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Algumas considerações sobre requisição

Agenda 01/09/2000 às 00:00

         A requisição corresponde ao direito de requisição de bens em benefício do Poder Público, um dos limites constitucionais à propriedade.

          De acordo com o art. 8º, XVII, da Constituição Federal, fica disposto que compete à União legislar sobre "requisições civis e militares em tempo de guerra", observa Sérgio de Andréa Ferreira. (Andréa p. 77) O art, 153, 2ª parte do § 22 estatui que "em caso de perigo público iminente, as autoridades competentes poderão usar da propriedade assegurada ao proprietário indenização ulterior".

          Inscreve-se na Constituição do Império - art. 179, § 22 - admitir, em razão do bem (interesse) público, legalmente verificado, o uso e o emprego da propriedade do cidadão mediante prévia indenização. A Carta Magna de 1891 - art. 72, , § 17 - apenas se referia à desapropriação, razão por que certa corrente chegou a sustentar ser incabível a requisição, apesar de o art. 80 (referido pelo próprio art. 591 do Código Civil), ao tratar do estado de sítio, no caso de agressão estrangeira, exigência da segurança da República ou de comoção intestina, admitisse a suspensão das garantias constitucionais em geral, por tempo indeterminado, como bem descreve Andréa Ferreira. ( ) p. 77

          A requisição recebeu tratamento específico nas Constituições de 1934 - art. 113, 17 -, e de 1946 - art. 141, § 16); apesar de omissa, na de 1937, pelo menos possuía sua própria índole, mecanismos de suspensão de direitos - art. 168 e s.

          No que concerne à desapropriação, reza o art. 40 do Regulamento, aprovado pelo Decreto 4.956, o seguinte teor: "nos casos de perigo iminente, como de guerra ou comoção, cessarão todas as formalidades e poder-se-á tomar posse do uso, quanto baste, reservados os direitos dos proprietários e interessados para serem deduzidos em tempo oportuno - Lei do ano de 1.826, art. 8º).

          As autoridades competentes poderiam usar da propriedade particular, até onde exigisse o bem público, garantindo ao proprietário o direito à indenização posterior, diz o artigo 591, do Código Civil, nos casos de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina - (Constituição Federal, art. 80).


          Tratam das requisições militares: Lei nº 4.263 - de 14.01.1921; Decreto-lei nº 4.263, de 14.01.1921; Decreto-lei nº nº 4.812, de 08.01.1942, alterado pelo Decreto-lei nº 5.451, de 30.04.43; e o Decreto-Lei nº 5.999, de 18.11.43.

          No tocante às requisições civis, de fins econômicos, como forma de intervenção estatal, a Lei Delegada 4, de 26.09.42 (intervenção no domínio econômico para assegurar a livre distribuição de produtos necessários ao consumo do povo), art. 2º, III, e § 1º, e o respectivo regulamento, aprovado pelo Decreto de nº 51.644-A, de 26.11.62, arts. 22 a 25; tais artigos estabelecem que "poderão ser requisitados os serviços prestados por entidades privadas considerados indispensáveis à realização dos objetivos previstos na Lei Delegada nº 4, de 26.09.62", como tais considerados "os serviços cuja prestação condiciona o exercício de qualquer outra atividade econômica, ou seja, de uso generalizado pelo povo". As requisições deverão ser feitas "por prazo certo, renovável em cada caso e previamente pagas em moeda corrente".

          Ainda no campo das requisições civis, como instrumento interventivo no domínio econômico, o Decreto-Lei nº 2, de 14.01.66, regulamentado pelo Decreto nº 57.841, de 18.02.66, autorizou a requisição de bens ou serviços essenciais ao abastecimento da população, através da Superintendência Nacional do Abastecimento (SUNAB) ou delegadas, mediante indenização prévia em dinheiro.

          Instituto diverso da desapropriação é a requisição administrativa. Enquanto a desapropriação engloba direitos formativos ou potestativos extintos, restritivos e criativos, de direitos, a requisição é direito formado correspondente a uma limitação ao exercício da propriedade, a que corresponde um direito redutivo (temporário) desse exercício.

