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Responsabilidade civil pelo fato da coisa e do animal

Agenda 02/05/2016 às 18:15

O presente artigo traz consigo reflexões a respeito da responsabilidade civil pelo fato da coisa e da responsabilidade civil pelo fato do animal a luz da doutrina e jusrisprudência.

Sumário: 1 Aspectos Introdutórios. 2. Da responsabilidade Civil pelo fato da coisa. 3.  Responsabilidade Civil Pelo Fato do Animal. 4. Aspectos Conclusivos. Referências Bibliográficas.

RESUMO

O presente artigo traz consigo reflexões a respeito da responsabilidade civil pelo fato da coisa e da responsabilidade civil pelo fato do animal. Sabe-se que nesse tipo de responsabilidade temos a modalidade objetiva, só sendo o dano irressarcível se comprovado algum dos tipos de excludente da responsabilidade. Dessa maneira, conhecendo a importância do tema, se objetiva fazer rápidas considerações sobre a responsabilidade pelo fato da coisa e do animal, sempre à luz do entendimento de doutrinário e jurisprudencial.

Palavras chave: Responsabilidade Civil; Responsabilidade Civil pelo fato da coisa; Responsabilidade Civil pelo fato do animal.

ABSTRACT

This article brings reflections on the civil responsibility for the fact of the thing and the liability because of the animal. It is known that this kind of responsibility we have the objective mode, only being damage if proven some of the types of exclusive responsibility. Thus, knowing the importance of this issue, it aims to make quick consideration of the responsibility for the fact of the thing and the animal, always in the light of understanding of doctrinal and jurisprudential.

Keywords: Civil responsibility; Civil responsibility for the fact of the thing; Civil responsibility for the fact of the animal.

  1. ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

A base fundamental da responsabilidade civil está em que o homem responde pelos danos que causa. Sem dúvida, representou um grande passo na evolução da responsabilidade civil o reconhecimento da responsabilidade de alguém pelo fato de outrem.

Por essa razão, Aguiar Dias insurge-se contra o conceito de responsabilidade pelo fato das coisas, sob o simples argumento de que coisa não é capaz de fato.

Assim por trás de uma coisa inanimada, há sem duvidas o fato do homem. Admite-se, no entanto, que há coisas mais perigosas do que outras. Pondera-se que quando o homem utiliza a força estranha aumenta sua própria força, este aumento rompe o equilíbrio antes existente entre o autor do acidente e a vítima.

Não bastasse o perigo decorrente das coisas inanimadas supra mencionadas, a mesma situação se aplica ao dono ou possuidor de animal feroz, que por ventura venha a ferir ou matar alguém que dele se aproxima.

E é por vivermos expostos a situações onde não apenas os homens, mas também as coisas e os animais podem acarretar graves riscos ao nosso patrimônio ou à nossa integridade físico-psíquica, é que se torna interessante o estudo do tema, onde se analisará a responsabilidade da pessoa que detém o poder de comando das coisas e animais causadores de danos à esfera jurídica de outrem, situação de prejuízo esta que, não poderia deixar-se sem ressarcimento.

Antes de adentrar ao tema de forma específica, indispensável citar as palavras de Silvio de Salvo Venosa:

Dessa maneira, passa-se ao estudo específico da responsabilidade civil pelo fato da coisa e do animal, prevista nos arts. 936 a 938, do Código Civil.

  1. DA RESPONSÁBILIDADE CIVIL PELO FATO DA COISA

O termo "fato", e não "ato", já permite visualizar a ideia de que se trata da responsabilidade de uma ação não-humana, entretanto que a este humano sobre cairá o ato de indenizar o dano causado por ser o responsável pelo objeto ou animal. A doutrina civilista espelhou-se grandemente nas teorias francesa, se utilizando das ideias de Planiol, Ripert e Boulanger que ao interpretar o Código Napoleão, chegou à teoria da responsabilidade pelo fato da coisa inanimada.

