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Controle judicial de políticas públicas

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Agenda 17/10/2016 às 03:11

O estudo propõe a possibilidade de controle judicial de políticas públicas, especialmente aquelas estabelecidas pela Constituição Federal, em contraponto à mera alegação da reserva do possível, diante da necessidade de concretização de direitos sociais.

 

 

 

 

RESUMO

 

O estudo propõe a possibilidade de controle judicial de políticas públicas, especialmente aquelas estabelecidas pela Constituição Federal, em contraponto à mera alegação da reserva do possível, diante da necessidade de concretização de direitos sociais em face do princípio basilar da dignidade da pessoa jurídica.

 

RESUMEN

 

El estudio sugiere la posibilidad de una revisión judicial de las políticas públicas, en especial las que se desarrollen en la Constitución Federal, en contraposición a la mera alegación de la reserva sea posible antes de la necesidad de la realización de los derechos sociales en la cara del principio básico de la dignidad de la persona jurídica.

 

SUMMARY

 

The study suggests the possibility of judicial review of public policies, especially those implemented in the Federal Constitution, as opposed to the mere allegation of reservation possible before the need for realization of social rights in the face of the basic principle of the dignity of the legal entity .

 

PALAVRAS-CHAVES

 

Controle judicial, políticas públicas, reserva do possível, direitos sociais, dignidade da pessoa humana.

 

CONTRASEÑAS

 

El control judicial , la política pública, reservación posible, los derechos sociales, la dignidad humana .

 

KEYWORDS

 

Judicial review , public policy, booking possible, social rights , human dignity .

 

INTRODUÇÃO

 

CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS

 

Os elementos tradicionais que integram o conceito de constituição se referem à limitação do Poder Público, o estabelecimento de direitos fundamentais, a separação de poderes, a forma e o sistema de governo. A Constituição Federal de 1988 estabelece que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito. Estado Democrático significa que o poder emana do povo, que o exerce indiretamente, através de eleições periódicas para escolha dos representantes de acordo com os ideais programáticos adotados de forma consensual, ou diretamente, através de plebiscito, de referendo e de outros instrumentos previstos na Carta Magna. Estado de Direito significa submissão às leis, não simplesmente no sentido formal, mas ao ordenamento jurídico, e que o diploma normativo tenha legitimidade e esteja em consonância com os direitos fundamentais previstos na Constituição.

Há de se ressaltar que o princípio da dignidade da pessoa humana é a viga mestra da ordem constitucional brasileira, toda ação do Estado deve estar voltada à concretização da dignidade do ser humano. A democracia há de ser considerada no sentido de ampliar a igualdade social para garantir o mínimo de com        dições de existência, pois a vida e a liberdade são essenciais, mas não basta apenas isso, há de se garantir uma existência digna, razão pela qual se consagra o Estado Social de Direito.

Com a superação do positivismo formalista, em que prevalecia a submissão irrestrita à lei, o Estado Social de Direito busca garantir uma sociedade pluralista, livre, justa e solidária, em que todo poder emana do povo, com reconhecimento e afirmação dos direitos fundamentais decorrentes da dignidade da pessoa humana. Entretanto, Dirley da Cunha Júnior[1] alerta que o Estado Social, sobretudo, há de ser democrático, nesse sentido:

Em razão da doutrina social do Estado que floresceu a partir da primeira Grande Guerra, o Estado de Direito passa a sofrer adaptações, para se converter em Estado Social de Direito e atender às reivindicações por justiça social. O problema é que a expressão Estado Social foi objeto de ambiguidades ideológicas de todas as ordens. Em nome da implantação de um Estado Social não foram poucos os governos de tirania. Como revela a história, a bandeira do Estado Social serviu para sustentar regimes arbitrários de pura barbárie, como ocorreu na Alemanha nazista, na Itália fascista, na Espanha franquista, em Portugal salazarista e de uma certa forma no Brasil a partir da Revolução de 1930 e durante todo o Estado Novo. Como observa Paulo Bonavides, o Estado Social se coaduna com regimes antagônicos, como a democracia, o fascismo e o nacional-socialismo.

Percebe-se, daí, como corretamente adverte José Afonso da Silva, que o Estado de Direito, quer como Estado Legislativo ou Liberal de Direito, quer como Estado Social de Direito, nem sempre se caracteriza como Estado Democrático.

O Estado Social de Direito tem por finalidade o bem estar geral, abandonando o individualismo extremo e a neutralidade do estado liberal, conforme leciona José Afonso da Silva[2]:

O Estado de Direito, na atualidade, deixou de ser formal, neutro, enquanto adota uma dogmática e pretende realizar a justiça social. Transforma-se em Estado Social de Direito, onde o qualificativo social refere-se à correção do individualismo clássico liberal pela afirmação dos chamados direitos sociais e realização de objetivos de justiça social. Caracteriza-se no propósito de compatibilizar, em um mesmo sistema, anota Elías Díaz, dois elementos: o capitalismo, como forma de produção, e a consecução do bem-estar social geral, servindo de base ao neocapitalismo típico do Welfare State.