          O uso, por se tratar de bem consumível, acaba por ser destruído, no entanto, existe o direito de usar, sem que se desfigure a figura jurídica. Exato, mesmo em caso semelhante, o ato de requisição em si (como ato do mundo jurídico) não faz com que o titular da propriedade do bem a perca: a perda seria conseqüência do uso (aspecto de fato), após a entrega da coisa.

          Pontes de Miranda esposa tal idéia, em seus ("Comentários à Constituição" de 1967, Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 1ª ed. t.V, p. 490), como outros autores que vislumbrara certa diferença com respeito à requisição ordinária, de coisa infungível e não-consumível, falando-se, naquele caso, em requisição expropriativa. Tanto o mútuo como o depósito de coisas fungíveis e consumíveis transferem o domínio das mesmas ao mutuário e ao depositário - dizem os arts. nºs 1.257 e 1.280 do Código Civil).

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          Somente nas hipóteses da 2ª parte do § 22 do art. 153 da Constituição Federal, a ulterior indenização é possível; fora disso, a indenização deverá ser prévia, conforme os termos do § único do art. 591 do Código Civil, anteriormente reproduzido e da legislação sobre requisição econômica, de serviços (art. 25 do Decreto n] 51.644-A, de 26.11.62).

          Requisição = ato de direito público, ato administrativo.

          No "Tratado de Direito Privado", do famoso jurista Pontes de Miranda, destaca-se a seguinte afirmação: "ato jurídico lícito, precisamente ato jurídico stricto sensu; e não ato-fato jurídico, nem negócio jurídico. Pode ocorrer negócio jurídico, mas seria plus". Todavia, em seus "Comentários à Constituição de 1967 (t.V, p. 492), declara: "é ato jurídico lícito, porque a própria lei civil limitou o direito de propriedade, e não ato-fato jurídico, nem ato jurídico stricto-sensu. É negócio jurídico unilateral".

          Há uma diferença fundamental entre a declaração de requisição (negócio jurídico unilateral, ato administrativo negocial) e o ato do apossamento do bem (tomada ou entrega da coisa) ou da fruição do serviço, que é fato administrativo.

          Se não houver necessidade de ato declaratório, pela legislação, a Constituição fala em usar o apossamento ou a fruição, como manifestação de vontade, e, assim, torna-se ato administrativo simples, ato jurídico em sentido estrito.

          O ato jurídico lícito corresponde ao exercício regular de um direito.

          Em caso de posse da coisa, trata-se de ingerência administrativa, em que os proprietários deverão ser indenizados, já que todos foram atingidos, sejam titulares de direitos reais, de fruição, sejam pessoais, como o locatário.

          Com indenização abrangente, limitando-se, em geral, ao dano emergente, embora admitam alguns sobre a viabilidade de ação direta do prejudicado, para obtenção do ressarcimento pelos lucros cessantes. Gratuito, em princípio, é o uso.

          Em casos de intervenção econômica, com requisição de serviços, o pagamento, correspondente ao valor dos mesmos, de acordo com o art. 27 do Decreto nº 51.644-A/62, será "em moeda corrente, cash, segundo os preços módicos vigentes no local da prestação".

          A indenização abrangerá o valor da coisa, em caso de bem consumível.

          Coisas móveis e imóveis (bens materiais) poderão ser objeto de requisição, é o que preconiza o art. 15 do Decreto-lei nº 4.812, de 08.10.42, já citado sobre requisições militares.

Sobre o autor
José Maria Pinheiro Madeira

professor da pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade Estácio de Sá, professor do Centro Universitário Moacyr Sreder Bastos, professor do CEPAD (Centro de Estudos Pesquisa e Atualização em Direito), professor palestrante do IBEJ (Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MADEIRA, José Maria Pinheiro. Algumas considerações sobre requisição. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 45, 1 set. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/483. Acesso em: 22 dez. 2024.

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