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O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público e suas implicações quanto ao controle da investigação

Agenda 19/10/2016 às 18:08

Ao MP, além do controle externo, caberia o controle das investigações que têm por fim apurar a prática de ilícitos penais? Temos que, no ordenamento jurídico vigente, atos formais de investigação, em matéria de infrações penais, são privativos da polícia civil.

                     

SUMÁRIO: 1- Considerações iniciais sobre o tema.  2- Os fundamentos constitucionais e legais do controle externo da polícia judiciária pelo MP.   2.1 - O controle da atividade policial pelo MP, no Ceará.   3- As funções da Policia Judiciária, as funções do Ministério Público e o Inquérito Policial. 4- Conclusões. Sugestões

1- CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O TEMA

A Constituição Federal de 1988, no artigo 144, § 4º, estabelece que: “às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as Militares” (grifo nosso).

Como vemos, a “competência” para presidir o inquérito policial é deferida, em termos constitucionais, salvo as exceções legais, aos delegados de policia civil de carreira, e de acordo com as atribuições que lhe forem conferidas pelas normas de organização da instituição policial de cada Estado.

Vale mencionar aqui a observação feita por Júlio F. Mirabete em sua obra Processo Penal: “Ressalve-se que a palavra ‘competência’ é empregada, na hipótese, em sentido amplo como a ‘atribuição’ a um funcionário público para as suas funções” [1]

A Lei Maior estadual em seu artigo 184, por sua vez, assim prescreve:  “Compete à Polícia Civil exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária (grifo nosso) e a apuração de infrações penais, exceto militares, realizando as investigações por sua própria iniciativa, ou mediante requisições emanadas das autoridades judiciárias ou do Ministério Público”

Já o Código de Processo Penal, em seu artigo 4º, prescreve que a policia judiciaria será exercida pelas autoridades policiais – entenda-se, delegados de polícia civil da carreira – no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Repetidas vezes falou-se em “polícia judiciária” e “polícia civil”, que são a mesma coisa, e convém agora dar-lhes conceituação. Polícia Judiciária é, resumidamente, a encarregada da feitura do inquérito policial, atuando, assim, na elucidação dos crimes perpetrados. Praticado um fato definido como infração penal, nasce para o Estado, como se sabe, o dever de exercer o jus puniendi. Esse mesmo Estado exerce o jus puniendi através da persecução penal, que se subdivide em duas fases: a policial e a judicial. Assim, essa fase policial da persecução penal cabe, como o próprio nome já esclarece, à policia judiciária.

Escrevendo sobre o assunto assim se manifesta Bismael B. Moraes:

Em síntese, o substantivo ‘Policia’ tem o significado que, hoje, todos conhecem: segurança pública. Por sua vez, o adjetivo ‘Judiciária’ equivale à locução ‘da justiça’, o mesmo que ‘para a justiça’, ‘ao lado da justiça’ Assim, pode-se afirmar que a Policia Judiciaria é o órgão do Estado que se destina a auxiliar o Poder Judiciário na realização da Justiça Penal. ” 2

Como bem esclarece Delza Curvello Rocha, então Subprocuradora-geral da República com atuação perante o Tribunal Superior de Justiça, em artigo publicado no Jornal da ADEPOL/Brasil – Associação dos Delegados de Polícia do Brasil:

 A decisão de entregar a exclusividade da atividade investigatória a determinado órgão da estrutura do Estado – a Polícia Judiciária -  não residiu simplesmente no fato de se encontrar esta instituição vinculada ao princípio da legalidade, pois todo organismo estatal assim se encontra submetido. Residiu primordialmente na circunstancia de a polícia judiciária estar  submetida não só ao controle interno, realizado por sua Corregedoria –Geral, mas a duplo controle externo – o do ministério público, a quem compete fiscalizar a correta busca da prova, e a efetiva observância pelas autoridades policiais dos direitos e garantias dos cidadãos envolvidos naquele procedimento, quer na posição de investigado, quer na condição de vítimas –, e ao controle do judiciário, que se inicia com a imediata comunicação do flagrante, ou com a indispensável distribuição do inquérito ao juízo competente.

