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A atuação das guardas municipais na assistência às mulheres vítimas de violência doméstica

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Agenda 10/03/2017 às 15:15

Explora-se o arcabouço jurídico da Lei Maria da Penha e analisa-se o amparo legal das guardas municipais na atuação efetiva de proteção e prevenção a violência de gênero. Mostra-se, ainda, o exemplo de atuação da Patrulha Maria da Penha.

1 INTRODUÇÃO

A violência contra a mulher, em razão do seu gênero, é algo que ocorre há mais tempo que a própria humanidade, em qualquer nação ou cultura. De acordo com Diniz:

A sociedade sempre deu maior valor ao papel masculino, o que se reflete na forma de educar os meninos e as meninas. [...] Quando falamos em violência de gênero, referimo-nos àquela violência empregada para manter o padrão de gênero, ou seja, uma relação de poder e subordinação, que vai da mais sutil coação até a mais cruel tortura. (DINIZ, 2009, p.06)

No Brasil foi sancionado, no ano de 2006, a Lei Federal nº 11.340, nomeada como a Lei Maria da Penha, um marco para os direitos da mulher contra a violência em razão do seu gênero. Com esta lei, o Brasil tornou-se o 18º país da América Latina a contar com uma Lei específica, que prevê medidas protetivas as mulheres em situação de violência. (RIBEIRO, 2015, p. 49)

De acordo com os estudos realizados pelo Mapa da Violência (2015), foram levantados que 27,1% dos homicídios cometidos contra as mulheres ocorreram no âmbito doméstico. Em relação ao local onde ocorrem as lesões não letais, contra as mulheres, 71,9% são no âmbito doméstico. Outro dado relevante é em relação aos autores das agressões: em relação as mulheres jovens e adultas (18 a 59 anos) o principal agressor é o parceiro ou ex-parceiro, concentrando metade de todos os casos registrados. Um fator, também levantado, é em relação a reincidência destas agressões, onde os dados apontam 49,2% dos casos. (WAISELFISZ, 2015, p. 39-51)

Estes dados refletem um grande problema: mesmo após 10 anos da promulgação da Lei Federal nº 11.340/2006, Lei Maria da Penha, os dados de violência doméstica são, ainda, exorbitantes, demonstrando que há a necessidade de maior participação de ações preventivas e de assistência às mulheres vítimas de violência doméstica, além da proteção de seus direitos, medidas emergenciais e medidas protetivas judiciais.

A partir da necessidade, de maior participação do poder público na assistência às vítimas de violência doméstica, este artigo tem por objetivo analisar os conceitos legais das legislações vigentes e propor a utilização das Guardas Municipais na assistência às mulheres vítimas de violência, para sua segurança, seja na prevenção primária a violência, por meio de medidas preventivas, ou a manutenção de medidas protetivas, após a concretização do ato da violência.


2 A LEI MARIA DA PENHA E SUAS PRINCIPAIS ALTERAÇÔES

A Lei Federal nº 11.340/2016, Lei Maria da Penha, foi um marco brasileiro que alterou, por força de lei, os direitos das mulheres, amparando-as da coloquial agressão e submissão cultural.

O nome alusivo a Lei veio da Sr.ª Maria da Penha Maia Fernandes, uma mulher brasileira que virou símbolo da luta contra a violência de gênero. Após várias agressões e tentativas de homicídio por seu cônjuge e pela impunidade de seu agressor, recorreu a Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), para que a justiça brasileira desse uma decisão definitiva ao seu caso. Em 2001 o Brasil foi condenado pela Comissão por omissão, tolerância e impunidade no caso de violência contra as mulheres. (D’URSO, 2009, p. 03)

Foram abordados alguns temas de relevância sobre a definição, segundo esta Lei, de violência e suas principais mudanças legais.

Um dos primeiros dados que a lei elucida é a configuração da violência doméstica. Em seu Art. 5º cita:

Art. 5o  Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: 

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único.  As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. (BRASIL, 2016, grifo do autor).