Cabe ao Estado assegurar as condições mínimas para que sejam efetivados os direitos fundamentais consagrados na Constituição Federal. Não se admite a singela alegação de escassez de recursos financeiros como justificativa para a ausência de que políticas públicas sejam implementadas no sentido de concretizar direitos sociais.

A Constituição Federal estabelece os princípios que regem a atuação do administrador, elencados no artigo 37, caput:

A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Desde as primeiras Constituições que os direitos fundamentais são reconhecidos, evoluindo de acordo com os fatos históricos e sociais, assim, a doutrina tradicional cunhou a classificação em três gerações de direitos fundamentais, porém, o termo gerações é objeto de crítica por parte da doutrina, que aponta ser mais adequado o termo dimensões. Nesse sentido, Ingo Wolfgang Sarlet[3] afirma que:

não há como negar que o reconhecimento progressivo de novos direitos fundamentais tem o caráter de um processo cumulativo, de complementaridade, e não de alternância, de tal sorte que o uso da expressão 'gerações' pode ensejar a falsa impressão da substituição gradativa de uma geração por outra, razão pela qual há quem prefira o termo 'dimensões' dos direitos fundamentais, posição esta que aqui optamos por perfilhar, na esteira da mais moderna doutrina. Neste contexto, aludiu-se, entre nós, de forma notadamente irônica, ao que se chama de 'fantasia das chamadas gerações de direitos', que, além da imprecisão terminológica já consignada, conduz ao entendimento equivocado de que os direitos fundamentais se substituem ao longo do tempo, não se encontrando em permanente processo de expansão, cumulação e fortalecimento. Ressalte-se, todavia, que a discordância reside essencialmente na esfera terminológica, havendo, em princípio, consenso no que diz com o conteúdo das respectivas dimensões e 'gerações' de direitos.

Os direitos fundamentais denominados de primeira dimensão são aqueles inerentes à liberdade e igualdade dos indivíduos, de caráter negativo, impõem ao Estado uma abstenção, os de segunda dimensão, são aqueles inerentes ao bem estar social, essencialmente impõem ao Estado uma prestação positiva para consagrar não apenas a igualdade formal dos indivíduos, mas a igualdade no sentido material, já os de terceira dimensão, são aqueles inerentes à fraternidade e solidariedade, cuja característica principal é consagrar a proteção de grupos de indivíduos, não se considerando apenas o ser humano isoladamente, portanto, a sua titularidade é coletiva, geralmente indeterminada.

 

Os direitos de segunda dimensão se referem aos chamados direitos sociais, ou seja, aqueles direitos que impõem ao Estado uma atuação positiva, uma prestação, no sentido de prestigiar o direito à igualdade material, não apenas formal, de forma que se tratem os desiguais de forma desigual, na medida das desigualdades existentes, conforme célebre expressão de Aristóteles. Assim, há uma relação de complementariedade e interdependência, pois os direitos de segunda dimensão configuram condições materiais para o pleno gozo dos direitos de primeira dimensão. Por exemplo, não há plenitude no direito à vida se o individuo não tem saúde, e não há plenitude no direito à livre manifestação do pensamento se o individuo não tem educação.

 

Políticas Públicas, Conceito Jurídico Indeterminado

 

Celso Antônio Bandeira de Mello[4], mediante critério formal, identifica as funções do Estado como sendo a função legislativa, a função jurisdicional e função administrativa. Contudo, afirma que há atos que não se alocam satisfatoriamente em nenhuma das clássicas três funções do Estado, os quais seriam inerentes à função política ou de governo:

Tais atos, ao nosso ver, integram uma função que se poderia apropriadamente chamar de 'função política' ou de 'governo', desde que se tenha a cautela de dissociar completamente tal nomenclatura das consequências que, na Europa, se atribuem aos atos destarte designados. É que, em vários países europeus, sustenta-se que os atos políticos ou de governo são infensos a controle jurisdicional, entendimento este verdadeiramente inaceitável e que, como bem observou o eminente Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, é incompatível com o Estado de Direito, constituindo-se em lamentável resquício do absolutismo monárquico.

