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O consumidor e o dano potencial na compra de produtos

Agenda 29/09/2016 às 23:34

O artigo analisa o dano potencial do consumidor na compra de produtos, sem prévia pesquisa sobre o fornecedor com quem pretende contratar.

RESUMO: O presente trabalho analisa o comportamento desenvolvido pelo consumidor no seu movimento em direção às compras, diante dos perigos a que se expõe ao contratar sem a adoção de medidas preventivas de dano. Essa postura, aliada à vulnerabilidade, agrava a situação de desequilíbrio frente ao fornecedor, pois, fragiliza mais ainda aquele que desconhece a gestão da logística de produção e oferta do produto no mercado de consumo, ao mesmo tempo em que há uma necessidade ilimitada de consumir produtos e serviços os quais influenciam diretamente no cotidiano do consumidor.

Palavras – chave: Comportamento do consumidor – Dano potencial – Compra de produto

Sumário: Introdução. 1 Conceito de consumidor, fornecedor, produto e serviço. 2 O comportamento do consumidor e do fornecedor. 3 O dano potencial e a sugestão de medidas preventivas. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

O Código de defesa do consumidor completou em 2016, 26 anos de existência. Essa comemoração é possível, a nosso pensar, devido, em grande parte, à importante atuação do Ministério Público na defesa dos direitos do consumidor. Reconhecemos a existência de importantes trabalhos desenvolvidos pelo Ministério da Justiça através da Secretaria Nacional do Consumidor – SENACON, Procons, associações de defesa do consumidor, a exemplo do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC e da PROTESTE, além de importantes atuações da Ordem dos Advogados do Brasil através das  Comissões de defesa do consumidor das suas seccionais e do Conselho Federal da OAB. Apesar do trabalho desenvolvido pelos órgãos de defesa do consumidor, a situação que se nos apresenta no momento, pelo menos de forma aparente, é a de que todo o trabalho desenvolvido parece não surtir o efeito desejável, na medida em que alguns fornecedores se comportam de maneira a ignorar as disposições elencadas no CDC e mais ainda, as sucessivas condenações sofridas no âmbito do Poder Judiciário.

Nesse contexto, o trabalho visa analisar o comportamento do consumidor diante das ferramentas que lhe são ofertadas para a sua proteção e a relação com a informação.

Com 26 anos de CDC, percebe-se que, não há ainda por parte do consumidor, uma cultura de prevenção de problemas potenciais, fato que, a nosso pensar, é deveras preocupante, uma vez que, se de um lado o consumidor não se preocupa em pesquisar antes sobre o fornecedor com quem pretende contratar, por outro, expõe-se ao aumento do risco de envolver-se em futuras demandas judiciais.

1 CONCEITO DE CONSUMIDOR, FORNECEDOR, PRODUTO E SERVIÇO

O conceito de consumidor abordado no presente estudo é o de consumidor destinatário final do produto, aquele que comparece ao estabelecimento e faz a compra. Encontra-se disciplinado no art.2º do CDC, caput:   “Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.”

Para José Geraldo Brito Filomeno:

Consoante já salientado, o conceito de consumidor adotado pelo Código foi exclusivamente de caráter econômico, ou seja, levando-se em consideração tão somente o personagem que no mercado de consumo adquire bens ou então contrata a prestação de serviços, como destinatário final, pressupondo-se que assim age com vistas ao atendimento de uma necessidade própria e não para o desenvolvimento de uma outra atividade negocial.[1]

Oportuno o magistério de Cláudia Lima Marques:

a)O consumidor e a vulnerabilidade: do homo faber ao homo economicus et culturalis do século XXI – Consumidor é o não profissional, aquele que retira da cadeia de fornecimento (produção, financiamento e distribuição) o produto e serviço em posição estruturalmente mais fraca, é o agente vulnerável do mercado de consumo, é o destinatário final fático e econômico dos produtos e serviços oferecidos pelos fornecedores na sociedade atual, chamada sociedade “de consumo” ou de massa.[2]

O CDC definiu fornecedor, produto e serviço, todos, no art. 3º:

        Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

        § 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

        § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Ao definir fornecedor, o CDC o fez de maneira a integrar todos os participantes da cadeia de fornecimento do produto e/ou serviço no mercado de consumo e isso, a nosso pensar, é deveras positivo sob o ponto de análise da proteção do consumidor. Quanto ao produto, foi específico: bem móvel, imóvel, material e imaterial.

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A definição de serviço também foi ampla, de maneira a não deixar dúvidas sobre quais os serviços alcançados pelo código consumerista.