Esta configuração definiu que a violência doméstica não é somente no âmbito doméstico, mas também no âmbito familiar, independentemente do local, mas da situação em que ocorre a violência. Outro dado interessante, explanado por Ribeiro (2016, p. 50), é que este artigo possibilitou a hipótese de que pessoas através de cirurgias transexuais e documentalmente identificadas como mulher também são amparadas por esta legislação específica.

Posteriormente, em seu Art. 7º, outro artigo de grande relevância norteadora, define como as violências “físicas, psicológicas, sexual, patrimonial e moral” (BRASIL, 2016). Com isto, desmistificou-se, por lei, a agressão física e sexual como o único tipo de violência contra a mulher.

Em seu Art. 22 trouxe, também, a possibilidade de medidas protetivas, visando a aplicação imediata, pela Autoridade Judiciária, de ações que prezem a preservação dos direitos e iminentes riscos em que a vítima possa sofrer, através de obrigações ao agressor, tais como:

Art. 22.  Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1o  As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2o  Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.

§ 3o  Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

§ 4o  Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).  (BRASIL, 2016, grifo do autor)

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Verificou-se que as medidas elencadas no Art. 22, da Lei Maria da Penha, trouxeram maior segurança a vitima, incentivando-as a realização da denúncia, considerando que, com estas medidas, elas estariam amparadas e protegidas do seu agressor. Em relação a isto, Tallulah Kobayachi de Andrade Carvalho comenta:

Além de ampliar a pena aos agressores, a lei alterou mecanismos processuais que antes inibiam o andamento da denúncia de violência doméstica. [...] Além do respaldo da Lei e da Justiça, a mulher vítima de violência precisa de amparo material, poder contar com mais locais para se abrigar e, se necessário, ficar e levar os filhos. Também precisa que o Poder Público assegure o acesso a cursos profissionalizantes, a fim de conquistar meios para sustentar a família e ter sua independência financeira. (CARVALHO, 2009, p.05, grifo do autor)

Por fim, pode-se ressaltar o Art. 41, onde definiu que em todos os crimes praticados de violência contra a mulher, não serão aplicados os termos da Lei Federal nº 9099/95.

Anteriormente a esta legislação, aplicava-se, frequentemente, a Lei Federal nº 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, aos agressores de mulheres, visto que, naquela época, os crimes erem tipificados como menor potencial ofensivo, não cabendo prisão em flagrante. O agressor, frequentemente, era punido com o pagamento de valores em cestas básicas. (SPANIOL; GROSSI, 2014, p. 400).

2.1 OS MUNICIPIOS, SUA RESPONSABILIDADE NA SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA DA MULHER.

São nos municípios onde as pessoas moram. Nele acontecem os problemas e soluções, é nele onde o poder público está mais próximo da população para ação nos problemas em que os afligem. (SENASP, 2005, p. 27)

Há muito tempo, antes um ator coadjuvante, os municípios estão, cada vez mais assumindo sua parcela de responsabilidade na segurança pública. De acordo com o Guia de Prevenção do Crime e Da Violência, da Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP, “Há uma nova realidade quanto à segurança pública no Brasil: os municípios, antes afastados, do debate e das iniciativas na área, estão assumindo, cada vez mais, um conjunto de iniciativas e responsabilidades [...]”. (SENASP, 2005, p. 8)

Em relação a defesa da mulher, a necessidade de integração e parceria entre todos os Entes Federativos, incluindo os municípios, estão descritos no Art. 8º da Lei Maria da Penha onde em seu caput cita como “políticas públicas” a ação articulada entre a União, Estados e Municípios.

O que frequentemente ocorre é o auxilio dos municípios em ações de assistência social, educação e saúde, incumbidos, principalmente, por repasses a Organizações não Governamentais (ONG’s), no auxilio e custeamento de ações em defesa da mulher. Porém, em relação as ações preventivas e relacionadas a segurança pública, os municípios estão, ainda, se reestruturando.

