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Comunidades indígenas no Brasil.

Caso Belo Monte

Agenda 25/04/2016 às 03:20

Trata-se de um apanhado normativo, jurisprudencial e doutrinário acerca da situação das comunidades indígenas no Brasil, e as intervenções dos órgãos interamericanos de direitos humanos, especificamente abordando o caso Belo Monte.

Resumo

Os direitos indígenas no Brasil, apesar de todo acervo normativo acerca do tema, têm sido aviltados, por atos fomentados pelos interesses dos ruralistas, massivamente representados no Congresso Nacional. Com o presente estudo, por tanto, fizemos um apanhado normativo, jurisprudencial e doutrinário acerca da situação das comunidades indígenas no Brasil, no esforço de identificação das formas para alteração do status quo. E, considerando esse cenário nacional, percebemos que de muita importância têm sido as intervenções dos órgãos interamericanos de direitos humanos, já encontrando suas recomendações observância em alguns poucos e heroicos julgados dos tribunais pátrios.


Palavras-chave: Direitos Indígenas – Brasil – Belo Monte.

Abstract

The indigenous rights in Brazil, althougt all norms about it, have been breached, by rural interestings well representated in National Congress. Trought this article, we did a normative, doctrinal and jurisprudencial search about the Brazilian Indigenous Comunities situation, to identify solutions to change the status quo. Considering this reality, we detected that the interamerican organisms in human rights interventions have been so much important and their recomends are already observed by some patriotics judgeds.

Key words: Indigenous Rights; Brasil; Belo Monte Case.

1 O índio e a questão da Terra

Debruçando-se sobre as principais normas hoje em vigência no Brasil, acerca dos direitos indígenas, podemos inferir que o fundamento da posse constitucional especial conferido aos índios referente às terras tradicionalmente ocupadas por estes é o indigenato (desde o Alvará Régio de 1º de abril de 1680 que se reconhece tal condição ou primado), que se revela como algo maior que um simples direito adquirido, “pois já nasceu com os silvícolas como um direito natural reconhecido pelo ordenamento jurídico brasileiro, (…) sendo direito independente de legitimação”1.

A proteção do direito nato do índio às terras tradicionalmente ocupadas é máxima, como reverbera Marcelo Novelino2:

A Constituição considerou como sendo nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, assim como a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar. Estabeleceu ainda que a nulidade e a extinção não geram direito à indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé (CF, art. 231, § 6º). Temos aqui uma hipótese de retroatividade máxima estabelecida pelo constituinte originário. A nulidade de tais atos se justifica pelo fato de que os direitos dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam são originários (CF, art. 231, caput), ou seja, são mais antigos do que qualquer outro, de maneira a preponderar sobre pretensos direitos adquiridos, mesmo os materializados em escrituras públicas ou títulos de legitimação de posse em favor de não índios. Tais direitos não foram outorgados aos índios pela Constituição, mas apenas 'reconhecidos' por ela, razão pela qual o ato de demarcação é meramente declaratório de uma situação jurídica ativa preexistente, e não um ato de natureza constitutiva.

Ainda assim, o direito posto e garantido não se perfaz na práxis, cometendo o Estado Brasileiro aviltamentos aos direitos indígenas, pressionado desde sempre pelo contexto político-econômico nacional, isto fomentado pelos grandes empresários (usineiros), que retardam ou obstam o reconhecimento da terra indígena, utilizando-se, para tanto, de subterfúgios legais, e apelos sociais, como por exemplo, a situação dos pobres fazendeiros alocados em terras indígenas, e incrementam o terror, diante de uma provável secessão ou de intrusão de estrangeiros na exploração das riquezas naturais nacionais.

Estes fatos, que servem como lobs contrários ao reconhecimento das terras indígenas, encontram eco na mídia internacional, com acusações contra o Governo Brasileiro, por cometimento de violência no tratamento destinado às famílias de não-índios alocadas nos espaços desapropriados.

Foi como noticiou a Washington Post3, em matéria relacionada à retirada de pequenos agricultores do Maranhão de uma área demarcada pela Funai no oeste do estado (tribo Awá), e incrementada por afirmações do Deputado Federal Weverton Rocha (PDT), segundo o qual “não podemos deixar que os direitos dos índios violem os direitos dos trabalhadores rurais”, e do antropólogo Edward Luz, que coloca o marco teórico da Constituição Federal no trato dos direitos dos índios às terra tradicionalmente ocupadas como “piada”, e resume a questão na seguinte crítica aos critérios seguidos pelos antropólogos da FUNAI: “basta um índio ou uma pessoa que se diz indígena requisitar o território como tradicional que os antropólogos carimbam e dão legitimidade a isto”, e, continua, afirmando “hoje em dia, até Copacabana, Ipanema ou até o Congresso Nacional podem virar terras indígenas. Basta que o antropólogo carimbe”.

Nessa mesma direção é o entendimento de Eduardo Corrêa Riedel4, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de MS, para quem a suspensão das reintegrações de posse, por ato do STF, consistem em afronta aos direitos dos produtores rurais. Ele considera que:

É o Estado brasileiro sucumbindo, reconhecendo que os indígenas não são submetidos ao nosso ordenamento jurídico, declarando que os títulos de propriedade dos produtores rurais não têm valor. E não se trata de terras indígenas porque a Funai assim as declarou, pois todas essas decisões são contestadas, administrativa e judicialmente.

De fácil percepção, porém, que todas as afirmações acima mencionadas são simplistas, voltadas à captura de simpatizantes no senso comum, que constroem a opinião pública.

Acerca desses argumentos pueris, à luz do entendimento do STJ, no MS 10.225/DF e no MS 10.994/DF, e do STF, na Pet. 3388, na ACO 323 e no RE 416144, Luciano Mariz Maia5:

Precisamente por estar no núcleo da questão indígena a luta pela terra, a declaração de reconhecimento de uma terra como indígena produz impactos previsíveis sobre atividades realizadas por não índios naquelas terras indígenas. E sobre os atos e fatos jurídicos que servem de suporte para os não índios desenvolverem suas atividades. Isso porque é recorrente a alegação, pelos não índios, de que os índios não são índios, são misturados, são caboclos, foram dizimados ou extintos, não há mais resquícios dos antigos aldeamentos, os imóveis foram adquiridos há muito tempo, devidamente escriturados e registrados, e argumentos do gênero.

