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Competência tributária negativa.

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Agenda 10/11/2003 às 00:00

7. INTRIBUTABILIDADE DAS ENTIDADES BENEFICENTES DE EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL

7.1. Conceituação

Conforme a prescrição do art. 150, IV, "c" da Carta da República são imunes à tributação por impostos "o patrimônio, a renda ou os serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, atendidos os requisitos da lei".

Tal lei mencionada pelo comando constitucional só pode ser complementar porque só esta pode regulamentar as limitações constitucionais ao poder de tributar, de acordo com o disposto no art. 146, II, da Constituição Federal. Permitido a lei complementar apenas imiscuir-se nos aspectos formais, ou seja, indicar medidas para assegurar a eficácia do prescrito na Constituição.

Neste sentido o Código Tributário Nacional, recepcionado pela Carta Magna, assumiu a posição de lei complementar regulamentadora dos dispositivos de natureza tributária insertos na Carta Política.

Na disposição do art. 14, IV, do CTN, estão os requisitos a serem observados pelas entidades referidas para gozarem da intributabilidade:

I – Não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a título de lucro ou participação no seu resultado;

II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;

III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Isto impõe às entidades beneficiadas pela imunidade a estrita observância das obrigações de natureza política e administrativa e, principalmente, as de natureza acessória em relação à finalidade.

7.2. Imunidades das instituições assistenciais de educação

Ex vi do art. 205. da Constituição: "a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho".

Trata-se de princípio inserido na norma constitucional que, embora tendo eficácia limitada, não pode ser ignorada pelo Poder Público, já que tem caráter social de interesse importantíssimo.

O comando do art. 150, VI, "c", reza que são imunes a impostos as instituições de educação, sem fins de lucro, atendidos os requisitos da lei.

Ressalte-se que o fato da instituição cobrar dos alunos não restringe seu direito à imunidade, visto que com o faturamento das mensalidades é que permitirá o pagamento dos professores, funcionários e efetuar investimentos necessários para a prestação dos serviços de sua finalidade.

Neste sentido ensina Carraza57:

"(...) mesmo as instituições de educação privadas, que cobram mensalidades de seus alunos, são abrangidas pela imunidade. Basta que, sem fins lucrativos, se associem ao Estado na consecução dos objetivos contemplados no art. 205. da Lei Maior e, é claro, cumpram os requisitos do art. 14. do Código Tributário Nacional (ausência de intuito lucrativo, aplicação integral de seus rendimentos no País e escrituração correta de suas receitas) ".

Entende na mesma direção Elizabeth Nazar Carraza58:

"O legislador constituinte, fazendo uso da palavra ‘intituições’, quis imunizar as entidades formadas com o propósito de servir à coletividade, colaborando com o Estado ao suprir suas deficiências, no setor educacional. Se, apenas para argumentar, as entidades particulares não gozassem de imunidade, pela só circunstância de não serem gratuitas os seus serviços, jamais este sentido da norma constitucional poderia ser alcançado".

Conclui o mestre Roque Carraza que o benefício da imunidade atinge também, se preencherem os requisitos exigidos pela lei, o museu, o centro de pesquisas, as academias de letras, artes e ciência e outras entidades congêneres que contribuem para a educação.

Entendemos, pois, que a imunidade das entidades de educação é de natureza condicionada, somente alcançando as instituições sem finalidade de lucro, como disciplina o art. 14. do Código Tributário Nacional, cuja determinação e não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título e aplicarem integralmente no país os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais e, ademais, manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

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Evidencia-se imunidade condicionada, ou seja, a entidade atingida pela imunidade terá que cumprir obrigações acessórias de forma continuada que, se não forem observadas, a autoridade competente poderá suspender a aplicação da imunidade, como dispõe o § 1° do art. 14, CTN.

Ressalte-se que, inobstante estar consignada na norma legal, o comando de suspender a imunidade não é consentâneo, visto que esta é inerente à instituição que preencha os requisitos para ser tratada pelas Fazendas Públicas como imune. Caso não atenda os requisitos legais em qualquer tempo simplesmente não houve o direcionamento para a imunidade, sendo, então, passível de tributação.

A exoneração tributária atinge as rendas, patrimônio e serviços relacionados com os objetivos institucionais previstos nos seus estatutos. Então, estão imunes a todos os tributos de todos as pessoas políticas.

Observe-se que na hipótese de existir nos atos constitutivos qualquer hipótese de distribuição patrimonial ou de suas rendas a qualquer título estará descaracterizada a finalidade social de entidade assistencial, não fazendo jus à imunidade e, pois, se sujeitando à tributação.

