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O Direito Aduaneiro como ramo autônomo do direito

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Agenda 05/02/2004 às 00:00

Já de longa data, em virtude das características, das normas e dos princípios relativos ao comércio exterior, alguns autores gritam sobre a existência de um novo ramo autônomo do Direito, especificamente o Direito Aduaneiro.

Sumário 1. PRIMEIRAS LINHAS DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA. 1.1 Histórico. 2. DA EXISTENCIA DE UM DIREITO ADUANEIRO. 2.1. Conceito e natureza jurídica. 2.3. Pressupostos de existência do direito aduaneiro. 2.3.1. Território aduaneiro. 2.3.2 Mercadoria. 2.3.2.1. Bem móvel corpóreo. 2.3.2.2. Classificação e nomenclatura das mercadorias. 2.3.3. Exportações. 2.3.3.1. Exportações com cobertura cambial. 2.3.3.2. Exportações sem cobertura cambial. 2.3.4 Importações. 2.3.4.1. Conceito. 2.4. Fontes. 3 CONCLUSÕES. 4 BIBLIOGRAFIA.


1 PRIMEIRAS LINHAS DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO COMÉRCIO INTERNACIONAL

1.1 Histórico

Desde os tempos mais remotos que o sentimento egoístico do homem tem direcionado sua vontade para a posse, despertando em si um sentimento de tomar do próximo, se assim for necessário, o objeto de seu desejo.

Em um estágio mais elevado da civilização, o homem substituiu este sentimento animalesco pela racionalidade da troca para obter aquilo que desejava, rabiscando os contornos da forma mais primitiva de comércio.

Conforme nos ensina Ênio Neves LABATUT [1], em sua brilhante obra Teoria e Prática de Comércio Internacional, a história, baseada em achados nas sepulturas da Escandinávia, mostrou que já há alguns milênios antes da era Cristã, chegaram ao norte da Europa mercadorias que provieram do Chipre e do Egito. Daí, depreende-se que estes objetos chegaram de mão em mão até o lugar onde foram encontrados.

Esse comércio de troca foi-se ampliando, bem como aumentando o número de produtos mercantis em decorrência da expansão dos povos, o que culminou com a organização da divisão do trabalho e a diversificação da atividade econômica.

Cabe salientar que durante a antiguidade e parte da idade média o comércio era visto como uma atividade insignificante na vida econômica dos povos. Este comércio limitava-se a artigos de luxo e pequenos objetos de fácil transporte.

É de vasto conhecimento histórico que os primeiros comerciantes que se tem conhecimento foram os egípcios, impulsionados pela atividade agrícola nacional e pela abundante fertilidade da lama do rio Nilo. A evolução agrícola provocou o desenvolvimento da indústria, que obteve índices técnicos excelentes para a época.

Somente em torno de 600 a.C. foram abertos aos navegantes os portos do baixo Nilo, que, aos poucos, foi-se tornando um dos principais pólos do comércio mundial da antiguidade.

Grande expoente da indústria e comércio foram os Fenícios, que tiveram nestas modalidades suas principais atividades. Este povo foi educado para a navegação e o comércio marítimo. Habitavam uma estreita faixa litorânea da Síria, entre o mar e as montanhas.

Até a aparição dos gregos, na época helênica, os fenícios foram os únicos intermediários das mercadorias mais procuradas naquele tempo. O que se destaca, no estudo do comércio dos fenícios, é o fato de que eles, com notável perspicácia, observavam as diferentes modas e costumes dos vários povos com os quais eles mantinham contato, e, com grande rapidez, levavam aos mesmos aquilo de que tivessem predileção e necessidade.

A hegemonia fenícia foi quebrada pelos gregos, seus herdeiros no comércio.

Do século XII ao VIII a.C. apenas uma economia vicejou na Grécia: a economia doméstica. A partir daí, e durante os séculos V, IV e III a.C., expandiu-se um sistema econômico de trocas mais amplas.

O desenvolvimento filosófico do povo grego imprimiu uma orientação geral ao pensamento, relegando a segundo plano o estudo independente e aprofundado dos problemas econômicos, devido à idéia de preponderância do geral sobre o particular, da igualdade e do desprezo pela riqueza. Em dada época, houve uma mudança na situação mundial e mercantil. A Grécia não mais estava no centro da política e do tráfego. A vida comercial do povo grego se diversificou.

