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O desafio da violência à sociedade brasileira

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Agenda 11/12/2003 às 00:00

VII - Controle da Mídia pela Sociedade

O cidadão tem na Constituição amparo para exigir a qualidade na televisão. A Constituição vislumbra nos meios de comunicação uma visão social, por isso apenas cede a concessão para as emissoras funcionarem, podendo revogar a qualquer momento pelo descumprimento da lei. O papel social da televisão e de todos os outros meios de comunicação é educar, informar, divertir e prestar serviços, além de garantir o respeito aos padrões éticos e morais dos cidadãos, sendo ilegal qualquer tentativa de frustrar a consecução da finalidade social da mídia.

Para concretizas esses direitos à sociedade civil tem se organizado para unida reivindicar-los diante das autoridades responsáveis. E a sociedade clama por um maior controle sobre o que é exibido pelo Estado, porque a ele incumbe zelar pelo respeito à Constituição. O que a sociedade deseja não é censura, mas a busca por um meio democrático de controle e supervisão da programação televisiva.

Nesse contexto ARIOSVALDO PIRES am artigo publicado na internet possui posição arejada, vejamos:

A neurose contra qualquer tipo de censura é admissível, em parte, à vista de exemplos recentes e de triste memória, não impede ao menos a criação de um código de ética para a mídia, especialmente para a televisão, transformada, em certos programas, em um instrumento de deformação moral da infância e da juventude. (...) (grifei)

(...)

O que não se pode permitir é que a impaciência de alguns, a ambição e o oportunismo de outros gerem um estado de coisas capaz de comprometer o regime democrático. Os que têm memória de lembrar sabem a experiência vivida pelo Brasil em passado não muito distante, responsável por muitos problemas que aí estão como enigmas quase indecifráveis. Enfim, a solução para nossos problemas não será alcançada no laboratório das tiranias. (...) (grifei)

Se houvesse um plebiscito para averiguar se a população deseja ou não a exibição de programas com imagens violentas antes das 22 horas (vinte e duas), é quase certo que a resposta da população seria positiva. O mesmo ocorre com a exploração sexual nos meios de comunicação, levando crianças ao contato sexual precoce, com conseqüências como gravidez precoce, doenças venéreas e tantas outras.


VIII - Ação Preventiva: Estado e Sociedade Unidos

A sabedoria popular nos indica "é melhor prevenir do que remediar" e de fato a prevenção é melhor do que a repressão posterior. O fator prevenção é algo alcançado após um longo processo ligado à conscientização popular. Para a formação da consciência acerca do problema e da necessidade de tomar medidas para evitá-lo é necessário um relacionamento mais estreito entre o Estado e as comunidades. Esse relacionamento deve ser realizado por meio de campanhas educacionais.

Diante da omissão do Estado surgiram as Organizações não governamentais - ONGs, ligadas a movimentos sociais e a questões relevantes do desenvolvimento humano. As ONGs ligadas ao combate e prevenção à violência atuam diretamente no seio da população, desenvolvendo projetos na escola e nas comunidades, instaurando nas pessoas o senso de cidadania. O ambiente escolar é o maio mais propício para a disseminação de informações porque os jovens levarão seus conhecimentos aos adultos de sua família, de forma que a semente da cidadania brotará na família toda.

A população em geral desconhece seus direitos, ignorando sua condição de cidadão ativo na sociedade. Então a tarefa a ser desenvolvimento é ambientar o cidadão no seio social, fornecendo a ele atividades que desenvolvam seu potencial de aprendizado, debatendo questões relacionadas à violência, direitos humanos e seu papel na sociedade. Através dessas iniciativas particulares estamos conseguindo excelentes resultados.


IX - A Dignidade Humana e a Pena Estatal

Dignidade é o mínimo de respeitabilidade que um ser humano merece receber do Estado e da população em geral. Toda forma de desrespeito à dignidade humana é uma violência e não apenas os crimes que deixam corpos ou feridos.

O Estado tem falhado no controle e repressão da violência e a prevenção tem advindo da própria sociedade organizada. Nesse cenário a impunidade corrói a estrutura do poder constituído, taxando-o de incapaz, de inepto, ou até mesmo inútil. A população sem perspectiva cede a qualquer proposta aparentemente de fácil aplicabilidade e que propicie bons resultados, como a pena de morte e a prisão perpétua.

