OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA: QUEM GANHA/PERDE COM ISSO?
RESUMO
A obsolescência programada é um fenômeno gerado pelos fornecedores/fabricantes que manipulam o processo de produção dos seus produtos, controlando e diminuindo o tempo de duração destes, para que, dessa forma, aumente o consumo por novos produtos. No decorrer deste artigo, se observará o fato de que, na maioria das vezes o consumidor acaba adquirindo outro produto em razão do conserto desse tornar-se inviável, relacionando esse fenômeno com o consumo exacerbado. O objetivo desse artigo é alertar aos consumidores sobre a existência dessa estratégia exercida pelos fornecedores, em razão de muitas pessoas ainda não terem esse conhecimento, vindo a cada dia tornarem-se vítimas do mercado e do círculo vicioso de consumo. Através do método dedutivo, busca-se explicar a ocorrência desse fenômeno, ou seja, explicar de que forma os fornecedores prejudicam o consumidor, utilizando-se de estratégias para diminuir o tempo de duração dos seus produtos. Os resultados obtidos comprovaram que essa prática realmente existe e quem é atingido e prejudicado com isso, é o consumidor, enquanto que, quem obtém lucros e vantagens é o fornecedor.
Palavras-chave: Consumidor; Fabricantes; Fornecedores; Obsolescência; Produto.
¹Acadêmica de direito – FANOR - milenarodrigues_sales@hotmail.com
ABSTRACT
The planned obsolescence is a phenomenon generated by suppliers / manufacturers who handle the production process of its products, controlling and reducing the duration of these, so this way, increase the consumption of new products. In this paper, will be observed the fact that, in most cases the consumer ends up buying another product because of repairs that become unfeasible, linking this phenomenon with exacerbated consumption. The purpose of this article is to alert consumers about the existence of this strategy exerted by suppliers, because many people still do not have this knowledge, coming every day become victims of the market and the vicious circle of consumption. Through deductive method, we try to explain the occurrence of this phenomenon, so explain how providers harm consumers, using strategies to reduce the duration of their products. The results proved that this practice does exist and who is affected and hurt by this, is the consumer, while, who gets profits and advantages is the supplier.
Keywords: Consumer; Manufacturers; Suppliers; Obsolescence; Product.
INTRODUÇÃO
Antigamente tudo durava mais. Geladeiras, liquidificadores, fogões, como também os automóveis, produtos de design ultrapassado para os dias de hoje, porém, funcionam bem melhor do que os produtos lançados pelo mercado atual. Há alguns anos atrás, tudo era feito para durar o máximo de tempo possível. Hoje tudo é totalmente programado para se tornar obsoleto/inutilizável, pouco tempo após a compra do produto. Dessa forma, aumenta-se o consumo, o que gera um lucro ainda maior para os fornecedores.
Tudo isso acontece propositalmente para que o consumidor passe a comprar novamente outro produto ou até o mesmo produto quando aquele atingir o seu “prazo de validade oculto”, sua obsolescência programada. Quem ganha com isso? Os fornecedores é claro! Quem sai prejudicado? O consumidor! Haja vista que não tem uma escolha diante dessa estratégia e se vê “forçado” a consumidor outro produto. Esse tipo de estratégia é usada em vários ramos do comércio, tanto com eletrodomésticos como também em automóveis. Dessa forma, as empresas possuem o controle sobre os clientes.
As empresas usam a estratégia da obsolescência programada em seus produtos como uma forma planejada de aumentar seus lucros.
“Apesar do avanço tecnológico, que resultou na criação de uma diversidade de materiais disponíveis para produção e consumo, hoje nossos eletrodomésticos são piores, em questão de durabilidade, do que há 50 anos.” (IDEC, 2015). Tais produtos são acessíveis para o consumo, porém são totalmente programados para durar pouco tempo. Em razão disso, o consumidor se vê desorientado para dar a esses produtos um destino final adequado e ainda tem que lidar com o fato de ter que consumir outro produto, por uma questão de necessidade e prática. (SOUSA, DOMINIQUI, 2015).
