6 CONCLUSÃO
O presente trabalho teve por objetivo estudar a matéria estrito cumprimento do dever legal à luz da tipicidade conglobante, facilitando, assim, o trabalho de todos os aplicadores do Direito de na área penal, já que na verificação de condutas delitivas há casos em que a constatação da inocorrência de um crime pode ser verificada desde a análise do primeiro elemento constitutivo do crime, que é o fato típico. Tendo por base a teoria da Tipicidade Conglobante é possível eliminar condutas que apenas aparentam ser delitivas, por meio do impedimento de existência de antinomias no ordenamento jurídico. Condutas que são fomentadas ou determinadas por lei, não podem ser proibidas.
Para a análise do crime a partir da teoria analítica-tripartida, há que se observar primeiramente se a conduta se encaixa na descrição da tipicidade. Posteriormente, observa-se a ilicitude e, por último, a culpabilidade. Havendo a exclusão de um desses, o sujeito ativo do crime não será responsabilizado.
Como visto, a tipicidade é o juízo de subsunção entre a conduta praticada pelo agente no mundo real e o modelo descrito no tipo penal. É a operação pela qual se analisa se o fato praticado pelo agente encontra correspondência em uma conduta prevista em lei como crime ou contravenção.
Por sua vez, a ilicitude é a contrariedade entre o fato típico praticado por alguém, ou seja, a conduta e o ordenamento jurídico, capaz de lesionar ou expor a perigo de lesão bens jurídicos penalmente tutelados.
Os institutos estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito fazem parte das excludentes de ilicitude.
Entende-se por estrito cumprimento do dever legal a situação em que a norma jurídica impõe uma conduta a determinada pessoa, e esta a cumpre rigorosamente da forma descrita em lei, deve-se atentar que a conduta descrita em lei é obrigatória, e não uma simples faculdade da pessoa em cumpri-la ou não.
Para os não adeptos da Teoria da Tipicidade Conglobante dos autores Zaffaroni e Pierangeli, tais causas se tratam de causas legais de exclusão de ilicitude, em que são praticados atos penalmente tipificados, porém abarcados pela exclusão da ilicitude em virtude de uma ponderação de bens juridicamente protegidos que, ameaçados ou em virtude de iminente ameaça, podem ser sacrificados conforme o caso em concreto.
Para a teoria da Tipicidade Conglobante, que prevê a tipicidade composta em tipicidade formal e tipicidade conglobante, esta subdividida em antinormatividade e tipicidade material, formando, assim, a tipicidade penal, o estrito cumprimento de um dever legal e o exercício regular de um direito são atos normativos (determinados por lei), não excluindo a ilicitude, mas a própria tipicidade.
De acordo com a Teoria da Tipicidade Conglobante, a hipótese de estrito cumprimento de dever legal, assim como a de exercício regular de direito, quando fomentado, por serem situações permitidas pelo direito não, se enquadram na necessidade da conduta punível ser antinormativa.
A tipicidade conglobante é a comprovação de que a conduta legalmente típica está também proibida pela norma, o que se afere separando o alcance da norma proibitiva conglobada com as demais normas do ordenamento jurídico.
Assim, há exclusão da tipicidade e não da ilicitude, excluindo a antinormatividade sob pena de o legislador ter criado situações antinormativas praticadas pela administração, como, por exemplo, no caso de um policial que prende, utilizando de força física necessária e indispensável, sujeito delinquente, atuando em estrito cumprimento de um dever legal.
Portanto, ao cumprir uma ordem ou faculdade legal, não é correto dizer que uma pessoa cometeu um fato típico, posto que o próprio Estado incentivou ou impôs essa conduta, então o fato será atípico. Portanto, se a conduta é fomentada ou determinada por lei, não há necessidade de lançar mão de uma causa de justificação, tendo em vista que o próprio ordenamento jurídico obrigou ou estimulou essa conduta.
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Notas
[1] A doutrina dominante no país defende o conceito tripartido de infração penal: fato típico, antijurídico e culpável. Adotam esta concepção Hans Welzel, Claus Roxin, Eugênio Zaffaroni e José Pierangeli, César Roberto Bitencourt, Francisco de Assis Toledo, Luiz Regis Prado, Rogério Greco e Cláudio Brandão. Há quem adote uma concepção bipartida em que os elementos configuradores da infração penal seria somente o fato típico e antijurídico, com a culpabilidade sendo mero pressuposto da pena. São defensores desta posição Damásio de Jesus, Júlio Mirabete, Celso Delmanto, René Ariel Dotti e Fernando Capez.
[2]GRECO, Rogério. Direito penal. 2005, p. 157.
[3] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 549, 550.
[4] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 551.
[5] LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. 2. Ed. Porto Alegre: Fabris, 2003. p. 143.
[6] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 362.
[7] RT 644/311.
[8] Súmula vinculante 11: “só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
[9] 70046968293 RS , Relator: Artur Arnildo Ludwig, Data de Julgamento: 13/09/2012, Sexta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 21/09/2012.
[10] BELING, Ernst von. Esquema de derecho penal. La doctrina del delito-tipo. Trad. De Sebástian Soler. Buenos Aires: Depalma, 1944, p. 59.
[11] MASSON, Cleber Rogério. Direito penal esquematizado – Parte geral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2009, p. 195.
[12] MASSON, Cleber Rogério. Direito penal esquematizado – Parte geral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2009, p. 230.
[13] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. Volume I: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 190.
[14] MUÑOZ CONDE, Francisco. Teoria geral do delito, p. 41.
[15] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 549.
[16] BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico, p. 80.
[17] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. Parte Geral. 7 ed. São Paulo: RT, 2007. v. 1, p. 395.
[18] WELZEL, Hans. Derecho penal alemán.
[19] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. p. 460.