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Retrocesso em solo paranaense.

A inconstitucionalidade do projeto de lei estadual 392/2015 PR e seus reflexos

Agenda 25/01/2016 às 21:08

Este artigo realiza uma análise do projeto de lei paranaense 392, aprovado no fim de 2015, que regula a advocacia dativa no Estado do Paraná, em face da Constituição da República Federativa do Brasil, apontando ainda vícios de economicidade e funcionalida

RESUMO: Este artigo realiza uma análise do projeto de lei paranaense 392, aprovado no fim de 2015, que regula a advocacia dativa no Estado do Paraná, em face da Constituição da República Federativa do Brasil, apontando ainda vícios de economicidade e funcionalidade.

Palavras-chave: Projeto de lei 392/2015 PR. Violação à Constituição da República Federativa do Brasil. Lesão ao erário público. Inefetividade na assistência judiciária gratuita.

1. INTRODUÇÃO

No fim do ano de 2015, foi aprovado, na Assembleia Legislativa do Paraná, o projeto de lei nº 392, de iniciativa do poder executivo, que possui, como um de seus capítulos, a regulação da advocacia dativa no Estado do Paraná.

A advocacia dativa é exercida por advogados devidamente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, os quais devem prestar assistência judiciária[2] gratuita aos necessitados, mediante o recebimento de honorários arbitrados pelo juiz e pagos pelo Estado, caso não haja Defensoria Pública instalada na região.

Segue uma síntese do projeto, para melhor entendimento.

O projeto de lei, de iniciativa do Governador Carlos Alberto Richa, cria uma espécie de regulamentação da figura do advogado dativo no Estado do Paraná; uma espécie de convênio.

Esta norma autorizará a Ordem dos Advogados do Brasil a criar uma relação de advogados para prestar assistência judiciária gratuita aos necessitados, onde não houver Órgão Defensorial instituído da forma devida, ou, ainda que este exista, em casos excepcionais, conforme art. 6º do projeto.

O projeto ainda prevê que os advogados serão remunerados por meio de honorários, os quais serão pagos pelo Poder Executivo, conforme tabela elaborada por resolução conjunta do Secretário de Estado da Fazenda e do Procurador-Geral do Estado, com prévia concordância do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, conforme art. 5º do projeto.

Outro ponto significativo é a limitação dos honorários a serem pagos aos advogados ao subsídio mensal dos defensores públicos, conforme art. 5º, §3º do projeto.

Por fim, como último destaque, fica o Poder Executivo autorizado a abrir crédito adicional de até R$ 15 milhões, para pagamento dos honorários arbitrados, conforme art. 15 do projeto.

Ocorre que o projeto desrespeita, flagrantemente, a Constituição em vários aspectos, conforme se passa a sopesar.

2. PRINCÍPIO DO CONCURSO PÚBLICO – VIOLAÇÃO AO ART. 37, II, CRFB

Por meio do projeto de lei nº 392/2015, será permitido que advogados prestem assistência judiciária aos necessitados, mediante remuneração paga pelo Poder Executivo.

Ocorre que a assistência judiciária é espécie do gênero assistência jurídica[3], serviço público[4] que, segundo a Lei maior, deve ser prestada pelo Estado, conforme art. 5º, LXXIV, CRFB[5].

Se é serviço público, que deve ser prestado pelo Estado, não resta dúvida que os agentes responsáveis pela assistência judiciária devem ser submetidos à regra do concurso público, sob pena de violação ao art. 37, II, CRFB.

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

É o que se depreende das palavras do professor José dos Santos Carvalho Filho[6], conforme segue.

A prévia aprovação em concurso público é, como regra, condição de ingresso no serviço público.

Explica ainda o professor que, somente em situações excepcionais previstas na própria constituição, é permitida a prestação de serviço público por particulares[7], mediante remuneração do Estado, o que não é o caso do advogado dativo.

Nessa linha de entendimento, Pedro Lenza estabelece que “Em razão da regra do concurso público, os provimentos derivados foram praticamente banidos do nosso ordenamento jurídico, sendo, como visto, enfaticamente afastados pela jurisprudência”[8].

Por isso é a defensoria pública a entidade apropriada para a prestação da assistência jurídica (o que incluiu a assistência judiciária) aos necessitados, mediante remuneração do Estado.