Esse também o motivo por que a Polícia, ao atuar como órgão da persecução penal – coligindo os elementos para a restauração da ordem jurídica violada pelo crime, em função do interesse punitivo do estado – passa a ser conceituada como órgão auxiliar do Poder Judiciário – a polícia judiciária ou repressiva -, embora o produto dessa atividade seja dirigido ao Ministério Público, titular da ação penal.3

No tocante ao Ministério Público, em contrapartida, o que se diz é que a CF/88 e, depois, a Lei Complementar 75//93(também chamada de Estatuto do Ministério Público da União),  bem como as leis orgânicas(nacional e estaduais), acabaram transformando essa instituição numa espécie de quarto poder,  com um rol de atribuições as mais diversas e da maior importância, dentre as quais o já pré-falado controle externo da atividade policial, aí incluídas, nos limites de cada atribuição orgânica, as atividades desenvolvidas pela Polícia Federal, Polícia Civil,  Polícia Militar dos Estados e Corpo de Bombeiros Militares,  sendo que quanto a estas últimas o controle faz-se no âmbito da atividade de polícia judiciária militar que cada milícia estadual desenvolve para apuração das infrações penais militares cometidos por seus membros ou em suas dependências

2- OS FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

Prescreve o artigo 129, inciso VII, da CF/88, que o Ministério Público exercerá o controle da atividade policial, de conformidade com leis complementares posteriores, da União e dos Estados, conforme o caso. 

Como bem já ressalvou Júlio F. Mirabete, tal norma constitucional não traz em si mesma força para gerar efeitos práticos, fazendo-se necessário que a União e os Estados editem leis complementares estatuindo como deve se dar esse controle da atividade policial. São palavras do grande processualista:

 Trata-se de norma constitucional de eficácia limitada ou reduzida, porque não tem aptidão para produzir, por si mesma, todos os seus efeitos essenciais, devendo ser regulamentada por leis complementares. Por estas deverá ser regulada a fiscalização da policia judiciaria, não em todas as suas atividades, pois não se permite pelos dispositivos citados poderes gerais de tutela nem ascendência hierárquica ou disciplinar do Ministério Público sobre as policias civil ou militar, mas para se prever mecanismos in genere no sentido de assegurar a colheita de elementos seguros, de forma lícita, para a instauração do devido processo legal.4

A Lei Complementar n.º 75, de 20/05/1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União, prescreve no caput do artigo 3º  que este exercerá o controle externo da atividade policial,  a vista dos fins e  situações  enumeradas nas alíneas seguintes do artigo, evidentemente referindo-se à Polícia  Federal, já que o controle externo das atividades da polícia estadual é atribuição de cada governo estadual.

Com a Lei n.º 8625, de 12/02/1993, que instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público,  houve a intenção de fazer avançar mais ainda esse controle do MP sobre as atividades da Polícia Judiciária, vez que buscava-se transferir para este não só a atribuição de poder tomar a  iniciativa do procedimento investigatório, no caso de ilícitos penais, dirigindo assim a atividade das autoridades policiais, mas também o controle completo do inquérito policial, inclusive com o afastamento do juiz, que só teria alguma ingerência sobre o trabalho da policia se e quando houvesse oferecimento da denuncia, conforme se pode verificar nas razões do veto do ex-presidente da República, Itamar Franco, em relação aos incisos X e XI do artigo 25 da referida lei.

