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Posso ser preso em flagrante por vender ou comprar produtos piratas?

A polícia combate um crime cometendo outro crime.

Agenda 17/01/2016 às 07:42

As exigências da lei para que se formalize uma prisão em flagrante encontram-se inadequadas ao nosso tempo. A polícia, desse modo, para autuar um infrator em flagrante, acaba cometendo outra ilegalidade, um abuso de poder ou de autoridade.

Em princípio sim. Tanto quem vende quanto quem compra produtos piratas podem ser autuados em flagrante. No entanto, não é tão simples quanto parece. A polícia, no afã de combater a pirataria, acaba por inobservar ditames legais, sem os quais a prisão se torna abusiva e ilegal.

                                                    Posso ser preso em flagrante por vender ou comprar produtos piratas

Posso ser preso em flagrante por vender ou comprar produtos piratas

Antes de dar continuidade ao texto, é necessário que se faça duas observações.

A primeira delas no sentido de que não há, na presente publicação, nenhuma intenção de esgotar o assunto além daquilo que o título propõe, sendo o tema abordado sem a pretensão de se elaborar tese de mestrado ou mesmo de doutorado, pois é a simplicidade a regente do discurso.

A segunda é no sentido de que a matéria não pretende posicionar-se nem pró e nem contra a pirataria, uma vez que há defensores, com bons argumentos, para ambos os lados.

Vamos iniciar pela venda de produtos piratas.

CDs, DVDs, seja de filmes ou de softwares, em sua maioria, são os produtos explorados pela pirataria.

Obviamente, o leque de falsificações ou contrafações envolve uma gama muito grade de produtos, incluindo roupas, eletroeletrônicos, aparelhos de telefone celular, entre muitos outros.

Vamos nos restringir, apenas, para o entendimento básico do leitor, muitas vezes leigo em matéria legal, aos CDs e DVDs.

Sejam eles de música, filmes ou de softwares, obrigatoriamente dependem de duas condicionantes para que a ação policial seja legal.

Trata-se de crime, cuja vítima é apenas o seu criador, autor ou detentor dos direitos.

Assim, para a formalização de um auto de prisão em flagrante é condição sine qua non a representação da vítima ou de quem tenha qualidade legal para representa-la.

Outra condicionante é o laudo pericial constatando a falsificação ou a contrafação.

Nem sempre a vítima pode ser localizada ou mesmo identificada com presteza, de modo que, sem ela, há impedimento para a formalização da prisão em flagrante.

Da mesma forma, o laudo constatando a falsificação ou a contrafação deve ser elaborado de imediato e juntado na peça flagrancial, sob pena de contamina-la e torna-la imprestável.

A grande e esmagadora maioria dos flagrantes são levados a efeito com a ausência destas duas determinantes, fazendo com que a própria polícia pratique um crime no combate a outro.

Quanto ao comprador de produtos piratas, em tese, ele também pode ser autuado em flagrante, desde que saiba tratar-se de produto de crime.

Mas como o comprador poderia saber?

A própria lei tenta responder a esta indagação no § 3º do art. 180 do Código Penal, quando cita que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve ele presumir que "aquilo" foi obtido por meio criminoso.

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Não é necessário possuir mais do que 2 neurônios para que o comparador de um CD ou DVD vendido na rua, em uma banca precária, feita de tecido ou jornal, no chão de uma calçada, bem como pelo seu valor desproporcional com o de praxe, entenda que tenha sido obtido por meio ilegal.

No entanto, mais uma vez a lei esbarra em mecanismos que dificultam sua aplicação.

Em outras palavras, a pirataria é prevista como crime. No entanto, a lavratura da prisão em flagrante do autor esbarra em uma lei inadequada, que não acompanhou a evolução de seu tempo.

O crime de receptação, especificamente para os casos de pirataria, é de tão difícil demonstração que, na prática, equivaleria dizer ser quase impossível ou, de difícil efetivação, a autuação do infrator em flagrante.

Portanto, a resposta à indagação do título é positiva, na teoria, e negativa, na prática.

Isso não quer dizer que os sujeitos ativos do crime de pirataria ou de receptação não podem ser processados nem punidos. Podem, sim, bastando para tanto que o inquérito policial se inicie de outra forma que não a prisão em flagrante.

Nossa lei, infelizmente, não acompanhou a mudança de seu tempo e sua inadequação leva à sensação de impunidade.

Finalizando, o presente artigo, propositadamente, foi escrito sem qualquer compromisso com a tecnicidade que um artigo jurídico exige. Porém, deixa bem clara a inadequação das leis para um combate mais contundente dos crimes em comento.

Sobre o autor
Nadir Tarabori

Consultor Legal - Direito Estratégico • São Paulo (SP) <br><br>Formado pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie - Membro Efetivo da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo - Mestrado em Ciências Penais pela Université Paris - Panthéon - Sorbone.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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