Merece apontamento o magistério de Rizzatto Nunes:

O CDC definiu serviço no § 2º do art. 3º e buscou apresenta-lo de forma a mais completa possível. Porém, na mesma linha de princípios por nós já apresentada, é importante lembrar que a enumeração é exemplificativa, realçada pelo uso do pronome “qualquer”. Dessa maneira, como bem a lei o diz, serviço é qualquer atividade fornecida ou, melhor dizendo, prestada no mercado de consumo.[3]

Aquele que comparece a uma loja e adquire um produto como destinatário final, não tem o conhecimento sobre quem participou efetivamente da fase de produção, uma vez que o contato ocorre somente na fase de compra e venda, portanto junto ao lojista. Nesse diapasão, o CDC ao assim proceder, facilitou para o consumidor, pois, basta participar da cadeia para ser considerado fornecedor.

2 O COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR E DO FORNECEDOR

A aquisição de produtos pelo consumidor ocorre sob duas óticas: primeiro, para o suprimento das suas necessidades. Segundo, para suprir o desejo das necessidades criadas pela indústria através da publicidade.

Para Christiane Gade, O comportamento de consumo tem sido definido como atos individuais que envolvem diretamente a obtenção e uso econômico de bens e serviços. Incluindo os processos decisórios que precedem e determinam estes atos.[4]

Para Flávio Calazans:

O termo propaganda tem sua origem etimológica no latim, pangere, plantar. Todo ato de comunicação visa, assim, plantar uma mensagem no receptor, sob a forma de propaganda de produtos (publicidade) ou de propaganda ideológica, política ou eleitoral.[5]

Merece apontamento a lição do autor sobre a propaganda invisível:

Em resumo: a tecnologia de projeção subliminar visual em velocidade taquicoscópica é uma forma de propaganda invisível empregada atualmente nas mídias cinema e televisão, e que já está adaptada ou formatada para fitas de videocassete e programas de computador.

            Evidencia-se, igualmente, que os conteúdos destas mensagens podem variar desde a manipulação de empregados até a venda de refrigerantes, passando pelo uso clínico, à semelhança de sugestão pós-hipnótica, para emagrecer, parar de fumar, etc.[6]

Assim, embora o consumidor adquira produtos por necessidade pessoal, é inegável que o seu comportamento é influenciado e muito pela publicidade veiculada na mídia e, a nosso pensar, mais ainda pela publicidade subliminar. A publicidade cria desejos e necessidades, o consumidor, ao responder a esses estímulos, compra.

Oportuno o magistério de Michael R. Solomon:

Uma compra do consumidor é uma resposta a um problema que, no caso de Richard, é a necessidade percebida de um novo aparelho de TV. Sua situação é semelhante à vivenciada por consumidores virtualmente todos os dias. Ele percebe que quer fazer uma compra e segue uma série de passos para realizá-la. Esses passos podem ser descritos como: (1)reconhecimento do problema, (2)busca de informações, (3)avaliação de alternativas e (4) escolha do produto.[7]

A compra em uma relação de consumo tem um viés que, a nosso ver, é parte fundamental de todo o processo que culmina com a decisão pela aquisição do produto, qual seja: o consumidor não sabe quem é o fornecedor. Mas o fornecedor sabe, muito bem, quem é o consumidor.  Tome-se, como exemplo, alguém que faz uma pesquisa no google sobre notebook. Ao se conectar novamente à internet, independentemente do assunto a ser pesquisado, passará a receber sugestões de modelos de notebook.

Dessa forma, por saber quem é o consumidor, os seus gostos, fraquezas e pretensões, o fornecedor elege o seu público alvo e promove campanhas publicitárias seletivas. Para isso, conta com sistemas habilmente organizados e elaborados sob a ideia difundida de prevenção de riscos, a exemplo do banco de dados SERASA e do sistema de avaliação dos riscos, scoring.

Como se vê, o consumidor é, a nosso pensar, com a devida venia, monitorado e, tem todo o seu comportamento observado e avaliado em tempo real pelo fornecedor.

O consumidor, por sua vez, possui apenas a expectativa criada pela publicidade veiculada pelo fornecedor.

3 O DANO POTENCIAL E A SUGESTÃO DE MEDIDAS PREVENTIVAS

O consumidor é vulnerável na relação de consumo. Além do seu desconhecimento sobre a forma de fabricação de um produto até a sua colocação no mercado de consumo, tem o risco da escolha ao optar por um fornecedor. Esse risco é inerente ao processo de compra.

O dano potencial objeto deste trabalho é aquele prejuízo que ainda não se consolidou, porém, poderá consolidar-se a qualquer momento. É o dano que se encontra na iminência de acontecer, diante do risco decorrente da forma adotada pelo consumidor no seu processo de escolha de um produto.

A nosso pensar, o consumidor que escolhe um produto sem antes pesquisar o histórico do fornecedor, expõe-se de maneira agravada aos riscos de uma eventual compra problemática.

Uma das dificuldades, a nosso ver, de se consolidar uma política de prevenção de danos no comportamento do consumidor no que se refere às suas compras, é a falta de estrutura para organizar dados sobre os fornecedores, na mesma medida ou similar, em que o fornecedor monitora o consumidor.   Essa dificuldade nos parece uma decorrência lógica da falta de recursos do consumidor e da falta de investimentos pelo poder público em uma política de prevenção de danos ao consumidor, pelo menos de forma mais eficaz.