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2.1- O CONTROLE DA ATIVIDADE POLICIAL PELO MP, NO CEARÁ

No Ceará, em 23/07/98, foi aprovada a Lei Complementar nº 09/98 que dispõe sobre o já referido controle externo por parte do ministério público. Essa lei obriga a autoridade policial estadual a comunicar imediatamente ao representante do MP a prisão de qualquer pessoa, com a indicação do lugar onde se encontra o preso e cópia dos documentos comprobatórios da legalidade da prisão, sem prejuízo da obrigatoriedade constitucional que já existia de também fazer tal comunicação ao juiz competente e à pessoa indicado pelo preso.

Ocorre que, com o advento desta lei,  começaram a surgir questionamentos quanto a sua validade por parte do sindicato dos delegados de polícia civil, inclusive fazia-se menção a possível inconstitucionalidade de algumas se suas normas, pois entendia, numa interpretação quase literal do inciso LXII, artigo 5º, da CF/ 88,  que os delegados de polícia estariam obrigados a comunicar a prisão de qualquer pessoa, nos casos de flagrante ou por força de mandado,  somente ao juiz de direito(bem como aqueloutras pessoas mencionadas na sobredita regra), e não assim, portanto, em relação ao promotor de justiça, já que a este a  norma constitucional não se refere, quando poderia tê-lo feito se essa tivesse sido a vontade do constituinte.

Contudo, até aí o que havia eram discussões sobre a validade ou não de uma norma legal. Porque, verdadeiramente, o questionamento do controle da atividade policial pelo ministério público só surgiu quando, logo em seguida,  veio a lume o Ato Normativo  nº 01/99, aprovado pelo Colégio de Procuradores de Justiça e publicado no Diário Oficial da Justiça, de 23/06/99, que, em consonância com  a mencionada LC 09/98,  fixou normas para o exercício das funções fiscalizatórias dos membros do MP e regulamentou o  Centro de Apoio Operacional ao Controle Externo da Atividade Policial – CAOCEAP-, que cuidaria do referido controle externo.

 É que as atribuições conferidas ao órgão do MP pelo citado ato normativo - reclamavam os delegados cearenses-, de tão minudentes e abrangentes só faltava dar a cada representante seu, ou seja, ao encarregado desse controle, o poder de controlar desde hora de chegada ao local de trabalho até a agenda de tarefas da autoridade policial. Daí a insatisfação de muitos dos delegados de polícia, que diziam temer que dali a pouco os doutores promotores de justiça do Estado do Ceará estariam fazendo às autoridades policiais locais exigências do tipo, “traga-me livro tal, justifique por que fez nele tal anotação; ouça tal testemunha, dia tal; ou então, “o prazo do inquérito número tal está expirando, trate de concluí-lo logo”. Supunha-se que isso pudesse realmente vir a ocorrer, não em razão de um normal e cuidadoso trabalho fiscalizatório da classe como um todo, mas sim por conta de vaidades ou idiossincrasias outras de alguns membros daquela instituição que, de fato, poderiam abusar do exagerado poder de fiscalização que lhes fora conferido -, receios que felizmente acabaram não se concretizando.

O Dr.  Irapuan Diniz de Aguiar, ex-Secretário de Educação do Estado do Ceará, ex-Subsecretário de Segurança Pública e delegado de polícia civil aposentado, ex-presidente da Associação dos Delegados de Polícia Civil do Estado do Ceará, ADEPOLCE e, agora, advogado atuante, escreveu, à época, um artigo no jornal Tribuna do Ceará, edição de 20/08/99, onde, na condição de porta voz da classe dos delegados de polícia civil, expressou assim a sua veemente e discordante opinião sobre tal questão. Disse ele:

[...] o Ministério Público cearense, pelo Ato Normativo nº 01/99, passa sobre a Constituição Federal e vai além do que estabelece a Lei Orgânica da instituição, invadindo atribuições constitucionais dos delegados de polícia e procurando supervisionar, dentro das Delegacias, atos que incumbem às autoridades policiais. E a questão não foi provocada pela Polícia Civil do Ceará, cujos integrantes sempre estiveram, no exercício da polícia judiciária e na apuração das infrações penais, dentro do que preconizam a Lei Maior e o Código do Processo Penal. A Carta Magna brasileira (art. 129, VII) dá, como função institucional do MP, ‘exercer o controle externo da atividade policial’, o que é repetido pela Lei Orgânica do MP do Ceará. Mas o ato referendado extrapola, até na linguagem, estabelecendo normas para ‘controle externo da atividade de polícia judiciária’, como se a Polícia Civil fosse uma instituição acéfala, sem órgãos de direção – Secretaria de Polícia, Corregedoria Geral, Diretorias e demais autoridades policiais – capazes para suas tarefas legais.