A responsabilidade dos municípios em promover ações a coibir a violência, no caso desse estudo a proteção das mulheres vítimas de violência, é descrita no §8º, Art. 226, da Constituição Federal/1988, onde cita:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.(Brasil, 2016, grifo do autor)

Outra responsabilidade, relacionado a segurança pública e que pode tornar-se auxilio na proteção e ações na manutenção de medidas as mulheres vítimas de violência é por meio das Guardas Municipais, esta inscrito no §8º, Art. 144, da Constituição Federal/1988, onde cita:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: [...] § 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. (Brasil, 2016, grifo do autor)

Em relação a termologia “Estado” é erroneamente atribuída ao sinônimo de Estados-Membros. Porém, a termologia “Estado” estaria atribuída ao poder público, em todas as suas esferas. João Alexandre dos Santos define:

O conceito trazido é que a segurança pública tem que ser um assunto tratado em todos os níveis da federação (União, DF, Estados-membros e os Municípios). Ocorre que por falta de entendimento e de uma correta informação, ao lerem a palavra Estado, muitos não se atentam que ela significa não os estados-membros que compõem a federação e sim todos os seus entes políticos componente da República Federativa do Brasil. É um dever irrecusável e intransferível. (DOS SANTOS, 2014, p. 05, grifo do autor).

2.2 AS GUARDAS MUNICIPAIS, CONCEITO E LEGALIDADE.

As Guardas Municipais estão tornando-se, no Brasil, órgãos auxiliadores na manutenção da segurança pública municipal, principalmente por fazer parte do poder público mais próximo do cidadão: o municipal. Esta instituição pode ser um órgão promovedor de políticas preventivas e de assistência, acompanhamento e manutenção de medidas protetiva aos direitos das mulheres. Uma questão a ser verificada: é legal o uso das Guardas Municipais nesta promoção?

Conforme visto na última secção, mostrou-se a possibilidade, dos municípios, da criação das Guardas Municipais, na “[...] proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.” (BRASIL, 2016, grifo do autor).

A regulamentação das atribuições das Guardas Municipais foi disposta, recentemente, com a sanção da Lei Federal nº 13.022/2014, denominada “O Estatuto Geral das Guardas Municipais”, onde regulamentaram vários princípios, competências e estruturações as Guardas Municipais no Brasil.

Nesta regulamentação esclareceu e delimitou a infinidade de subjetiva interpretação do §8º, Art. 144 da Constituição Federal/1988. Conforme isto, Dos Santos (2014) explana que:

A instituição deixou de ser encarcerada no ultrapassado conceito de guarda patrimonial focada somente em bens, serviços e instalações (um tipo de polícia intramuros) e foi inserida no espaço público, para de fato e de direito proteger direitos humanos fundamentais, o exercício da cidadania, as liberdades públicas, preservando o maior bem, que é a vida, fazendo com que haja a redução do sofrimento humano e social e a diminuição de perdas de ambos os lados desta relação [...]. (DOS SANTOS, 2014, p. 03, grifo do autor).

Também, esta lei sofreu algumas críticas, em relação a sua legalidade e a possibilidade de criação de uma “nova policia”. Em relação a isto, Rafael Faria Domingos afirma:

A posição topográfica do parágrafo em questão revela a clara intenção do constituinte em incluir as guardas municipais dentro do aparato de segurança pública estatal, respeitadas as atribuições dos demais órgãos, as quais são elencadas também no art. 144 da Constituição. Assim, não se pode falar que o legislador infraconstitucional criou uma “nova polícia”, já que o próprio constituinte incluiu a guarda municipal dentro do sistema de segurança pública constitucional, em capítulo destinado para tal, como órgão com atribuições específicas. Não pode ser este o argumento utilizado pelos defensores da inconstitucionalidade do diploma legal em análise. (DOMINGOS, 2014, p. 03, grifo do autor).