O desgaste natural dos produtos que adquirimos e/ou utilizamos é algo previsível. E vários fatores colaboram para isso. Porém, cotidianamente o que se observa é o que se convencionou chamar de obsolescência programada, situação em que os fornecedores dos produtos planejam o envelhecimento e funcionamento dos mesmos, ou seja, programam quando ele se tornará obsoleto/inútil. Assim, o consumidor fica condicionado a adquirir outro.
Diante desse contexto, esse artigo tem como objetivo geral alertar e orientar aos consumidores sobre a existência dessa estratégia exercida pelos fornecedores, através de normas e jurisprudências, em razão de muitas pessoas ainda não terem esse conhecimento, vindo a cada dia tornarem-se vítimas do mercado e do círculo vicioso de consumo. Através da norma e da jurisprudência, será possível observar o entendimento jurídico desse fenômeno simplificando o entendimento aos consumidores para que os mesmos saibam que atitude tomar diante de uma situação de obsolescência programada.
O método utilizado nesse artigo é o dedutivo, que busca explicar a ocorrência desse fenômeno, ou seja, explicar de que forma os fornecedores prejudicam o consumidor, utilizando-se de estratégias para diminuir o tempo de duração dos seus produtos.
Segundo Emerson Santiago(2015):
Raciocínio dedutivo ou método dedutivo é um tipo de raciocínio lógico que faz uso da dedução para obter uma conclusão a respeito de determinada premissa. O termo “dedução” está registrado no dicionário como o ato de deduzir, concluir, ou a enumeração minuciosa de fatos e argumentos. A origem do método dedutivo é atribuída aos antigos gregos, com o silogismo do filósofo Aristóteles, sendo mais tarde desenvolvido por Descartes, Spinoza e Leibniz.
Destaque-se que a dedução retrata sobre algo já conhecido. Esse método simplesmente especifica um conhecimento que já existe, organizando-o de um ponto a outro. É parte de uma hipótese geral sem ligação com o mundo real, mas com o pensamento do cientista, pensador ou filósofo, observando-se seus pensamentos sobre o mundo. A lógica e a experiência são as ferramentas fundamentais nesse método.
Ainda metodologicamente fez-se uma revisão e fichamento bibliográfico e interpretação legal da temática abordada.
CONCEITO DE CONSUMIDOR, PRODUTO, FORNECEDOR E OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA
Antes de adentrar na temática desse artigo, necessário se faz conceituar consumidor, produto e fornecedor. O conceito de consumidor está previsto no artigo 2º, caput e § único, sendo complementado pelos artigos 17 e 29, todos do CDC.
Quanto à doutrina, Rizzato Nunes (2012, p.121) aduz que:
Consumidor é a pessoa física, a pessoa natural e também a pessoa jurídica. Quanto a esta última, como a norma não faz distinção, trata-se de toda e qualquer pessoa jurídica, quer seja uma microempresa, quer seja uma multinacional, pessoa jurídica civil ou comercial, associação, fundação etc.
O inciso I do art. 4º classifica que o consumidor é vulnerável. Esse reconhecimento é uma forma de realização da isonomia a qual é garantida pela Constituição Federal. Isso significa que o consumidor é a parte fraca da relação jurídica de consumo. Essa fragilidade é real e advém de dois aspectos: o de ordem técnica e o de cunho econômico. O técnico está relacionado aos meios de produção, cujo conhecimento pertence ao fornecedor.
Quando se fala em meios de produção, além de se referir aos aspectos técnicos e administrativos dos produtos e prestação de serviços em poder do fornecedor também se fala do elemento da decisão, pois é o fornecedor que decide o que vai produzir, quando e de que forma fará isso. Dessa forma, o consumidor fica sujeito àquilo que é produzido.
