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Estrutura da ponderação e da proporcionalidade em Robert Alexy

Agenda 12/07/2016 às 12:48

O presente artigo aborda a teoria da ponderação e da proporcionalidade em Robert Alexy, bem como contrapõe uma das críticas realizadas pela doutrina de Karl-Heinz Ladeur.

A Teoria dos Direitos Fundamentais trabalhada por Rober Alexy estabelece diferenças entre regras e princípios. Norma é gênero do qual decorrem as espécies regras e princípios. Tal divisão é baseada na estrutura e forma de aplicação da norma. Alexy assinala que a distinção entre as regras e os princípios constitui a estrutura de uma teoria normativo-material dos direitos fundamentais.[1]

Sinteticamente, Alexy conceitua princípios como normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas (são mandamentos de otimização). Já as regras são normas satisfeitas ou não, contêm determinações no âmbito daquilo que é fática e juridicamente possível.

A aplicação da ponderação aos conflitos entre regras difere da aplicação na colisão entre princípios.

Quando há um conflito entre regras é preciso introduzir uma cláusula de exceção em uma das regras conflitantes ou declarar uma delas inválida. Aqui haverá uma decisão sobre validade.  

Por outro lado, quando o conflito existente se dá entre princípios, um deles deverá ceder. Nenhum deles será considerado inválido ou cláusula de exceção. Simplesmente, um tem precedência sobre o outro. Princípios têm pesos diferentes. O objetivo do sopesamento é definir qual dos interesses em conflito (os quais estão no mesmo nível hierárquico, do ponto de vista abstrato) terá maior peso no caso concreto.

O balanceamento é a forma específica de aplicação dos princípios.

Para Alexy, a proporcionalidade não se enquadra na categoria de princípios; para ele, a proporcionalidade é uma regra.

Alexy subdivide a proporcionalidade em três sub-elementos, a saber: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Tais regras se relacionam exatamente nesta ordem.

A adequação está intimamente ligada à ideia do “ótimo de Pareto”, ou seja, verifica-se quando uma posição pode ser melhorada sem prejuízo de outra.

Já a necessidade, exige que, entre dois meios igualmente adequados, seja escolhido aquele menos prejudicial.

Por fim, a proporcionalidade em sentido estrito preocupa-se, verdadeiramente, com a ponderação.

Os dois primeiros consistem em possibilidades factuais; o último em possibilidade legal.

EXEMPLO PARADIGMÁTICO

A fim de esclarecer sua teoria, Alexy cita o caso Lebach.

O caso citado foi julgado pelo Tribunal Constitucional da Alemanha, em 1973, e traz um conflito aparente entre a liberdade de expressão e os direitos de personalidade.

De maneira sintética, o caso em tela iniciou-se em 1969, em Lebach (oeste da República Federal da Alemanha). Naquele ano quatro soldados que guardavam um depósito de munição foram brutalmente assassinados e um quinto soldado foi gravemente ferido.

Em 1970, dois principais acusados foram condenados à prisão perpétua e um terceiro acusado condenado a seis anos de reclusão (por auxílio na preparação do crime).

Decorridos quatro anos, a ZDF (Zweites Deutsches Fernsehen – Segundo Canal Alemão) produziu um documentário sobre os fatos, no qual seriam apresentados o nome e a foto de todos os acusados, além de representação do crime, detalhando a relação dos condenados, inclusive, com suas ligações homossexuais.

 O documentário seria transmitido pouco antes da soltura do terceiro acusado. Todavia,  esse terceiro acusado pleiteou judicialmente medida liminar para impedir a transmissão do programa, sob o argumento de que o documentário dificultaria o seu processo de ressocialização. A medida liminar foi indeferida nas instâncias ordinárias e ele, então, apresentou uma reclamação constitucional perante o Tribunal Constitucional Federal, requerendo proteção ao seu direito de desenvolvimento da personalidade.

Como resposta, o Tribunal Constitucional Alemão, harmonizando os direitos em conflito (direito à informação versus direitos de personalidade), decidiu pela não transmissão do documentário, caso a imagem ou o nome do reclamante fossem mencionados.