Os conceitos jurídicos indeterminados são normas de conteúdo plástico, vago, impreciso, nos termos da lição de José dos Santos Carvalho Filho[5]:

termos ou expressões contidos em normas jurídicas, que, por não terem exatidão em seu sentido, permitem que o intérprete ou o aplicador possam atribuir certo significado, mutável em função da valoração que se proceda diante dos pressupostos da norma. É o que sucede com expressões do tipo “ordem pública”, “bons costumes”, “interesse público”, “segurança nacional” e outras do gênero. Em palavras diversas, referidos conceitos são aqueles cujo âmbito se apresenta em medida apreciável incerto, encerrando apenas uma definição ambígua dos pressupostos a que o legislador conecta certo efeito de direito.

Hely Lopes Meirelles[6] define atos políticos como sendo aqueles que:

praticados por agentes do Governo, no uso de competência constitucional, se fundam na ampla liberdade de apreciação da conveniência e oportunidade de sua realização, sem se aterem a critérios jurídicos preestabelecidos. São atos governamentais por excelência, e não apenas de administração. São atos de condução dos negócios públicos, e não simplesmente de execução de serviços públicos. Daí seu maior discricionarismo e, conseqüentemente, as maiores restrições para o controle judicial. Mas nem por isso afastam a apreciação da Justiça quando argüidos de lesivos a direito individual ou ao patrimônio público.

O regime político não tem conceituação uniforme na doutrina, José Afonso da Silva[7] adota a concepção de professores da Universidade de Barcelona, que parte do princípio de que:

o regime político, antes de tudo, pressupõe a existência de um conjunto de instituições e princípios fundamentais que informam determinada concepção política do Estado e da sociedade, mas é também um conceito ativo, pois, ao fato estrutural há que superpor o elemento funcional, que implica uma atividade e um fim, supondo dinamismo, sem redução a uma simples atividade do governo, para concluir que o regime é um complexo estrutural de princípios e forças políticas que configuram determinada concepção do Estado e da sociedade e que inspiram seu ordenamento jurídico.

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Eduardo Appio[8] assevera que as políticas públicas no Brasil se desenvolvem na área social e na área econômica, ambas com o sentido de impulsionar o desenvolvimento da Nação, através da melhoria das condições gerais de vida de todos os cidadãos, conceituando políticas públicas como sendo:

instrumentos de execução de programas políticos baseados na intervenção estatal na sociedade com a finalidade de assegurar igualdade de oportunidades aos cidadãos, tendo por escopo assegurar as condições materiais de uma existência digna a todos os cidadãos.

As políticas públicas são realizadas por meio de atos administrativos, ou até mesmo por omissão, o que revela a ideologia adotada pela Administração. O conceito de ato administrativo, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello[9] é a declaração unilateral do Estado no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante comandos concretos complementares da lei (ou, excepcionalmente, da própria Constituição, aí de modo plenamente vinculado) expedidos a título de lhe dar cumprimento e sujeitos a controle de legitimidade por órgão jurisdicional.

Os elementos dos atos administrativos são sujeito, forma, objeto, motivo e finalidade. Sujeito é o autor do ato, aquele que detém poderes jurídico-administrativos necessários para produzi-lo, forma é o revestimento externo do ato, objeto é o que o ato expressamente estabelece, é o seu conteúdo, finalidade é o bem jurídico que o ato deve atender[10]

O mérito administrativo trata da avaliação a respeito da conveniência e oportunidade relativas ao motivo e objeto do ato administrativo, conforme o interesse público, o que doutrina denomina discricionariedade. Os demais elementos do ato administrativo,  competência, finalidade e forma, prevalece o entendimento no sentido de que são vinculados[11].

No que tange ao controle judicial de atos administrativos, a jurisprudência pátria é predominante no sentido da impossibilidade de o Poder Judiciário apreciar o mérito administrativo, sob pena de violação do princípio da separação e independência dos poderes. Nesse sentido, eis o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça - STJ[12]:

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. JUIZ SUBSTITUTO DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO CEARÁ. CONTROLE JUDICIAL DO ATO ADMINISTRATIVO. LIMITAÇÃO. OPORTUNIDADE E CONVENIÊNCIA. EXIGÊNCIA DO ENUNCIADO DA QUESTÃO NÃO VALORADA NO ESPELHO DE CORREÇÃO DA PROVA DE SENTENÇA PENAL. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE. OFENSA AOS  PRINCÍPIOS DA CONFIANÇA E DA MORALIDADE. INCLUSÃO DE NOVO ITEM NO ESPELHO DE CORREÇÃO. REDISTRIBUIÇÃO DOS PONTOS.

1. É cediço que o controle judicial do ato administrativo deve se limitar ao exame de sua compatibilidade com as disposições legais e constitucionais que lhe são aplicáveis, sob pena de restar configurada invasão indevida do Poder Judiciário na Administração Pública, em flagrante ofensa ao princípio da separação dos Poderes.

