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Impeachment X golpe.

Agenda 07/05/2016 às 01:12

No presidencialismo, ao contrário do parlamentarismo, o mandato do chefe de governo não é interrompido em razão da quebra de confiança com o parlamento ou da baixa popularidade, e esta ruptura também não se confunde com o recall.

A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu Título IV, Capítulo II, Seção III, especificamente no artigo 86, prevê a possibilidade de impeachment do Presidente da República e que pode ocorrer nas hipóteses de crime de responsabilidade, tratadas na Constituição Federal e na Lei 1.079 de 1950.

Esta modalidade de interrupção do mandato presidencial não é nova em nosso ordenamento jurídico, a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1.891, em seu artigo 53, com uma redação semelhante à do artigo 86 da Constituição Federal de 1.988, já consignava a hipótese de se processar e julgar o chefe do governo federal em determinados casos, e, apenas a título de ilustração, registramos a seguir os dois artigos, o antigo e o atual:

Constituição de 1.891

Art 53 - O Presidente dos Estados Unidos do Brasil será submetido a processo e a julgamento, depois que a Câmara declarar procedente a acusação, perante o Supremo Tribunal Federal, nos crimes comuns, e nos de responsabilidade perante o Senado.

Constituição de 1.988

Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.

Impeachment é uma palavra de origem inglesa que significa "impedimento" ou "impugnação", e é utilizada para indicar um modelo de processo instaurado contra altas autoridades governamentais acusadas de infringir os seus deveres funcionais. O impeachment não é aplicável em outros casos, como impopularidade ou falta de base parlamentar.

O Brasil é um país republicano, democrático e possui o sistema presidencialista como forma de governo.

República é uma forma de governo em que o Chefe de Estado ou Presidente da República é eleito, direta ou indiretamente, pelos cidadãos, para exercer a sua função durante um tempo limitado.

Democracia é um regime de governo em que todas as importantes decisões políticas estão com o povo, que elegem seus representantes por meio do voto.

Presidencialismo é um sistema de governo em que o presidente é o Chefe de Estado e de Governo.

No parlamentarismo as funções de chefe de Estado (rei ou presidente) e de chefe de governo não se confundem e não se concentram na mesma pessoa. Chefe de Estado possui funções limitas e não tem responsabilidade política. O chefe de governo é o premier ou primeiro ministro, indicado pelo chefe de Estado e escolhido pelos representantes do povo. Fica no cargo enquanto tiver a confiança do Parlamento, ou seja, não é eleito para cumprir um mandato por um determinado período.

O Brasil é uma República Presidencialista deste 1889, quando ocorreu a Proclamação da República. O parlamentarismo só existiu no Brasil entre 7 de setembro de 1961 e 24 de janeiro de 1963, durante o governo do presidente João Goulart.

No presidencialismo, ao contrário do parlamentarismo, o mandato do chefe de governo não é interrompido em razão da quebra de confiança com o parlamento ou da baixa popularidade, e esta ruptura não se confunde com o recall, modalidade de destituição de mandatários, em regra é destinado para Senadores e Deputados, mas nada impede a aplicação para chefes de governo.

Recall, adotado em alguns regimes jurídicos de nações ocidentais, é a retirada do poder de alguém que tenha sido eleito para uma função pública, ou ainda para reformar uma decisão judicial sobre a constitucionalidade de uma lei. É uma forma de poder político exercido pelo cidadão para revogar o mandato do governante, e, normalmente ocorre em razão dos maus resultados de políticas públicas adotadas pelo governante e de sua baixa popularidade. Na essência, em que pese a insegurança jurídica que pode acarretar, o recall é um método bem mais democrático, pois o poder de destituir o governante do cargo está nas mãos das mesmas pessoas que o elegeram, e que periodicamente fazem uma reavaliação do chefe de governo.

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Como se sabe, o Brasil não adota o recall como forma de interrupção do mandato do governante, em contrapartida, para alguns casos específicos regulados na Constituição Federal e na Lei 1079/50, adota o impeachment, que também é uma forma de destituir o chefe do executivo de seu cargo.

Golpe se caracteriza por uma ruptura institucional repentina, destituindo-se, de forma indevida e contrariando a normalidade da lei e da ordem, o governante.

Um golpe de Estado costuma acontecer quando um grupo político renega as vias institucionais para chegar ao poder e apela para métodos de coação, coerção, chantagem, pressão ou mesmo emprego direto da violência para desalojar um governo.

Feitos os esclarecimentos preliminares, adentraremos no cerne do problema que vem marcando as manchetes de todos os veículos de comunicação nos últimos dias: IMPEACHMENT ou GOLPE?

O Brasil já passou por diversas crises institucionais, intervenções militares, deposições e renúncias de presidentes. Nestes 126 anos de república, dos 42 presidentes, 12 não concluíram seus mandatos à frente da nação.