Foi como decidiu o Supremo Tribunal Federal, na ADI 3.700, de relatoria do Min. Ayres Brito, conforme segue:

A Defensoria Pública se revela como instrumento de democratização do acesso às instâncias judiciárias, de modo a efetivar o valor constitucional da universalização da justiça (inciso XXXV do art. 5º da CF/1988). Por desempenhar, com exclusividade, um mister estatal genuíno e essencial à jurisdição, a Defensoria Pública não convive com a possibilidade de que seus agentes sejam recrutados em caráter precário. Urge estruturá-la em cargos de provimento efetivo e, mais que isso, cargos de carreira. A estruturação da Defensoria Pública em cargos de carreira, providos mediante concurso público de provas e títulos, opera como garantia da independência técnica da instituição, a se refletir na boa qualidade da assistência a que fazem jus os estratos mais economicamente débeis da coletividade.” (ADI 3.700, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 15-10-2008, Plenário, DJE de 6-3-2009.)

O mesmo Tribunal Constitucional, no julgamento da ADI 4.270/SC, cujo objeto se mostrava semelhante ao presente projeto de lei, decidiu da seguinte maneira:

Nessa linha de argumentação, as requerentes lembram que a LC 80/1994 prevê, em seus artigos 110 e 112, a criação de cargos efetivos de defensor público, preenchidos mediante aprovação em concurso público. Essas regras, de nítido caráter impositivo, não poderiam deixar de ser observadas pelo Estado de Santa Catarina.

Embora, no caso de Santa Catarina, fosse convênio em substituição à defensoria e não em suplementação, a regra do concurso público é desrespeitada da mesma maneira, pois somente o defensor público, aprovado em concurso público, nos termos da constituição republicana, pode exercer a assistência jurídica gratuita aos necessitados mediante contraprestação econômica advinda do estado.

Mais uma vez, a Corte Constitucional entendeu, na ADI 4.163/SP, o que segue.

 Observa-se, por fim, mais uma vez, que regra primordial para a prestação de serviços jurídicos pela administração pública, enquanto atividade estatal permanente, é a do concurso público, constituindo situação excepcional e temporária a hipótese de prestação de assistência jurídica à população carente por profissionais outros que não defensores públicos estaduais concursados, seja mediante convênio com a OAB, seja mediante alternativas legítimas.

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Portanto a indicação de advogados para a prestação deste múnus público configura burla ao princípio do concurso público, devendo ser rechaçado do ordenamento jurídico, por se mostrar inconstitucional.

3. ENTIDADE RESPONSÁVEL PELA PRESTAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA – VIOLAÇÃO AO ART. 134, CAPUT, CRFB

O Poder Constituinte Originário, na ocasião da edição da atual Constituição, escolheu, dentre os modelos de assistência jurídica gratuita, o modelo da salaried staff model.

Conforme ensinam Diogo Esteves e Franklyn Roger Alves Silva, segundo este sistema, a assistência jurídica gratuita é prestada por “advogados” sob regime de dedicação exclusiva, mediante remuneração fixa prestada pelo Estado[9].

Da simples leitura do dispositivo constitucional descrito abaixo, percebe-se que foi atribuída à Defensoria Pública, instituição autônoma e permanente, somente ela, esta função, conforme previsão do art. 134 da CRFB descrito abaixo.

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.

O Supremo Tribunal Federal somente admitiu que a assistência judiciária com contraprestação fosse realizada por outra entidade que não a defensoria pública, no caso de inexistência efetiva desta, conforme trecho de acórdão do RE nº 135.328, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, o que deveria ser uma situação temporária e excepcional.

“LEGITIMIDADE - AÇÃO "EX DELICTO" – MINISTÉRIO PÚBLICO - DEFENSORIA PÚBLICA - ARTIGO 68 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CARTA DA REPÚBLICA DE 1988. A teor do disposto no artigo 134 da Constituição Federal, cabe à Defensoria Pública, instituição essencial à função jurisdicional do Estado, a orientação e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º, LXXIV, da Carta, estando restrita a atuação do Ministério Público, no campo dos interesses sociais e individuais, àqueles indisponíveis (parte final do artigo 127 da Constituição Federal). INCONSTITUCIONALIDADE PROGRESSIVA - VIABILIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE DIREITO ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE - ASSISTÊNCIA JURÍDICA E JUDICIÁRIA DOS NECESSITADOS – SUBSISTÊNCIA TEMPORÁRIA DA LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao Estado, no que assegurado constitucionalmente certo direito, cumpre viabilizar o respectivo exercício. Enquanto não criada por lei, organizada - e, portanto, preenchidos os cargos próprios, na unidade da Federação - a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de Processo Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele prevista. Irrelevância de a assistência vir sendo prestada por órgão da Procuradoria Geral do Estado, em face de não lhe competir, constitucionalmente, a defesa daqueles que não possam demandar, contratando diretamente profissional da advocacia, sem prejuízo do próprio sustento. (parte final do artigo 127 da Constituição Federal).