(…)

Os direitos dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam foram constitucionalmente 'reconhecidos', e não simplesmente outorgados. O ato de demarcação tem natureza declaratória, e não constitutiva.

São direitos originários, mais antigos do que qualquer outro, e preponderam sobre pretensos direitos adquiridos por escrituras públicas ou títulos de legitimação de posse. Essas escrituras e títulos em favor de não-índios são nulos e extintos.

Redação clara. Precisa. Direta. Sem subterfúgios ou meias palavras. Corajosa. À altura da responsabilidade.

Entretanto, é assim que o Estado Brasileiro, seja por ação ou omissão, continua afrontando o direito dos índios ao reconhecimento da titularidade de suas terras tradicionalmente ocupadas, como se pode citar nos seguintes casos:

1.1 Decreto nº 1.775/1996

O reconhecimento da titularidade das terras indígenas pressupõe um procedimento administrativo regulado pelo Decreto nº 1.775 de 08 de janeiro de 1996, segundo o qual, de acordo com a leitura do seu art. 2º, a demarcação iniciar-se-á com estudo de identificação feito por antropólogo de qualificação reconhecida. E em todas as etapas restará garantida a participação do grupo indígena envolvido.

Ao final do estudo, será produzido um relatório. Nesse passo, “uma vez apresentado o relatório delimitando a área a ser demarcada, caberá ao Presidente da FUNAI aprová-lo e publicá-lo no Diário Oficial da União” (AMADO, 2012), ficando disponível, ainda, como dispõe o § 7º, do art. 2º, afixado na sede da Prefeitura local, no prazo de noventa dias.

Desde o início do procedimento até o prazo de 90 dias após a publicação do relatório, poderão, de posse de provas, insurgirem-se órgãos públicos ou terceiros interessados contra o relatório ou pleitear indenizações que entender devidas (§ 8º).

Após o decurso de prazos, o relatório é remetido ao Ministro de Estado da Justiça, que (§ 10, I), caso aprove o relatório, declarará, mediante portaria, os limites da terra indígena e determinará a sua demarcação, que, como já vimos, possui natureza declaratória.

Verificada a presença de não índios no local, conforme art. 4º, “o órgão fundiário federal dará prioridade ao respectivo reassentamento, segundo o levantamento efetuado pelo grupo técnico, observada a legislação pertinente.”

Por fim, o Presidente da República, mediante decreto, homologará a demarcação da terra indígena (art. 5º), e segundo o STF (RE 183188), este ato estatal se reveste de presunção juris tantum de legitimidade e veracidade.

Nas palavras de Poliene Bicalho8:

No plano oficial, a partir do determinado juridicamente pelas leis estatais, a demarcação se dá em quatro momentos importantes. A identificação é o primeiro estágio do processo de demarcação de uma terra indígena. Neste momento, o trabalho de um grupo técnico específico é realizado e os resultados são publicados pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI). De acordo com o Decreto 1.775/1996, são reservados 90 dias para que as pessoas que se sintam lesadas possam contestar a terra em questão – eis aqui o princípio do contraditório. O segundo estágio é o da demarcação física, período longo e oneroso de mais noventa dias, em que a demarcação propriamente dita é feita, quando também deve ser realizado o reassentamento dos não índios que ocupam a terra. O terceiro estágio é o da homologação da área indígena, por meio de decreto presidencial, quando o registro final da mesma como propriedade da União deve ocorrer no cartório da comarca onde se encontra localizada. Por fim, tem-se a regularização fundiária, com “a completa desintrusão das áreas da presença de ocupantes não-índios...”

Pois bem. O decreto do medo, como ficou conhecido o Decreto 1.775/96, à época de sua publicação, trouxe receio nas comunidades indígenas, diante da abertura dada pelo mencionado art. 2º, § 8º, ao contraditório, não previsto pelo anterior Decreto nº 22/91 (e , por isoto, considerado inconstitucional), que atenderia, entre outros aspectos, os interesses de latifundiários, garimpeiros e invasores, prejudicando os interesses indígenas.” (BICALHO, 2012), dado que o direito ao reconhecimento das terras indígenas é originário, carente de ato formal de reconhecimento (mero procedimento administrativo), não cabendo apreciação de interesses de terceiros, pois inaptos a desconstituir o fato da titularidade originária:

Primeiro, a demarcação da terra indígena é mera formalidade, já que detêm o direito às mesmas pelo simples fato de viverem e de se reproduzirem culturalmente nelas, o que está legitimado pela “tendência moderna” que assegura aos indígenas do Brasil e a diferentes grupos étnicos do mundo todo “os seus direitos originários as terras que tradicionalmente ocupam.”

(…)

Para as lideranças indígenas e as entidades de apoio, como o CIMI, as alegações e as intenções do Estado com estas modificações na legislação indigenista se explicavam por outros motivos. Vários jornais da época publicaram que há muito o Ministro da Justiça, o senhor Nelson Jobim, havia demonstrado interesse em alterar a legislação sobre a demarcação das terras indígenas, desde os tempos em que advogou a pedido do governador do Pará, o senhor Jader Barbalho, “contestando terras indígenas desse Estado.” (CARNEIRO DA CUNHA, 1996, p. 3)

(…)

Para o Conselho de Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (CAPOIB), assim como para o CIMI e demais entidades de apoio, e para a ampla maioria das populações indígenas do País, inconstitucional era o Decreto N° 1.775/96, por todas as razões já aqui apontadas, como se pode observar nesta opinião de algumas lideranças, manifestada em 10 de julho de 1996: … o Governo atende as pressões internas das forças políticas e econômicas que lhe dá sustentação, inclusive no Congresso Nacional, e administra as pressões externas favoráveis à demarcação das terras dos povos indígenas e à preservação ambiental. Dessa forma, de acordo com as pressões políticas que recebe, (o governo federal) atende a um ou a outro grupo, numa verdadeira gangorra genocida. (PORANTIM, 1996, p. 3)

Interesses escusos à parte, haveremos que reconhecer, entretanto, em termos quantitativos, que foi no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), Presidente da República à época, que houve “o maior número de decretos homologatórios e a maior extensão já demarcada por um presidente na história do Brasil”, ao menos até o final do seu mandato”. (BICALHO, 2012).