Em síntese, o Tribunal Constitucional Alemão fundamentou sua decisão  alegando que não se pode outorgar a nenhum dos dois valores constitucionais, em princípio, a prevalência absoluta sobre o outro. O interesse de informação da população merece em geral prevalência sobre o direito de personalidade do criminoso. Entretanto, a proteção constitucional da personalidade não permite que a televisão se ocupe com a pessoa do criminoso e sua vida privada por tempo ilimitado. Será inadmissível noticiário que tenha o condão de provocar um prejuízo considerável à pessoa do criminoso, especialmente se ameaçar sua reintegração à sociedade.

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O processo de ponderação adotado para solucionar o caso foi, em síntese: há a liberdade de radiodifusão, de um lado, e, de outro, a proteção à personalidade. Ambos os valores constituem componentes essenciais para a ordem democrática e, portanto, deveriam ser harmonizados. Quando tal harmonização não é possível, deve-se analisar o caso particular e definir qual dos dois interesses será preterido. No caso ora em análise, concluiu-se que o dano causado à personalidade por uma apresentação pública não pode ser desproporcional ao significado da divulgação para a comunicação livre.

CRÍTICAS À TEORIA DE ROBERT ALEXY

Um dos grandes críticos à teoria elaborada por Robert Alexy é o jurista alemão Karl-Heinz Ladeur.

Ladeur afere a ligação entre o direito constitucional e a teoria dos princípios elaborada por Robert Alexy. Ele argumenta que a distinção estabelecida por Alexy entre princípios e regras esbarra em problemas insuperáveis, em face do desenvolvimento histórico do direito alemão. Discute, também, a possibilidade em se falar em otimização de um direito em uma sociedade complexa.

Lauder afirma que a teoria dos princípios, como produto da segunda metade do século XX, incorporou distinções, deturpações e imprecisões típicas dos autores que influenciaram o pensamento jurídico do pós-guerra na Alemanha.[2]

A primeira crítica formulada diz respeito à teoria dos princípios pertencer a uma desorientação da prática decisória no direito constitucional. Lauder alega que é preciso esclarecer que a ausência de parâmetro, controle e racionalidade da decisão jurídica ponderativa, na teoria dos princípios, não decorre do problema do resultado da teoria em si, mas sim da equivocada construção interna chamada por Alexy de  dimensão analítica do trabalho jurídico da tradição alemã. Segundo Lauder, a teoria dos princípios

“elimina em seu conceito de direito a importância das construções dogmáticas e distinções dentro de uma teoria dos direitos fundamentais, que orientam decisões futuras e não relegue a prática dos direitos fundamentais a uma casuística descontrolada.”[3]

A segunda crítica é interna à teoria dos princípios. Para Lauder, tal teoria criou um conceito de direito existente no século XIX. Traz como exemplo a teoria da argumentação de Alexy, na qual a distinção central se dá entre a justificação interna (se a decisão pode ser tomada por diretivas ou regras concatenadas na forma lógica) e externa (se as premissas da forma de justificação interna podem ser corrigidas pelos critérios da verdade, correção ou aceitabilidade). Lauder entende que somente a justificação externa poderia conferir mobilidade ou visibilidade ao sistema jurídico ao observar a linearidade da justificação interna.[4] A simples distinção entre princípios e normas feita por Alexy desconsidera a dimensão da construção de conceitos como institutos jurídicos.

Por fim, Lauder levanta a questão de saber se o núcleo dos princípios e valores pode ser compatível com uma sociedade complexa. A ponderação não consegue se constituir como mandado de otimização jurídico, vez que as colisões são fáticas (colisões fáticas são incompatíveis com direitos fundamentais incomensuráveis). É exatamente nos casos de extrema complexidade que o conceito de mandado de otimização encontra fronteiras.

Lauder conclui que a ponderação, como método privilegiado, “é uma reação à profunda mudança do sistema jurídico, a qual ganha corpo na sociedade por sua rápida autotransformação.”[5] Para ele, a ponderação traz insegurança jurídica, uma vez que é vaga e imprecisa.