Os Etruscos acabaram por substituir os gregos; eles se tornaram grandes navegadores e comerciantes e constituíam a terceira potência marítima da época, atrás dos fenícios e gregos. A

Etrúria imperava sobre a península itálica até o ano de 600 a.C. quando, após o enfraquecimento provocado por sucessivos ataques de inimigos externos, foi dominada pelos romanos.

Os romanos, por sua vez, desenvolveram a economia com mais intensidade que os gregos.

O governo romano cortou a Itália com excelentes estradas, que davam acesso a todas as províncias, formando uma unidade econômica baseada nas suas vias de comunicação.

A navegação no Mediterrâneo foi fator favorável à grande expansão do intercâmbio de mercadorias que originou poderosas companhias mercantis e sociedades por ações. A linha de pensamento dos romanos concentrava-se inteiramente no fato político, e suas idéias foram, de maneira geral, tomadas de empréstimo aos gregos.

Fato marcante desta época ficou a cargo dos jurisconsultos romanos, que em seus trabalhos notáveis assentaram as bases do direito e das obrigações, dotados de acurado senso econômico.

Durante a hegemonia romana, todas as regiões litorâneas do mediterrâneo estavam agrupadas em um núcleo político, constituindo uma área mercantil cerrada. O Ocidente latino tinha como opositor o Oriente grego. Nasceu então, entre as duas áreas, Constantinopla, que se tornou uma nova capital do comércio mundial. Constantinopla absorveu o Direito romano, a arquitetura bizantina, a cultura dos gregos e se desenvolveu nas artes industriais, tornando-se, por muitos séculos, a rainha econômica e cultural do mundo.

Neste prisma, começou a engatinhar o comércio no âmbito internacional


2 DA EXISTÊNCIA DE UM DIREITO ADUANEIRO

Já de longa data, em virtude das características, das normas e dos princípios relativos ao comércio exterior, alguns autores gritam sobre a existência de um novo ramo autônomo do Direito, especificamente o Direito Aduaneiro.

Nós, sob estes holofotes, nos coadunamos com aqueles que crêem na existência do direito aduaneiro como um ramo autônomo.

Conforme comentado, não são poucos aqueles que aderem ao nosso pensamento e lançam sementes que trepidam pelo seu reconhecimento.

No entender de José Lence CARLUCI [2], a existência do direito aduaneiro tem como prenúncio: "O comércio internacional como seu antecedente e a relação aduaneira como seu conseqüente, são os dois fatores condicionantes de um direito aduaneiro, aliados à especificidade de princípios e normas."

Segue o grande mestre José Lence CARLUCI [3], em suas exposições:

Na esteira de Idelfonso Sánchez González podemos conceituar o Direito Aduaneiro como o conjunto de normas e princípios que disciplinam juridicamente a política aduaneira, entendida esta como a intervenção pública no intercâmbio internacional de mercadorias e que constitui um sistema de controle e de limitações com fins públicos.

No entendimento do ilustre Máximo Carvajal CONTRERAS [4], o direito aduaneiro se define, da seguinte forma:

(…) conjunto de normas jurídicas que regulan, por medio de un ente administrativo, las actividades o funciones del estado en relación al comercio exterior de mercancías que entren o salgan en sus diferentes regímenes al o del territorio de un país, así como de los medios y tráficos en que se conduzcan y las personas que intervienen en cualquier fase de la actividad o que violen las disposiciones jurídicas.

Para os defensores ferrenhos do direito aduaneiro, a abordagem deste braço do direito seria disciplinar os controles de entradas e saídas de veículos, pessoas e mercadorias, de acordo com os tratados internacionais, firmados pelo ordenamento pátrio, e, ainda, ter o cuidado de atender aos interesses nacionais de intervenção na política de interna e externa de comércio exterior.

Sob a ótica jurídica, seria composto pelo conjunto de normas internas aplicáveis às importações e exportações, assim como pelos tratados internacionais, devidamente reconhecidos, sobre comércio exterior. Neste passo, apresenta uma ambivalência entre normas internas e externas.

Ao comentar a o tema Roosevelt Baldomir SOSA [5], verbaliza:

Ademais sabemos ter a atividade aduaneira um caráter ambivalente, o que se demonstra quando consideramos que a concretização de uma operação de Comércio Exterior é disciplinada no plano da legislação interna (que dita o modo de realização), porém em atenção a normas internacionais pactuadas ou observadas pelas nações envolvidas no ato de comércio.