Isto é, na edição da lei maior, a Constituinte decidiu que a edição das leis seria atribuição do Poder Legislativo; a Administração seria de competência do Executivo; o exercício da jurisdição, do Poder Judiciário; a iniciativa da ação penal, do Ministério Público; a assistência jurídica gratuita, da Defensoria Pública.

Diante disso, é vedado, e ninguém duvida disso, que qualquer ente federativo possa criar uma nova entidade para legislar, para exercer jurisdição, para propor a ação penal.

A título de exemplo, seria o legislativo, por meio de lei, perpetrando convênio com a OAB, para que esta indicasse árbitros, com o fim de julgamento de lides; ou convênio com a entidade sus generis, com o propósito de autorizar advogados a proporem ações penais ou ações civis públicas.

Ainda hoje, em localidades longínquas, onde não existe a presença de Poder Judiciário estruturado, não há qualquer espécie de convênio entre o judiciário e qualquer outro órgão, para a prestação da jurisdição. O cidadão tem que se deslocar até uma localidade que sedie unidade judiciária.

Portanto qualquer criação diferente da Defensoria, com o propósito de prestar assistência jurídica gratuita, mediante remuneração do Estado, viola a Constituição de 1988, já que nenhum convênio, de qualquer natureza, pode se substituir à defensoria pública na sua atribuição.

Foi como decidiu o Supremo Tribunal Federal, na ADI 4163/SP, embora autorizando o convênio de forma excepcional e temporária, conforme trecho do voto do Min. Cezar Peluso que segue.

“É dever constitucional do Estado oferecer assistência jurídica gratuita aos que não disponham de meios para contratação de advogado, tendo sido a Defensoria Pública eleita, pela Carta Magna, como o único órgão estatal predestinado ao exercício ordinário dessa competência. Daí, qualquer política pública que desvie pessoas ou verbas para outra entidade, com o mesmo objetivo, em prejuízo da Defensoria, insulta a Constituição da República.”

Na mesma Ação Direta, o Supremo Tribunal Federal permitiu a realização de convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil, desde que realizado com a defensoria pública, titular da assistência jurídica gratuita, e somente no interesse desta, conforme segue:

5. Em relação ao art. 109 da Constituição Estadual, é, no entanto, possível mantê-lo na ordem jurídica, desde que interpretado conforme a Constituição. Para compatibilizar-lhe o sentido normativo emergente com o preceito fundamental da Constituição da República, deve entender-se que seu texto enuncia apenas a mera autorização ou possibilidade de celebração de convênios com a Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo, sem cunho de necessidade, nem de exclusividade, de modo a ficar garantida à Defensoria Pública, em rigorosa consonância com sua autonomia administrativa e funcional, a livre definição dos seus eventuais parceiros e dos critérios administrativo-funcionais de atuação.

Portanto, a edição da lei estadual constitui afronta ao art. 134, CRFB.

4. DA NECESSIDADE DE ESTRUTURAÇÃO DAS DEFENSORIAS PÚBLICAS – VIOLAÇÃO AO ART. 98, ADCT

Conforme já elucidado acima, cabe à defensoria pública, e somente a ela, a assistência jurídica gratuita aos necessitados, mediante remuneração do Estado, não sendo permitida a criação de outras entidades para substitui-la, total ou parcialmente.

Coube aos entes federados, a partir da promulgação da Lei Maior de 1988, a criação, onde não havia, e estruturação das respectivas defensorias públicas. Esta ação deveria ser imediata.

Entretanto, diante da omissão dos entes, o que, no Paraná, deu-se por mais de 20 anos, o Constituinte Derivado, atento à importância da defensoria pública, editou a Emenda Constitucional 80/2015, com o fito de confirmar e lembrar a ordem já emanada em 1988, qual seja, que a estruturação da defensoria pública era medida de urgência.

Hoje, com a edição da reforma constitucional, estabelece o art. 98, §1º dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias:

§ 1º No prazo de 8 (oito) anos, a União, os Estados e o Distrito Federal deverão contar com defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais, observado o disposto no caput deste artigo.

