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Mediação criminal na fase inquisitorial: o delegado de polícia na solução extrajudicial dos conflitos penal

É consabido da relevância da atuação policial na elucidação de delito de forma investigativa, contudo nosso objeto de estudo tende a destacar a relevância da atuação da autoridade policial na solução extrajudicial das lides penais.

O presente artigo tem por escopo analisar o trabalho do delegado de polícia, mostrando a importância da implementação do uso da mediação para a realização de um trabalho que auxilie a celeridade dos processos demandados na investigação, bem como proporcionando assim a resolução dos conflitos de menor potencial ofensivo e evitando com isso alta demanda no judiciário brasileiro, viabilizando às partes envolvidas uma maior oportunidade de resolver seus conflitos. É possível observar as várias críticas que são dirigidas ao judiciário, no entanto, é possível também perceber que a mediação como forma de resolução de conflitos tem se mostrado bastante eficaz e menos desgastante. Dessa forma é viável buscar caminhos que possam contribuir para que os envolvidos sintam-se mais confiantes em buscar meios alternativos capazes de resolverem seus conflitos sem que haja necessidade de acionar o Estado – juiz. Afinal, não se pode esquecer que o Código de Processo Penal data do ano de 1941 e com a evolução social faz-se necessário o Estado oferecer institutos que possam facilitar a resolução dos conflitos com maior brevidade possível. Tendo em vista que mesmo com a criação da Lei do Juizado Especial e de outros órgãos que tratam da resolução dos crimes de menor potencial ofensivo, ainda assim, pode-se notar uma alta demanda nesses referidos órgãos, e por ser o delegado de polícia a autoridade que primeiro toma ciência do fato delituoso, é viável que esta autoridade tenha competência para dirimir os conflitos através da mediação.

É sabido que a sociedade contemporânea busca em primeiro momento a delegacia de policia para noticiar um determinado fato ocorrido, e diante da situação de ver seu direito sendo violado procura-se os órgãos competentes para solucionar tais fatos. Muitas vezes o cidadão quer apenas que a outra parte seja notificada para que se possa orientar e aconselhar, que caso o fato volte a se repetir, as autoridades judiciárias buscarão outros meios de sancionar o indiciado, assim orientando-o em relação às futuras mazelas que poderão permear em sua vida caso continue a lesar o direito alheio.

A mediação em sede inquisitorial é novidade para a sociedade brasileira, tendo em vista que o CPP nada fala da mediação nessa fase pré-processual. Sabemos que será de suma importância a mediação extrajudicial feita pelo delegado de polícia por vários motivos: agilidade na pacificação social, restabelecer a paz entre os envolvidos e propiciar que pequenas lesões ao direito alheio possam ser resolvidas de maneira célere, devendo enviar ao poder judiciário apenas casos de maior complexidade.

No contexto social em que vivemos, faz- se necessário um Estado presente e atuante para buscar e resguardar a ordem social, e quanto mais dificuldades a serem encontradas por parte de quem procura o Estado para resolver esses conflitos, maior é a possibilidade de os envolvidos buscarem resolver seus problemas sozinhos, fazendo a justiça com as próprias mãos, tornando assim um fato que poderia ser resolvido de uma maneira mais simples em um caso mais complexo. Dessa forma é que se faz necessário a busca por uma justiça mais eficiente, onde na atualidade se encontra nos meios alternativos de resolução de conflitos uma forma de fazer com que seja levado para o judiciário apenas casos de maior potencial ofensivo, evitando o abarrotamento de processos.

Sabendo que no âmbito do Processo Civil existe tipificação legal recomendando a estimulação de mediação e conciliação nas demandas processuais, e nessa perspectiva ao analisar o trabalho do delegado de polícia utilizando-se da mediação e conciliação como forma alternativa na resolução de conflitos nota-se que é uma evolução para o judiciário brasileiro, tendo em vista que contribui no sentido de evitar o acúmulo de processos.

            Na Constituição Federal de 1988, já é possível observar em vários de seus artigos a vontade do legislador em propiciar maior acesso à justiça e celeridade na demanda processual. Pode-se denotar a preocupação do poder originário em criar meios capazes de solucionar problemas de forma célere e objetiva, dando oportunidades aos envolvidos na lide de buscar outros meios que evitem a burocracia do poder judiciário deixando as partes com ampla liberdade de buscar a solução mais adequada no caso concreto, evitando que o poder do Estado interfira desnecessariamente na vida do particular e que seja mais uma demanda no judiciário sem uma resposta no tempo razoável.