Para aqueles incrédulos na existência do direito aduaneiro como ramo autônomo, e que defendem a sua inserção no direito fiscal ou tributário, nos unimos ao entendimento exarado por Roosevelt Baldomir SOSA [6], citando Eduardo Raposo de MEDEIROS, litteris:

Uma questão está fora de dúvida; o Direito Aduaneiro não tem nada a ver com o Direito Fiscal, quer pelo seu próprio contorno conceitual, quer pela especificidade da ação em função dos regimes mais diversos devido a espaços econômicos, aos tipos de acordos internacionais, a procedimentos normalizados ou simplificados de facilitação do comércio externo, a suportes documentais de declaração das mercadorias, etc. Por outras palavras, o Direito Aduaneiro tem particularidades técnicas e econômicas susceptíveis de considerar os seus mecanismos jurídicos de intervenção no comércio internacional, como um conjunto à parte, com uma técnica e originalidades independentes do Direito Fiscal, e com uma terminologia própria. Daí espraiar-se pela nomenclatura pautal em conexão com questões da taxação em eventuais alternativas de aplicação dos regimes geral ou preferenciais, passando pelos regimes suspensivos de conteúdo econômico das mercadorias e regime aduaneiro dos meios de transporte, e terminando no contencioso aduaneiro.

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Pelo lançado, é de total nitidez que os direitos exercidos por um país na política de comércio exterior são, na maioria das vezes, direitos aduaneiros. É o caso, por exemplo, dos direitos antidumping (taxação de mercadorias importadas para que seu valor equipare-se a do mercado interno) e compensatório.

São vários os fatores que nos levam a crer na existência de um direito aduaneiro. Nos dias atuais, com a evolução do comércio e a formação de novos blocos econômicos, o volume de negociações internacionais cresce assustadoramente, o que implica o surgimento de regramentos destinados às situações fáticas que nascem no cotidiano do intercâmbio comercial.

É evidente que a abundância de legislações, tais como, Decretos-leis, Leis Ordinárias, Leis Constitucionais, Instruções Normativas, Portarias, Resoluções, etc., que regulam as situações fáticas surgidas nas operações de comércio com o estrangeiro, anuncia a existência de uma ciência aduaneira.

Toda a mercadoria que chega a uma zona primária ou uma zona secundária, seja ela porto, aeroporto ou estação aduaneira, está sujeita a um emaranhado de normas que regulam as suas relações de transportes, seguros, estiva, câmbio e outras, as quais atraem dispositivos constitucionais, tributários, administrativos, entre outros.

Neste tópico de discussão acerca da existência do direito aduaneiro, não conseguimos encontrar obras de doutrinadores que tivessem a preocupação de abordar a quaestio de forma tão eloqüente como José Lence CARLUCI, e desta preocupação exteriorizassem seu posicionamento de forma firme sobre a existência ou não do direito aduaneiro.

A Constituição brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, não prevê expressamente a competência da União para legislar sobre direito aduaneiro ou ao menos prevê a existência do direito aduaneiro como ramo específico do direito no Brasil. Entretanto, protrai-se do texto do artigo 22, VIII, que a União é privativamente competente para legislar sobre comércio exterior. Sendo assim, entendemos que este dispositivo constitucional engloba a competência para legislar em direito aduaneiro, afinal as normas que regulam o comércio exterior são a mais pura expressão do direito aduaneiro.

Neste giro, reitere-se, somos partidários de CARLUCI, e de forma inequívoca cremos que a evidência do direito aduaneiro, como não poderia deixar de ser, é uma conseqüência das relações comerciais internacionais.

2.1 CONCEITO

O Direito Aduaneiro é um conjunto de normas e princípios que regulamentam juridicamente a política aduaneira, com a intervenção pública no intercâmbio internacional de mercadorias, formando um sistema que possibilita o controle e a criação de barreiras com finalidades públicas.

É um conjunto de normas porque seus regramentos, como já vimos, advêm de Leis, Decretos-Leis, Portarias, etc; é um conjunto de princípios porque em sua seara devemos observar os princípios gerais do direito.

Os princípios são importantes em duas fases principais: na elaboração das leis e na aplicação do Direito, pelo preenchimento das lacunas da lei. Para Paulo NADER [7] : "São os princípios que dão consistência ao edifício do Direito, enquanto que os valores dão-lhe sentido."