2. Desborda do juízo de oportunidade e conveniência do ato administrativo, exercido privativamente pelo administrador público; a fixação de critérios de correção de prova de concurso público que se mostrem desarrazoados e desproporcionais, o que permite ao Poder Judiciário realizar o controle do ato, para adequá-lo aos princípios que norteiam a atividade administrativa, previstos no art. 37 da Carta Constitucional.

3. Mostra-se desarrazoado e abusivo a Administração exigir do candidato, em prova de concurso público, a apreciação de determinado tema para, posteriormente, sequer levá-lo em consideração para a atribuição da nota no momento da correção da prova. Tal proceder inquina o ato administrativo de irregularidade, pois atenta contra a confiança do candidato na administração, atuando sobre as expectativas legítimas das partes e a boa-fé objetiva, em flagrante ofensa ao princípio constitucional da moralidade administrativa.

4. Recurso ordinário provido.

Os atos governamentais são voltados para determinadas prioridades, com vista à consecução dos direitos fundamentais do princípio basilar da dignidade da pessoa humana. Existem setores em que inexiste discricionariedade por parte do administrador, não há margem de conveniência e oportunidade na execução de políticas públicas voltadas para as áreas de educação, saúde e segurança pública, pois a própria Constituição federal determina que esses desígnios devem ser atendidos.

Há que se distinguir a formulação de políticas públicas com a sua execução. A formulação de políticas públicas depende de uma participação coletiva da sociedade junto ao governo, demonstrando seus anseios sociais e econômicos, quanto à execução ou implementação de políticas públicas já formuladas, o controle há de ser feito pelos setores competentes, além dos interessados que são afetados diretamente por essas ações.

No que se refere à primeira fase de formulação das políticas públicas, o administrador possui ampla margem de discricionariedade, e o Brasil adota a livre concorrência, pois o Estado tem como fundamentos os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (Artigo 1º, inciso IV da CF/1988), além de incentivar os investimentos estrangeiros no país. Este modelo é denominado neoliberalismo, assim, a formulação das políticas públicas no país sofre influência direta do poder econômico, direcionando as ações estatais, o que torna cada vez mais necessária a participação popular nesse processo, pleiteando atendimento às suas demandas prioritárias.

O conceito de direitos sociais, segundo José Afonso da Silva[13] configura a:

dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo de liberdade.

Celso Antônio Bandeira de Mello[14] considera que as “pedras de toque” do regime jurídico-administrativo se delineia em função da consagração dos princípios da supremacia do interesse público sobre o privado e da indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos. Dessa forma, o que há em comum em termos de políticas públicas é que sempre devem estar voltadas a atender ao interesse público.

O desrespeito à Constituição Federal tanto pode ocorrer mediante um comportamento ativo do Estado, quanto por omissão, deixando de adotar as medidas necessárias para a concretização de direitos fundamentais nela previstos. Assim, a inércia governamental acarreta violação negativa do texto constitucional, passível de correção na via judicial.

Não há entendimento pacífico no que se refere ao controle judicial de políticas públicas. Existe posicionamento de que o magistrado não tem legitimidade para tanto, pois não foi eleito segundo o regime democrático. Contudo, o Poder Judiciário tem por função precípua a preservação dos direitos fundamentais, previstos na Constituição Federal, sobretudo o princípio da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, não há porque se impedir o controle judicial de políticas públicas, na função de fiscalizar a atividade do administrador quando há omissão ou descumprimento de normas insculpidas na Carta Magna, sem que configure substituição do Judiciário nessa atividade de administrar.

Não há porque conferir apenas à Administração a determinação do significado de conceitos jurídicos indeterminados, inclusive porque estabelece a Constituição Federal que compete ao Judiciário interpretar o direito. Nesse sentido, Luis Manuel Fonseca Pires[15] assevera que (fl.107)

A defesa desta posição – a de ser possível, sempre ao Judiciário determinar o sentido de um conceito jurídico -, se tantos embates provoca entre os administrativistas, parece pouco ou bem menos afligir àqueles que tratam de relações jurídicas entre particulares. Como exemplo, é o que ocorre com o art. 32 do Código de Defesa do Consumidor ao dispor que os fabricantes e importadores devem assegurar a oferta de componentes e peças de reposição enquanto não cessar a fabricação ou importação do produto, e em seu parágrafo único prescreve-se que cessadas a produção ou a importação a oferta deve ser mantida por “período razoável de tempo”, na forma da lei. Quanto “tempo” representa este “período razoável”? Na ausência de lei determinando com mais precisão este dever jurídico, é inquestionável que o Judiciário, ao ser acionado por um consumidor que reclame que o bem que adquiriu deve ter, pelo fabricante, a disponibilidade de peças de reposição, deve pronunciar-se, no caso concreto, se houve, ou não, a violação da norma, e em caso positivo ordenar ao fabricante que em certo lapso forneça as peças necessárias. A indeterminação da norma é inquestionável. Por quanto tempo um fabricante de veículos, após ter encerrado a fabricação de certo modelo de automóvel, deve produzir as peças de reposição? E, um fabricante de eletrodomésticos? Por maior que seja a dificuldade de precisar, para o caso concreto, sentido da expressão “período razoável de tempo”, é certo que o Judiciário, pautado em novas técnicas, deverá fazê-lo.