Ele propõe como alternativa à ponderação trabalhada por Alexy a busca não na jurisprudência, mas sim junto aos acadêmicos do direito. Ressalta, ainda, que “a toda caricatura corresponde uma figura deturpada”.[6] Acrescenta que a escola de Alexy, bem como o conceito de direito por ele trabalhado é deturpado, vez que tem um condão a-histórico e seu conceito de direito é revestido de um trabalho que, na verdade, nunca existiu no século XIX.

CONCLUSÃO

O presente artigo buscou trabalhar a teoria da ponderação e da proporcionalidade proposta por Robert Alexy, bem como mostrar uma das visões contrárias a essa teoria encontradas na doutrina.

Segundo a visão desta autora, Robert Alexy exerce um papel fundamental, vez que sua obra influenciou (e influencia) o pensamento jurídico atual.

Alexy trabalha com a importância da racionalidade dos juízos de ponderação entre os princípios jurídicos. Para ele, quando o direito positivo não fornece a resposta para os problemas concretos, nasce a necessidade de uma decisão judicial que considere os princípios jurídicos envolvidos.

A fórmula trabalhada por Alexy, na teoria, pode ser tida como uma excelente alternativa para a resolução de conflitos entre normas.

Entretanto, quanto tal ponderação é trazida para a prática surgem os problemas.

O primeiro deles, é a ausência de uma métrica que confira a cada direito o seu peso. A falta de métrica, por si só, não configura algo negativo, eis que direitos não consistem em institutos estáticos, podendo ter pesos diferentes mesmo dentro de um mesmo território. A um determinado direito pode ser conferido diferentes pesos, a depender da sua aplicação no caso em concreto.

Surge aqui, no caso em concreto, um segundo problema, sob o ponto de vista da autora: o ativismo judicial. É inegável que o representante do poder judiciário possui suas próprias crenças e valores. E, por mais que suas decisões sejam fundamentadas na lei, há um grau de subjetivismo quando da escolha da norma que deve prevalecer. E, nessa escolha, pode estar implícita uma de suas crenças pessoais. O grau de subjetivismo é alto.

O ativismo judicial, portanto, pode trazer insegurança jurídica ao ordenamento e à sociedade.

Há que se concordar com a questão levantada por Lauder, de saber se o núcleo dos princípios e valores pode ser compatível com uma sociedade complexa. Por se tratar de colisões fáticas, a ponderação não consegue se constituir como mandado de otimização jurídico.

Entretanto, é inescapável a utilização da ponderação e da proporcionalidade no dia-a-dia.

Assim, como pensa Lauder, esta autora não vislumbra uma alternativa ao uso da ponderação e da proporcionalidade. Engessar o ordenamento jurídico sob o argumento de se obter decisões menos subjetivas não parece uma alternativa viável à ponderação.

Referências

AFONSO, DA SILVA, L.V. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, 2002.

ALEXY, Robert. Constitutional rights and proportionality. Revus 22, 2014. Disponível em https://revus.revues.org/2783. Acesso em 04/03/2016.

_______.Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008.

CAMPOS, Ricardo. Crítica da Ponderação. Método constitucional entre a dogmática jurídica e a teoria social. São Paulo: Saraiva, 2016.


[1] ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p.85

[2] CAMPOS, Ricardo. Crítica da Ponderação. Método constitucional entre a dogmática jurídica e a teoria social. São Paulo: Saraiva, 2016, p.101

[3] apud, p.106.

[4] apud, p.113.

[5] apud., p.122.

[6] apud., 123.

Sobre o autor
Luciana Tudisco Oliveira Morte

Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2013). Graduada pela Instituição Toledo de Ensino - Presidente Prudente (2003).<br>Atua como analista judiciário na Justiça Federal em Primeiro Grau de São Paulo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de conclusão da disciplina "Temas e Leituras Contemporâneas em Teoria do Direito I", ministrada pelo Professor Titular do Departamento de Filosofia do Direito da USP, Dr. Ronaldo Porto Macedo Jr.

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