No Art. 3º, da Lei Federal nº 13022/2014, incube princípios mínimos de atuação, entre eles pode-se destacar como diretrizes em ações de defesa as mulheres vítimas de violência, tais como:

Art. 3o  São princípios mínimos de atuação das guardas municipais:

I - proteção dos direitos humanos fundamentais, do exercício da cidadania e das liberdades públicas;

II - preservação da vida, redução do sofrimento e diminuição das perdas;

III - patrulhamento preventivo;

IV - compromisso com a evolução social da comunidade; e.  

V - uso progressivo da força. (BRASIL, 2016, grifo do autor).

 Em relação a suas competências legais pode-se analisar o Art.5º, da mesma lei, que cita competências específicas das Guardas Municipais, onde se enquadram na possibilidade da atuação e defesa das mulheres, nos termos da Lei Maria da Penha:

Art. 5o  São competências específicas das guardas municipais, respeitadas as competências dos órgãos federais e estaduais: [...]. 

III - atuar, preventiva e permanentemente, no território do Município, para a proteção sistêmica da população que utiliza os bens, serviços e instalações municipais; [...].

IV - colaborar, de forma integrada com os órgãos de segurança pública, em ações conjuntas que contribuam com a paz social; [...].

V - colaborar com a pacificação de conflitos que seus integrantes presenciarem, atentando para o respeito aos direitos fundamentais das pessoas; [...].

IX - interagir com a sociedade civil para discussão de soluções de problemas e projetos locais voltados à melhoria das condições de segurança das comunidades; [...].

X - estabelecer parcerias com os órgãos estaduais e da União, ou de Municípios vizinhos, por meio da celebração de convênios ou consórcios, com vistas ao desenvolvimento de ações preventivas integradas; [...].  

XI - articular-se com os órgãos municipais de políticas sociais, visando à adoção de ações interdisciplinares de segurança no Município; [...]. 

XIII - garantir o atendimento de ocorrências emergenciais, ou prestá-lo direta e imediatamente quando deparar-se com elas;  

XIV - encaminhar ao delegado de polícia, diante de flagrante delito, o autor da infração, preservando o local do crime, quando possível e sempre que necessário; [...].

XVI - desenvolver ações de prevenção primária à violência, isoladamente ou em conjunto com os demais órgãos da própria municipalidade, de outros Municípios ou das esferas estadual e federal; [...]. 

XVIII - atuar mediante ações preventivas na segurança escolar, zelando pelo entorno e participando de ações educativas com o corpo discente e docente das unidades de ensino municipal, de forma a colaborar com a implantação da cultura de paz na comunidade local. [...] (BRASIL, 2016, grifo do autor).

Verifica-se que há um leque de competência amplo, definido legalmente, na possibilidade de utilização de uma Guarda Municipal, no sentido deste estudo. Em resumo, a atuação da Guarda Civil Municipal, principalmente após a regulamentação constitucional, é descrita por Benedito da Silva Zanin como:

Guarda Municipal é uma policia preventiva de proteção comunitária da população, no sentido institucional. Gozando do poder de policia administrativa para fazer valer a proteção dos munícipes que se utilizam dos espaços públicos de sua cidade, em especial por meio dos patrulhamentos dos logradouros, parques e do entorno das escolas, garantindo a continuidade dos serviços essenciais, em especial as de policia de posturas, sanitárias, e de meio ambiente, atuando na fiscalização do trânsito e agindo de forma integrada com as demais forças de segurança pública. (ZANIN, 2015, p. 14)

2.3 PATRULHA MARIA DA PENHA DA GUARDA MUNICIPAL DE CURITIBA/PR – UMA REFERÊNCIA A SER ESTUDADA

Em muitos municípios uma ação implantada está concretizando êxito e dados expressivos na defesa as vítimas de violência doméstica. Este projeto é o denominado Patrulha Maria da Penha.

