RESUMO
O presente trabalho tem a finalidade de mostrar do que se trata o novo instituto jurídico que aparece, mais precisamente no Direito Previdenciário que é a desaposentação.
A desaposentação é o direito de o segurado renunciar ao ato jurídico perfeito da aposentadoria, visando optar por um benefício mais vantajoso, visto que continuou a contribuir para a Previdência Social.
Veremos que existem entendimentos favoráveis ao instituto e outros desfavoráveis, por diversos motivos. Alguns Tribunais Federais entendem que, por ser um ato jurídico perfeito, o segurado não pode renunciar à aposentadoria; outros entendem que o direito pode ser concedido, porém condicionado à devolução dos valores percebidos anteriormente.
De toda forma, o presente trabalhado mostra a possibilidade de concessão do benefício, tendo por base a hermenêutica do Direito Previdenciário e sem que viole norma constitucional alguma.
PALAVRAS-CHAVE: Aposentadoria. Desaposentação. Direito Previdenciário. Correntes.
ABSTRACT
This paper aims to show what it is the new legal institution that appears, more precisely in the Social Security Law which is the desaposentation.
The desaposentation is the right of the insured waive the perfect legal retirement in order to opt for a more advantageous benefit, since continued to contribute to Social Security.
We will see that there are understandings favorable to the institute and other unfavorable for various reasons. Some Federal Courts understand that to be a perfect legal act, the insured can not renounce retirement; others believe that the right can be extended, however conditioned on the return of amounts previously perceived.
Anyway, this worked shows the possibility of granting the benefit, based on the hermeneutics of the Social Security Law and without violating any constitutional norm.
KEYWORDS: Retirement. Desaposentation. Social Security Law. Currents.
- INTRODUÇÃO
Atualmente é cada vez mais comum a quantidade aposentados trabalhando no mercado formal brasileiro. Para ter que complementar a renda, os aposentados precisam voltar ao mercado, e quando o empregador assina a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) desse empregado, ele deve se submeter a um regime previdenciário onde se torna um segurado obrigatório, ou seja, por força da lei, o desconto é feito no salário do empregado para que seja feita a contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Ocorre que a legislação previdenciária diz que o aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social – RGPS que permanece em atividade sujeita ao mesmo Regime não faz jus aos benefícios da Previdência Social na sua plenitude por conta do exercício dessa atividade, mas tão somente ao salário-família e à reabilitação profissional, enquanto estiver empregado (lei n. 8.213/91, artigo 18, §2º). Ademais, ainda não há um instituto na legislação previdenciária brasileira que beneficie o aposentado que precisou voltar ao mercado de trabalho, no sentido de que ele possa ter direito a um benefício melhor, visto que fez novas contribuições. Diante dessa situação, muitos aposentados recorrem ao INSS, autarquia responsável pela concessão dos benefícios sociais, para que o tempo trabalhado seja contabilizado e a aposentadoria convertida em um benefício mais vantajoso. Entretanto, não obtêm êxito, por conta da falta da previsão legal. O presente trabalho, portanto, tem o objetivo de esclarecer esses questionamentos.
- DESAPOSENTAÇÃO
- CONCEITO
A desaposentação é um tema ainda não regulamentado pelo direito previdenciário, ou seja, não possui previsão legal, porém, nos últimos anos vem sendo bastante discutida tanto na doutrina quanto na jurisprudência.
Um possível caso que pode ensejar a desaposentação é quando um segurado se aposenta pelo RGPS por tempo de contribuição. Logo depois ele passa em um concurso público, tomando posse de um cargo público, e por consequência passa a contribuir de forma compulsória para o RPPS.
Nesse exemplo a desaposentação consiste em uma certidão onde é averbado o tempo de contribuição no outro regime, visando assim uma majoração do benefício.
Caso o segurado já seja aposentado pelo RPPS, existe uma vedação constitucional, onde proíbe expressamente a percepção de duas aposentadorias no mesmo regime (art. 40, §6º da CRFB/88).
