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Aplicabilidade do contrato de licença GPL em face do ordenamento jurídico brasileiro

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Agenda 27/12/2003 às 00:00

7. Conclusão

A reciprocidade é o conceito basilar da licença GPL. O autor de um software cede os seus direitos patrimoniais exclusivos de utilizar, fruir e dispor de sua obra para toda a sociedade com a condição resolutória de que a referida obra, suas derivações e os produtos nela baseados sejam também licenciados nos mesmos termos. O conhecimento adquirido da sociedade deve ser devolvido para a sociedade - a licença GPL é a tradução jurídica deste ideal comunitário do software livre.

No que tange ao ordenamento jurídico brasileiro, sobrelevam-se, pela notória desconformidade jurídica, as cláusulas de exclusão de responsabilidades e ausência de garantias. Não podemos olvidar que cláusulas semelhantes são comuns, também, nas licenças de softwares proprietários, conhecidas como EULA (End User License Agreements).

Também é problemática a cláusula que permite a extensão da utilização da obra, para modalidades ainda não existentes na época de sua constituição. O autor de uma obra literária não poderia prever, há vinte anos atrás, a utilização de sua criação em um e-book. Se este autor cedeu os seus direitos patrimoniais para utilização em todos os meios existentes na época da cessão, vedada a sua utilização para a novel forma surgida a posteriori.

No que concerne à integridade do software, notadamente quando de orientação artística, sobreleva-se a possibilidade de lesão à reputação do autor, com implicações jurídicas que exigem um estudo mais minudente.

Sérgio Amadeu da Silveira, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), afirma, no livro, de sua co-autoria, "Software Livre e Inclusão Digital":

"O movimento de software livre é a maior expressão da imaginação dissidente de uma sociedade que busca mais do que a sua mercantilização. Trata-se de um movimento baseado no princípio do compartilhamento de conhecimento e na solidariedade praticada pela inteligência coletiva conectada na rede mundial de computadores."

Luis Millán Vázquez de Miguel, conselheiro de Educação, Ciência e Tecnologia do governo de Extremadura, região da Espanha, concluindo seu artigo "Os poderes públicos como garantia de uma sociedade do conhecimento para todos" - também do livro retro mencionado – onde expõe o bem sucedido projeto de implantação de software livre naquela região espanhola, assevera:

"O método tradicional da ciência é mais válido que nunca: o fundamental é compartilhar a resolução de problemas, difundindo ao máximo as soluções, para que continuem sendo ampliadas e melhoradas por outros. A firme convicção de que a igualdade é o que permite o exercício da liberdade, e que essa é a fonte de riqueza do futuro, nos permite dizer, de qualquer tribuna, que nós somos o futuro."

Na avaliação da juridicidade da licença GPL deve-se atentar para o seu aspecto teleológico jungido com o preceito legal insculpido no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro:

Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.


Notas

01. Até o dia 30/08/2003 existiam 43 licenças de software livre aprovadas pela fundação OSI (http://www.opensource.org/licenses).

02. (http://sourceforge.net). A segunda licença mais utilizada é a LGPL com 5,6% e a terceira a BSD com 2,8%.

03. Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPS) – Negociações realizadas na rodada do Uruguai (1986-1994). Este acordo cobre as áreas de direitos autorais e conexos, marcas, patentes, desenhos industriais, indicações geográficas, topografias de circuitos integrados e segredos comerciais.

04. Article 10 (Computer Programs and Compilations of Data)

1. Computer programs, whether in source or object code, shall be protected as literary works under

the Berne Convention (1971).

2. Compilations of data or other material, whether in machine readable or other form, which by

reason of the selection or arrangement of their contents constitute intellectual creations shall be protected

as such. Such protection, which shall not extend to the data or material itself, shall be without prejudice

to any copyright subsisting in the data or material itself.

05. Art 9º do Decreto-Lei 4.657: Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. § 2º : A obrigação resultante de contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.

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06. Art. 1.275 da Lei 10.406/2002

07. Art. 27 da Lei 9.610/98: Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis.

08. Art. 111 da Lei 10.406/2002: O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.

09. Art 2o §1o da Lei 9.609/98 : Não se aplicam ao programa de computador as disposições relativas aos direitos morais, ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa de computador e o direito do autor de opor-se a alterações não-autorizadas, quando estas impliquem deformação, mutilação ou outra modificação do programa de computador, que prejudiquem a sua honra ou a sua reputação.

10. Marcelo Tosatti pertencia ao quadro de pessoal da Conectiva (www.conectiva.com.br) mas se transferiu, recentemente, para a empresa Cyclades (www.cyclades.com)

11. O Kernel é a parte nuclear de um Sistema Operacional como o Linux, onde estão implementados os serviços básicos do providos pelo sistema (gerência de memória, sistema de arquivos, escalonamento de processos, interface com dispositivos,etc).

12. Um Kernel estável é o que já saiu do ciclo de desenvolvimento e testes e está pronto para ser distribuído (apresenta numeração par, como 2.2, 2.4 e a recente 2.6).

13. O GNU/Linux é um Sistema Operacional livre com crescente participação no mercado. O termo GNU/Linux se refere ao conjunto formado pelo Kernel mais os pacotes selecionados por uma determinada distribuidora (Conectiva,SuSe,SlackWare,RedHat,Debian,Mandrake,etc).