As suas normas e seus princípios surgem para juridicamente regular a política aduaneira, que é uma função pública. No Brasil, por força do dispositivo constitucional sedimentado no artigo 22 e seus incisos VII e VIII, da Constituição de 1988, aduz-se que sendo a União competente para legislar em matéria de comércio exterior, inequívoco é seu interesse público.

A União traz para si esta responsabilidade de legislar em matéria de comércio exterior, considerando, por óbvio, que este setor é extremamente importante para regular a entrada e saída de divisas do país. Havendo incentivo à exportação, aumenta-se a entrada de capitais; por outro lado, baixando alíquotas de impostos de importação, facilita-se o ingresso de mercadoria do exterior, e, embora saiam divisas, a política aplicada consegue suprir o mercado através da oferta de produtos que estão em falta e conseqüentemente com preços altos. Neste caminho, o poder público mantém o preço baixo evitando efeitos inflacionários na economia interna.

2.2 NATUREZA JURÍDICA

O Direito Aduaneiro, quanto à sua natureza, em face da atividade aduaneira ser uma atividade pública, é um ramo do direito público.

Segundo José CRETELLA JUNIOR [8] o "direito público é o que disciplina relações jurídicas em que preponderam imediatamente interesses públicos; direito privado é o que disciplina relações jurídicas em que predominam imediatamente interesses de ordem particular."

Nesta órbita, extirpamos a possibilidade de ser um ramo do direito privado, em face da notória intervenção estatal nos regramentos da política de comércio exterior. Consoante o ensinamento acima transcrito, notamos a preponderância do interesse público sobre o privado.

2.3 PRESSUPOSTOS DE EXISTÊNCIA DO DIREITO ADUANEIRO

Para que exista um direito aduaneiro devem co-existir os seus pressupostos. São eles: o território aduaneiro, a mercadoria e as operações de exportação e importação.

2.3.1 Território aduaneiro

O território aduaneiro confunde-se com o território nacional devido as suas semelhanças.

O território nacional, na acepção de Aderson de MENEZES [9], assim se define: "O território não é apenas o solo, superficial e continuadamente considerado. Vai além, para abranger a superfície da terra, o subsolo, os rios e lagos internos, as bacias, golfos e portos, as chamadas águas territoriais e o espaço aéreo sobre a área compreendida pelas fronteiras estatais."

Já o território aduaneiro, abrange:

a) Zona primária - São as faixas internas e externas de portos e aeroportos, recintos alfandegados e locais habilitados nas fronteiras terrestres, bem como as que efetuam operações de carga e descarga de mercadoria ou ainda embarque e desembarque de passageiros provenientes ou em deslocamento para o estrangeiro.

b) Zona secundária - É o restante do território nacional, não compreendido na zona primária.

Há um entendimento em separar os conceitos de zonas primárias e secundárias pelo tipo de trabalho executado. Assim, na zona primária se realizaria o desembaraço das mercadorias e na zona secundária a fiscalização dos estabelecimentos importadores ou exportadores. Todavia, este critério para nós não é absoluto, posto que existem casos em que mercadorias saem da zona primária e são transferidas através de Declaração de Trânsito Aduaneiro para uma zona secundária, sem efetuar o desembaraço da mercadoria, sendo que o mesmo acaba ocorrendo na zona secundária. Para a Secretaria da Receita Federal esta transferência possibilita uma folga da zona primária, já que remove quase todos os procedimentos de fiscalização para a zona secundária. Para o importador, possibilita a proximidade da mercadoria e seus procedimentos com a sede de sua empresa.

2.3.2 Mercadoria

Mercadoria é tudo aquilo que é objeto do comércio.

A mercadoria é o objeto da relação aduaneira. Sobre ela serão aplicados os mecanismos de controle que o Estado tem a sua disposição. A aduana tem sua atenção voltada para a o bem móvel corpóreo.

2.3.2.1 Bem móvel corpóreo

Ensina Aurélio Buarque de Holanda FERREIRA, em sua obra Novo Dicionário da Língua Portuguesa, que a palavra corpóreo provém do latim corporeu, que significa corporal, que tem corpo.

Reza o Código Civil Brasileiro, em seu artigo 82, in verbis:

Art. 47. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substancia

"Os bens móveis são os que, sem deterioração na substância ou na forma, podem ser transportados de um lugar para outro, por força própria (animais) ou estranha (coisas inanimadas)" (Maria Helena DINIZ [10]).