  O art. 1.382 daquele Código teve grande importância, encontrando a consagração parcial da teoria do risco, se desenvolvendo e atingindo os Tribunais da França encontrando depois a doutrina internacional.

Diversas modificações profundas foram acrescidas para responder às novas necessidades surgidas do desenvolvimento tecnológico, industrial e social. Somente depois de cinquenta anos de trabalho jurisprudencial, veio ao primeiro plano a responsabilidade pelo fato das coisas inanimadas em geral.

Segundo Planiol, Ripert e Boulanger foi somente ao fim do século passado que a jurisprudência teve a ideia de encontrar no § 1º do art. 1.384 do Código de Napoleão uma regra geral que abrigasse tal gênero de responsabilidade civil.

Ocorreu através da ideia de presunção de culpa, assim explicados os arts. 1.385 e 1.386, e, num desenvolvimento lógico foi possível utilizar a mesma explicação “quando o dano provinha do fato de uma coisa inanimada”. Assinalavam os Mazeaud que o art. 1.385 editava uma “presunção de culpa”. Não se contentou em reforçar a presunção antes editada pelo art. 1.384, estendendo-a consideravelmente para aplicação sobre as coisas, móveis, imóveis, perigosas e não perigosas.

Da presunção de culpa criou-se a presunção de responsabilidade. Expressão muito criticada como não tendo sentido, pois que ou uma pessoa é responsável ou não; o que não é cabível, é dizer que se presume ser responsável. O fato, porém, é que não obstante combatida, a chamada presunção de responsabilidade, esta encontra boa acolhida entre prestigiados mestres franceses.

Parte da doutrina enxerga na teoria da responsabilidade pelo fato das coisas, uma consagração parcial da teoria do risco (Planiol, Ripert e Boulanger), o que repercute diretamente no conceito de guardião da coisa.

A guarda é noção-chave que exprime a ideia de responsabilidade de pleno direito, ligando-se a certo poder sobre a coisa. Segundo Marty e Raynaud a detenção material de uma coisa não basta para caracterizar a figura do guardião. Liga-se mais o conceito de guarda jurídica do que ao conceito de guarda material.

A saber o proprietário é presumido como guardião da coisa, desta sorte, em ocorrendo fato danoso, contra ele, ergue-se a presunção de culpa. Embora seja presunção relativa, posto que nem sempre o proprietário tem o uso direto da coisa.

Salientam os irmãos Mazeaud que essa responsabilidade do proprietário é alternativa e não cumulativa, logo a vítima não pode em todos os casos voltar-se contra o proprietário. Poderá o dono da coisa elidir a guarda presuntiva da coisa provando que outra pessoa se servia da coisa, seja por locação, comodato, arrendamento, depósito ou penhor. Nesses casos, a responsabilidade passa do proprietário ao cessionário.

Há diversos critérios para se definir o princípio da responsabilidade pelo fato das coisas. Em primeiro plano, posta-se o critério do proveito, dizendo-se que é o guardião da coisa quem dela se aproveita economicamente, que atrai a doutrina para a teoria do risco: ubi emolumentun ibi onus.

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Tal teoria é contestada pelos partidários da doutrina subjetiva, para os quais, fora da culpa, é impossível dizer por que a propriedade, o uso ou a detenção de uma coisa que constituem direitos, imporiam, ao mesmo tempo obrigações.(Planiol, Ripert e Boulanger). É certo que pelo Código Civil brasileiro de 2002 a propriedade vigora sob ótica da função social, daí certamente acarreta obrigações tanto individuais como coletivas.

O segundo critério proposto pelos irmãos Mazeaud é o da direção material, assim: guarda é pessoa que materialmente tem a direção da coisa ( a guarda do automóvel será o motorista, quando o dirige, mesmo que não seja preposto do proprietário).

Variação deste critério será o “direito de direção”, onde se tem o conceito de guardião como a pessoa à qual a situação jurídica confere um direito de direção relativamente à coisa. Quando o proprietário confia seu veículo ao motorista, permanece aquele como guarda de seu automóvel. Quando um ladrão se apossa de uma coisa, a guarda continua com o proprietário, posto que o ladrão não tem direito sobre a coisa.