O Código de Processo Civil de 2015 foi criado com uma perspectiva onde opta por meios alternativos para resolução de conflitos, o legislador consagrou no Novo Código de Processo Civil, especificamente nos parágrafos 2º e 3º do artigo 165 a medição e conciliação, onde o conciliador atuará nos casos em que não houver vínculo anterior entres as partes, podendo sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. Já a mediação dispõe claramente que o mediador atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entres as partes, auxiliando os interessados a compreenderem as questões e os interesses em conflitos, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação identificar por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

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A mediação e a conciliação são técnicas que são apresentadas como soluções alternativas de controvérsias. A doutrina costuma considerá-las como técnicas distintas, onde o conciliador tem uma maior participação, ou seja, é mais ativo no processo de negociação podendo inclusive sugerir soluções. Já o mediador serve como veículo de comunicação entre os interessados, de modo que os próprios envolvidos possam identificar a solução. O termo mediação origina-se do latim mediare, que significa intervir, mediar. Consiste em um meio não-jurisdicional de solução de litígios. Lília Maia de Morais Sales conceitua-a como:

“[...] procedimento consensual de solução de conflitos por meio do qual uma terceira pessoal imparcial – escolhida ou aceita pelas partes – age no sentido de encorajar e facilitar a resolução de uma divergência. As pessoas envolvidas nesse conflito são as responsáveis pela decisão que melhor a satisfaça. A mediação representa um mecanismo de solução de conflitos utilizado pelas próprias partes que, motivadas pelo diálogo, encontram uma alternativa ponderada, eficaz e satisfatória. O mediador é a pessoa que auxilia na construção desse diálogo.”

A presente pesquisa realizar-se-á através de pesquisas de uma análise qualitativa, mediante a formalização de exames de natureza bibliográficas, sendo estas instrumentalizadas através das informações exaradas em livros, artigos científicos, periódicos e pesquisas da internet que possam contribuir com a elucidação do objeto de pesquisa ora exposto, buscando assim aprofundar os argumentos aqui expostos de acordo com nosso posicionamento acerca do tema em análise.

Quanto ao método de pesquisa, destaca-se tratar de uma pesquisa de natureza indutiva, realizada com estudos exploratório descritivo de discussões inerentes à abordagem da mediação criminal na fase inquisitorial.

O SURGIMENTO DO NÚCLEO ESPECIAL CRIMINAL (NECRIM)

O NECRIM é um núcleo criado dentro da Delegacia de Polícia que tem por objetivo transformar o Delegado de Polícia em mediador de situações conflituosas entres as partes em crimes de menor potencial ofensivo. Surgiu, formalmente, por meio da Portaria nº 6 de 15 de dezembro de 2009, do Departamento de Polícia Judiciária do Interior de São Paulo. Atualmente esta proposta é aplicada em 16 (dezesseis) cidades do Estado de São Paulo (Ribeirão Preto, Araraquara, Barretos, Bebedouro, Bragança Paulista, Bauru, Dracena, Franca, Lins, Marília, Tupã, Assis, Jaú, Jundiaí, Sertãozinho, Tupã e Ourinhos) e possui tendente expansão desde 2003.

Trata-se de uma tentativa de conciliação que o Delegado de Polícia treinado para conciliar, faz junto às partes no momento que o TCO é realizado. O Delegado responsável pelo núcleo passa por treinamento específico para aprender a ser conciliador e, assim, poder atuar como dirigente do NECRIM. A exigência de ser um Delegado treinado para conciliar deriva do fato da consciência de que nem todo Delegado possui vocação para exercer atividade conciliadora. Não havendo o acordo segue para o juiz competente somente o TCO e então o procedimento segue seu rito habitual.

O PAPEL DO DELEGADO DE POLÍCIA

 

Não é de hoje que se fomenta uma mudança no que diz respeito à segurança pública no Brasil, onde possibilite encarar os problemas sociais com o auxílio de outras ciências que não só a jurídica. O delegado de policia é uma autoridade judicial, incumbido de manter a paz social e a tranquilidade coletiva, é a primeira autoridade que toma conhecimento do fato delituoso, tendo sua atribuição prevista na Carta Política vigente, além disso é operador do direito. A polícia judiciária atua intensivamente no atendimento das partes envolvidas, por ser o órgão estatal com função de zelar pela instauração do procedimento cabível em cada demanda relatada, por sua vez busca impedir uma maior violação do direito no caso concreto, tendo o Estado, o dever de dar imediatamente uma resposta capaz de coibir as atuais e futuras violações.