"São bens móveis os que, sem alteração da substância, podem ser removidos, por movimento próprio, ou por força estranha, bem como os que têm essa qualidade jurídica por disposição legal."(Orlando GOMES [11]).

Diante de tais ditames, concluímos que bem móvel corpóreo é aquele que possui corpo e é móvel ou suscetível de movimento próprio, ou ainda de remoção por força alheia.

As coisas móveis podem ser divididas em:

a)genéricas e individuais – são genéricas as coisas que se identificam pelos caracteres comuns à espécie a que pertencem. Individuais, as que se distinguem por seus caracteres próprios;

b)fungíveis e não-fungíveis – fungíveis são os bens suscetíveis de substituição por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Não-fungíveis, são os insubstituíveis porque são analisadas as suas qualidades individuais;

c)consumíveis e não-consumíveis – São consumíveis os bens móveis cuja existência termina com o primeiro uso. Não-consumíveis, por sua vez, são coisas que suporta uso continuado, repetido;

d)divisíveis e indivisíveis - Dizem-se divisíveis as coisas que, sem modificação de sua substância ou considerável desvalorização, podem dividir-se em partes homogêneas e distintas, cada parte sem perder a forma de coisa autônoma. Dizem-se indivisíveis as coisas que não se podem partir, sem alteração em sua substância ou sacrifício de seu valor;

e)singulares e coletivas – Singulares são as coisas distintamente consideradas em sua individualidade. Coletivas, as coisas singulares agrupadas que formam coisa distinta em sua unidade.

Como vimos, as coisas corpóreas são geralmente designadas como mercadorias e, neste caso, se inclui a moeda. Em geral, no comércio são vendidas em mais larga escala as coisas fungíveis, mas podem ser vendidas, também, as coisas infungíveis, como por exemplo: um quadro de Leonardo da Vinci.

Das modalidades de bem móvel corpóreo que transcrevemos acima, todas elas são passíveis de controle aduaneiro.

Em contra partida, um exemplo de bem que a aduana não controla é o resultante da produção intelectual. Para melhor clarear o exemplo, tomaremos como base uma importação de programas operacionais de computadores, que ingressam no Brasil contidos e gravados em um CD - Compact Disk, a aduana irá tributar a mercadoria de acordo com os impostos incidentes sobre o CD, como bem corpóreo, aquela produção intelectual (bem incorpóreo) não estará sujeito à tributação de impostos ou regramentos com fins fiscais.

2.3.2.2 Classificação e Nomenclatura de Mercadorias

Cada mercadoria possui uma classificação. Portanto, classificá-la nas operações de importação, exportação e operações no mercado interno é tarefa básica.

A classificação dos produtos ganha importância na seara do direito aduaneiro, porque é através dela que podemos descobrir as alíquotas de impostos e outras imposições que porventura estejam gravadas às mercadorias.

No Brasil, torna-se necessária a utilização das seguintes nomenclaturas, para classificar as mercadorias:

a)Nomenclatura Brasileira de Mercadorias - Sistema Harmonizado - NBM/SH. Esta nomenclatura é utilizada para conhecimento dos tributos internos (IPI, ICMS, II, e demais tributos) e normas internas no Brasil (leis ordinárias, decretos-leis, portarias, regulamentos, circular, e outros dispositivos legais pertinentes.);

b)Nomenclatura da Associação Latina Americana de Integração - Sistema Harmonizado - NALADI/SH. Esta é utilizada nas negociações que envolvem os países da ALADI;

c)Nomenclatura Comum do Mercosul - Sistema Harmonizado - NCM/SH. Esta nomenclatura é utilizada para a obtenção das alíquotas do imposto de importação e outras disposições, no âmbito do Mercado Comum do Sul - Mercosul, envolvendo os países signatários: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai.

Todas as nomenclaturas existentes possuem um mesmo objetivo e finalidade que é individualizar a mercadoria e, desta forma, traze-la ao encontro destas listas de produtos que indicam em seu conteúdo os gravames a que ela estará sujeita.

A codificação das mercadorias traz um conjunto de códigos numéricos que é baseada no Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (SH). O Sistema Harmonizado foi instituído na Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias, celebrado em Bruxelas, em 14 de junho de 1983. No Brasil entrou em vigor a referida convenção por força do Decreto n. 97.409/88.