Por essa razão, a chamada “escolha” do consumidor existe de forma reduzida, ou seja, o consumidor só pode escolher por aquilo que foi oferecido no mercado. Aquilo que é oferecido pelo fornecedor, visa apenas seus interesses, ou seja, a obtenção de lucro.
“A característica de vulnerabilidade do consumidor prevista no inciso I do art. 4º decorre diretamente da aplicação do princípio da igualdade do texto magno.”(NUNES,2012 p.115).
O art. 5º da CF, aduz em seu caput: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”. No que diz respeito ao consumidor, muitas vezes esse princípio constitucional é desrespeitado, como exemplifica Rizzato Nunes (2012, p.75):
Veja-se, por exemplo, um caso típico de discriminação ao consumidor: o sucesso do filme “Titanic”, ganhador de vários Oscars, levou, durante semanas, milhares de pessoas (consumidores do serviço de diversão) às salas de cinema. A procura era tamanha que o público tinha de chegar mais de três horas antes do início de cada sessão (sendo que o próprio filme tem mais de três horas de exibição). Era um enorme esforço. Mas, ao que tudo indica, os consumidores não se importavam. Acontece que os exibidores firmaram um contrato com os administradores do cartão de crédito Diners Club, que permitia que seus usuários pudessem adquirir os ingressos para assistir ao filme sem pegar fila. Foi um verdadeiro “fura-fila”. Esses consumidores privilegiados passaram a gozar de um direito não oferecido aos demais. Isso porque somente podiam comprar pelo telefone os portadores do indigitado cartão de crédito. Bem ao estilo de George Orwel, esses usuários do cartão eram “mais iguais que os outros iguais”. Não resta dúvida de que aquela prática era ilegal, na medida em que feria o princípio de isonomia previsto na Carta Magna.
Dessa forma, percebeu-se que, nesse caso, existiu discriminação por parte do exibidor, pois houve diferença no tratamento oferecido (aqueles que possuíam o cartão eram bem tratados e tinham prioridade). Só é justificado o tratamento diferenciado em relação ao consumo, quando o consumidor está protegido pelo ordenamento e pela Lei, merece o tratamento diferenciado, como por exemplo: os idosos, mulheres grávidas.
Quanto ao conceito de produto, está previsto no parágrafo 1º do artigo 3º, do CDC: “Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial”. Segundo a doutrina, “a preocupação da lei é garantir que a relação jurídica de consumo esteja assegurada para toda e qualquer compra e venda realizada. Por isso fixou conceitos os mais genéricos possíveis.”(NUNES, 2012, p.140).
Essa conceituação genérica procura abranger o maior número de coisas possíveis com o objetivo de que nada escape.
O conceito de fornecedor está previsto no caput do artigo 3º, do CDC, que diz:
Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
A simples leitura do artigo já nos dá uma relação das pessoas consideradas como fornecedoras. “Na realidade são todas pessoas capazes, físicas ou jurídicas, além dos entes desprovidos de personalidade. Não há exclusão alguma do tipo de pessoa jurídica, já que o CDC é genérico e busca atingir todo e qualquer modelo.”. (NUNES, 2012, p.135).
Ainda segundo Rizzato Nunes (2012, p.135):
São fornecedores as pessoas jurídicas públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades anônimas, as por quotas de responsabilidade limitada, as sociedades civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da Administração direta etc.
Esclarecidos então os conceitos das palavras mais encontradas durante esse artigo, adentremos no conceito de obsolescência programada: “Obsolescência Programada, também chamada de obsolescência planejada, é quando um produto lançado no mercado se torna inutilizável ou obsoleto em um período de tempo relativamente curto de forma proposital.” (PENA, 2015).
Ainda segundo Packard(1965, p.51) apud Padilha e Bonifácio (2013), existem três tipos de obsolescência:
“Pode haver obsolescência de função. Nessa situação, um produto existente torna-se antiquado quando é introduzido um produto que executa melhor a função. Obsolescência de qualidade. Nesse caso, quando planejado, um produto quebra-se ou se gasta em determinado tempo, geralmente não muito longo. Obsolescência de desejabilidade. Nessa situação, um produto que ainda está sólido, em termos de qualidade ou performance, torna-se gasto em nossa mente porque um aprimoramento de estilo ou outra modificação faz que fique menos desejável”.