Outro critério que também influenciou a jurisprudência francesa, após longas hesitações, é o da “direção intelectual”, que se define como o poder de dar ordens ou o poder de comando relativamente à coisa. Distinto do critério da direção material e do “direito de direção” somente considera a situação de fato: guarda é a pessoa que tem, de fato, um poder de comando em relação à coisa.

Como alega Carbonnier, guardião é quem tem o uso, a direção e o controle da coisa. A lei põe a cargo da pessoa que exerce um poder sobre a coisa a obrigação de tê-la sob seu comando; se a coisa lhe escapa a comando, o guardião é responsável, a menos que demonstre que por causa estranha não pôde exercer seu poder.

A noção de guardião e de guarda são fundamentais para determinação de quem é responsável pelo fato das coisas. André Bresson sustenta que o fato da coisa deve ser entendida como a imperfeição da ação do homem sobre a coisa. Cumpre apurar quem tinha o poder efetivo sobre a coisa no momento em que provocou o dano.

Cabe ao julgador, portanto, verificar quem tinha de fato a guarda da coisa, sobre quem deve razoavelmente recair a presunção de culpa na vigilância e a falta de vigilância é uma circunstância material que pode ser estabelecida mediante prova direta.

A distinção entre a guarda jurídica e a guarda material não tem fundamento sólido e, é contrária à própria significação da palavra “guarda” que supõe um poder de vigilância sobre a coisa e meios de evitar que esta venha a causar danos a terceiros. Não se compreende guarda quando o controle da coisa se torna impossível de ser exercido. Assim, a partir do momento em que perdeu a direção da coisa, deixa evidentemente de ser o guardião.

Ao se deparar com o problema do furto do automóvel em estacionamento, a jurisprudência brasileira, para definir a responsabilidade pelo dano, cogita do depósito do bem, o que demonstra, que, sem se ter aprofundado na ideia de “guarda”, chega a esse mesmo resultado.

De qualquer maneira é necessário determinar a relação de causalidade entre a coisa e o dano, a responsabilidade pelo fato da coisa exige do juiz a determinação do vínculo causal.

O guardião fica exonerado quando a coisa desempenhou função meramente passiva na realização do dano, o que estabelece que a coisa não foi a causa do acidente e induz que este teve uma causa inteiramente estranha.

Não cabe a distinção entre coisas perigosas e não perigosas, bem como animadas ou inanimadas. A responsabilidade pelo fato das coisas dirige-se para aquelas situações em que a ocorrência do prejuízo origina-se de circunstância em que não é a ação direta do sujeito que predomina no desfecho prejudicial. São danos causados por animais, pela ruína de edifício, por objeto que cai ou é arremessado de um prédio, por acidente com a máquina.

Demonstramos a segui decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:

CIVIL. REPARAÇÃO DE DANOS. RESPONSABILIDADE CIVIL PELO FATO DA COISA OU DO ANIMAL. DANOS MATERIAIS. ARTIGOS 186, 927 E 936, DO CCB/02. GADOS QUE ARVORARAM-SE PELA PROPRIEDADE DE TERCEIRO CAUSANDO-LHE PREJUÍZOS. QUEBRA DA CERCA DIVISÓRIA E EM PLANTAÇÕES DE CANA, MANDIOCA E BANANA. PREJUÍZO CONSTATADO. NEXO CAUSAL DEMONSTRADO. PLANTAÇÃO NÃO COMERCIAL. ACERVO PROBATÓRIO (DEPOIMENTOS E FOTOGRAFIAS) CORROBORANDO A TESE AUTORAL. PROVA DO FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO. ART. 333, I E II, DO CPC. CONCENTRAÇÃO DAS PROVAS NA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO, CONFORME DISPOSTO NO ART. 33, DA LEI 9099/95, PODENDO O JUIZ LIMITAR OU EXCLUIR AS QUE CONSIDERAR EXCESSIVAS, IMPERTINENTES OU PROTELATÓRIAS. PRINCÍPIO DA PERSUASÃO RACIONAL DO JUIZ. NÃO CONFIGURAÇÃO DE NULIDADE NA JUNTADA DE FOTOGRAFIAS NA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO. PROVA DO ALEGADO NA INICIAL. ALEGAÇÕES DE CONDUTA PROVOCATIVA E INVEJOSA SEM RESPALDO NO ACERVO PROBATÓRIO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. NECESSIDADE DE PREVISÃO NO ART. 17, DO CPC. MERA REPETIÇÃO DE MATÉRIAS JÁ EXAMINADAS POR OCASIÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO MAS IMPROVIDO. UNÂNIME. 1. AQUELE QUE POR AÇÃO OU OMISSÃO VOLUNTÁRIA, NEGLIGÊNCIA OU IMPRUDÊNCIA, VIOLAR DIREITO E CAUSAR DANO A OUTREM, AINDA QUE EXCLUSIVAMENTE MORAL, COMETE ATO ILÍCITO, GERANDO A OBRIGAÇÃO DE REPARÁ-LO, AO TEOR DOS ARTIGOS 186, 927 E 936, DO CCB/02, VEZ QUE "O DONO OU DETENTOR DO ANIMAL RESSARCIRÁ O DANO POR ESTE CAUSADO SE NÃO PROVAR CULPA DA VÍTIMA OU FORÇA MAIOR"; 2. O JUIZ É O DESTINATÁRIO DA PROVA E CONSOANTE O PRINCÍPIO DA PERSUASÃO RACIONAL, COMO DIRIGENTE PROCESSUAL, CABE, ALÉM DE LIMITAR, EXCLUIR OU INDEFERIR AS PROVAS QUE CONSIDERAR PROTELATÓRIAS, IMPERTINENTES OU EXCESSIVAS, DETERMINAR A PRODUÇÃO DAQUELAS NECESSÁRIAS À FORMAÇÃO DO SEU CONVENCIMENTO. TENDO O MAGISTRADO EXARADO SENTENÇA COM BASE NAS PROVAS PRODUZIDAS, CONCLUI-SE QUE ESSAS FORAM SUFICIENTES PARA SEU MOTIVADO CONVENCIMENTO; 3. SE O JULGAMENTO DO FEITO SE DEU NOS LIMITES LEGAIS, DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO E À LUZ DAS PROVAS TRAZIDAS À BAILA, VEZ QUE AS PRÓPRIAS P ARTES INTERESSADAS NA INSTRUÇÃO DO FEITO ENTENDERAM SUFICIENTES AS PROVAS APRESENTADAS EM AUDIÊNCIA, NÃO HÁ QUE SE FALAR EM FALHA PROCESSUAL E CERCEAMENTO DE DEFESA; NEM HÁ QUE SE FALAR EM NULIDADE PELO FATO DA JUNTADA DE FOTOGRAFIAS, COMO PROVA DO ALEGADO NA INICIAL, NO MOMENTO DA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO - TEOR DO ART. 33 DA LEI 9099/95. 4. CUMPRE AO AUTOR A DEMONSTRAÇÃO DE FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO; LADO OUTRO, AO RÉU O ÔNUS DE DEMONSTRAR EXISTÊNCIA DE FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO AUTORAL; TENDO O AUTOR DEMONSTRADO, POR DOCUMENTOS E TESTEMUNHAS, QUE SOFREU PREJUÍZOS EM SUA PROPRIEDADE, COM A QUEBRA DA CERCA DIVISÓRIA E DESTRUIÇÃO DE PLANTAÇÕES DA CANA, MANDIOCA E BANANA; A REPARAÇÃO DOS DANOS É DIREITO CONSAGRADO NOS ARTIGOS 186, 927 E 936, DO CCB/02. 5. PARA A CONFIGURAÇÃO DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, E SUA RESPONSABILIZAÇÃO, NECESSÁRIO QUE PELO MENOS UMA DAS CONDUTAS PREVISTAS NO ART. 17, DO CPC SEJA PRATICADA, NÃO VERIFICADA (S) NO CASO "SUB EXAMINE". 6. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. UNÂNIME. DE CONFORMIDADE COM O REGRAMENTO QUE ESTÁ AMALGAMADO NO ARTIGO 55 DA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS (LEI Nº 9.099/95), A RECORRENTE, SUCUMBINDO NO SEU INCONFORMISMO, SUJEITA-SE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, OS QUAIS ARBITRO EM 15% (QUINZE POR CENTO) SOBRE O VALOR CORRIGIDO DA CONDENAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO, CONSOANTE REITERADOS JULGADOS DAS TURMAS RECURSAIS, LEGITIMANDO A LAVRATURA DO ACÓRDÃO NOS MOLDES AUTORIZADOS PELO ARTIGO 46 DA LEI Nº 9.099/95. UNÂNIME.