Mas esse fenômeno não ocorre somente no caso de mudança de regime previdenciário. Um segurado que esteja filiado ao RGPS que se aposenta, pode perfeitamente voltar a trabalhar, e consequentemente voltar a ser um segurado obrigatório, conforme dispõe o artigo 12, § 4º da lei n. 8.212/91, que destacamos in verbis: “o aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta Lei, para fins de custeio da Seguridade Social.”
Dessa forma o segurado terá sua contribuição previdenciária retida direto da fonte e continuará a receber a aposentadoria, mas quando este segurado deixar de trabalhar por algum motivo, o tempo que contribuiu de forma compulsória para previdência, não será contabilizado para fins de majoração de sua aposentadoria.
Logo, caso esse segurado conseguisse cumprir os requisitos legais, a solução seria solicitar à autarquia um novo benefício de acordo com sua situação. Porém existe uma vedação legal para tal prática, conforme exposto no artigo 18, § 2º da lei n. 8.213/91 (com redação da lei n. 9.528/97) in verbis: “O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus à prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto salário-família e a reabilitação profissional, quando empregado.”
Pelo dispositivo legal, podemos verificar que o segurado é obrigado a contribuir para a Previdência Social, mas a contribuição não é vantajosa, visto que a autarquia não reconhece tais contribuições com fito de majorar o valor do benefício.
O segurado que perceber essa possibilidade ao se dirigir a uma agência da Previdência Social para requisitar tal averbação terá seu direito frustrado, por conta da falta de legislação sobre o assunto.
Dessa forma, não há o que ser feito pela autarquia, visto que a concessão do benefício é um ato administrativo, portanto deve decorrer da lei.
A desaposentação, então, trata-se da possibilidade do aposentado abrir mão do benefício que recebe, visando o reconhecimento de contribuições posteriores à jubilação, fazendo assim, que possa optar por um benefício mais vantajoso. Podemos então, destacar o conceito de desaposentação de IBRAHIM:
A desaposentação, portanto, como conhecida no meio previdenciário, traduz-se na possibilidade do segurado renunciar à aposentadoria como o propósito de obter benefício mais vantajoso, no Regime Geral de Previdência ou em Regime Próprio de Previdência Social, mediante a utilização de seu tempo de contribuição. Ela é utilizada colimando a melhoria do status financeiro do aposentado. (IBRAHIM, 2011, P.35)
2.2. DESFAZIMENTO DO ATO DE CONCESSÃO DA APOSENTADORIA
A concessão da aposentadoria pela autarquia tem a natureza jurídica de um ato jurídico perfeito, é um direito adquirido, portanto, a princípio tal direito não pode ser revogado em detrimento do beneficiado, pois só pode ser desfeito pelo Poder Público, portanto, em caso de erro ou fraude na concessão. Sobre o ato concessório da aposentadoria podemos destacar o que diz BANDEIRA DE MELLO:
O ato administrativo é perfeito quando esgotadas as fases necessárias à sua produção. Portanto o ato perfeito é o que completou o ciclo necessário à sua formação. Perfeição, pois, é a situação do ato cujo processo está concluído.( BANDEIRA DE MELLO, 1997, p.272)
O ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, estão no art. 5º, inciso XXXVI; e tem a natureza jurídica de Cláusula Pétrea, ou seja, não podem ser alteradas, nem mesmo por Emenda Constitucional (art. 60,§ 4º, inciso IV da CRFB/88).
Além disso, o INSS tem entendido que a aposentadoria é irrenunciável, dado seu caráter alimentar, só se extinguindo com a morte do beneficiário.
Porém tal preceito constitucional não pode ser interpretado visando prejudicar o cidadão, pois ao requerer a desaposentação, o segurado não estará abrindo mão de seu benefício, como destaca IBRAHIM:
Convém ainda notar que a desaposentação, ao contrário do que possa parecer, não admite a renúncia ao benefício em qualquer hipótese, mas somente dever ser admitida a jubilação. Do contrário, se permitida a renúncia pura e simples do benefício, sem cômputo de qualquer tempo posterior, o que se estará fazendo é abrir a possibilidade de aplicarem-se regras futuras de aposentadoria a benefícios pretéritos, configurando evidente mecanismo de burla ao tempus regit actum. (IBRAHIM, 1997, p.703)
Assim, não há impedimento legal algum para a concessão do requerimento do desfazimento do ato da concessão da aposentadoria, visto que as garantias do ato jurídico perfeito visam assegurar a garantia do cidadão, nesse caso o segurado, e não pode ser argumento para se impedir uma expectativa de direito.