O consumidor ainda não conta, em tempo real, com a possibilidade de acesso a um banco de dados de fornecedor para que possa consultar o histórico, por exemplo, da quantidade de ações a que responde na justiça; a quantidade de reclamações nos Procons, existência de protestos em cartórios etc.

Algumas medidas, porém, podem minimizar esse risco do consumidor no momento da sua escolha, como, por exemplo, a análise de satisfação dos consumidores com o pós-vendas; a existência de processos na justiça e, o percentual de solução de problemas no âmbito extrajudicial com o consumidor.

Atualmente, há sites que se destacam na internet pela intermediação da solução extrajudicial de conflitos entre consumidor e fornecedor, a exemplo do www.reclameaqui.com.br. O site disponibiliza informações que podem influenciar diretamente o consumidor no seu processo de escolha do fornecedor:  a)quantidade de reclamações feitas pelos consumidores; b)quantidade de reclamações atendidas; c)índice de satisfação do consumidor. Um dado importante é a avaliação pelo consumidor ao final mesmo após a solução do problema pelo fornecedor, se ele voltará a fazer negócio com ele, ou seja, se ele ainda confia naquele fornecedor. O site também informa o tempo de resposta do fornecedor.

Outra importante ferramenta de proteção ao consumidor é o site: www.consumidor.gov.br, do Ministério da Justiça que, na mesma linha do www.reclameaqui.com.br, possibilita ao consumidor ter conhecimento do perfil do fornecedor, além de fazer sua reclamação diretamente no site.

Outra medida que poderá ajudar o consumidor é a pesquisa junto aos sites dos tribunais de justiça, para saber se o fornecedor com quem pretende contratar responde a processos no Poder Judiciário.

A nosso pensar, a análise da compra de um produto deve ser precedida de pesquisa prévia sobre o histórico do fornecedor, pesquisa essa a ser realizada junto aos sites de reclamações de consumidores e ao Poder Judiciário, ambas feitas via internet e que por essa razão, facilitam a pesquisa pelo consumidor.

CONCLUSÃO

a)a compra de produtos pelo consumidor sem prévia pesquisa sobre o fornecedor contratado, o expõe de forma agravada a riscos de eventuais problemas, inclusive no âmbito do Poder Judiciário;

b)como medida de prevenção, sugere-se ao consumidor que, antes de proceder à escolha de um produto, faça uma pesquisa prévia sobre o histórico do fornecedor junto aos sites de reclamações de consumidores e do Poder Judiciário, com destaque para as seguintes informações: satisfação do consumidor com o pós-vendas e quantidade de ações a que o fornecedor pesquisado responde na justiça. 

REFERÊNCIAS

CALAZANS, Flávio. Propaganda subliminar multimídia.  São Paulo : Summus, 1992;

FILOMENO, José Geraldo Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos Autores do Anteprojeto, 10ª edição, Editora Forense, Rio de Janeiro, 2011;

GADE, Christiane. Psicologia do consumidor e da propaganda. Ed. rev. e ampl. – São Paulo: EPU, 1998;

MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor : o novo regime das relações contratuais. – 6. ed. rev., atual. E ampl. São Paulo : editora Revista dos Tribunais, 2011;

NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor: com exercícios. São Paulo, Saraiva, 2004;

SOLOMON, Michael R. Comportamento do consumidor : comprando, possuindo e sendo. 5 ed., Porto Alegre, 2002.

www.reclameaqui.com.br, acesso em 10/06/2016.

www.consumidor.gov.br, acesso em 10/06/2016.


[1] Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos Autores do Anteprojeto, 10ª edição, Editora Forense, Rio de Janeiro, 2011,p.23.

[2] Contratos no Código de Defesa do Consumidor : o novo regime das relações contratuais. – 6. ed. rev., atual. E ampl. São Paulo : editora Revista dos Tribunais, 2011, p.302.

[3] Curso de direito do consumidor: com exercícios. São Paulo, Saraiva, 2004, p.95.

[4] Psicologia do consumidor e da propaganda. Ed. rev. e ampl. – São Paulo: EPU, 1998, p.13.

[5] Propaganda subliminar multimídia.  São Paulo : Summus, 1992, P.17.

[6] Propaganda subliminar multimídia.  São Paulo : Summus, 1992, P.25.

[7] Comportamento do consumidor : comprando, possuindo e sendo. 5 ed., Porto Alegre, 2002, p.209.

Sobre o autor
Winston Neil Bezerra de Alencar

Mestre e doutorando em direitos difusos e coletivos pela PUC-SP. Especialista em direito das relações de consumo pela PUC-SP. Advogado.

Informações sobre o texto

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