A Patrulha Maria da Penha é um projeto implantado em algumas Guardas Municipais, onde é criado um grupo especializado de agentes para o atendimento a mulheres vítimas de violência doméstica.  Este grupo atua na prevenção, proteção, monitoramento e acompanhamento de mulheres vítimas de violência, que possuem medidas protetivas de urgência.

O exemplo deste projeto pode-se citar e analisar a Patrulha Maria da Penha na Guarda Municipal da Cidade de Curitiba/PR, sobre os seus processos e sistema, para um maior entendimento do uso de uma Guarda Municipal na defesa dos direitos da mulher vítima de violência, além de sua legalidade. Esta análise é realizada com base de dados divulgados pela Secretaria de Segurança e Defesa Social da cidade de Curitiba/SP, onde a Guarda Municipal esta lotada, e dados do Tribunal de Justiça do Paraná, onde indicou o projeto ao Prêmio Innovare, na edição XII de 2015.

Tido como marco de referência de implantação do programa, em Guardas Municipais, para municípios como São Caetano do Sul/SP, São Paulo/SP, Londrina/PR, Foz do Iguaçu/PR, entre outros. Em nove meses de atuação, a Patrulha Maria da Penha atendeu 2.500 mulheres vítimas de violência. (CURITIBA, 2016)

 Implantada em 05/03/2014, após realização de um convênio administrativo entre a Prefeitura de Curitiba com o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, onde se delegou a responsabilidade de monitoramento das vitimas com medidas protetivas à Guarda Municipal de Curitiba, de forma recíproca e articulada.

A realização de um convênio administrativo, como a que ocorreu entre a Prefeitura Municipal de Curitiba e o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, demonstra-se possível, conforme o Art. 116 da Lei Federal nº 8.666/1993, que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública, onde diz: “Art. 116.  Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.” (BRASIL, 2016, grifo do autor).

De acordo com Rafael Carvalho Rezende Oliveira (2015, p. 262-263), é defendido que os convênios administrativos são caracterizados por comunhão de interesses compartilhados, em comum, com o fim de satisfazer o interesse público. Além, esta modalidade é defendida, pela maioria das doutrinas, como dispensado a necessidade de licitação.

No caso deste convênio administrativo, o interesse em comum é o atendimento e a aplicação de defesa dos direitos da mulher, conforme a Constituição Federal/1988 e a rede de conjuntos articulados, descritos na Lei Maria da Penha.

Tal como supramencionado, a possibilidade de celebração de convênios administrativos também é previsto como uma competência específica das Guardas Municipais, conforme o inciso X, do artigo 5º da Lei Federal nº 13.022/2014, onde cita:

X - estabelecer parcerias com os órgãos estaduais e da União, ou de Municípios vizinhos, por meio da celebração de convênios ou consórcios, com vistas ao desenvolvimento de ações preventivas integradas; (BRASIL, 2016, grifo do autor).

Os atendimentos da Patrulha Maria da Penha são realizados por um grupo de agentes, por meio de um veículo composto de no mínimo dois e no máximo quatro guardas civis, onde há ao menos um agente do sexo feminino. (CURITIBA, 2016)

Versando este procedimento Spaniol e Grossi (2014, p. 405) descrevem a necessidade da presença de um agente do sexo feminino, para menos constrangimento à vítima e maior confiança e acolhimento para relatar o ocorrido.

O treinamento dos agentes segue a grade da Matriz Curricular da Secretaria Nacional de Segurança Publica (SENASP), do Ministério da Justiça, onde sua formação abrange em torno de 600 horas/aula. Além da formação básica, os agentes realizam um curso específico para a atuação na Patrulha Maria da Penha, com aproximadamente 32 horas/aula.