2.3. POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL
Apesar de ser um tema relativamente novo, existem vários julgados nos Tribunais Regionais Federais que possibilitam uma maior discussão do tema, visto que há divergência entre os juízes federais quanto ao assunto.
Como podemos ver no entendimento do TRF da 1ª região existe um posicionamento que não pode haver renúncia à aposentadoria:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. DESAPOSENTAÇÃO. ATIVIDADE REMUNERADA EXERCIDA APÓS A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RENÚNCIA. RECÁLCULO DA RMI. OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA MAIS VANTAJOSA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1. A renúncia à aposentadoria previdenciária com o objetivo de sua majoração, para que sejam consideradas novas contribuições vertidas após a concessão do benefício, encontra óbice no ordenamento jurídico e afronta a garantia do ato jurídico perfeito. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Regionais Federais da 3ª, 4ª e 5ª Regiões. 2. Apelação não provida.
Em entendimento contrário temos o posicionamento do Tribunal Regional Federal da 1º Região, no qual há apontamentos favoráveis à desaposentação, conforme se pode ver:
“Acordão Origem: TRF - PRIMEIRA REGIÃO Classe: AC - APELAÇÃO CÍVEL – 200238020020870 Processo: 200238020020870 UF: MG Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA Data da decisão: 28/9/2004 Documento: TRF100202796 Fonte DJ DATA: 3/11/2004 PAGINA: 15 Relator (a) DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ GONZAGA BARBOSA MOREIRA Decisão A Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação e à remessa oficial. Ementa PREVIDENCIÁRIO - RENÚNCIA DE APOSENTADORIA CONCEDIDA PELA PREVIDÊNCIA SOCIAL - POSSIBILIDADE - CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. 1- A renúncia à aposentadoria previdenciária não encontra óbice legal. Afasta-se a aplicação dos Decretos 2.172/97 (art. 58, § 2º) e 3.048/99 (art. 181-B), que estabeleceram a irreversibilidade e a irrenunciabilidade da aposentadoria, porque foram além da norma regulamentada (Lei 8.213/91). 2- Efetivada a renúncia à aposentadoria, o tempo de serviço pertinente deve ser computado para efeito de concessão de outra aposentadoria, o que impõe a expedição da certidão de tempo de serviço. 3- Precedentes: (AMS 1997.01.00.046806-3/DF, Rel Juiz Aloísio Palmeira Lima, 1ª Turma; AC 1996.01.56046-7/DF, Rel. Juiz Jirair Aram Meguerian, 2ª Turma; TRF 4ª Região, AMS 1999.04.01.003180-3/RS, Rel. Juiz Carlos Sobrinho, 6ª Turma; STJ, AGRESP 497683/PE, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, unânime, DJ: 04/08/2003, p. 00398. 4- Apelação e Remessa Oficial, tida por interposta, improvidas. Sentença confirmada. Data Publicação 03/11/2004”
Portanto, há tribunais que entendem que para a concessão da desaposentação é necessário que o segurado devolva aos cofres públicos o valor que recebeu de benefício anteriormente. Porém, existem outros pensamentos contrários a este entendimento, ou seja, entendem que não há necessidade da devolução do valor, conforme o acórdão da quinta turma do Tribunal Regional Federal da 3º Região que segue:
“Processo: 199961050007760 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA Data da decisão: 26/02/2002 Documento: TRF300060693 Fonte DJU DATA:03/09/2002 PÁGINA: 348 Relator(a) JUIZ ANDRE NABARRETE Decisão Após manifestação ministerial pelo improvimento do recurso, à Turma, à unanimidade, negou provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do voto do(a) Relator(a). Ementa PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
PEDIDO DE DESAPOSENTAÇÃO. - O artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, garantia fundamental do cidadão, resolve a questão da lide. Somente a lei poderia vedar a renúncia a benefício previdenciário. O segurado aposentou-se em 04.03.1985 e, tanto o Decreto 89.312/84 como a Lei n.º 8213/91 não contêm proibição de renúncia. Afastada, em consequência, a invocação do artigo 58, § 2º, do