A democracia representativa é fundamentada na exigência de consenso acerca da legitimidade dos atos políticos, ou seja, através do voto, o cidadão legitima as decisões que são tomadas pelos governantes. Contudo, os governantes não detêm essa legitimidade de forma absoluta, pois atuar de acordo com o programa proposto, caso contrário, o Poder Judiciário intervirá de forma legítima assegurando a manutenção do regime constitucional.

Inocêncio Mártires Coelho[16] afirma que o ponto de partida para reflexões acerca do tema é distinguir ativismo judicial de criação judicial do direito, dois conceitos muito próximos, mas que são controversos e geram desentendimentos. Referido autor assevera que:

Sobre a criação judicial do direito, o essencial não é sabermos se ele pode ou deve assumir  papel ativo e autônomo na elaboração do direito, mas determinarmos de que maneira e em que limites se dará essa colaboração, até porque, via de regra, toda lei precisa de consistência judicial, vale dizer, de uma espécie de juízo de validação do Judiciário, para que se tenha como efetivamente em vigor, sendo certo , ademais, que a participação dos juízes na criação do direito varia, significativamente, conforme o tipo de norma que se trata de interpretar, aplicar e desenvolver.

Um ligeiro passar de olhos sobre as decisões da jurisdição constitucional ilustra, sobejamente, o crescimento dessa legislação judicial em diversos sistemas jurídicos. No Brasil, sob aplausos de uns e críticas de outros, vemos a todo instante o STF criar direito novo, embora sempre com a cautela de anunciar que as normas emergentes dos seus julgados não surgiram do nada, antes foram apenas extraídas do próprio texto da Constituição, onde estavam insinuadas, latentes ou implícitas, como que à espera do momento de se mostrarem às claras. Tal foi o caso da decisão fixando o entendimento de que os mandados pertencem aos partidos políticos e, assim, os perdem todos quantos abandonem as suas legendas, seja trocando de partido, seja simplesmente desligando-se da agremiação pela qual se elegeram.

 

Os chamados direitos fundamentais de segunda geração impõem ao Estado prestações positivas em favor dos indivíduos, o que demanda alocação de recursos financeiros, que são limitados. Surge então a teoria da reserva do possível, em que a efetivação dos direitos sociais deve ocorrer de forma gradual, de acordo com as disponibilidades orçamentárias do Estado.

Contudo, a cláusula da reserva do possível não pode ser utilizada como justificativa genérica para que o administrador deixe de implementar políticas voltadas ao bem estar social, finalidade precípua do ordenamento jurídico que é a promoção da dignidade humana.

Portanto, há que se garantir o mínimo essencial para os indivíduos no estabelecimento de prioridades orçamentárias, de forma a se conciliar a limitação financeira com as necessidades básicas da sociedade.

Diante da escassez de recursos, a satisfação das necessidades sociais pelas políticas públicas ensejam as denominadas escolhas trágicas, configurando opções da destinação dos recursos a determinado serviço a ser prestado em detrimento de outros, levando-se em consideração o número de indivíduos atingidos e a maximização dos resultados.

 

Princípio da Força Normativa da Constituição Federal

 

Afirmar simplesmente que os direitos sociais, por dependerem de políticas públicas para serem implementados, seriam normas programáticas, apenas indicando diretrizes a serem observadas pelo legislador sem produzir efeitos, significaria negar a força normativa da Constituição.

José Afonso da Silva[17] afirma que a eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais acerca de direitos fundamentais dependem muito de seu enunciado, pois se trata de assunto que está em função do Direito positivo. Segundo o qual:

A Constituição é expressa sobre o assunto, quando estatui que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Mas certo é que isso não resolve todas as questões, porque a Constituição mesma faz depender de legislação ulterior a aplicabilidade de algumas normas definidoras de direitos sociais, enquadrados dentre os fundamentais. Por regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais democráticos e individuais são de eficácia contida e aplicabilidade imediata, enquanto as que definem os direitos econômicos e sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas algumas, especialmente as que mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada, de princípios programáticos e de aplicabilidade indireta, mas são tão jurídicas como as outras e exercem relevante função, porque, quanto mais se aperfeiçoam e adquirem eficácia mais ampla, mais se tornam garantias da democracia e do efetivo exercício dos demais direitos fundamentais.