Conjugando o art. 134, CRFB com o art. 98, §1º, ADCT, depreende-se que os Entes devem, de forma imediata, paulatinamente, estruturar as respectivas defensorias e não aguardar que se chegue a 2022 para fazê-lo. No prazo de 8 anos, espera-se que todas as defensorias públicas deste país estejam devidamente estruturadas para atender, de forma eficiente, a população hipossuficiente.

Assim, o projeto de lei, de inciativa do Chefe do Executivo, vai de encontro ao que determina a Constituição da República.

Isso porque o Governador deixa de investir na Defensoria Pública, para insistir em métodos já declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal.

Em Santa Catarina, localidade em que a defensoria enfrenta as mesmas dificuldades, já há manifestação jurisdicional reconhecendo esta medida do executivo incoerente, conforme trecho de acórdão que segue.

8. Ao intentar a celebração de novo convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil para a prestação do serviço próprio da Defensoria Pública Estadual, sem que tenham sido nomeados os candidatos aprovados em [10]concurso público para o cargo de Defensor Público Estadual/SC a Administração Pública inverte a lógica legal, fixando como regra a atuação da 'Defensoria Pública Dativa' e, como exceção, a Defensoria Pública instituída pela Constituição da República.

A iniciativa do Executivo chancelada pelo legislativo configura retrocesso social e inviabiliza que a ordem constitucional seja efetivada.

Portanto, com base nestas considerações, evidente mais este acinte à norma constitucional.

5. PREJUÍZOS ECONÔMICOS DECORRENTES DA ATUAÇÃO DA ADVOCACIA DATIVA

A terrível escolha política no Estado do Paraná acarretará prejuízos financeiros ao ente.

A escolha, pelo Poder Constituinte de 1988, do método de assistência jurídica da salaried staff model baseou-se, indubitavelmente, na maximização do binômio custo-benefício.

Isso porque a manutenção de um sistema do tipo judicare, que prevê a assistência jurídica gratuita sendo realizada por advogados privados, mediante remuneração estatal, apresenta-se muito mais oneroso que o método adotado pela Lei Maior.

O Professor Virgílio Afonso da Silva, em parecer, no qual atuou na     qualidade de amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4163, sobre o convênio realizado entre a Defensoria Pública de São Paulo e a OAB/SP[11], levantou que eram gastos, em 2011, quase 4 vezes mais com o convênio (R$ 272 milhões) do que toda a infraestrutura da Defensoria Pública (R$ 75 milhões).

Segundo lição dos professores Diogo Esteves e Franklyn Roger Alves Silva, o modelo adotado pelo Brasil, se comparado a outros sistemas adotados no mundo, tem proporcionado um elevado grau de aproveitamento dos recursos públicos. Explicam os doutrinadores que, se os recursos direcionados às defensorias públicas fossem aplicados no sistema judicare, o resultado final em termos de números de pessoas atendidas e qualidade do serviço prestado seria inegavelmente menor[12].

Neste diapasão, estudo realizado pela Defensoria Pública do Paraná demonstrou que, num período de 01 ano, seriam necessários quase R$ 400 milhões para realizar todos os atendimentos que a Defensoria fez com seu orçamento de R$ 45 milhões.

Ainda que o projeto de lei limite, quanto aos honorários advocatícios, o pagamento de até R$ 13 mil (valor aproximado do subsídio do defensor público) para cada advogado, no mês, o dispositivo não limita o gasto global, que pode alcançar valores exorbitantes.

Também não pode ser entendido como limite, mas sim como um ponto de partida, o valor direcionado pelo Poder Executivo de R$ 15 milhões para esta atividade, porque tal entendimento violaria o acesso à justiça.

Isto porque configuraria uma situação esdrúxula o não atendimento ao assistido, sob o fundamento de que o valor direcionado para assistência jurídica pelos advogados dativos teria se exaurido.

Portanto, conclui-se que a atuação da advocacia dativa é um mal necessário a ser empregado, de forma temporária, no menor prazo possível, enquanto não haja uma defensoria pública devidamente estruturada.

6. OMISSÃO QUE CONFIGURA O ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL

O projeto de lei aprovado na ALEP, somado a diversas condutas violadoras da Constituição, configura, indubitavelmente, o estado de coisas inconstitucional.