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Diante de tanta violência a sociedade silencia para os abusos policiais, nos casos em que não é parte envolvida diretamente. Resta aos espancados, torturados e seviciados pela força repressiva estatal a "lei do silêncio", na qual quem delata encontra a morte próxima.

Se for permitido que a polícia possa agir contrariamente à lei, estaremos todos sujeitos a sofrer abusos porque ficará a cargo da própria polícia decidir quem é ou não bandido e executar o castigo sumariamente. Essa situação é perigosa demais. Somente garantindo a todos a dignidade humana que a teremos para nós mesmos.

Nesse momento de instabilidade em todos os setores da sociedade, marcado pela corrupção, desrespeito à dignidade humana, expansão do crime organizado, do tráfico de entorpecentes, e decadência do Estado enquanto instituição, os problemas sociais parecem ganhar dimensão e a criminalidade e violência também.

A sociedade recua temerosa da violência em suas casas, procurando sair menos, evitar saídas à noite ou visitar locais perigosos no perímetro urbano. O cidadão torna-se encarcerado em sua residência, portador de inúmeras fobias oriundas do temor de ser vítima de violências. Nesse turbilhão de emoções os discursos demagógicos ganham força e adeptos, apontando meios esdrúxulos como solução dos conflitos urbanos.

A pena de prisão é colocada como solução para o crime, generalizando sua aplicação o máximo possível, de modo a evitar o contato da população com os infratores. Essa idéia de penalização máxima foi implantada pela mídia, através do show dramático da violência urbana. Diante da visibilidade de tantos crimes bárbaros, e só são estes os abordados, a população adquiriu o temor de ser vítima dos mesmos crimes que vê na mídia a qualquer instante.

O crime não é fruto da atualidade, sempre existiu e sempre existirá. O crime não tem óbices de nenhum caráter, ocorre em todas as camadas sociais, e em todas as nações. Diante da impossibilidade de extinção dos crimes, devemos controla-los a níveis aceitáveis e que viabilizem a convivência em sociedade.

A história evolutiva da pena iniciou-se com o significado de tortura ou castigo, vindo após a ser uma medida terapêutica, com finalidades de cura do infrator em seu mal social, possibilitando seu retorno à sociedade em condições de nela permanecer sem cometer novos delitos. A finalidade é construir uma sociedade tranqüila, através da recuperação do infrator.

Ao passo que a finalidade da pena não vem sendo cumprida, observamos o ingresso dos apenados da sociedade com temor, porque a prisão não recupera o doente social, acentua sua patologia. As conseqüências do nosso sistema penal falido são retratadas em livros, filmes e pela mídia quando demonstram as constantes rebeliões nos presídios superlotados.

A superlotação não é um problema a ser resolvido somente com a construção de mais presídios, mas também com a recuperação dos encarcerados para que no futuro não mais comentam crimes e retornem ao estabelecimento penal. Aliado a isso, faz-se necessário graduar e adequar as penas em relação aos crimes, possibilitando aos crimes de menor ofensa à sociedade penas cada vez menores e possibilidade ampliada de serviços comunitários, acordo penal para contribuição com cestas básicas a instituições de caridade.

O aparato estatal necessita de voluntários nas escolas e hospitais por exemplo, porque não aproveitar o infrator de crimes mais leves a prestação de serviços como pintura de escolas, recuperação de jardins públicos com poda de árvores, limpeza de terrenos públicos tomados pelo mato e aproveitamento dos infratores também na construção de obras públicas. Esses serviços têm caráter indenizatório para a sociedade que ficará satisfeita com os serviços realizados.

Já existem algumas penas alternativas, porém a aplicabilidade ainda é restrita pelas próprias disposições legais. E as penas alternativas apresentam inúmeras vantagens tais como: redução dos gastos estatais com presidiários; menor impacto social nas famílias dos infratores porque não seria retirado do convívio familiar; impedir o contato do infrator de crimes leves com o crime organizado instalado nas prisões. Há desvantagens também, porém o risco de não atuação dessa medida ressocializadora no âmago do ser repreendido também ocorre no encarceramento.


X - Conclusões

A história brasileira em sua constituição é marcada pela violência. Já no nosso "descobrimento", na ocupação européia do nosso território os portugueses dizimaram a população indígena quase levando a sua completa extinção, por inúmeras razões, mas principalmente as econômicas. E durante toda a nossa história, marcada por pequenos levantes e revoluções, tivemos a presença da violência.