Nesse artigo, nos limitaremos à obsolescência de qualidade, ou seja, a obsolescência programada.
CONTEXTO HISTÓRICO DA OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA
A lâmpada é um dos maiores exemplos de obsolescência programada. Quando as lâmpadas foram criadas, duravam muito mais tempo, porém isso atingiu o diretamente o lucro do mercado, pois os fornecedores estavam vendendo apenas um número limitado lâmpadas. Em razão disso, criaram uma estratégia para limitar o funcionamento das lâmpadas. Tal prática vem sendo exercida até hoje, em variados tipos de produtos. Diante dessa realidade, o consumidor é o principal prejudicado.
O documentário dirigido por Cosima Dannoritzer, Comprar, tirar, comprar, produzido em 2011, na Espanha, relata o caso de um jovem em busca de consertar sua impressora, após várias consultas, percebeu que não valia a pena consertar aquele produto, pois o preço seria alto, dessa forma o jovem sentiu-se obrigado a comprar outra impressora.
Tal documentário menciona o comunismo na Europa Oriental na segunda metade do século XX destacando que não havia sentido exercer a obsolescência programada no mercado, pois o Estado tinha outras prioridades no lugar do consumo. Na antiga Alemanha Oriental, as geladeiras eram produzidas para durar uns 25 anos. Porém, devido à queda do muro de Berlim (1989), os produtos fabricados nessa época, pararam de ser produzidos e hoje podem ser encontrados em museus.
O contrário do que acontece nos dias de hoje, em que o consumismo é altamente visado e objetivado pelos fornecedores.
É o que se pode observar também através de Serge Latouche (2012, p.33) apud Santos e Dominiqui (2015):
Com a obsolescência programada, a sociedade do crescimento tem em seu poder a arma absoluta do consumismo. No termo de períodos cada vez mais curtos, os aparelhos e os equipamentos, desde as lâmpadas eléctricas aos óculos, deixam de funcionar devido a uma avaria prevista dum dos seus elementos. É impossível encontrar uma peça de substituição ou um técnico que o repare. Ainda que pudéssemos deitar mão a essa ave rara, a reparação acabaria por ser mais cara do que comprar um aparelho novo (pois são actualmente fabricados a preços reduzidos devido às miseráveis condições de trabalho do Sudeste Asiático)
Se uma empresa cria um automóvel que não quebra, não se desgasta rapidamente, iriam vender apenas um número limitado de automóveis, isso faria com que as vendas diminuíssem o que acarretaria também na diminuição dos lucros dos empresários.
As pessoas associam esse fenômeno ao processo de globalização, porém, acredita-se que tudo começou devido à Grande Depressão de 1929, com a crise econômica que ocorreu nessa época, além disso, o mercado encontrava-se impotente, havia muitos produtos em estoque e não saíam do mercado, o que acarretou na diminuição dos lucros das empresas, gerando desemprego, reduzindo o consumo e consequentemente aumentando a crise.
Diante disso, os empresários chegaram a conclusão de que os produtos duráveis não favoreciam a economia. A partir daí, começaram a usar estratégias para diminuir o tempo de serventia dos produtos.
OBSOLESCÊNCIA E OS PRODUTOS TECNOLÓGICOS
A obsolescência programada é vista com maior frequência na área tecnológica, comumente no período de garantia dos produtos, como por exemplo, notebooks, computadores que funcionam normalmente até que seu período de garantia é atingido e aquele aparelho simplesmente deixa de funcionar normalmente, ou porque a bateria não funciona mais, ou alguma peça precisa torna-se e na maioria dos casos o preço do conserto é muito alto e o consumidor vê-se impelido a adquirir um novo produto.