Através deste sistema, conseguimos classificar e verificar todos os impostos incidentes sobre o produto objeto da transação comercial.

2.3.3 Exportações

O conceito de exportação é bastante amplo, podendo inclusive estender seu alcance aos serviços secundários ligados a esse regime de venda de produtos.

De acordo com RATTI [12]: "Exportação vem a ser a remessa de bens de um país para outro. Em sentido amplo poderá compreender, além dos bens propriamente ditos, também os serviços ligados a essa exportação (fretes, seguros, serviços bancários, etc.)."

Nosso entendimento se coaduna com o conceito de RATTI, eis que o autor consegue magistralmente sintetizar o que seja uma operação de exportação.

Conforme se extrai do Regulamento Aduaneiro, as exportações, no Brasil, poderão dar-se com cobertura cambial e sem cobertura cambial.

2.3.3.1 Exportação com cobertura cambial

As exportações com cobertura cambial são aquelas que recebem divisas do exterior como forma de pagamento da mercadoria; estes valores são enviados pelo importador no exterior.

Para que haja a transferência de divisas de um país a outro, como forma de pagamento das exportações realizadas, há que se atentar para alguns aspectos formais.

Os pagamentos internacionais são liquidados pela compensação de créditos no exterior contra débitos no exterior. Na maioria dos países são proibidas negociações diretas entre particulares, devendo as transações cambiais serem conduzidas por meio de estabelecimentos bancários. No Brasil, segue-se a linha da maioria dos paises e é vedado ao particular a negociação direta, desta forma, obrigatoriamente, a aludida negociação deve ser efetuada por uma instituição financeira autorizada pelo Banco Central.

Ensina Robison Gonçalves de CASTRO [13] que as transações cambiais conduzidas pelos bancos operam-se da seguinte forma:

Os exportadores vendem a um banco localizado em seu país os créditos havidos contra o importador estrangeiro. O banco remete o saque para cobrança a um banco estrangeiro que age como seu correspondente no exterior e o total de cobranças realizadas por este último é creditado na conta do banco nacional. Assim, fica o banco nacional dispondo de ativos em moeda estrangeira no exterior para, por sua vez, vendê-los aos importadores nacionais, a fim de saldar os débitos decorrentes de suas compras internacionais.

Como tal procedimento ocorre inversamente (trocando-se os papéis de importadores e exportadores na descrição do parágrafo anterior), existe reciprocidade.

Seguindo na esteira de Robison Gonçalves de CASTRO, constata-se que existem várias formas de pagamento que podem ser utilizadas no comércio internacional, podendo-se utilizar as seguintes:

a)remessa antecipada – O importador remete previamente o valor da transação, ato contínuo, o exportador efetua a exportação da mercadoria e o envio da correspondente documentação. Esta modalidade não é muito utilizada porque coloca o importador na dependência do exportador, criando riscos para o primeiro, de vez que, enquanto não receber a mercadoria, não terá certeza do cumprimento da obrigação assumida pelo exportador. Faz-se necessário este tipo de pagamento nos casos em que o exportador precisa de meios financeiros para atender o pedido do importador;

b)remessa sem saque – O importador recebe do exportador os documentos de embarque, efetua o desembaraço da mercadoria na aduana e, após, providencia a remessa da quantia respectiva para o exterior. Nesta modalidade de pagamento deve o exportador ter confiança no importador, porque ele fica sem garantia;

c)cobrança à vista – Nesta modalidade o exportador entrega ao banco de sua escolha os documentos de embarque, juntamente com saque contra o importador. A instituição bancária, remete os documentos acompanhados de carta-cobrança a um correspondente na praça do importador para cobrar do sacado. Recebidos os documentos e o saque pelo correspondente, este registra-os para cobrança em conformidade com instruções vindas do banco remetente e dá aviso ao importador para que liquide a transação. Operado o pagamento, o banco cobrador transfere a moeda estrangeira para o exterior e entrega ao importador a documentação, para que ele possa liberar a mercadoria na alfândega;

d)cobrança a prazo - Neste tipo de pagamento os documentos são acompanhados de saque com vencimentos futuros (a prazo). O banco remetente instrui o banco cobrador para entregar os documentos contra aceite. Com isso, o credor estará financiando o importador, que entrará na posse da mercadoria imediatamente, mas efetuará o pagamento só no vencimento;

e)crédito documentário (carta de crédito) - Neste caso é emitido um documento pelo qual o banco emitente, por instruções de seu cliente ou em seu próprio nome, compromete-se a efetuar pagamento ao beneficiário ou a sua ordem, ou deve pagar ou aceitar saques emitidos pelos beneficiários, contra entrega de documentos, desde que os termos e condições do crédito sejam cumpridos. Esta modalidade é a mais utilizada, dado possuir mais garantias tanto ao importador como ao exportador.