Quem chega a ler o Ato Normativo 01/99, com honestidade de propósitos, verificará, na maioria dos seus dez artigos, intervenção do MP em atribuições constitucionais da Polícia Civil, procurando fazer controle interno, numa evidente inversão do Direito.

Imagine-se esta hipótese: a Constituição incumbe a um órgão do Estado ‘realizar o controle externo dos meios de comunicação’ e o referido órgão, ao arrepio da Lei Maior, resolve criar regras próprias e ingressar nas redações dos jornais e nos estúdios de rádios e televisão, exigindo exibição de documentos, registro de programação, arquivo de matérias, ou de onde vieram as noticias e como foram processadas, e porque umas publicadas e outras, não. Seria ou não seria isso um controle interno, muito próximo das práticas ditatoriais.

Bom, mas então em que consiste afinal esse controle externo da atividade policial tão desejado pelo Ministério Público? Certamente não deve ser algo apenas como fiscalizar pequenas falhas funcionais, impontualidade, pouco assiduidade, ou mesmo ocorrências do tipo atrasos na conclusão de procedimentos investigatórios em andamento nas delegacias, porque para isso já existe um órgão de fiscalização, estranho aos quadros das duas  polícias estaduais,  criado por lei justamente com a finalidade de apurar e punir quaisquer ilícitos(penal ou administrativo),  previstos nas leis e nos respectivos Estatutos,  por acaso cometidos por policiais civis e militares, órgão esse, diga-se, bastante atuante e rigoroso, em verdade. Tal órgão trata-se da Corregedoria-Geral, que recebeu a pomposa designação de Corregedoria-Geral dos Órgãos de Segurança Pública do Estado do Ceará.

Talvez fosse o caso de se perguntar:  – não estará havendo aí, em algumas situações, um caso de sobreposição de atribuições entre o Ministério Público estadual e a Corregedoria-Geral dos Órgãos de Segurança do Estado.

3- AS FUNÇÕES DA POLÍCIA JUDICIÁRIA, AS FUNÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO E O INQUÉRITO POLICIAL

As funções da polícia civil ou policia judiciária estão apontadas no artigo 144, § 4º, da CF/88, funções essas que, complementadas com o rol de atribuições elencadas nos artigos 4º ao 10 do CPP, consolida a competência das autoridades policiais (Delegados de Polícia de Carreira) para investigar noticia de infração penal e instaurar inquéritos policiais. Por outro lado, na mesma CF/88, art. 129, está o rol taxativo das funções institucionais do Ministério Público, igualmente completadas com atribuições outras constantes da lei orgânica nacional e respectivas leis estaduais de organização.

Certo, o Ministério Público, como titular privativo da ação penal pública, poderá intentá-la sem respaldo em inquérito policial, desde que, para tanto, disponha, com a noticia da infração penal, de elementos de convicção suficientes para fundamentar a denuncia. Mas a Constituição, no citado artigo 129, não deferiu ao MP atribuições investigatórias formais no âmbito das infrações penais, competência esta privativa das policias civis (lato sensu), como dispõe o prefalado artigo 144.

Resumindo, no ordenamento jurídico vigente, atos formais de investigação, em matéria de infrações penais, são privativos dos delegados de polícia, defesos, pois, ao ministério público, a quem cabe, como fiscal da lei, acompanhar-lhes a produção. Assim, não há como, legitimamente, passar essa atribuição para o ministério público por meio de ato administrativo ou de qualquer medida administrativa infraconstitucional, sem grave afronta as normas e princípios constitucionais, como vimos acima.