Com efeito, quando se fala em entidade sem finalidade de lucro impende-se entender que o seu criador, instituidor, mantenedor, associado, filiado ou dirigente, não pode ter fim de lucro para si, porém não há impedimento que a entidade obtenha resultados financeiros positivos, conquanto este será superávit, não sendo lucro, vez que este é conceito empresarial. Da mesma forma estará afastada a imunidade se houver remuneração exorbitante aos seus dirigentes, fora dos padrões de mercado, o que ficará caracterizada distribuição de patrimônio, renda ou lucro de forma simulada. Resumindo, o que é vedado é que quem cria a entidade não pode visar lucro como também não pode beneficiar-se pessoalmente das rendas ou patrimônio da instituição.

Então, na hipótese do § 1° do art. 14, CTN, suspensa a qualquer tempo a imunidade da entidade, esta terá efeito ex tunc, alcançando fatos exigíveis não contemplados pela prescrição do crédito tributário, que se opera em cinco anos de sua constituição.

Ressalte-se que, conforme o princípio da primazia do direito, não importa o nomen juris da entidade. Se a mesma prevê nos seus atos estatutários a possibilidade de distribuição patrimonial e de rendas a qualquer tempo, não se caracteriza como entidade assistencial e sim entidade de cunho lucrativo, não contemplada pela regra imunizante.

No tocante às contribuições previdenciárias é importante comentar a posição da Lei n° 9.732/98 que alterou a Lei n° 8.212/91, que trata do custeio da seguridade social. Aquela impôs novas regras para o gozo da imunidade prevista no § 7° do art. 195. da Carta Política que colidem com a própria existência das entidades assistenciais de educação, vez que atingem o seu cerne financeiro com o condicionamento da initributabilidade proporcional à prestação dos serviços gratuitos, ou seja, se a entidade concede gratuidade a 20 % dos seus alunos somente estará imune à contribuição previdenciária patronal no mesmo percentual.

Esta lei, que é ordinária, não tem o condão de regulamentar o instituto da imunidade das contribuições previdenciárias. Isto é afeto à Lei Complementar, nos termos do art. 146, II, da Constituição Federal, e o Código Tributário Nacional, recepcionado como tal cumpre esta função no art. 14. e nenhuma outra exigência poderá ser feita para a fruição da imunidade tributária.

O art. 55. da redação original da Lei 8.212/91 cumpre sua função regulamentar nos termos constitucionais e, portanto, a Lei n° 9.732/98, quando altera o seu texto e inova condições para a imunidade em questão, é inconstitucional, vez que o legislador constituinte não determinou restrições ou proporcionalidades para o gozo da imunidade, nenhum legislador infraconstitucional está autorizado a estipular, muito menos por lei ordinária ou até por lei complementar.

7.3. Imunidade das instituições de assistência social

A Constituição Federal declarou imunes a impostos as entidades de assistência social porque estas auxiliam o Estado na consecução do bem comum, executando atribuições típicas do Estado, como é o caso das Santas Casas que prestam serviços médicos e hospitais de forma gratuita a pessoas carentes.

Portanto, não tendo fins lucrativos não poderiam ser tituladas por meio de impostos, como dispõe o art. 145, § 1º, da CF, visto serem desprovidas de capacidade contributiva e por isso justo é que tais instituições gozem de imunidade relativa a IR, ISS, IPTU, II, etc.

Incluem-se também no rol das instituições assistenciais exoneradas de impostos as entidades fechadas e de previdência privada, denominadas fundos de pensão.

Ressalte-se que a Lei 9.732/98 impõe novas exigências para o gozo da imunidade às contribuições previdenciárias também das demais entidades assistenciais e, como versado em linhas pretéritas, patentes é a inconstitucionalidade desta norma.

7.4. Imunidade das instituições assistenciais diante das contribuições para a seguridade social

Assiste também a tais instituições, além da imunidade a impostos, a intributabilidade em relação à contribuição para a seguridade social, conforme dispõe o art. 197, § 7º, da Carta Maior, que prescreve que "são isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei".

Ressalte-se que, embora haja o emprego da expressão "isentas" não deixa de ser norma excludente de tributação, sendo apenas uma atecnia da linguagem utilizada.

Verifica-se evidente parceria entre o Estado e tais instituições para o alcance do objetivo comum de coordenação e execução de programas de assistência social, como dispõe o art. 204, I, da CF.

A professora Costa59 brilhantemente nos brinda discorrendo sobre os princípios que emolduram o preceito imunitório de tais instituições.

Primeiramente diz que se trata de imunidade natureza subjetiva e ontológica calcada na ausência de capacidade contributiva dessas entidades, cuja capacidade econômica exaure-se na execução de suas finalidades.

Afirma que o preceito exonerativo funda-se nos princípios da universalidade de cobertura e da solidariedade contributiva.