1.2 PEC nº 215/2000

Num contexto de reclamos internacionais pelo reconhecimento dos direitos indígenas, de reavivamento dos direitos humanos, no Brasil, entretanto, opta-se pela contramão, em desarmonia aos princípios que informam o sistema normativo de proteção ao índio. Além da duvidosa modificação operada nos idos de FHC, está em trâmite, desde 28 de março de 2000, a Proposta de Emenda à Constituição nº 215, de autoria do Deputado Almir Sá (PRP – Partido Republicano Progressista).

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Pela proposta, acrescenta-se o inciso XVIII ao art. 49; modifica-se o § 4º e acrescenta-se o § 8º ambos no art. 231, da Constituição Federal" (inclui dentre as competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas, estabelecendo que os critérios e procedimentos de demarcação serão regulamentados por lei). Vejamos:


 

Art. 1º Acrescente-se ao art. 49 um inciso após o inciso XV, renumerando-se os demais:

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

(...)

XVIII - aprovar a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e ratificar as demarcações já homologadas;

Art. 2º O § 4º do art. 231 passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 231 (...)

§ 4º As terras de que trata este"artigo, após a respectiva demarcação aprovada ou ratificada pelo Congresso Nacional, são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

§ 8º Os critérios e procedimentos de demarcação das Áreas Indígenas deverão ser regulamentados por lei.

Na justificativa dada, o Deputado Almir Sá afirmou:

No sistema de mútuo controle entre os Poderes da República, adotado pela Constituição Brasileira, busca-se o necessário equilíbrio para evitar que no desempenho desmedido das respectivas competências se criem entraves na área de atribuição de outro Poder OU de outra esfera de Poder. Assim, por exemplo, pode o Congresso sustar ato normativo do Executivo, sempre que este exorbite o poder regulamentar ou os limites da delegação legislativa; por sua vez, o Executivo dispõe do poder de edição de medidas provisórias, antecipando-se a, ou determinando, a iniciativa legislativa do Congresso. No caso da demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, verifica-se que implementada a atribuição pela União Federal no caso, por meio do Poder Executivo - sem nenhuma consulta ou consideração aos interesses e situações concretas dos estados-membros, tem criado insuperáveis obstáculos aos entes da Federação. No fim e ao cabo, a demarcação das terras indígenas consubstancia-se em verdadeira intervenção em território estadual, com a diferença fundamental de que, neste caso e ao contrário da intervenção prevista no inciso IV do art. 49, nenhum mecanismo há para controlá-la, ou seja, a falta de critérios estabelecidos em lei torna a demarcação unilateral. Por isso, e valendo-se do próprio precedente constitucional, que exige a aprovação congressual para a intervenção federal, é que se propõe a presente emenda à Constituição, para que o Congresso, em conjunto com as partes interessadas na demarcação, passem a aprovar a demarcação das terras indígenas. É mantida a atribuição da União Federal e, assim, preservada a separação entre os Poderes, ao mesmo tempo em que se estabelece um mecanismo de co-validação ao desempenho concreto daquela competência. Coerentemente, prevê-se que o Congresso ratifique as demarcações já homologadas. Ao contrário do que a alguns possa parecer, com tal providência outorga-se um inédito nível de segurança jurídica às demarcações das terras indígenas, na medida em que, tendo-se pronunciado sobre elas o Poder que representa o povo e as unidades federativas, ficarão absolutamente isentas de qualquer questionamento.
 

Em que pese a argumentação contida na justificativa, de uma leitura simplória da proposta extrai-se facilmente o retrocesso9 que nela está contido, quando se intenta, com a modificação, não somente o condicionamento da demarcação homologada por decreto presidencial ao aval das bancadas do Congresso Nacional como também a revisão dos processos já findos, esta última sob o termo de “ratificação”. Ao menos esta última possibilidade foi retirada do texto pela CCJ.

Tais mudanças implicariam, ainda assim, em afronta ao fundamento do indigenato, e, assim, aos direitos fundamentais individuais (art. 60, § 4º, IV, da CF), retirando o direito originário dos índios sobre a terra, reconhecido pela Constituição Federal, tornando o ato de demarcação não mais meramente declaratório, mais eminentemente constitutivo, o que, tomadas as consequências jurídicas, abre um sem número de possibilidades de questionamento, e, na prática, a sobreposição dos interesses dos ruralistas, massivamente representados no Congresso Nacional (interesses econômicos de Estados e de particulares interessados na exploração das terras).

Tanto é assim que o Deputado Mariton Benedito de Holanda ingressou com o mandado de segurança nº 32262 junto ao Supremo Tribunal Federal, no qual alega, em síntese, que a tramitação da mencionada PEC seria incompatível com o art. 60, § 4º, IV, da Constituição, que veda a deliberação de propostas de emenda tendentes a abolir direitos individuais, dentre os quais os direitos dos índios, previstos no art. 231, da CF, promovendo-se, como dissemos, um retrocesso, e, ainda, ofensa ao princípio da proporcionalidade/razoabilidade, em sua vertente de proibição de proteção deficiente.

Em resposta, as autoridades impetradas, Presidentes da Câmara dos Deputados e da Comissão de Constituição e Justiça, afirmaram que o direito previsto no art. 213, da CF, não seria fundamental, pois “outorga direito a um grupo específico”, sendo sua natureza de direito social, coletivo de minoria, enquanto que os direitos fundamentais são universais e genéricos, que se referem a todos os indivíduos de todos os grupos sociais e comunidades.

Flagrantemente risível, pois, a tese contida nas informações das autoridades ditas coatoras, e, em que pese a liminar ter sido indeferida, por deficiência na instrução da peça inicial, diante da não colação das complementações à PEC (Informativo 271, do STF) (encontra-se concluso ao Relator desde 17 de outubro de 2013), o Ministro Relator Roberto Barroso foi categórico em sua decisão, quando da apreciação da hipótese da existência de um direito fundamental em risco:

O art. 60, § 4º, IV, da Constituição proíbe a deliberação de propostas de emenda que tendam a abolir os direitos individuais. A despeito do que sua literalidade poderia sugerir, a expressão destacada vem sendo objeto de uma leitura mais generosa pela doutrina, que considera protegidos os direitos materialmente fundamentais em geral – aí incluídos não só os tradicionalmente classificados como individuais (e.g., liberdade de expressão), mas também os políticos (e.g., direito de voto), os sociais (e.g., direito à saúde) e os coletivos (e.g., direito ao meio ambiente equilibrado). Isso porque, como meios de proteção e promoção da dignidade da pessoa humana (CF/88, art. 1º, III), os direitos materialmente fundamentais definem um patamar mínimo de justiça, cujo esvaziamento privaria a pessoa das condições básicas para o desenvolvimento de sua personalidade. Por extensão, a própria ordem constitucional perderia a sua identidade.