Conforme Paulo Bonavides[18], “o Estado de direito do constitucionalismo social precisa de absorver a programaticidade das normas constitucionais.” Referido autor afirma ainda que:

É óbvio que o problema de limitar poderes e competências a um instrumento constitucional não se resolve declarando apenas a juridicidade de seu conteúdo. Haverá sempre uma instância invisível, um poder latente ao lado da Constituição formal, decidindo, modificando, renovando comportamentos. Essa instância é política. A programaticidade traz a sua presença tanto quanto possível para dentro da Constituição, em ordem a apagar o funesto dualismo que gravita ao redor da suposta incompatibilidade de fundamentos jurídicos da Constituição.

Afigura-se-nos que a compreensão correta das normas programáticas como normas jurídicas contribui consideravelmente para reconciliar os dois conceitos da histórica crise constitucional de dois séculos: o conceito jurídico e o conceito político de constituição.

Robert Alexy[19] assevera que o ponto decisivo na diferença entre princípios e regras é que princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, por conseguinte, princípios são mandamentos de otimização, no sentido de serem satisfeitos em graus variados. Já as regras são normas que são satisfeitas ou não, sempre assim, se uma regra é válida, deve ser aplicada nos seus exatos termos, portanto, regras contém determinações no âmbito das possibilidades jurídicas e fáticas.

Quanto à normatividade dos princípios constitucionais, Dirley da Cunha Júnior[20] leciona que:

Interessante destacar que os princípios, por se revelarem como normas jurídicas impositivas de optimização, ainda que eventualmente conflitantes (o que pode ocorrer), coexistem, pois permitem o balanceamento de valores e interesses de acordo com a sua importância para o caso concreto, ou seja, podem ser objeto de ponderação, de harmonização ou concordância. Já as regras sequer podem coexistir quando colidentes, pois as regras antinômicas se excluem. Como acentua Canotilho, 'as regras contém fixações normativas definidas, sendo insustentável a validade simultânea de regras contraditórias.' Vale dizer, ou as regras valem (têm validade), e devem ser cumpridas na exata medida de suas prescrições ou não valem (não têm validade), e devem, nesse caso, ser extirpadas do sistema jurídico.

A política social está prevista de modo específico na Constituição Federal, a exemplo do artigo 208, inciso I, da CF/88, o qual prevê que é dever do Estado assegurar acesso universal ao ensino fundamental, inclusive em benefício de quem não se encontre em idade própria, os valores financeiros para tanto já se encontram à disposição dos entes da Federação, conforme texto constitucional. Conforme estabelece o § 1º do art. 208, da CF/88, o ensino obrigatório gratuito para crianças de 4 a 5 anos é uma obrigação do Município, o que corresponde a um direito público subjetivo que conduz o indivíduo e o Estado a uma relação jurídica obrigacional.

 

Nesse sentido, não cabe a mera alegação de insuficiência de recursos ou dificuldades técnicas na implementação de referidas políticas públicas, cabendo ao Poder Judiciário a devida intervenção, conforme assevera Eduardo Appio[21]:

Mesmo nos casos em que não existam valores específicos previstos em orçamento, a ordem judicial determinará a utilização de recursos públicos, previstos em rubrica especial, destinadas a fazer frente às despesas de natureza emergencial, consoante determina a lei de responsabilidade fiscal. Os valores deverão sair da chamada “reserva de contingência”, que deverá estar prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias, não havendo necessidade de alteração da lei orçamentária anual do ano de cumprimento da decisão. O crédito a ser previsto na lei orçamentária anual, todavia, não pode ter um valor ilimitado, razão pela qual o Poder Público terá limites mesmo em sede de despesas contingenciais (Lei de Responsabilidade Fiscal, art. 5º, § 4º), do que pode resultar a necessidade de uma suplementação orçamentária específica para atender a novas despesas decorrentes de decisões judiciais. Caso a decisão projete despesas de caráter continuado para os anos subseqüentes, a lei orçamentária anual ulterior deverá prever estas despesas, sob pena de responsabilidade direta e pessoal do chefe do Poder Executivo.

Aos direitos sociais se aplica o princípio da universalidade, segundo o qual todas as pessoas são titulares desse direito fundamental, têm como destinatário o Estado que, mediante prestações positivas atenua as desigualdades existentes na sociedade para promover uma igualdade não apenas formal, mas efetivamente material.

Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco[22] asseveram que:

os direitos em comento têm que ver com as redistribuição de riquezas -  matéria suscetível às influências do quadro político de cada instante. A exigência de satisfação desses direitos é mediada pela ponderação, a cargo do legislador, dos interesses envolvidos, observado o estádio de desenvolvimento da sociedade.