Vale aqui ressaltar, tão somente com o intuito de reforçar e reafirmar a importância de se deixar bem definida esta questão, o porquê da Assembléia Constituinte de 88 ter tido o cuidado de centralizar, em determinado órgão estatal – ou seja, à polícia civil - a instauração do procedimento investigatório (o inquérito), salvo as exceções da lei.

É que sabedores de experiências colhidas de episódios ocorridos em período de regime de exceção – quando procedimentos investigatorios sobre a conduta dos cidadãos podiam, e  eram, instaurados nos diversos órgãos ligadas ao sistema estatal, especialmente pelas conhecidas comissões gerais de inquérito, investigações essas que, muitas vezes, deram origem a ações truculentas (prisões de cidadãos, que ficavam  detidos pelos órgãos de segurança, restando aos seus familiares e amigos a procura incessante, para saber onde e porque se encontrava o desaparecido, detido), e preocupados, portanto, em assegurar ao cidadão todas as garantias do Estado Democrático de Direito, conceberam eles, os constituintes, um texto constitucional para enfrentar essa realidade, de sorte que o cidadão tivesse a garantia de ser investigado apenas por uma determinado órgão estatal, definido constitucionalmente.

Não restam dúvidas, portanto, que procedimentos apuratórios destinados á formação da culpa, ou investigações feitas pelo próprio órgão com vistas à colheita de provas para instruir futura ação penal, fogem à atuação direta do MP, ou  qualquer outro órgão público, porque devem ficar jungidos a quem detenha constitucionalmente a titularidade para instaurar esse tipo de procedimento, por se encontrar submetido às regras constitucionais do controle judicial, na forma da lei processual, sob pena de restar ferido o inciso LIII do artigo 5º: ninguém será processado (ab initio, de regra, investigado) nem sentenciado senão pela autoridade competente.

Por isso, cabível a seguinte observação: não obstante a assertiva de que a instauração de procedimentos administrativos investigatórios destinadas à formação de culpa, à investigação do indivíduo, foge à atuação direta do Ministério Público, o que se verifica é que isso vem acontecendo com certa frequência, tanto que essa prática foi motivo de debates no 13º Congresso Nacional de Ministério Público, realizado em Curitiba, Paraná, no período de 26 a 29 de outubro de 1999, quando então alguns participantes apresentaram e defenderam teses nesse sentido, teses essas que se acham sumariadas no Livro de Teses do congresso, da seguinte forma: SUMÁRIO. Volume I. Tema I:  A atuação do Ministério Público na Área Criminal. Tomo I:

Tese nº 3- A Subordinação da Atividade Investigativa da Polícia ao Ministério Público: uma nova policia;

Tese nº 4- Legalidade da Investigação Criminal pelo Ministério Público;

Tese nº 7- A Imprescindibilidade do Procedimento Investigatório do MP;

Tese nº 8- Oficiais de Investigação no Ministério Público

4 – CONCLUSOESSUGESTÕES

Encerrando o presente trabalho e, agora,  restringindo-nos, a final, a questão do controle externo da atividade policial  pelo MP, no Estado do Ceará, temos a dizer que, segundo nosso ponto de vista, a Procuradoria Geral de Justiça, agindo através do Centro de Apoio Operacional do Controle Externo da Atividade Policial,  não deveria  ter elaborada escalas, como o fez, de modo que a cada Delegacia de Polícia correspondesse um Promotor de Justiça responsável pela fiscalização das atividades daquela unidade policial, como se estivesse de plantão. Primeiro, porque custa crer que os senhores promotores aceitarão comparecer durante as madrugadas aos plantões diários nas delegacias ou, mesmo no decorrer do dia, nos finais de semana, para se certificarem acerca da regularidade de detenções e lavraturas de autos de prisão. Depois, porque as cópias desses autos de prisão são encaminhadas não ao promotor-fiscal e sim ao promotor natural, ou seja, ao promotor com atuação na vara ou comarca competente para oferecer a denúncia, o que, por si só, já levanta dúvidas quanto a eficiência e validade prática dessas escalas.