(TJ-DF - ACJ: 80052020068070005 DF 0008005-20.2006.807.0005, Relator: ALFEU MACHADO, Data de Julgamento: 08/05/2007, SEGUNDA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DO DF, Data de Publicação: 14/06/2007, DJU Pág. 190 Seção: 3)

  1. RESPONSABILIDADE CIVIL PELO FATO DO ANIMAL

A responsabilidade por fatos causados por animais tem sua origem no Direito Romano, segundo o qual o dominus era o responsável, mas exonerava-se abandonando o animal.

Diariamente, infelizmente, nos últimos anos deparamo-nos com um crescente número de incidentes envolvendo animais ferozes, por conta da falta de cautela e civilidade dos seus donos ou possuidores. Diariamente, a é noticiado casos de ataques de cães ferozes, de raças agressivas como o que ocasionam danos graves e até a morte das vítimas.

Para esses casos, a legislação prevê a responsabilidade do dono ou detentor do animal, prevista no art. 936, do atual Código Civil: “O dono ou detentor do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior”.

Na atual lei, a responsabilidade do dono ou detentor do animal não pode ser elidida pela simples guarda ou vigilância com cuidado preciso do animal, como regulava o Código de 1916 em seu art.1527, pois, partindo-se da teoria do risco, o guardião somente se eximirá se provar quebra do nexo causal em decorrência da culpa exclusiva da vítima ou evento de força maior, não importando a investigação de sua culpa.

Ressalte-se que, se o dano ocorre estando o animal em poder do próprio dono, dúvida não há no sentido de ser este o responsável pela reparação, pelo fato de ser o seu guardião presuntivo. Se, entretanto, transferiu a posse ou a detenção do animal a um terceiro (caso do comodato ou da entrega a amestrador), entende-se que o seu dono se exime de responsabilidade, por não deter o poder de comando sobre ele.

 Nesse sentido, a jurisprudência:

Responsabilidade civil – Acidente de trânsito – Animal solto na pista – Gado que sai de propriedade na margem de rodovia vicinal e ganha a pista, provocando atropelamento com danos em veículo Responsabilidade indenitária do réu, de cujo sítio as rezes saíram, independentemente de ser ou não o proprietário dos animais – Falta de marca que não exime aquele dever, porque gado não tem certidão de nascimento, transmitindo-se a propriedade pela simples tradição e, se saíram do pasto do réu, destruindo a cerca, aliás, frágil e imprópria nas circunstâncias, houve falta de cuidados e de vigilância – O fato de terceiro, não comprovado, também não isentaria a responsabilidade gerando apenas direito de regresso – Indenizatória procedente – Recurso provido para esse fim. (1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo. Apelação Cível n.º 910290-5 . Rel. Souza Oliveira. São Paulo, 03 de agosto de 2000).