2.3.3.2 Exportação sem cobertura cambial

As exportações sem cobertura cambial são aquelas que não recebem as divisas do exterior, ou seja, o importador não efetua pagamentos pelas mercadorias recebidas. Tais exportações acontecem nos seguintes casos: exportação temporária, amostras de mercadorias, bagagem de passageiros, mercadorias destinadas a feiras e exposições (desde que não sejam vendidas) etc.

As exportações temporárias são aquelas que saem do território aduaneiro para o estrangeiro, sob condição de retornar a sua origem em determinado prazo, como por exemplo, máquinas para uma feira de demonstração no exterior.

Já as amostras de mercadorias são as pequenas porções de produtos que são enviadas para o estrangeiro a título de demonstração para possibilitar um futuro negócio comercial, como cinco quilos de polipropileno, por exemplo.

As bagagens de passageiros, por sua vez, são aqueles pertences pessoais, desde que não caracterize fins comerciais, que são indispensáveis a sua manutenção pessoal, quais sejam, roupas íntimas, malas, produtos cosméticos, etc.

Os produtos para feiras e exposições são enviados através da exportação temporária, como já discorrido anteriormente.

Estes são apenas alguns dos casos que não necessitam cobertura cambial. Salienta-se que não iremos nos aprofundar muito em tais elucidações por não ser tema de nosso trabalho. Discorremos sobre tais aspectos tão só para facilitar o entendimento da matéria.

2.3.4 Importações

2.3.4.1 Conceito

A importação resulta de um conjunto de normas e regras a serem observadas no campo de comércio exterior e na área do comércio internacional, disciplinada e acompanhada dos documentos necessários ao desembaraço dos produtos estrangeiros, cujo processamento se dará com obediência às regras emanadas do R.A. e as normas complementares da legislação aduaneira. (Antonio CAMPOS, 1996, p. 19)

Para Bruno RATTI [14]: "Denomina-se importação a entrada de mercadorias em um país, provenientes do exterior."

No entender de Roosevelt Baldomir SOSA [15] importação assim se define: "É a soma dos procedimentos que são adotados para possibilitar a admissão de uma mercadoria de procedência estrangeira no território aduaneiro."

Dos conceitos existentes não podemos encontrar uma definição capaz de sintetizar o que seja uma operação de importação.

O importador, ao decidir realizar uma operação de importação deve determinar qual o regime que deseja submeter a mercadoria estrangeira ao chegar ao Brasil. A decisão cabe a ele. Em virtude de sua decisão é que surgirão os procedimentos que ele deverá observar. Por exemplo, se quiser introduzir a mercadoria para ser consumida ou fazer parte definitivamente da economia nacional, deverá observar os procedimentos do regime aduaneiro geral de importação definitiva. Se desejar introduzir a mercadoria temporariamente para fins de exposição em feiras e depois reexportá-la ao exterior, deverá observar os procedimentos do regime aduaneiro especial de admissão temporária. Por tais observações, Roosevelt Baldomir SOSA alega ser a importação uma soma de procedimentos, o que entendemos ser o reflexo da verdade.

Para nós, o conceito sintético de importação funda-se no fenômeno que ocorre quando certa mercadoria dá entrada em determinado território aduaneiro.

2.4 FONTES

Fontes, à luz de uma interpretação jurídica, significam a causa, o início, o começo das normas de direito. Neste prisma, o direito possui fontes que dão lastro a sua própria razão de existir.

No direito podemos ter fontes classificadas em:

a)fontes formais – são aquelas diversas maneiras pelas quais se manifesta o direito, são os meios através dos quais o direito aparece nos diversos sistemas jurídicos;

b)fontes materiais – representam o conglomerado de fatores ou fenômenos sociais que compreendem elementos políticos, econômicos, morais, religiosos, etc, que extraídos da realidade social influenciam o legislador ao criar as normas, quanto a sua substância, determinando o surgimento do direito, exteriorizado na norma jurídica;

c)fontes históricas - são aquelas representadas por documentos jurídicos e coleções coletivas do passado que, mercê de sua sabedoria, continuam a influir nas legislações do presente.