No caso dos autos, o que estaria em risco, segundo os autores, é o direito originário dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam (CF/88, art. 231). Como recentemente observado por este Tribunal, não se trata aqui de um direito de propriedade ou de posse – no sentido que os termos assumem no direito privado –, mas de uma figura peculiar, de índole e estatura constitucional, voltada a garantir aos índios os meios materiais de que precisam para proteção e reprodução de sua cultura.

Não é outra a orientação acolhida pelos tratados internacionais pertinentes, pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU e pela Corte Interamericana de Direitos Humano. Como a cultura integra a personalidade humana e suas múltiplas manifestações compõem o patrimônio nacional dos brasileiros (CF/88, arts. 215 e 216), parece plenamente justificada a inclusão do direito dos índios à terra entre os direitos fundamentais tutelados pelo art. 60, § 4º, IV, da Constituição.

A circunstância de um grupo ser minoritário não enfraquece, mas antes reforça a pretensão de fundamentalidade dos seus direitos. Como já observado por este Tribunal, “a proteção das minorias e dos grupos vulneráveis qualifica-se como fundamento imprescindível à plena legitimação material do Estado Democrático de Direito”. Ademais, o modelo constitucional contemporâneo reconhece o pluralismo como uma marca das sociedades livres e democráticas, de modo que a proteção do que nos faz diferentes pode ser, e frequentemente é, tão importante quanto a tutela do que temos em comum. Nas palavras de Boaventura de Souza Santos, “temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza”.

Atualmente, já aprovada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), referida proposta foi encaminhada a uma sessão da comissão especial, com data agendada para reunião no dia 06 de maio de 2014, na qual foram apresentados 35 requerimentos10, dentre os quais, a oitiva de juristas como Dalmo Dallari e Carlos Frederico Marés; a oitiva de Advogados Geral da União (AGU)-Carlos Daniel Coldibelli, Dalmo Dallari e Ex Desembargador Luiz Stefanini, Gustavo Passareli, Ives Guandra, Min. Francisco Rezek, Min. Nelson Jobim, Ministério Público Federal (MPF), Newley Amarilla Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Presidente da OAB/MS Júlio Cesar Souza Rodrigues, Rodinei Candeia e Rudy Maia Ferraz; o debate de soluções utilizando-se como paradigma o posicionamento do STF no caso Raposa Terra do Sol; a realização de uma audiência pública; e a oitiva de alguns representantes indígenas.

Sobre a PEC 215, semelhantemente ao que se verifica em outras propostas afins, é de se atentar para a advertência de Adriana Ramos11, segundo a qual “as propostas têm quase sempre a mesma origem: parlamentares amazônicos, em sua maioria francamente contrários aos interesses indígenas, que se alternam na apresentação de proposições”. E, continua, ao afirmar que o mote dessas propostas é sempre a omissão do Estado Brasileiro, mas as intenções nelas contidas são escusas, pois “a maioria dos parlamentares insiste em deturpar os objetivos dos constituintes”.

1.3 Autogoverno versus Secessão
 

Da leitura da legislação já estudada no Capítulo I, notadamente pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, extrai-se que as garantias vindicadas pelas comunidades indígenas são da igualdade, da autodeterminação, e, consequentemente, da autonomia e do autogoverno, como pressupostos à concretização de outros direitos humanos, como os direitos à terra, aos recursos naturais, à preservação da identidade cultural, à língua e à educação.

Vários são os argumentos para legitimar esse direito à autodeterminação, dentre os quais: “o histórico, baseado na ocupação anterior ou na soberania anterior; o argumento da igualdade coletiva entre os povos; o argumento liberal, que utiliza a igualdade individual e a justiça etnocultural; e o argumento comunitarista.12

Esse direito à autodeterminação consiste para as comunidades indígenas na “liberdade de viver bem como seres humanos e de determinar o que isso significa, ou seja, trata-se do sentimento de que eles podem decidir seu próprio modo de vida”. Sob o prisma externo, equivale ao “direito de não sofrer dominação estrangeira”, e, internamente, ao “direito de se governar, de escolher o seu sistema político e de manter sua identidade cultural” (FILHO, 2013).

Não se trata, porém, de um suposto direito do povo indígena cindir-se do Estado em que se encontra territorialmente alocado, ou, em outras palavras, não se trata de secessão, este o maior temor dos Estados em progredirem no reconhecimento dos direitos indígenas. Aliás esta negativa encontra-se expressa no art. 46, da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas13, o que implica em reconhecer que o direito à autodeterminação se submete à manutenção da integridade territorial de um Estado multinacional, em harmonia, ademais à orientação contida na Declaração sobre a concessão de Independência aos Países e Povos Coloniais14.

A secessão funcionaria, então, para os povos indígenas da mesma maneira que opera para todos os demais povos, ou seja, o desmembramento na hipótese de existência de Estado opressor, i.e, direito de revolução. É como explica Robério Nunes dos Anjos Filho15:

A secessão só seria justificada nos casos em que há situação recente de colonialismo ou ocupação estrangeira, ou, como ultima ratio, quando ocorre violação de valores democráticos e de igualdade e respeito. Reconhece-se, assim, que a secessão só pode ser concebida a título de sanção contra um Estado que não cumpre suas obrigações relativas ao respeito à integridade dos demais Estados e à proteção dos direitos das minorias.

(…)

Com a ideia de Estado plurinacional abandona-se a premissa de que deve existir uma organização política estatal própria para cada grupo nacional, substituindo-a pela ideia de que é possível que diversas nações convivam em um único Estado, em situação de igualdade, harmonia e respeito mútuo. De fato não há – e talvez nunca tenha havido – espaço para a equação uma nação, um estado, considerando que existem em torno de 5.000 a 8.000 mil grupos étnicos em apenas cerca de 200 Estados independentes.