Isso porque há violação massiva e generalizada de vários direitos constitucionais, já que a Defensoria Pública, com a sua atuação, presta assistência jurídica gratuita, viabiliza o direito à moradia digna, inclui socialmente, é instrumento do regime democrático, educa em direitos humanos, dentre outros.

Também há prolongada omissão das autoridades no cumprimento de suas obrigações para garantir os direitos violados, já que, desde 1988, a Defensoria Pública não está nem perto de sua estruturação devida.

O projeto de lei 392 é só mais uma prática inconstitucional a gerar, por exemplo, a necessidade de sempre ter que se buscar a tutela judicial para a obtenção do direito.

Não há adoção de medidas legislativas, administrativas e orçamentárias necessárias para estruturar a Defensoria Pública.

A ausência de defensoria pública traduz um problema social cuja solução depende da intervenção de várias entidades, da adoção de um conjunto complexo e coordenado de ações e da disponibilização de recursos adicionais consideráveis.

Diante do que foi exposto, resta demonstrado que a conduta do executivo é mais uma medida contra os direitos fundamentais garantidos na Constituição.

7. CONCLUSÃO

Diante de tudo que foi exposto, percebe-se que a atuação da advocacia dativa acarreta diversos inconvenientes, sejam eles legais, econômicos, operacionais. Além disso, traduz investimento em uma instituição fadada à inconstitucionalidade, em processo de extinção.

Por isso a importância de direcionamento de todo orçamento disponível em prol da defensoria pública, pois esta instituição pode alcançar resultados muito maiores com gastos bem reduzidos.

Isso porque a Defensoria Pública presta não somente a assistência no âmbito do processo, mas em toda gama do direito, conforme art. 5º, LXXIV, CRFB c/c art. 4º, LC 80/1994.

Foi como José Carlos Barbosa Moreira interpretou a Constituição, senão vejamos:

A Constituição abandona aquela orientação retritiva de cuidar do assunto com referência à defesa em juízo; abandona a concepção de uma assistência puramente judiciária, e passa a falar em assistência jurídica integral, obviamente, alarga de maneira notável o âmbito da assistência, que passa a compreender, além da representação em juízo, além da defesa judicial, o aconselhamento, a consultoria, a informação jurídica e, também, a assistência aos carentes em matéria de atos jurídicos extrajudiciais.dicial, o aconselhamento, a consultoria, a informaç

Ademais, a atuação da defensoria pública tem a característica de maximizar o acesso à justiça, já que esta instituição é proativa, educa em direitos, informa, ao contrário da advocacia dativa, que possui papel eminentemente passivo.

Segundo José Carlos Barbosa Moreira, há uma enorme demanda reprimida de prestação jurisdicional, resultante da circunstância de que grande parcela da população não tem qualquer informação sobre os seus direitos.

Não se pode olvidar que a atuação da defensoria pública tem a missão de prevenir certo número de demandas, tanto por prevenir que estas sejam levadas ao judiciário por falta de informação, quanto pelas novas atribuições conferidas à defensoria pública, quais sejam, a de homologação de transações, com força de título executivo, bem como por meio das ações coletivas.

E um passo importante na direção da constitucionalidade é a nomeação dos aprovados no II Concurso para o cargo de defensor público, sem prejuízo de novos concursos, a fim de grassar a defensoria por todo o Estado e alcançar toda população paranaense.


[2] Assistência judiciária se caracteriza pelos recursos e instrumentos indispensáveis à defesa dos direitos do necessitado em juízo. Segundo lição dos doutrinadores Diogo Esteves e Franklyn Roger Alves Silva, consiste no auxílio, ajuda ou amparo prestado estritamente no campo judicial.

[3] Assistência jurídica possui conotação bem amis ampla, abrangendo toda e qualquer atividade assistencial concernente ou relacionada ao universo do direito.

[4] Segundo a obra da professora Maria Sylvia Di Pietro, serviço público é toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente de direito público.

[5] LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

[6] Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Ed. Atlas. 2014. Pág. 635.

[7] Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Ed. Atlas. 2014. Pag. 638

[8] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo. Saraiva, 2013. pag. 1371

[9] ROGER, Franklyn. ESTEVES, Diogo. Princípios Institucionais da Defensoria Pública. Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 105.

[10] Processo: 5010696-38.2013.404.7200 (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO). Relator: FERNANDO QUADROS DA SILVA

[11] www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/20/RevistaDefensoria.pdf

[12] ROGER, Franklyn. ESTEVES, Diogo. Princípios Institucionais da Defensoria Pública. Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pag. 108.

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