14. Linus Torvalds, programador finlandês criador do kernel do Linux.

15. Art. 121 da Lei 10.406/2002: Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.

16. Art. 474 da Lei 10.406/2002: A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial.

17. Art. 553 da Lei 10.406/2002: O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral.

18. Obrigação resultante do vínculo da pessoa com um bem ou direito real de uso e gozo sobre este bem. As despesas com condomínio é um exemplo desta obrigação.

19. GPL Section 9 . The Free Software Foundation may publish revised and/or new versions of the General Public License from time to time. Such new versions will be similar in spirit to the present version, but may differ in detail to address new problems or concerns. Each version is given a distinguishing version number. If the Program specifies a version number of this License which applies to it and "any later version", you have the option of following the terms and conditions either of that version or of any later version published by the Free Software Foundation. If the Program does not specify a version number of this License, you may choose any version ever published by the Free Software Foundation.

20. You may charge a fee for the physical act of transferring a copy, and you may at your option offer warranty protection in exchange for a fee.

21. GPL (Sections 11,12)

NO WARRANTY

11. BECAUSE THE PROGRAM IS LICENSED FREE OF CHARGE, THERE IS NO WARRANTY FOR THE PROGRAM, TO THE EXTENT PERMITTED BY APPLICABLE LAW. EXCEPT WHEN OTHERWISE STATED IN WRITING THE COPYRIGHT HOLDERS AND/OR OTHER PARTIES PROVIDE THE PROGRAM "AS IS" WITHOUT WARRANTY OF ANY KIND, EITHER EXPRESSED OR IMPLIED, INCLUDING, BUT NOT LIMITED TO, THE IMPLIED WARRANTIES OF MERCHANTABILITY AND FITNESS FOR A PARTICULAR PURPOSE. THE ENTIRE RISK AS TO THE QUALITY AND PERFORMANCE OF THE PROGRAM IS WITH YOU. SHOULD THE PROGRAM PROVE DEFECTIVE, YOU ASSUME THE COST OF ALL NECESSARY SERVICING, REPAIR OR CORRECTION.

12. IN NO EVENT UNLESS REQUIRED BY APPLICABLE LAW OR AGREED TO IN WRITING WILL ANY COPYRIGHT HOLDER, OR ANY OTHER PARTY WHO MAY MODIFY AND/OR REDISTRIBUTE THE PROGRAM AS PERMITTED ABOVE, BE LIABLE TO YOU FOR DAMAGES, INCLUDING ANY GENERAL, SPECIAL, INCIDENTAL OR CONSEQUENTIAL DAMAGES ARISING OUT OF THE USE OR INABILITY TO USE THE PROGRAM (INCLUDING BUT NOT LIMITED TO LOSS OF DATA OR DATA BEING RENDERED INACCURATE OR LOSSES SUSTAINED BY YOU OR THIRD PARTIES OR A FAILURE OF THE PROGRAM TO OPERATE WITH ANY OTHER PROGRAMS), EVEN IF SUCH HOLDER OR OTHER PARTY HAS BEEN ADVISED OF THE POSSIBILITY OF SUCH DAMAGES.

22. U.C.C.-ARTICLE-2 SALES

PART 3.GENERAL OBLIGATION AND CONSTRUCTION OF CONTRACT

§ 2-316. Exclusion or Modification of Warranties

(1) Words or conduct relevant to the creation of an express warranty and words or conduct tending to negate or limit warranty shall be construed wherever reasonable as consistent with each other; but subject to the provisions of this Article on parol or extrinsic evidence (Section 2-202 ) negation or limitation is inoperative to the extent that such construction is unreasonable.

2) Subject to subsection (3), to exclude or modify the implied warranty of merchantability or any part of it the language must mention merchantability and in case of a writing must be conspicuous, and to exclude or modify any implied warranty of fitness the exclusion must be by a writing and conspicuous. Language to exclude all implied warranties of fitness is sufficient if it states, for example, that "There are no warranties which extend beyond the description on the face hereof."

(3) Notwithstanding subsection (2)

(a) unless the circumstances indicate otherwise, all implied warranties are excluded by expressions like "as is", "with all faults" or other language which in common understanding calls the buyer''s attention to the exclusion of warranties and makes plain that there is no implied warranty; and

(b) when the buyer before entering into the has examined the goods or the sample or model as fully as he desired or has refused to examine the goods there is no implied warranty with regard to defects which an examination ought in the circumstances to have revealed to him; and

(c) an implied warranty can also be excluded or modified by course of dealing or course of performance or usage of trade.

(4) Remedies for breach of warranty can be limited in accordance with the provisions of this Article on liquidation or limitation of damages and on contractual modification of remedy (Sections 2-718 and 2-719 ).

23. Lei Nº 8.078/90 Art.2 - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

24. Lei Nº 8.078/90 Art.3º § 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes de relações de caráter trabalhista.

25. Lei Nº 8.078/90 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor, pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;

Sobre o autor
Josafá Rodrigues Carvalho Silva

Analista do Banco Central do Brasil; Mestre em Ciência da Computação (UFMG)e Acadêmico de Direito na UniCEUB –DF;

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Josafá Rodrigues Carvalho. Aplicabilidade do contrato de licença GPL em face do ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 174, 27 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4632. Acesso em: 23 nov. 2024.

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