Referidos autores lecionam ainda que o Judiciário não pode extrair direitos subjetivos das normas constitucionais que ainda não foram regulamentadas, contudo, há de se observar o princípio da mínima efetividade das normas constitucionais[23]:

A satisfação desses direitos é, pois, deixada ao regime democrático, primacialmente ao descortino do legislador. Não cabe, em princípio, ao Judiciário extrair direitos subjetivos das normas constitucionais que cogitam de direitos não originários de prestação. O direito subjetivo pressupõe que as prestações materiais já hajam sido precisadas e delimitadas – tarefa própria de órgão político, e não judicial.

(…)

A doutrina, porém, busca atenuar essas contingências decepcionantes com a teoria do grau mínimo de efetividade dos direitos a prestação material. Tenta-se extrair um garantia a um mínimo social dos direitos a prestação.

(…)

A Constituição brasileira acolheu essa garantia do mínimo social. O art. 201, § 5º, da Constituição, estabelece o salário mínimo como piso dos benefícios previdenciários, e o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência sedimentada no sentido de que essa norma é auto-aplicável. Pode-se vislumbrar, então, aí, um exemplo de direito a prestação material que gera imediatamente direito subjetivo para os seus titulares – um 'direito fundamental originário e subjetivo a prestação', que tem em mira assegurar um patamar mínimo de efetividade do direito à previdência pelo Estado.

 

Controle Judicial das Políticas Públicas

 

No que toca ao controle judicial, a Constituição Federal pátria adota o sistema de jurisdição única, segundo o qual nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser excluída da apreciação do Poder Judiciário, que, pelo princípio da inércia, depende de provocação do titular do direito para prestar a devida tutela jurisdicional.

Eduardo Appio[24] afirma que não há qualquer garantia de que o controle judicial de uma política pública irá assegurar o seu sucesso, muito embora se possa sustentar que a ampliação do universo de pessoas responsáveis por sua formulação corresponda a uma concepção contemporânea sobre a democracia. O referido autor afirma ainda que o controle judicial das políticas públicas pode se dar em três momentos distintos, ou seja, na sua formulação, execução ou avaliação.

Acerca do controle judicial dos atos administrativos, Dirley da Cunha Júnior[25] assevera que não há discricionariedade absoluta, o espaço legítimo de discricionariedade deve observar a razoabilidade, sendo que a atuação administrativa há de ser verificada pelo Judiciário em face dos princípios constitucionais. Nesse sentido:

todo e qualquer ato administrativo, seja emanado de competência discricionária ou vinculada, pode ser analisado pelo Judiciário em qualquer de seus elementos (competência, finalidade, forma, motivo e objeto), haja vista que sempre há um limite à liberdade da Administração Pública, que é demarcada pelo próprio Direito. O que não se admite é o Judiciário imiscuir-se nos espaços considerados como puramente mérito administrativo, para fazer sobrepor a sua avaliação subjetiva sobre a conveniência e oportunidade do ato, substituindo-se
à Administração. É inegável que no sistema jurídico-constitucional moderno, no qual os direitos fundamentais assumem a dupla dimensão subjetiva-objetiva, no sentido de que, além de conferirem ao indivíduo posições jurídicas subjetivas de vantagem invocáveis perante o Estado e o particular, também apresentam-se como parâmetros objetivos de legitimação e limitação do exercício das competências políticas e administrativas, a idéia de mérito administrativo deve ser entendida associada à idéia de controle de legitimidade dos atos da Administração Pública. Daí sugerirmos a distinção entre mérito administrativo, controlável judicialmente em face dos direitos fundamentais e dos princípios constitucionais como a razoabilidade, proporcionalidade, eficiência e moralidade, por exemplo, e o puro mérito administrativo, insindicável judicialmente, por referir-se a aspectos exclusivamente subjetivos ligados à conveniência e oportunidade da Administração Pública.

Aqueles que não admitem o controle judicial de políticas públicas afirmam que os juízes não são eleitos pelo povo, então lhes faltaria legitimidade, assim, haveria invasão de função reservada constitucionalmente a outros poderes.

No julgamento da STA 175[26], o Ministro Gilmar Mendes afirmou que talvez o problema não seja “de interferência do Poder Judiciário na criação e implementação de políticas públicas em matéria de saúde, pois o que ocorre, na quase totalidade dos casos, é apenas determinação judicial do efetivo cumprimento das políticas públicas já existentes”.