Sobre indenização de dano causado por mordida de cão, interessante o seguinte julgado:

Apelação Cível. Direitos Civil e Processual. Ação de Reparação de Danos. Lesão incurável nos testículos decorrente de feroz mordida de animal. Responsabilidade civil do dono do animal. Artigos 5º, X, da Constituição Federal, 333, I, do Código de Processo Civil e 1527 do Código civil [atual art. 936]. O instituto da responsabilidade civil, na modalidade subjetiva, encontra-se assentado em três pressupostos sem os quais não se perfaz: o dano, a culpa e o nexo de causalidade entre o primeiro e o segundo. O art. 1527 do Código Civil restringe-se, enquanto regra distributiva do ônus da prova, nestes casos, apenas e tão-somente ao elemento culpa do tripé que pressupõe a responsabilidade civil. Tem-se por evidente, pois, da simples verificação do que consta dos respectivos incisos que todos eles, sem exceção, referem-se à culpabilidade do dono ou detentor do animal. Assim, a procedência do pedido de reparação de danos materiais é imprescindível sejam estes, os danos, comprovados pelo demandante, nos termos do art. 333, I, do CPC, segundo o qual ao autor incumbe a prova dos fatos constitutivos de seu direito. Restando estes incomprovados, improsperável a pretensão de ressarcimento pelo dano material. Noutro pólo, verificada a lesão à esfera extrapatrimonial do ofendido, deve a verba indenizatória coadunar-se com o dano efetivamente demonstrado, no caso, inflamação crônica nos testículos e azoospermia. A idade do demandante nada tem que ver com a extensão da dor sofrida pela esterilidade. Menos

ainda com o constrangimento. Nem a idade, nem a prole e nem mesmo a circunstância de ser o autor casado. O valor tutelado pela norma – a intimidade, a vida privada, a imagem e a honra referidas no inciso X, do art. 5º, da Constituição Federal – está muito além da virilidade ou mesmo opção sexual e familiar da pessoa. Refere-se este valor, inquestionavelmente, a aspectos intangíveis e personalíssimos, calcada sua tutela na idéia de solidariedade à vítima, em razão da ofensa que sofreu a um bem jurídico lesado pelo agente. Sentença que se reforma, majorando-se a verba indenizatória a título de reparação pelo dano extrapatrimonial de 50 (cinqüenta) para 500 (quinhentos) salários mínimos. Provimento parcial do recurso. (RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. Apelação cível nº 2001.001.00890. Rel. Sérgio Cavalieri Filho. Data da decisão: 24 de abril de 2001).

Não obstante a regra contida na primeira parte do art. 936, só o ataque do cão resultar de culpa exclusiva da vítima (provocar o animal; adentrar em terreno onde o animal está, desconsiderando a existência de placas indicativas de animal perigoso, etc.) não haverá obrigação de indenizar, conforme preceitua a parte final do referido dispositivo. Sobre o tema, o Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina recentemente decidiu:

RESPONSABILIDADE CIVIL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - AUTOR MORDIDO POR CÃO DE PROPRIEDADE DO RÉU QUE SE ENCONTRAVA AMARRADO EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL - FATO OCORRIDO NUM DOMINGO QUANDO O LOCAL ESTAVA FECHADO AO PÚBLICO- PERÍCIA TÉCNICA QUE CONSTATOU A EXISTÊNCIA DE PLACA INDICATIVA DE ANIMAL FEROZ NO LOCAL – DEPOIMENTO TESTEMUNHAL QUE CONFIRMA O FATO DO AUTOR TER ADENTRADO NO PÁTIO E SE APROXIMAR DO CÃO - CONDUTA IMPRUDENTE - SUPOSTA OMISSÃO DO RÉU NÃO CARACTERIZADA - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DOS ARTS. 159 E 1.527 DO CÓDIGO CIVIL/1916 (CORRESPONDENTES AOS ARTS. 186 E 936 DO CC/02) E 927 DO CÓDIGO CIVIL/02 - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. Não obstante os incômodos sofridos pelo autor em razão dos fatos narrados na inicial, estes não chegaram a configurar ilícito passível de indenização, uma vez que a mordida do cão, por si só, não enseja dano moral quando ausente a prova de que houve omissão por parte do dono do animal (SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº. 2007.000234-2. Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato. Florianópolis, 08 de maio de 2007).

