direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie, cursando o 10º semestre com previsão de conclusão do curso em 2015

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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