Atualmente, o Brasil passa por um conturbado e delicado processo político, que em tese, teve início com a crise econômica internacional e com as revelações, através da “Operação Lava-Jato” deflagrada pela Polícia Federal, de diversos escândalos de corrupção e desvios de verbas públicas. Aliado a isto, o fato de a presidente Dilma Rousseff ter utilizado dinheiro de instituições financeiras mantidas pelo governo federal, e, desta forma, poder arcar com compromissos dos programas sociais do Estado, as chamadas “pedaladas” fiscais, fato que agravou ainda mais a situação, sendo esta última, a razão e fundamento jurídico para que fosse impetrado um pedido de impeachment contra a Presidente de República.

Assim, um novo capítulo dessa sequência de rupturas pode estar sendo escrito com a votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Ela admitiu ter cometido “pedaladas” fiscais, fundamento jurídico do pedido que tramita no Congresso Nacional, entretanto, Dilma afirma ser vítima de um golpe. O tema tem gerado intensas discussões e debates entre juristas, cientistas políticos, parlamentares, dirigentes partidários e pela população em geral.

Argumentos não faltam para ambos os lados, ou seja, entre os que são favoráveis e os que são contra o impeachment.

Os que são favoráveis ao impeachment afirmam que a presidente Dilma Rousseff cometeu crime de responsabilidade ao realizar as “pedaladas” fiscais, e que tais atos estão claramente previstos na Lei 1079/50 – Lei de Responsabilidade Fiscal, que o processo de impeachment está previsto na Constituição e teve o rito regulamentado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Os contrários ao impeachment dizem que a presidente Dilma Rousseff não cometeu nenhum crime, pois não realizou operações crédito, apenas atrasou compromissos financeiros perante os bancos e que outros presidentes também se utilizaram desta prática, e afirmam que impeachment sem crime é golpe.

O processo de impeachment, apesar de tratar-se de uma peça jurídica, não é julgado pelo Poder Judiciário, mas sim pelo Poder Legislativo, no caso, o pedido formulado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reali Júnior e Janaína Pascoal foi aceito pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. Instalou-se a Comissão Especial, tendo o relator opinado pelo cometimento de crime de responsabilidade e a Comissão aprovou o respectivo relatório, prosseguindo para julgamento em Plenário, fato ocorrido em 17 de abril deste ano e com o seguinte resultado: 357 votos a favor do impeachment, 137 votos contrários, 7 abstenções e 2 ausências, sendo encaminhado para o Senado Federal dar o devido andamento.

Caso o Senado Federal proceda a instauração do processo, a presidente Dilma Rousseff deverá ser afastada de suas funções por até 180 dias. A sessão de julgamento no Senado é conduzida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Ministro Ricardo Lewandowski. Chegando o processo na fase de julgamento, para que a Presidente da República perca o seu cargo definitivamente, será necessário que ao menos dois terços dos 81 senadores (54 votos) decidam pela condenação.

Golpe ou não, o que mais nos preocupa são as consequências dos resultados, para tanto, apresentamos três situações:

1 - Dilma Rousseff condenada no processo de impeachment

a) – Michel Temer (PMDB) assume a Presidência da República com o compromisso de buscar a conciliação com os demais partidos políticos e recompor o governo destruído por uma administração que ele mesmo apoiou por mais de cinco anos na vice-presidência;

b) - Michel Temer assume, mas em razão de implicações na Lava-Jato, comece a sofrer pressões e renuncie, neste caso o Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), assume, e se nada interromper, permanecerá até o término do mandato em 2018, podendo, inclusive, ser candidato a reeleição.

c) - Caso Eduardo Cunha assuma a presidência e no decorrer do mandato for cassado ou sofrer impeachment, assumirá o Presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB), também citado na operação Lava-Jato.

2 – Dilma Rousseff e Michel Temer cassados pelo Tribunal Superior Eleitoral

Tramita no Tribunal Superior Eleitoral – TSE – Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) que visa cassação de Dilma Rousseff e Michel Temer, que se for julgada procedente quando Temer estiver na presidência, quem deverá assumir, na ordem sucessória, é Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, que não se encontra em condição confortável em razão de complicações na “Operação Lava-jato”, mas deverá convocar novas eleições em 90 dias caso a cassação ocorra até dezembro de 2016, mas se ocorrer a partir de 2017, teremos eleições indiretas, nesta última situação, deverá o Congresso Nacional escolher dois parlamentares para que assumam as funções de presidente e de vice-presidente;

3 - Dilma Rousseff é absolvida no processo de impeachment e no Tribunal Superior Eleitoral

Não terá a mínima condição de governabilidade, principalmente se ficar afastada pelos 180 dias e novos fatos surgirem no processo da “Lava-Jato”.

Se ao invés de preocupar-se em salvar o seu mandato, a Presidente Dilma Rousseff, se preocupasse em salvar nação, com toda certeza, todos sairiam ganhando.

O cidadão paga muito caro pelos péssimos serviços públicos prestados.

Sobre o autor
George Melão

Advogado especializado em Direito Eleitoral – Pós-graduado em direito Público e Privado pela Faculdade Damásio de Jesus – Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Paulista da Magistratura – Pós-graduado em Direito Eleitoral e Direito Processual Eleitoral pela Escola Judiciária Eleitoral Paulista – Foi Professor de Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Processual Civil do Curso Preparatório para Concursos FMB.<br>

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