O período militar é caracterizado pela inexistência dos direitos humanos, de sorte que os militares tudo podiam e cometiam todo o tipo de abusos, inclusive seqüestros, assassinatos, torturas e atentados. Essa época deixou marcas profundas na sociedade brasileira que aprendeu a prezar e lutar pela liberdade a todo custo.

Diante da complexidade que envolve a violência faz-se necessário o desenvolvimento de pesquisas quantitativas e qualitativas confiáveis, para a partir delas ser possível a formação de uma política de segurança pública eficaz, passo fundamental para iniciar a melhoria da segurança para a população.

O Plano Nacional de Segurança Pública deve ater-se às peculiaridades regionais, buscando atender o imenso contingente territorial brasileiro de maneira democrática, abrindo discussão popular por meio de audiências públicas em todos os estados da federação. Ademais, o Plano deve trazer diretrizes gerais, deixando as específicas para os governos e prefeituras que estão mais próximos da realidade prática de seu território. Para garantir a eficácia, devem ser estabelecidas metas a serem alcançadas e encontros anuais para discuti-las e sanar eventuais problemas de curso.

Paralelamente a esta iniciativa o Programa Nacional de Direitos Humanos deve ser retomado, e suas metas restabelecidas, de forma a propiciar melhoria da imagem internacional do país, que mede a civilização pelo critério dos direitos humanos respeitados. Finalmente, é importante articular as iniciativas de reforma das polícias (cursos de reciclagem, direitos humanos, acompanhamento psicológico, etc.), do sistema penitenciário e a introdução de penas alternativas.

Em concomitância deve haver o incentivo financeiro a entidades não governamentais, mediante prestação de contas, para viabilizar projetos de cidadania e conscientização social. A criação de programas governamentais de educação e conscientização popular, porque a sociedade civil organizada atuante é capaz de reduzir a criminalidade e a violência no país, não sendo tarefa apenas do Estado, mas de toda a sociedade.

O poder público incapaz de controlar a violência deixa o cidadão entregue à própria sorte. E os braços do poder público, representados pela polícia, poder executivo, legislativo e judiciário está constantemente envolvido com escândalos de corrupção ou conivência com a criminalidade organizada, também chamada de poder paralelo.

Os meios de comunicação exercem papel essencial num Estado Democrático, porque garantem a publicidade a todos os atos do Estado, mostrando inclusive a atividade criminosa, não permitindo o maquiamento da realidade pelo Estado, como acontecia na ditadura militar. Mas quando a atividade da mídia revela-se causadora de violência, desrespeitando os direitos individuais, afrontando os padrões de moral e ética da sociedade, é justo que de forma democrática a população exerça uma forma de controle. Essa forma de controle possibilitará o melhor uso da mídia na sociedade, propiciando o crescimento humanístico dos cidadãos brasileiros e educando-os para o mundo globalizado.

Somente a sociedade civil pode legitimar os atos de um governo democrático e é este o caminho seguro para o combate à violência com possibilidades de êxito. E é a mobilização da população e sua imediata tomada de conscientização é que irão garantir que toda a instrumentação fornecida pelo Estado irá surtir o efeito esperado. É nesse contexto que iremos implementar e fortalecer nossa cidadania infante, condição básica para qualquer avanço da sociedade brasileira.


Referência Bibliográfica

PIRES, Ariosvaldo de Campos. Reflexão sobre a independência. Imprensa Oficial de Minas Gerais. Disponível em: <http://www.iof.mg.gov.br/iodiario/comemorativo/07091999/Artigo9.htm>. Acesso em: 10 jul. 2003.

Sobre a autora
Dayse Coelho de Almeida

Professora do Curso de Direito da Universidade Federal de Sergipe - UFS e do Curso de Direito da Faculdade de Sergipe – FaSe, advogada cível e trabalhista do escritório Almeida, Araújo e Menezes Advogados Associados - ALMARME, Mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, pós-graduada em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas, pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes – UCAM/RJ. Coautora dos livros: Relação de Trabalho: Fundamentos Interpretativos para a Nova Competência da Justiça do Trabalho, LTr, 2005 e 2006; Direito Público: Direito Constitucional, Direito Administrativo e Direito Tributário, PUC Minas, 2006 e Roda Mundo 2006, Editora Ottoni, 2006. Membro do Instituto de Hermenêutica Jurídica – IHJ, da Associação Brasileira de Advogados – ABA e do Instituto Nacional de Estudos Jurídicos – INEJUR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Dayse Coelho. O desafio da violência à sociedade brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 158, 11 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4611. Acesso em: 25 dez. 2024.

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