Nos casos de invasão de rodovias por animais, gerando graves acidentes e causando danos a veículos e pessoas, quando não for possível identificar o dono ou detentor do animal, a jurisprudência vem admitindo, que o administrador ou concessionário da rodovia também responda pelos referidos danos, pois é seu o dever de vigilância do leito carroçável, assegurando-lhe, porém, ação regressiva contra o dono do ser irracional, após identificá-lo. Sobre o tema, decisão do Areópago Paulista:

Responsabilidade civil – Acidente de trânsito – Colisão em rodovia entre veículo e animal solto na pista – Empresa que é concessionária de serviço público e que tem por objetivo a conservação de estrada de rodagem, com a finalidade de garantir aos usuários a segurança necessária ao tráfego de veículos – Incidência do art. 37, § 6º, CF – Indenizatória ajuizada pela transportadora procedente – Recurso improvido. (SÃO PAULO. 1º Tribunal de Alçada Civil. Apelação Cível nº. 1030614-4. Rel. Carvalho Viana. São Paulo, 29 de janeiro de 2002.)

Se o fato do animal decorrer de relação de consumo, aplicam-se os princípios da responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos ou serviços. A imprensa noticiou recentemente trágica ocorrência em circo: criança foi atacada por leão no curso do espetáculo e veio a falecer. Configura-se inelutavelmente a responsabilidade da empresa circense, que somente se escusaria de indenizar se provasse caso fortuito ou força maior ou culpa exclusiva da vítima. Não bastassem os princípios do Código de Defesa do Consumidor, os responsáveis por espetáculos públicos assumem também obrigação inerente de incolumidade com relação a seus espectadores (VENOSA, 2005, p.123).

Os experts do tema trazem também a situação de furto do animal, vindo esse, na posse do larápio, a atacar um terceiro, causando danos. Quem responderia pelo dano: o dono ou o ladrão? Depende. Se o animal foi furtado por falta de cuidado do seu dono, esse ainda responderá pelo dano que o bicho vir a causar a um terceiro, ainda que na posse do ladrão. Mas, se o furto do animal ocorreu, não obstante o cumprimento de todas as cautelas devidas por seu dono, não terá esse o dever de indenizar. O dono se exonera da obrigação, por ser o furto (bem como os crimes contra o patrimônio em geral: roubo, extorsão etc.) equiparável à força maior (GAGLIANO, 2005, p.194).

Portanto, o dono ou detentor do animal terá que ressarcir o dano por esse causado independentemente de culpa, por aplicação da teoria da responsabilidade objetiva. Não obstante, poderá eximir-se da culpa se provar a ocorrência de culpa exclusiva da vítima ou força maior.

  1. ASPECTOS CONCLUSIVOS

Conviver em sociedade não é tarefa fácil, para diminuir estes transtornos normas devem necessariamente ser criadas e cumpridas, caso contrário o caos aproxima-se. Os que desrespeitam estas regras devem arcar com as consequências.

As normas de responsabilidade civil pelo fato da coisa e do animal têm como objetivo principal não apenas a reparação a quem de alguma maneira foi prejudicado, mas também o de reprimir comportamentos que prejudique terceiro, lembrando assim o possuidor/ construtor (no que couber) de seu diante de seu animal ou coisa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. 6.ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2008. v. III

  SCWARTZ, Diego.Responsabilidade civil pelo fato da coisa e do animal.http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10805, junho de 2010  STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

  VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2005.

Ação Civil do Juizado Especial Civil, disponível em: http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/6762601/acao-ci-vel-do-juizado-especial-acj-80052020068070005-df-0008005-2020068070005.


[1]                      

Sobre a autora
Raabe Tirza Braga Pinto

Acadêmica do curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão.

Informações sobre o texto

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