Em respeito à segurança pública, aduz o artigo 144, parágrafo 4º, que as polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e apuração de infrações penais, exceto as militares. Esse artigo mostra o quão é importante o papel do delegado de polícia, no que diz respeito ao zelo pela apuração e coibição de práticas de delitos na sociedade, fazendo com que o delegado de polícia use o diálogo e a força estatal para evitar a prática de crimes de menor potencial ofensivo.

Atualmente nas delegacias de polícia, é bastante comum existir altas demandas de conflitos não criminais, onde se nesses casos as partes forem ouvidas e puderem discutir suas divergências na presença do delegado, usando a mediação ou conciliação, seria mais fácil de entenderem e chegarem a um acordo, sem precisar levar ao judiciário, até porque a função de conciliar e mediar não é apenas do juiz, como deixa bem claro a Lei 9099/95 em seu art. 73, onde diz que a conciliação será conduzida pelo Juiz ou por conciliador sob orientação. Em seu parágrafo único diz que os conciliadores são auxiliares da justiça, recrutados na forma da lei local, preferencialmente entre bacharéis em Direito, excluídos os que exerçam funções na administração da Justiça Criminal.

Como bem observado no artigo acima citado, especificamente no parágrafo único, a mediação e a conciliação é uma forma de cooperar com o trabalho do juiz, pois ficarão junto às partes para conduzir o entendimento destes, frente à autocomposição. Sem falar que os casos resolvidos nas delegacias aproximam a polícia e a comunidade, além de contribuir pra a resolução de pequenos delitos e principalmente a redução do volume de processos nos fóruns.

A LEI 9.099/95

Com o intuito de materializar a criação dos Juizados Cíveis e Criminais, onde o modelo de intervenção penal adotado no que se refere aos crimes de menor potencial ofensivo, onde a pena máxima cominada em abstrato não superem dois anos, deve ser feito pela busca da conciliação entre as partes. Além disso, a lei em questão possibilita a transação penal, que no caso, o Ministério Público poderá propor ao autor do fato, a aplicação imediata da pena restritiva de direito ou multa, isso é claro, no caso da ação ser pública incondicionada. Não obstante isso, essa Lei dá margem à justiça restaurativa, que é um processo de colaboração que envolve os afetados, para determinar qual a melhor forma de reparar o dano causado.

Nota-se, pois, que a Lei 9099/95 veio com o intuito de desafogar o Sistema Carcerário e o Judiciário, optando assim por um procedimento simples e célere. O propósito da Lei é bem claro ao estabelecer como critérios e princípios a Oralidade, a Economia Processual, a Informalidade, a Simplicidade e a Celeridade.

Analisando cada princípio exposto anteriormente podemos observar que no princípio da Oralidade ao contrário do processo escrito, onde prevalece a escrita, denomina-se no caso a palavra falada, isso quer dizer que no caso só são reduzidos a termo os fatos mais importantes, visando assim a simplificação nos trâmites processuais. O princípio da Simplicidade significa dizer que dentro das práticas processuais, alguns requisitos formais podem ser dispensados para que não acabem prejudicando o entendimento entre as partes. O princípio da Informalidade, no entanto aduz que os atos devem ser realizados com certo desapego de formalidade, para propor de forma mais rápida a solução do litígio.

Já o princípio da Economia Processual, que objetiva a redução das custas processuais, está voltado para a gratuidade processual, justamente para beneficiar aqueles que necessitem deste serviço. O Doutrinador Demócrito Reinaldo Filho em seu livro cita o ponto de vista de Rogério Lauria Tucc, onde diz que o Princípio da Economia Processual, tem no processo especialíssimo dos Juizados Cíveis, uma conotação relacionada com a gratuidade do pagamento das custas, e com facultatividade de assistência das partes por advogados que dizem, à evidência , com o barateamento de custos aos litigantes fundamentado na economia de despesas, que com a de tempo e a de atos ( a economia no processo enfim), constitui uma das maiores preocupações e conquistas do Direito Processual Civil moderno.