Quanto a esses princípios ensina que:

A) Princípio da universalidade da cobertura – baseia-se no art. 194, parágrafo único, da CF, e funda-se no dizer que "todas as espécies de infortúnios e limitações que retiram do homem a sua capacidade laboral estejam cobertos pelos planos de benefícios da Previdência Social" (apud Luiz Cláudio Flores da Cunha, Princípios de Direito Previdenciário – Aspectos Materiais, Processuais e Penais. Livraria do Advogado Editora. Porto Alegre : 1988, p. 31.)

B) Princípio da solidariedade contributiva – albergado no art. 195, CF, que trata do financiamento da seguridade social. Amolda-se no objetivo do Estado brasileiro, dentre outros, da construção de uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I) e afigura-se na co-responsabilidade do Estado e Sociedade pela manutenção financeira da seguridade social.

A festejada mestra discerne a imunidade atribuída às entidades de educação e de assistência social dizendo que a imunidade genérica das instituições educacionais sem fins lucrativos está inserta no art. 150, VI, "c", e ressalta que essa imunidade não premia a exoneração das contribuições para a seguridade social, que atinge apenas as entidades beneficentes de assistência social, justificada pelo fato de que a assistência social ser derivação da seguridade social e que não ocorre com a educação.

Nos objetivos da assistência social elencados pelo art. 203. estão: a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho; a habitação e a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; e a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Para assoberbar-se da imunidade à baila a entidade de assistência tem que ser qualificadamente beneficente, não importando o seu tamanho ou a amplitude dos serviços prestados, pois qualquer que seja a parcela do atendimento aos carentes e desvalidos já está configurado o caráter filantrópico de auxílio ao Estado.

Importante realçar as distinções, para efeito das imunidades, entre instituição ou entidade de assistência social e instituição ou entidade beneficente de assistência social. No primeiro grupo estão aquelas que se dedicam a um dos objetivos insertos no art. 203, CF, e não tem finalidade de lucros. No segundo grupo sediam aquelas que não possuem finalidades de lucros e dedicam-se, mesmo que parcialmente, ao atendimento dos desvalidos, tendo como elemento caracterizador de beneficência a gratuidade dos serviços.


CONCLUSÃO

Ao bebermos dos conhecimentos dos mestres citados encontramos, especialmente, nas lições da brilhante professora Regina Helena Costa inovadoras sobre a matéria, inclusive com terminologias próprias, determinando até que pensador do quilate de Antonio Roque Carraza, resignadamente e com a inteligência que lhe é peculiar, modificasse alguns de seus conceitos sobre o tema, conforme se constata nas páginas 620 e 621 da 17ª edição de sua renomada obra Curso de Direito Constitucional Tributário onde há o seguinte discurso: "Percebida a cinca, estamos fazendo as necessárias retificações. Com efeito, não somos daqueles que pensam que a coerência é sinônima da mumificarão das idéias. Levou-nos a mudar de opinião a leitura do excelente livro da Regina Helena Costa titulado Imunidades Tributárias (...) "

Então, na dinâmica do direito como ciência social não podemos conceber idéias estanques, sob pena de quedarmos em conceitos distorcidos da realidade histórica, daí a grandeza da busca constante do saber e a reavaliação de posicionamentos, como nos ensina o escólio do grande pensador Norberto Bobbio60 na sua perspicaz filosofia:"O que pensamos e escrevemos tem sempre um caráter provisório, jamais peremptório. A realidade tem muitas faces e é difícil vê-las todas. Daí, a exigência da cautela crítica e, não obstante todos os controles, a possibilidade de errar, mas com o compromisso de jamais persistir no erro e de aceitar e respeitar todas as correntes contrárias".

Portanto, nestas digressões, realçamos o instituto das imunidades tributárias entendendo que se trata, conclusivamente da competência tributária negativa, visto estar afastada a imponibilidade das pessoas políticas nas situações previstas constitucionalmente. Todavia, o debate sobre o tema tem contornos elevados, haja vista a grande divergência doutrinária sobre a aplicabilidade da imunidade a taxas e contribuições. Por isso, o debate, de forma ampla, sobre o instituto constitucional da inintributabilidade permanece aceso e inesgotável, carecendo de mais idéias para aclarar as suas zonas cinzentas.

Sobre o autor
João Bosco Peres

advogado e professor em Goiânia (GO)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PERES, João Bosco. Competência tributária negativa.: As imunidades tributárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 131, 10 nov. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4478. Acesso em: 23 nov. 2024.

Mais informações

Trabalho elaborado no Curso de Especialização em Direito Tributário pelo Instituto Goiano de Direito Tributário em convênio com a Universidade Católica de Goiás, transcorrido no biênio 2002/2003. Orientador: professor Octávio Campos Fischer, mestre em direito tributário e docente da PUC Paraná, em Curitiba.

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