A Matriz Curricular de Guardas Municipais, elaborada pela SENASP em 2005, foi criada visando “[...] constituir um marco de referência para as ações formativas a serem empreendidas por todas as Guardas Municipais, contribuindo para o fortalecimento e institucionalização do Sistema Único de Segurança Pública – SUSP.” (SENASP, 2005, p. 03).

Nesta Matriz Curricular, em relação a formação do aspirante a guarda municipal, há temas de reflexão e estudo a violência doméstica e de gênero, onde somados são sugeridos, no mínimo, 36 horas/aula. (SENASP, 2005, p. 32-39)

Outro fator que se atrela a necessidade e continuação do treinamento dos agentes é o inciso VII, do Art. 8º da Lei Maria da Penha, onde determina:

 VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia; (BRASIL, 2016, grifo do autor).

Considerando o “principio da legalidade” dos órgãos da administração pública, descrito no Art. 37 da Constituição Federal/1988, a Patrulha Maria da Penha da Guarda Municipal de Curitiba foi, posteriormente, constituída pela Lei Municipal nº 14.690/2016. Tal ato, após dois anos do início do projeto, demostra a aceitabilidade social e o interesse público em sua promulgação.

Em relação à importância deste ato, Celso Antônio Bandeira de Mello defende:

Prevendo-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as tendências (inclusive minoritárias) do corpo social – garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral. (DE MELLO, 2009, p. 100, grifo do autor).

Finalizando, a legalidade da atuação da Patrulha Maria da Penha, o Art. 2º da Lei Municipal nº 14.690/2016 descreve as diretrizes de atuação da Patrulha Maria da Penha, conforme:

Art. 2º As diretrizes de atuação da Patrulha Maria da Penha são:

I - instrumentalização da Guarda Municipal no campo de atuação da Lei Maria da Penha;

II - capacitação dos Guardas Municipais da patrulha e dos demais agentes públicos envolvidos para o correto e eficaz atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, visando o atendimento humanizado e qualificado;

III - qualificação do Município no controle, acompanhamento e monitoramento dos casos de violência contra a Mulher, de modo a reduzir a incidência desse tipo de ocorrência;

IV - garantia do atendimento humanizado e inclusivo à mulher em situação de violência onde houver medida protetiva de urgência, observado o respeito aos princípios da dignidade da pessoa humana, da não discriminação e da não revitimização;

V - integração dos serviços oferecidos às mulheres em situação de violência;

VI - corresponsabilidade entre os Entes Federados;

Parágrafo único. A Patrulha Maria da Penha atuará na proteção, prevenção, monitoramento e acompanhamento das mulheres vítimas de violência doméstica ou familiar que possuam medidas protetivas de urgência, integrando as ações realizadas pela Rede de Atendimento à Mulher em situação de violência na Cidade de Curitiba de acordo com o Termo de Cooperação firmado entre a Prefeitura de Curitiba e o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. (CURITIBA, 2016, grifo do autor).

As diretrizes de atuação da Patrulha Maria da Penha seguem os conceitos e determinações descritos na Lei Maria da Penha. Em relação as competências das Guardas Municipais, estas diretrizes são paralelas as descritas como princípios e competências específicas, regulamentadas pelo Art. 3º e o Art. 5º da Lei Federal nº 13.022/2016, explanados na secção anterior.

Sobre o autor
Fábio Augusto Romano

Inspetor da Guarda Civil Municipal de Votorantim/SP. Graduado em Processos Gerenciais pela ESAMC/SP, pós-graduado em Gestão Pública pela UniFAEL/PR, especialista em Gestão de Guardas Civis Municipais pela EFAE-GCS/SP, pós-graduado em Violência Doméstica pela FGS/MG e pós-graduado em Direito Administrativo pela FOCUS/PR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Fábio Augusto. A atuação das guardas municipais na assistência às mulheres vítimas de violência doméstica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5000, 10 mar. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/52273. Acesso em: 21 nov. 2024.

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