O princípio da Celeridade por sua vez, deve demorar o mínimo possível, de acordo com a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, onde diz que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo, e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Em seu art. 98, I, a Constituição Federal de 1988 instituiu os Juizados Especiais Criminais com o intuito de proporcionar à sociedade maior eficiência na resolução de suas demandas, determinando que deve ser priorizada a conciliação, ou seja, métodos autocompositivos, sempre que possível.

            Portanto, é cabível a mediação pela autoridade policial em sede inquisitorial, ou seja, o delegado de polícia irá desempenhar um papel semelhante ao dos Juizados Especiais, com o objetivo de dar solução ao caso.

Em face de todo o exposto no decorrer da presente pesquisa, observou-se que a formalização da mediação criminal na seara da investigação criminal tende a afastar o excesso de litígios de natureza penal e processual penal da esfera do Judiciário, o que por conseguinte, tende a propiciar maior celeridade no trâmite processual, bem como a efetividade da restauração conflitiva celebrada entre as partes.

Nesse sentido impende por destacar que a celebração da mediação criminal contudo só resta assente em face dos delitos que denotem menor expressividade quanto à ofensa do bem jurídico, de modo que a violação de bens jurídicos de maior relevo, tais como a vida, a dignidade sexual e o erário público ainda impendem a fixação do exercício do ius puniendi do Estado, de modo a afastar, quanto a estes, a possibilidade de celebração de acordo entre as partes em face do maior vulto na ofensa do bem jurídico.

Destarte, é possível portanto aferir que a fixação da mediação criminal na fase investigativa dar-se-á como corolário da tese de um direito penal mínimo, de modo a afastar da seara penal e processual penal a solução litigiosa que pode ser composta entre os polos da relação em lide.

Conclui-se assim pela expressividade da aplicação da mediação criminal na fase pré-processual como mecanismo apto a afastar a burocracia processual na solução da lide de natureza penal, na constituição dotada de maior celeridade, na eficácia imediata do problema apresentado e na formalização de uma pacificação social sem a necessária intervenção do direito penal, trazendo assim, toda a expressividade de um direito penal mínimo, inclusive quando se opta pela mediação criminal na fase inquisitorial. 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 17 ago. 2016.

BRASIL. Código civil. Organização de Sílvio de Salvo Venosa. São Paulo: Atlas, 1993.

BRASIL. Código de processo penal (1941). Código de processo penal. In: ANGHER, Anne Joyce. Vade mecum universitário de Direito RIDEEL. 23ª. ed. São Paulo.

JÚNIOR, Fredie Didier – Curso de Direito Processual Civil – 1°. ed. Juspodivm. 2016.

SALES, Lilia Maria de Morais – Mediação de Conflitos. 2007.

FILHO, Eduardo Neves Lima; QUARESMA, Gisany Pantoja. Conciliação pré-processual nas infrações de menor potencial ofensivo. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/30421/18384 >. Acesso em: 20 ago. 2016.

Sobre os autores
Semiramys Fernandes Tomé

Mestranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Docente do Curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá lecionando as disciplinas de de Prática Civil, Direito Penal II, Direito Penal IV, Direito Processual Penal I e Direito Civil VI (Sucessões) desde 2012.2. Docente convidada do Módulo de Direito Penal - Parte Especial do curso de pós-graduação em Direito e Processo Penal em 2014.2 da Faculdade Católica Rainha do Sertão - FCRS. Advogada atuante no Estado do Ceará, inscrita na OAB/CE sob o nº 22.066. É especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Vale do Acaraú- UVA (2010). Possui graduação em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR (2009.1). Possui experiência na área de Direito, com ênfase em Direito e Processo do Trabalho e Direito e Processo Penal. Bolsista Funcap. Membro do grupo de pesquisa Mulheres e Política junto ao CNPQ. É autora de diversos artigos e capítulos de livro sobre temas de significativo relevo na área jurídica.

Antônio Ednardo da Silva

Discente do 6º semestre em direito pelo Centro Universitário Católica de Quixadá - Unicatólica

Anna Patrícia de Souza Veríssimo

Discente do 6º semestre do curso de direito pelo Centro Universitário Católica de Quixadá - Unicatólica

Geísa de Araújo Oliveira

Discente do 6º semestre em direito pelo Centro Universitário Católica de Quixadá - Unicatólica

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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