Decreto 2172/97. - Os direitos sociais e o sistema previdenciário brasileiro, com sede constitucional, existem em razão de seus destinatários. Os limites de sua disponibilidade são balizados pela sua própria natureza. Trata-se de proteção patrimonial ao trabalhador. Quando se cuida de interesse material, em regra, cabe ao titular do direito correspondente sopesar as vantagens ou desvantagens. Assim, quanto aos direitos com substrato patrimonial, constitui exceção sua irrenunciabilidade, que sempre é prevista expressamente pelo legislador. - Os efeitos da renúncia são ex nunc, ou seja, dão-se da manifestação formal para extinguir a relação jurídico-administrativa-previdenciária da aposentadoria. Nada vicia a concessão do benefício, que gerou consequências legítimas, as quais não se apagam com o ato de renúncia. - O impetrante tem direito à certidão de tempo de serviço. O órgão previdenciário computou o tempo para a concessão do benefício. A vedação de que um tempo de serviço não pode ser contado quando já tiver sido para aposentadoria de outro deve ser interpretada, à vista da cumulatividade de aposentadorias concomitantes e não sucessivas. A compensação financeira eventual dos regimes (art. 202, § 2º, C.F.) dar-se-á na forma da Lei n.º 9796/99, segundo o artigo 4º, inciso III, §§ 2º, 3º e 4º. - Remessa oficial e apelação não providas. Data Publicação 03/09/2002”
Em que pese a relevância das decisões judiciais, hoje está em trâmite no STF o RE 381.367, que pode dirimir de uma vez a questão.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse trabalho nos mostrou a possibilidade de conhecer de uma maneira geral do que se trata esse novo instituto jurídico: a desaposentação.
Apesar de ser cada vez mais comum um aposentado retornar ao trabalho e questionar o por quê da não majoração de seu benefício, visto que contribuiu para o INSS, a legislação ainda não trata do assunto. Mas verificamos que o tema está tomando grandes proporções tanto na doutrina quando na jurisprudência.
Dessa forma, mesmo sem previsão legal, o Poder Judiciário pode cuidar, aos poucos, de propor requisitos para a concessão desse novo instituto. Mesmo sabendo, porém, que não é função do Judiciário legislar, mas na ausência de lei o juiz pode usar de algum instrumento para que seja garantido o direito tutelado.
O instituto ainda é resguardado pela constituição, pois não há nenhum óbice legal para a concessão do mesmo. Mais um motivo para que cresça a discussão sobre o assunto.
Em contrapartida temos o julgamento do Recurso Especial n. 381.367/RS, onde Supremo Tribunal Federal poderá por fim ao assunto no meio jurídico, mas nada obsta do legislador se mobilizar no sentido de criar de uma vez um meio para tutelar esse direito.
Resta-nos, então aguardar um posicionamento final do STF e aguardar que o legislador se movimente para que os aposentados, enfim, possam ver o seu direito reconhecido.
- REFERÊNCIAS
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 10ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Desaposentação. 5ª edição. Niterói: Impetus, 2011.
BRASIL. Lei 8.212/1991. Lei Orgânica da Seguridade Social. Brasília, DF: Senado, 2015.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 2015.
BRASIL. Lei 8.213/1991. Planos de Benefícios da Previdência Social. Brasília, DF: Senado, 2015.
__________. Supremo Tribunal Federal. Recurso Especial n. 381.367-RS. Recorrente: Lúcia Costella e outros. Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Relator- Ministro Marco Aurélio. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em 14 de outubro de 2015.
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. APELAÇÃO CIVEL n. 00638000338620.
Relator: JUIZ FEDERAL MIGUEL ANGELO DE ALVARENGA LOPES, julgado em 26 de janeiro de 2011.
[1] Bacharelando em Direito pela Associação Piripiriense de Ensino Superior – CHRISFAPI