(…)

Importante, ainda, não perder de vista que não pertencem originariamente à cultura indígena os conceitos de Estado-nação, poder constituinte, constituição, território, soberania. Portanto, também não é um dado originário da sua cultura a ideia de secessão. Todos esses signos têm sua origem na cultura majoritária. Inclusive, na maior parte dos grupos indígenas prevalece a visão de território compartilhado com outras comunidades, o que se choca com a noção de exclusividade que o território adquire no contexto do Estado-nação.

A legitimidade da integridade do Estado multinacional ou pluriétnico repousaria, assim, sobre um consentimento tardio, pelas minorias étnicas que o constituem, desta feita, com base num entendimento mútuo, numa espécie de refundação do Estado (FILHO, 2013, p. 599).

2 Exploração dos recursos naturais

De acordo com o informativo nº 539, do STF, no julgamento da Pet 3.388 (demarcação da área Raposa/Serra do Sol), com explicitações feitas pelo Ministro Menezes Direito:
 

1) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas (CF, art. 231, § 2º) pode ser relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da CF, relevante interesse público da União, na forma de lei complementar;

2) o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso Nacional;

3) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando-se-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei;

4) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se for o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira;

5) o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da Política de Defesa Nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI;

6) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI;

7) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação;

8) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;

9) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, as tradições e os costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI;

10) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;

11) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI;

12) o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não podem ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas; 13) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação ou não;

14) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios;

15) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária extrativa;

16) as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos artigos 49, XVI, e 231, § 3º, da Constituição da República, bem como a renda indígena, gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros;

17) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada;

18) os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis;

19) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento.

De tudo que se lê, extrai-se primordialmente que o usufruto das terras indígenas somente pode ser exercido pelas comunidades indígenas como exploração sustentável, de subsistência, não predatória. Era o que dispunha o art. 3º-A, do antigo Código Florestal, e não obstante mencionado dispositivo não tenha sido expresso no novo Código, a orientação persiste.

As terras são, em consonância com o que fora esposado alhures, acerca da manutenção da integridade do Estado continente das comunidades indígenas, de propriedade da União.

Aos não-índios voltam-se as vedações de “aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas mineiras em terras indígenas”, salvo com autorização do Congresso Nacional, “ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra.”(AMADO, 2013, p. 775).


 

3 A CIDH e o Caso Belo Monte
 

Além de órgãos internacionais como o alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR – Resolução 48/141 da Assembleia Geral da ONU), o Conselho de Direitos Humanos (CDH – Resolução 60/251), e de diversos outros comitês específicos sobre os direitos humanos, enfatizamos, no plano continental, os Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos.

Ele é administrado pela OEA (Organização dos Estados Americanos) e compreende, dentre outros, dois órgãos “competentes para monitorar e exigir o cumprimento” (PORTELA, 2012, p. 875) de compromissos assumidos pelos Estados Americanos, em matéria de Direitos Humanos, a saber, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, a primeira com sede em Washington, Capital dos Estados Unidos, e a segunda em São José, na Costa Rica.

Acerca das atribuições e competências de cada órgão, transcreveremos quadro sinótico trazido por Paulo Henrique Gonçalves Portela16:

Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Corte Interamericana de Direitos Humanos

Órgão não-jurisdicional, responsável, em termos genéricos, por acompanhar a aplicação dos tratados de direitos humanos do sistema interamericano

Órgão jurisdicional responsável, em termos genéricos, por promover a aplicação dos tratados de direitos humanos do sistema interamericano por meio de decisões judiciais e pareceres

É composta por sete membros, que atuam a título pessoal, independentemente, portanto, dos Estados dos quais são nacionais

É composta por sete juízes, que atuam a título pessoal, independentemente dos Estados dos quais são nacionais

Pode ser acionada por Estados, por órgãos da OEA ou, ainda, dentro de determinadas condições por indivíduos e determinadas instituições

Pode ser acionada apenas pelos Estados e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Pode formular recomendações aos Estados para que adotem medidas progressivas em prol da promoção dos direitos humanos

Tem competência contenciosa (exame, processo e julgamento dos feitos judiciais) e consultiva (emissão de pareceres)

Pode solicitar aos Estados informações sobre as medidas que adotarem no campo dos direitos humanos

Os Estados só poderão ser partes em processos na Corte se aceitarem sua competência obrigatória

Deve atender às consultas dos Estados em questões relacionadas com os direitos humanos e prestar-lhes o apoio possível

O Brasil aceita a competência da Corte

Deve examinar as petições individuais e comunicações que lhe forem dirigidas

A sentença é obrigatória, definitiva e inapelável

Pode investigar denúncias de violações de direitos humanos.

As sentenças que determinem indenização poderão ser executadas no país respectivo pelo processo interno vigente para a execução de sentenças contra o Estado

Pode também trabalhar para que os envolvidos cheguem a uma solução amistosa em problemas vinculados aos direitos humanos

Expressa suas conclusões e recomendações por meio de relatórios, que conterão as informações pertinentes.

Os principais casos envolvendo o Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos foram: “Caso Damião Ximenes Lopes”, “Caso Nogueira de Carvalho”, “Caso Escher e outros”, “Caso Garibaldi” e “Caso Júlia Gomes Lund e outros – Guerrilha do Araguaia” (PORTELA, 2012, pp. 893-894).

Neste último caso, da Guerrilha do Araguaia, a Corte, no dia 24 de setembro de 201017, em sentença condenatória, reconheceu as afrontas procedidas pelo Estado brasileiro, e, em conclusão final, consignou:

Finalmente es prudente recordar que la jurisprudencia, la costumbre y la doctrina internacionales consagran que ninguna ley o norma de derecho interno, tales como las disposiciones acerca de la amnistía, las normas de prescripción y otras excluyentes de punibilidad, debe impedir que un Estado cumpla su obligación inalienable de castigar los crímenes de lesa-humanidad, por ser ellos insuperables en las existencias de un individuo agredido, en las memorias de los componentes de su círculo social y en las transmisiones por generaciones de toda la humanidad.

Es necesario ultrapasar el positivismo intensificado, pues sólo así se entrará en un nuevo período de respeto de los derechos de la persona, contribuyendo para acabar con el círculo de impunidad en Brasil. Es necesario mostrar que la Justicia actúa de forma igualitaria en el castigo de quien sea que practique graves crímenes contra la humanidad, de modo que la imperatividad del Derecho y de la Justicia sirva siempre para mostrar que prácticas tan crueles e inhumanas jamás pueden repetirse, jamás serán olvidadas y a cualquier tiempo serán castigadas.