Em alguns casos, acontece de o produto atingir seu prazo de garantia e logo alguns dias depois se torna obsoleto. É o que vemos na jurisprudência a seguir:
Nº 71004675278 (Nº CNJ: 0043865-29.2013.8.21.9000)
2013/Cível
RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO REPARATÓRIA. VÍCIO DE PRODUTO. NOTEBOOKADQUIRIDO HÁ APROXIMADAMENTE TRÊS ANOS. DEFEITO QUE SOMENTE SURGE COM O USO. NEXO CAUSAL COMPROVADO. DEVOLUÇÃO PARCIAL DOS VALORES. DANO MORAL AFASTADO. SENTENÇA MODIFICADA.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(Brasil. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Nº 71004675278 (Nº CNJ: 0043865-29.2013.8.21.9000). Recorrente: ACER do Brasil LMTDA; Recorrido: Aldo Cassel; Relator:Roberto José Ludwig. Porto Alegre.20/02/2014.)
No presente caso, o requerido comprou um notebook que após três anos de uso, começou a tornar-se obsoleto. A partir da observação do inteiro teor da decisão, o caso foi entendido como mais uma das situações de obsolescência programada e ainda menciona diante do pedido de danos morais, que não se pode esperar que o produto durasse indefinidamente.
Esse é apenas um dos casos em que o consumidor é desrespeitado diante dessa prática dos fornecedores, o desgaste programado dos produtos virou algo “normal”, quando o normal deveria ser o seu bom funcionamento ou pelo menos o seu desgaste natural.
OBSOLESCÊNCIA E O IMPACTO AMBIENTAL
Diante da realidade da obsolescência programada, o consumo vem aumentando exacerbadamente nos últimos anos colaborando também para o aumento do fluxo de lixo eletrônico e tóxico, o que tem se tornado uma grande preocupação para o planeta.
Serge Latouche (2012, p. 33) apud Santos e Dominiqui(2015), fala sobre esse assunto:
Deste modo, montanhas de computadores encontram-se lado a lado com televisores, frigoríficos, máquinas de lavar a loiça, leitores de DVD e telemóveis a atravancar caixotes e depósitos de lixo, com diversos riscos de poluição: 150 milhões de computadores são transportados anualmente para as lixeiras do Terceiro Mundo (500 navios por mês para a Nigéria!).
Se vivêssemos como os franceses, “seriam necessários três planetas, e seis para nos equipararmos aos nossos amigos americanos”, declara Latouche (2012, p.39) apud Sousa e Dominiqui (2015).
Uma sociedade plenamente consumista e que não reflete sobre a sustentabilidade do planeta, pois “a capacidade de regeneração da Terra não acompanha a procura: o homem transforma os seus recursos em lixo mais rapidamente do que a natureza pode transformar lixo em novos recursos” (LATOUCHE, 2012, p. 38) apud Sousa e Dominiqui (2015).
É bem verdade que, é dever do Estado, fiscalizar, regularizar e induzir padrões de mudanças de produção e consumo, com o objetivo de amenizar a atuação situação do nosso planeta, como também proteger os direitos do consumidor.
Segundo o caput e II, “d” do artigo 4º, do CDC:
A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
II- ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:
[...]
d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho;(Destaque nosso)
Podemos entender melhor o funcionamento desse círculo consumista através de Zygmunt Bauman (2008, p.31) apud Santos e Dominiqui(2015):
Afinal de contas, nos mercados de consumidores-mercadorias, a necessidade de substituir objetos de consumo defasados está inscrita no design dos produtos e nas campanhas publicitárias calculadas para o crescimento constante das vendas. A curta expectativa de vida de um produto na prática e na utilidade proclamada está incluída na estratégia de marketing e no cálculo de lucros: tende a ser preconcebida, prescrita e instilada nas práticas dos consumidores mediante a apoteose das novas ofertas (de hoje) e a difamação das antigas (de ontem).