Podemos classificar como fontes formais do direito aduaneiro, estabelecidas hierarquicamente:

d)Constituição Federal;

e)Tratados internacionais firmados pelo Brasil;

f)Código Tributário Nacional;

g)Lei n. 3.244/57, que trata das disposições tarifárias;

h)Decreto-Lei n. 37/66, que dispõe sobre o Imposto de Importação e reorganiza os serviços aduaneiros e dá outras providencias;

i)Decreto n. 4.345/2002, o dito Regulamento Aduaneiro;

j)Decreto-Lei n. 2472/88, que altera disposições da legislação aduaneira, consubstanciada no Decreto-Lei n. 37/66, e dá outras providências;

k)Atos normativos.

Podemos classificar como fontes materiais a matéria aduaneira de um modo amplo, configurada pelo comércio internacional, seus procedimentos, costumes e conceitos.

Característica marcante das fontes do direito aduaneiro são os freqüentes acordos e convenções internacionais. As aludidas fontes emanam tanto das autoridades nacionais como de organismos internacionais e intergovernamentais.

3. CONCLUSÕES

Nos calcanhares de sua forte característica internacional, o Direito Aduaneiro possui uma inclinação natural de globalizar-se, ou seja, de ser o ninho de normas, cujo principal objetivo consubstancia-se em harmonizar procedimentos a nível mundial do comércio exterior.

Embora cediço, no Brasil, vale jogar luzes sobre o fato de que tal ramo do direito não é reconhecido como autônomo, conforme comentado alhures, e para muitos é considerado um sub-ramo do Direito Tributário.

Neste particular, ainda que sustentado por mestres de grande saber jurídico, nos permitimos discordar de tal entendimento, visto que a legislação aduaneira não pode ser resumida a lei tributária em sentido estrito. Como de larga sabedoria, é um ordenamento jurídico direcionado ao disciplinamento das entradas e saídas de bens, mercadorias, veículos ou pessoas do País. Ademais, o tributo como função de arrecadação ou mesmo extrafiscal é relativamente deixado de lado ao cerne desse ramo da ciência jurídica. Acreditamos que não é a existência da cobrança de tributo que justificaria a razão do direito aduaneiro. Neste ínterim, é de se observar que nos casos de compra e venda internacionais, que não há tributação sobre estas operações, ainda assim, haveria um direito aduaneiro, regulando estas entradas e saídas do território.

Curial salientar que, inevitavelmente, o não reconhecimento leva a um conflito de competências entre os entes estatais, o que vem contribuindo, cotidianamente, para a ineficácia de políticas no setor.

O mais preocupante e que é independentemente do reconhecimento no Brasil da existência do direito aduaneiro como um ramo autônomo, é a inexistência de profissionais qualificados para assuntos aduaneiros.

Na imensa maioria dos casos, os profissionais que emergem no setor são especialistas em outras áreas, dificultando excessivamente o entendimento das regras de práticas de comércio exterior e, principalmente, da problemática aduaneira.

A título conclusivo, é de fácil constatação que o país carece, tanto no setor público como no privado, de uma estrutura de pessoal adequada para o ingresso no mercado globalizado proporcionado pela atual abertura econômica dos últimos períodos.

Sem um efetivo técnico especializado é de se concluir, também, que o país enfrenta e enfrentará abissais dificuldades em matérias aduaneiras, sem contar, incisivamente nas inevitáveis disputas comerciais internacionais. O ensino do Direito Aduaneiro é matéria que se faz indispensável ao estudo do direito, seja nas Universidades seja em outras instituições de ensino.

É de constatar-se, todavia, que na esteira da inteligência e da visão global, existem Universidades que se adiantam ao seu tempo e inserem a cadeira de direito aduaneiro como disciplina curricular, profetizando e concretizando seu reconhecimento como ramo autônomo do direito.

Sobre o autor
Maxsoel Bastos de Freitas

advogado e Professor/Consultor em Porto Alegre – RS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Maxsoel Bastos. O Direito Aduaneiro como ramo autônomo do direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 214, 5 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4791. Acesso em: 29 dez. 2024.

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