Tomaremos, entretanto, como caso paradigma para compreendermos a situação dos indígenas, o de Belo Monte, no qual, pelo Decreto Legislativo nº 788/2005, do Congresso Nacional, autorizou-se o aproveitamento hidroelétrico no trecho do Rio Xingu, localizado no Estado do Pará, sobre o qual fora manejada Ação Direta de Inconstitucionalidade, não conhecida, porém, pelo STF18.

Como explica Sarah Delma Almeida Vasconcelos19:

O complexo hidrelétrico de Belo Monte é uma obra vultosa a ser feita nas margens do Rio Xingu, importante afluente do Rio Amazonas, com vistas a ser a maior hidrelétrica do Brasil e a terceira maior do mundo, ficando atrás somente da “Três Gargantas”, na China, e da binacional “Itaipu” e terá um custo de US$ 10,6 bilhões. O rio Xingu faz parte da bacia Hidrográfica Amazônica, a maior do mundo, e percorre o trajeto de aproximadamente dois mil quilômetros de extensão rumo ao interior da Amazônia, sendo responsável pela sobrevivência de populações tradicionais da região, dentre elas alguns povos indígenas. A Bacia do Xingu é habitada por 24 etnias que ocupam 30 terras indígenas, sendo 12 no estado de Mato Grosso (MT) e 18 no estado do Pará (PA). Na região de influência direta da usina, três terras indígenas seriam diretamente impactadas: a Terra Indígena Paquiçamba, dos índios Juruna, e a área dos Arara da Volta Grande, que se situam no trecho de 100 km do rio que teria sua vazão drasticamente reduzida. O projeto é alvo de contestações de ambientalistas, do Ministério Público Federal e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Conforme Rojas e Telles do Vale (2011), o impacto que essa obra causará sobre esses povos será não pela a água, mas pela a ausência dela, uma vez que mais de cem quilômetros de rio passarão a suportar a seca causada pelo desvio do percurso do rio e mais de oitenta por cento da água será usada para a geração de energia. Segundo Magalhães (2009, p. 62), o projeto está previsto para ser instalado em uma área indígena por excelência, além de existir outros grupos indígenas isolados, como, por exemplo, os Arara da Volta Grande e Paquiçamba, nos arredores da Volta Grande do rio Xingu.

Referido caso chegou ao conhecimento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que, em 1 de abril de 2011, considerando os aviltamentos aos direitos indígenas envolvidos, outorgou medidas cautelares20 em prol dessas comunidades (Arara da Volta Grande do Xingu; Juruna de Paquiçamba; Juruna do “Kilómetro 17”; Xikrin de Trincheira Bacajá; Asurini de Koatinemo; Kararaô e Kayapó da terra indígena Kararaô; Parakanã de Apyterewa; Araweté do Igarapé Ipixuna; Arara da terra indígena Arara; Arara de Cachoeira Seca; e as comunidades indígenas em isolamento voluntário da bacia do Xingu), e, posteriormente, em 29 de julho de 2011, após informações técnicas a respeito do processo de licenciamento para a construção da hidrelétrica, encaminhadas à CIDH pelo Estado Brasileiro, aquela Comissão as reconsiderou, no seguinte sentido:

Em 29 de julho de 2011, durante o 142o Período de Sessões, a CIDH avaliou a MC 382/10 com base na informação enviada pelo Estado e pelos peticionários, e modificou o objeto da medida, solicitando ao Estado que: 1) Adote medidas para proteger a vida, a saúde e integridade pessoal dos membros das comunidades indígenas em situação de isolamento voluntario da bacia do Xingu, e da integridade cultural de mencionadas comunidades, que incluam ações efetivas de implementação e execução das medidas jurídico-formais já existentes, assim como o desenho e implementação de medidas especificas de mitigação dos efeitos que terá a construção da represa Belo Monte sobre o território e a vida destas comunidades em isolamento; 2) Adote medidas para proteger a saúde dos membros das comunidades indígenas da bacia do Xingu afetadas pelo projeto Belo Monte, que incluam (a) a finalização e implementação aceleradas do Programa Integrado de Saúde Indígena para a região da UHE Belo Monte, e (b) o desenho e implementação efetivos dos planos e programas especificamente requeridos pela FUNAI no Parecer Técnico 21/09, recém enunciados; e 3) Garantisse a rápida finalização dos processos de regularização das terras ancestrais dos povos indígenas na bacia do Xingu que estão pendentes, e adote medidas efetivas para a proteção de mencionados territórios ancestrais ante apropriação ilegítima e ocupação por não- indígenas, e frente a exploração ou o deterioramento de seus recursos naturais. Adicionalmente, a CIDH decidiu que o debate entre as partes no que se refere a consulta previa e ao consentimento informado em relação ao projeto Belo Monte se transformou em uma discussão sobre o mérito do assunto que transcende o âmbito do procedimento de medidas cautelares.


 

Após entraves que perduram sobre o caso por mais de duas décadas, recentemente, em 22 de abril do ano em curso, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região decidiu em torno do tema, nos autos do AC 0025999-75.2010.4.01.3900, determinando a suspensão das obras UHE Belo Monte.

Mais especificamente no tocante aos interesses dos índios Xingu, também no mês de abril deste ano, nos autos da ação civil pública 655-78.2013.4.01.3903, a Justiça Federal, em 1ª Instância, Seção Judiciária do Estado do Pará, decidiu, em liminar, determinou que a Norte Energia se abstivesse de executar as obras das unidades de proteção territorial em padrões diversos dos pactuados no Plano Emergencial de Proteção das Terras Indígenas do Médio Xingu não autorizadas pela FUNAI, sob pena de multa diária no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais).

Como estes, tramitam nos limites da jurisdição do TRF1ª Região dezenas de ações questionando as obras para implementação da Hidroelétrica Belo Monte, as quais, apesar dos avanços tímidos em torno do tema, estão longe de uma solução que assegure os direitos das comunidades indígenas da região.