OBSOLESCÊNCIA E AS ESTRATÉGIAS DE CONSUMO
Segundo Serge Latouche (2012, p.30) apud Santos e Dominiqui(2015):
São necessários três ingredientes para que a sociedade de consumo possa prosseguir o seu circuito diabólico: a publicidade, que cria o desejo de consumidor, o crédito, que lhe fornece os meios, e a obsolescência acelerada e programada dos produtos que, renova a sua necessidade.
Esses três ingredientes juntos nos ajudam a entender melhor como funcionam as estratégias de consumo. As propagandas publicitárias apelam para o consumismo e na maioria das vezes não trazem todas as informações necessárias sobre os produtos, ou até mesmo passam uma publicidade enganosa com o propósito de iludir o consumidor e aumentar o lucro das empresas.
Quanto a isso, Rizzato Nunes(2012, p.111) considera que “o anúncio publicitário não pode faltar com a verdade daquilo que anuncia, de forma alguma, quer seja por afirmação quer por omissão. Nem mesmo manipulando frases, sons e imagens para, de maneira confusa ou ambígua, iludir o destinatário do anúncio.
Quanto às formas de crédito, podemos observar a variedade de formas que se pode fazer compras, cartões, crediário, parcelamentos, dessa forma, o consumidor compra várias coisas e passa a vida pagando um cartão de crédito, muitas vezes a durabilidade do produto se torna obsoleta antes mesmo de o consumidor terminar de pagar o que comprou.
O crédito é o que movimenta a sociedade de consumo atualmente, possuindo grande importância na vida das pessoas. Porém é necessário responsabilidade na sua concessão e condução, caso contrário, o resultado obterá sérias consequências.
Porém, o que se observa na realidade são publicidades altamente trabalhadas que oferecem o crédito de forma fácil e que são transmitidos ao consumidor de diversas formas: televisão, jornais, revistas, rádio, internet, etc.
RESULTADOS
Diante da realidade do fenômeno da obsolescência programada e do consumo exacerbado, um acordo foi feito entre o mercado consumidor e os especialistas em tecnologia, o objetivo desse acordo foi de executar campanhas que visem o controle do consumo desenfreado, bem como o uso de medidas que objetivem o combate ao fenômeno da obsolescência programada no que toca aos fabricantes. Tal acordo visa proteger o meio ambiente, diminuindo a produção de lixo eletrônico, como também visa proteger o consumidor, que muitas vezes compra um produto e se vê prejudicado em razão da obsolescência programada.
Segundo Nalini (2010, 19) apud Santos e Dominiqui(2015):
Somente uma conversão – ou uma reconversão ética – poderá inverter o círculo vicioso da inércia, da gastança, do desperdício, da insensibilidade, para uma existência de zelo pela natureza. De uso responsável. De desenvolvimento sustentável. De sensibilidade ambiental. De amor à natureza e de amor ao próximo. De respeito à vida. De luta permanente para consecução de uma vida digna.
Porém, ainda é possível ver muitas pessoas afundadas em dívidas, comprando desenfreadamente, presas a este círculo vicioso causado pela obsolescência programada.
É necessário que o consumidor procure sempre estar atento quanto à durabilidade desses produtos, e caso o produto torne-se obsoleto antes mesmo de terminar seu prazo de garantia, uma atitude deve ser tomada por parte do consumidor, devendo este procurar pelos órgãos responsáveis por sua defesa, como o DECON. Tomando esse tipo de atitude é que o consumidor pode demonstrar que está atento aos seus direitos, é uma forma de protesto contra essa estratégia comercial.
Já existem várias jurisprudências e algumas delas foram expostas nesse artigo, que reconhecem o fenômeno da obsolescência programada como um problema social que deve ser visto com cautela, a fim de que os direitos do consumidor possam ser respeitados e postos em prática.