O Supremo Tribunal Federal possui reiterados julgados no sentido de acatar a possibilidade de controle judicial de políticas públicas sem que isso signifique violação do princípio constitucional da separação dos poderes, conforme os seguintes arestos:

DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO A SAÚDE. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROSSEGUIMENTO DE JULGAMENTO. AUSÊNCIA DE INGERÊNCIA NO PODER DISCRICIONÁRIO DO PODER EXECUTIVO. ARTIGOS 2º, 6º E 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. O direito a saúde é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço. 2. É possível ao Poder Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas públicas constitucionalmente previstas, sem que haja ingerência em questão que envolve o poder discricionário do Poder Executivo. Precedentes. 3. Agravo regimental improvido.
(AI 734487 AgR, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 03/08/2010, DJe-154 DIVULG 19-08-2010 PUBLIC 20-08-2010 EMENT VOL-02411-06 PP-01220)

 

 

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SEGURANÇA PÚBLICA. LEGITIMIDADE. INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. OMISSÃO ADMINISTRATIVA. 1. O Ministério Público detém capacidade postulatória não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos [artigo 129, I e III, da CB/88]. Precedentes. 2. O Supremo fixou entendimento no sentido de que é função institucional do Poder Judiciário determinar a implantação de políticas públicas quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 367432 AgR, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 20/04/2010, DJe-086 DIVULG 13-05-2010 PUBLIC 14-05-2010 EMENT VOL-02401-04 PP-00750)

 

 

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TRANSPORTE DE ALUNOS DA REDE ESTADUAL DE ENSINO. OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO. EDUCAÇÃO. DIREITO FUNDAMENTAL INDISPONÍVEL. DEVER DO ESTADO. 1. A educação é um direito fundamental e indisponível dos indivíduos. É dever do Estado propiciar meios que viabilizem o seu exercício. Dever a ele imposto pelo preceito veiculado pelo artigo 205 da Constituição do Brasil. A omissão da Administração importa afronta à Constituição. 2. O Supremo fixou entendimento no sentido de que "[a] educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública, nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental[...]. Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário determinar, ainda que em bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam essas implementadas pelos órgãos estatais inadimplentes, cuja omissão - por importar em descumprimento dos encargos políticos-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório - mostra-se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais impregnados de estatura constitucional". Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.
(RE 603575 AgR, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 20/04/2010, DJe-086 DIVULG 13-05-2010 PUBLIC 14-05-2010 EMENT VOL-02401-05 PP-01127 RT v. 99, n. 898, 2010, p. 146-152)

 

 

DIREITO CONSTITUCIONAL E DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. GARANTIA ESTATAL DE VAGA EM CRECHE. PRERROGATIVA CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE INGERÊNCIA NO PODER DISCRICIONÁRIO DO PODER EXECUTIVO. PRECEDENTES. 1. A educação infantil é prerrogativa constitucional indisponível, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a creches e unidades pré-escolares. 2. É possível ao Poder Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas públicas constitucionalmente previstas, sem que haja ingerência em questão que envolve o poder discricionário do Poder Executivo. 3. Agravo regimental improvido.
(RE 464143 AgR, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 15/12/2009, DJe-030 DIVULG 18-02-2010 PUBLIC 19-02-2010 EMENT VOL-02390-03 PP-00556)

 

            A denominada justiciabilidade dos direitos sociais significa a possibilidade de se exigir judicialmente o cumprimento de determinados direitos sociais estabelecidos na Carta Magna em face do Estado. As dificuldades que existem em relação à efetivação pelo Poder Judiciário de direitos a uma prestação positiva estatal decorrem da alegação do princípio da separação de poderes, da escassez de recursos públicos, da reserva do possível, bem como da indeterminação do conteúdo dos referidos direitos. Entretanto, há que se realizar uma ponderação entre esses argumentos e a necessidade vital dos cidadãos diante da preservação do mínimo existencial.

 

Conclusão

 

Evidencia-se a possibilidade de o Poder Judiciário determinar a implementação de face das políticas públicas, desde que previstas impositivamente na Constituição Federal, ainda que se trate das denominadas normas programáticas, que estabelecem programas a serem cumpridos, pois segundo a teoria da força normativa da constituição federal, todas as normas constitucionais são dotadas de eficácia normativa, de modo que devem ser atendidos os seus comandos, em observância ao princípio da dignidade da pessoa humana e defesa dos direitos fundamentais. Nesse sentido, o Poder Judiciário não estaria violando o princípio da separação de poderes, mas sim realizando a Constituição.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

 

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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.

 

 

Sobre o autor
Wolney Nascimento Lopes

Pós-graduado no Curso Ordem Jurídica e Ministério público pela ESMPDFT, pós-graduado em Direito Público pela UNIDERP, pós-graduado em Investigação Policial pela Universidade Católica de Brasília. Graduação em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Foi assessor jurídico de Subprocurador-Geral da República na PGR. Aprovado no concurso público para Delegado de Polícia da PCDF, curso de formação profissional concluído em 2016.

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