 

4 Considerações finais


 

De todo apanhado feito no presente trabalho, percebe-se que, apesar de todo arcabouço normativo em torno do tema, as afrontas aos direitos indígenas continuam sendo cometidas pelo Brasil, seja por ação ou omissão, como o Relatório da Justiça Global no ano de 2003 reconheceu que “o Governo Brasileiro é responsável direto pelo estado de depauperação em que se encontram as comunidades indígenas, tomando partido, por não aplicar a lei, daqueles que empreendem as mais terríveis atrocidades em nome dos atos de lucro e da especulação imobiliária”, e conforme constatado pela Carta do 1º Congresso Municipal de Direitos Humanos de Belém21, “apesar da existência de inúmeros documentos internacionais e nacionais de proteção aos direitos humanos, especialmente a Constituição Federal de 1988, ainda hoje podemos constatar que esses direitos frequentemente não são assegurados e protegidos em sua plenitude, especialmente pelas diversas esferas do Poder Público”.

Ainda, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos entendeu estarem, no Brasil, ameaçadas a integridade física e cultural dos índios, e as suas terras, tanto por particulares quanto pelo próprio Estado. Demonstrando uma preocupação especial, também, com a carência da assistência na saúde, alimentação e óbices ao acesso de outros serviços públicos22.

Com efeito. Muitos desrespeitos têm sido cometidos mesmo desde a segunda metade do século XX, época das regulamentações a nível internacional e nacional, contra os direitos dos índios, tanto por parte do Estado, como por parte dos policiais, fazendeiros, agricultores, rizicultores, garimpeiros e suas milícias privadas.

As principais reivindicações dos índios e recomendações dos órgãos Internacionais e nacionais de defesa dos direitos humanos são no seguinte sentido: parcerias agrícolas para que as comunidades façam as terras produzir; consideração, na saúde, das práticas de medicina natural dos grupos; instituição de medidas compensatórias efetivas na educação e saúde; assessoria dos povos; cumprimento integral das demarcações de terras; paralisação do processo de municipalização nas áreas de habitação indígena; aumento da vigilância e da punição contra os violadores dos direitos humanos; regularizar e desintrusar as terras; formação de indivíduos da própria comunidade, como professores e agentes de saúde, para atuarem em suas áreas; melhoramento da comunicação, do transporte; linhas de crédito para projetos indígenas; formação de escolas técnicas, como as agropecuárias; a reestruturação da FUNAI, com a investigação e destruição da prática de corporativismo dentro do Órgão; o combate às agressões ambientais (monoculturas, agropecuária extensiva, contaminação das águas); tratamento dos índios como cidadãos brasileiros, com pleno exercício dos seus direitos políticos; recuperação da memória histórica da etnia através de medidas de incentivo cultural.

Entretanto, a passos lentos, caminha o Estado Brasileiro, sendo poucos os casos em que o Estado Brasileiro atua como garante dos direitos das minorias indígenas, como se deu no exemplo do Caso dos Índios Potiguara, na Paraíba, em julgado do TRF da 5ª Região, no processo nº 465442 PB (MAIA, 2013, p. 469). E ainda há, exageradamente, muito que se fazer.

Nesse cenário, o que se mostra imperioso é verdadeiramente fazer valer o significado de proteção e interação. Proteção para reequilibrar uma relação desigual, com instituição de um microssistema que transmitam o real conceito de minoria e que, por isso, compensem as desigualdades. E interação para ter direito à voz no meio da comunidade nacional, sem ter que, pra isso, se descaracterizar como etnia praticante. Ou seja, é de um todo deturpável o conceito de processo de civilização para os índios, de escala de evolução, utilizados, inclusive por alguns dos nossos doutrinadores de direito mais respeitáveis, como Maria Helena Diniz e Caio Mário Pereira23. A questão deve, pois, ser encarada como o direito à diferença étnica e não como uma escala hierárquico-evolutiva24.

Em verdade, o que se evidencia é a reprodução de um resistente modelo histórico, que, mediante processo de demonização25, coloca os diferentes, ou vulneráveis, no caso, os indígenas, como que num estado de carência de civilização, o que impõe a submissão daqueles às ordens preestabelecidas. E, nesse desiderato, os aviltamentos à dignidade indígena passa-nos invisíveis, indiferentes ou, pior, presumidamente justificados.

Contra o status quo, os direitos humanos caminham sob o prisma26 do “new legal pluralism”, ou das redes de legalidade paralelas, ou ainda “the politics of definition of law”, como construção antiglobalista, que pretende uma interação humana, como movimento de pressão em direção à recuperação das tradições normativas pré-coloniais, de afirmação das identidades regionais e étnicas27, e não em sua extinção, tal qual aconteceu no processo civilizatório brasileiro em detrimento dos índios nativos.


 

5 Referências


 

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1 AMADO, Frederico. In Direito Ambiental. 3ª Edição, São Paulo: Editora Método, 2012, p. 771.

2 Ob. Cit, p. 1097-1098.

3 http://www.washingtonpost.com/world/the_americas/brazils-government-program-to-protect-a-tribe-criticized-for-its-treatment-of-poor-farmers/2014/03/20/a532b1ca-aca6-11e3-a06a-e3230a43d6cb_story.html

4 Disponível em: http://www.noticiasagricolas.com.br/noticias/questoes-indigenas/136804-no-blog-questao-indigena-washington-post-denuncia-violencia-do-governo-brasileiro-contra-agricultores-pobres-no-maranhao.html

acesso em: 28 de abril de 2014.

5MAIA, Luciano Mariz. O Direito dos Índios nos Tribunais. Direitos Humanos e Direitos Fundamentais. Diálogos Contemporâneos. Org. Robério Nunes dos Anjos Filho, Salvador: Editora Jus Podivm, 2013, p. 454.