Segundo Édis Milaré (2011, p. 99) apud Santos e Dominiqui(2015):
Tanto a proteção do meio ambiente como a proteção do consumidor são princípios da ordem econômica, nos termos da Constituição Federal de 1988. Isso quer dizer que, no plano constitucional, as duas esferas de preocupação (meio ambiente e consumidor) estão igualmente situadas, e funcionam como limites à livre iniciativa, uma vez que a ordem econômica se direciona para a ordem social, como afirmam os requisitos jurídicos e o ordenamento econômico-social a partir da Carta Magna.
Não é uma tarefa fácil controlar essa situação e erradicar a obsolescência programada, porém, o consumidor tem os seus direitos e deve procurá-los diante de uma situação em que se sinta prejudicado, tal ação já é o começo para combater esse fenômeno obstruidor de direitos e do meio ambiente.
DISCUSSÃO
Essa atitude tomada pelas empresas visa apenas o lucro próprio, sem pensar nos problemas que isso pode causar ao meio ambiente e principalmente ao consumidor. Essa estratégia de controlar o tempo de uso dos produtos tem colaborado para o crescimento aumentado do consumismo, como também tem aumentado a produção de lixo tóxico e eletrônico.
É possível observar esse resultado através do aumento do consumismo e da qualidade dos produtos atuais, comparando-os com os produtos fabricados antigamente. É notória a diferença na qualidade e durabilidade desses produtos. Existem alguns desses produtos que perduram até hoje, funcionam perfeitamente. Tal fato só comprova que, existem formas de tornar esses produtos mais duráveis, porém existe um grande controle do mercado em relação a isso.
É tudo uma questão de lucro e marketing, quanto aos interesses e direitos do consumidor, são deixados de lado, ou seja, o consumidor sai prejudicado nessa situação, enquanto que as empresas continuam lucrando através de seus produtos com “validade oculta”.
CONCLUSÃO
Portanto, foi possível observar que a obsolescência programada tem crescido bastante nos últimos anos através da manipulação feita pelos fornecedores/fabricantes no processo de desenvolvimento dos seus produtos, controlando e diminuindo o tempo de duração destes, para que dessa forma, aumente o consumo por novos produtos.
Os objetivos desse artigo foram alcançados através do método dedutivo onde foram utilizados fatos e argumentos jurídicos para compor toda a sua estrutura. Buscando na lei, na doutrina, jurisprudência, documentários e artigos científicos, formas de esclarecer ao consumidor sobre os aspectos desse fenômeno, preparando-o para tal situação, norteando-o a uma tomada de decisão por via jurídica, caso seja vítima da obsolescência programada.
Vários foram os resultados observados ao longo deste artigo, e pôde-se concluir que, o maior prejudicado nessa situação é o consumidor, pois, na maioria das vezes o conserto dos produtos obsoletos torna-se inviável, isso acaba obrigando-o a cair nessa estratégia, levando-o a consumir ainda mais. Além disso, esse consumo exagerado tem aumentado a quantidade de lixo tóxico e eletrônico, prejudicando também o meio ambiente, pois as pessoas não sabem que destino dar à esses produtos que tornaram-se inúteis/obsoletos, ou seja, a obsolescência programada não prejudica somente ao consumidor, mas também o meio ambiente.
Esse fenômeno tem colaborado com o grande crescimento econômico das empresas, gerando cada vez mais lucros aos fornecedores. Por outro lado, o consumidor, que sai prejudicado, tem que arcar com os prejuízos causados por essa estratégia, comprando um produto novo em razão de o conserto de seu produto obsoleto, tornar-se inviável, ou por não ter no mercado algo que resolva o problema ou por que o custo torna-se tão elevado que a saída mais “vantajosa” é comprar outro.
Algumas medidas são tomadas para controlar esse fenômeno, como as campanhas que visam o controle do consumo desenfreado, bem como o uso de medidas que objetivam o combate ao fenômeno da obsolescência programada. Porém, também é necessária uma posição do próprio consumidor em relação a isso, não apenas ficar de braços cruzados quando perceber que seu direito está sendo violado, mas procurar os órgãos responsáveis por sua defesa, como uma forma de enfrentar esses fornecedores que estão tomando o controle sobre o mercado.
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