6 Outro caso: 105022790 – MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – INSTALAÇÃO DAS SEDES DOS RECÉM-CRIADOS MUNICÍPIOS DE PACARAIMA E UIRAMUTà EM VILAS COM OS MESMOS NOMES – ARTIGOS TERCEIROS DAS LEIS NºS – 96 E 98, DE 17.10.1995 – ALEGAÇÃO DE QUE ESTÃO SITUADOS NAS ÁREAS INDÍGENAS DE "SÃO MARCOS" E "RAPOSA TERRA DO SOL", RESPECTIVAMENTE, E DE OFENSA AO ART. 231, §§ 1º, 4º E 6º, DA CONSTITUIÇÃO – 1. Escorço histórico dos contornos dos fatos relacionados com a ocupação das áreas do Estado de Roraima, desde 1768, onde se pretende instalar os novos Municípios. 2. O deslinde das questões ligadas à ocupação da área exige observância à legislação da época (Lei nº 601, de 1850, e Decreto nº 1.918, de 1854, que a regulamentou, entre outros), pesquisa de documentos e depoimentos de eventuais testemunhas que conheçam o passado destas áreas. 3. Pendência de interdito proibitório requerido pela FUNAI contra o Estado de Roraima. 4. Casos como a demarcação homologada da Reserva de São Marcos, estão com a eficácia suspensa em virtude da nova orientação de política demarcatória de reservas indígenas adotadas pelo Decr. nº 1.775/95, que alterou o Decr. nº 22/91; inexistência de ato demarcatório das áreas aperfeiçoado. 5. Incerteza quanto aos requisitos exigidos pelo § 1º do art. 231 da Constituição, para se considerar que as áreas mencionadas são tradicionalmente ocupadas pelos índios; situação que não permite arrostar a autonomia do Estado, manifestada ao criar os Municípios. 6. Solução da lide que exige a apuração de um estado de fato concreto e contraditório cuja natureza do tema e deslinde não são compatíveis com os moldes e limites do juízo cautelar nem com o conteúdo da ação de controle normativo abstrato das Leis. Precedentes. 7. Ação direta não conhecida. (STF – ADI 1512 – RR – TP – Rel. Min. Maurício Corrêa – DJU 01.08.2003 – p. 00099) JCF.231 JCF.231.1 JCF.231.4 JCF.231.6

7CORRÊA, Maurício. O contraditório de Raposa Serra do Sol. In Revista Jurídica Consulex. Ano XII, nº 272, 2008, p. 27.

8BICALHO, Poliene Soares dos Santos. Lideranças Indígenas e o Decreto nº 1.775/1996. In Emblemas Revista do Departamento de História e Ciências Sociais – UFG/CAC - v. 9, n. 1, 57-75, jan-jun, 2012.

9 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6ª edição. São Paulo: Editora Método, 2012, p. 383.

10http://www.camara.leg.br/internet/ordemdodia/ordemDetalheReuniaoCom.asp?codReuniao=36038

11In Os índios e o novo Congresso Nacional. Disponível em http://laced.etc.br/site/arquivos/03-Alem-da-tutela.pdf; acesso em 29 de abril de 2014.

12FILHO, Robério Nunes dos Anjos. O Direito à autodeterminação dos povos indígenas: entre a secessão e o autogoverno. Direitos Humanos e Direitos Fundamentais. Diálogos Contemporâneos. Org. Robério Nunes dos Anjos Filho, Salvador: Editora Jus Podivm, 2013, p. 594.

13Nada do disposto na presente Declaração será interpretado no sentido de conferir a um Estado, povo, grupo ou pessoa qualquer direito de participar de uma atividade ou de realizar um ato contrário à Carta das Nações Unidas ou será entendido no sentido de autorizar ou de fomentar qualquer ação direcionada a desmembrar ou a reduzir, total ou parcialmente, a integridade territorial ou a unidade política de Estados soberanos e independentes.

14Resolução 1514 (XV) da Assembleia Geral de 14 de dezembro de 1960.

15Ob cit, p. 596.

16Ob. Cit. Pp 889 e 892.

17http://www.bjdh.org.mx/BJDH/doc?doc=casos_sentencias/CasoGomesLundOtrosvsBrasil_ExcepcionesPreliminaresFondoReparacionesCostas.htm Acesso em 29 de abril de 2014.

1810160157 - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DECRETO LEGISLATIVO N. 788, DE 2005, DO CONGRESSO NACIONAL. AUTORIZAÇÃO AO PODER EXECUTIVO PARA IMPLEMENTAR O APROVEITAMENTO HIDROELÉTRICO BELO MONTE NO TRECHO DO RIO XINGU, LOCALIZADO NO ESTADO DO PARÁ. ATO CONCRETO. LEI-MEDIDA. AUSÊNCIA DE ABSTRAÇÃO E GENERALIDADE NECESSÁRIOS AO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONCENTRADO. INVIABILIDADE DA AÇÃO DIRETA. ARTIGO 102, INCISO I, "A", DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. Compete ao Supremo Tribunal Federal julgar originariamente a ação direta de inconstitucionalidade de Lei ou ato normativo federal ou estadual [artigo 102, I, "a", CB/88]. Os atos normativos que se sujeitam ao controle de constitucionalidade concentrado reclamam generalidade e abstração. 2. Não cabe ação direta como via de impugnação de leimedida. Alei-medida é Lei apenas em sentido formal, é Lei que não é norma jurídica dotada de generalidade e abstração. 3. Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida. (STF; ADI 3.573-8; DF; Tribunal Pleno; Rel. Min. Eros Grau; Julg. 01/12/2005; DJU 12/02/2007; Pág. 15)

19In A Reação do Estado Brasileiro diante do Sistema Interamericano de Direitos Humanos no Caso Belo Monte. Acervo UFPB, monografias CCJ – Centro de Ciências Jurídicas.

20http://www.cidh.oas.org/medidas/2011.port.htm Acesso em 29 de abril de 2014.

21In Direitos Humanos no 3º Milênio, com Inclusão Social e Democracia.

22MONTEIRO, Eduardo Martins Neiva. In Direitos Indígenas: Proteção Necessária à Luz dos Direitos Humanos. Vide também: HÉLIO BICUDO. In Revista Jurídica Consulex. Ano XI, nº 246, 2007, p. 66.

23MONTEIRO, Eduardo Martins Neiva. In Direitos Indígenas: Proteção Necessária à luz dos Direitos Humanos.

24Hélder Girão Barreto apud MONTEIRO, Eduardo Martins Neiva, ibidem.

25“Demonização, portanto, é o processo pelo qual a sociedade desconstrói a imagem humana de seus inimigos, que a partir desse momento não merecem ser incluídos sobre o domínio do Direito.”

26ZOLO, Danilo. Rumo ao ocaso global? Os direitos humanos, o medo, a guerra. São Paulo: Editora Conceito, 2011.

27Degregori, Carlos Iván. Multiculturalidad e Interculturalidad.En: Educación y diversidad rural. Seminario Taller Julio 1998, Ministerio de Educación, Lima, 1999, pp. 63-69.

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