O controle externo, entendemos nós, deve funcionar como uma espada de Dâmocles sobre a cabeça do policial negligente, autoritário, corrupto, por exemplo. Tomando conhecimento, por qualquer modo -, reclamação do interessado, denúncia anônima, notícia em documento chegado ao seu poder, etc -  , da prática de ato ilícito cometido por policial, no desempenho das funções ou nas dependências da delegacia de policia sob sua fiscalização, o órgão competente do MP buscará  informações,  primeiramente junto a autoridade policial  titular daquela delegacia, se não for a própria autoridade o denunciado, e, depois,  junto  à Corregedoria –Geral,  para saber,  ao final,  se  tal prática já não é objeto de Sindicância naquele órgão,  requisitando à sobredita autoridade, se é que não foram adotadas ainda, as providências cabíveis ou, se for o caso, tomando ele próprio, MP,  as devidas medidas, inclusive as necessárias representações.

Três medidas bastante simples, duas aproveitadas do já citado ato normativo (com algumas modificações apenas), bastariam para, sem exageros, sem abusos, materializar e oportunizar o tal controle externo da atividade policial por parte do MP:

Em resumo: ao que parece, e a despeito do problema inicial de relacionamento entre os membros das duas instituições, a questão do controle da atividade policial pelo MP, no Ceará, está pacificada e sequer  houve o acionamento de mecanismos processuais-legais pelo sindicato ou pela associação dos delegados  no sentido de movimentar o poder judiciário para que decidisse sobre possível inconstitucionalidade de tal ou qual norma da Lei Complementar estadual ou do Provimento já mencionados, que tratam dessa questão do controle externo. 

Na verdade, nunca se soube de qualquer abuso por parte dos representantes do MP no desempenho de suas atividades fiscalizatórias, que, ultimamente, aliás, vêm se mostrando bastante escassas. Também não se tem noticias de que alguma autoridade policial tenha tentado obstaculizar esse trabalho do ministério público.

Em beneficio dos delegados é preciso anotar que, em verdade, nunca foram radicalmente contra o controle externo de suas atividades   - como sói acontecer com o próprio MP, e o Poder Judiciário como um todo, em relação mesmo às suas atividades-meios,  por exemplo -, mas, pelo contrário,  passados os primeiros efeitos da novidade, disseram-se prontos a acatar o controle exercido pelo MP sobre aquelas suas atividades eminentementes policiais,  desde que isso se fizesse na forma e nos limites da lei, sem os exageros do malsinado Ato Normativo 01/99.

Uma segunda conclusão está relacionada com a discussão sobre se o MP poderia também manter o controle das investigações que têm por fim apurar a pratica de ilícitos penais. Temos que, no ordenamento jurídico vigente, atos formais de investigação, em matéria de infrações penais, são privativos dos delegados de polícia, defesos, pois, ao ministério público, a quem cabe, como fiscal da lei, acompanhar-lhes a produção. Assim, não há como, legitimamente, passar essa atribuição para o ministério público por meio de ato administrativo ou de qualquer medida administrativa infraconstitucional, sem grave afronta as normas e princípios constitucionais, como vimos acima.

[1] MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal, 12ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 79.

2 BISMAEL, B. Moraes. Direito e Polícia: uma introdução à Polícia Judiciária. São Paulo: RT, 1986. p.68

3 ROCHA, Delza Curvello. Investigação criminal em procedimento administrativo. Jornal da Adepol/Brasil,        Porto Alegre,  ano I,  n. 04,  p.17,  jun. 1999

4 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Ob. cit. p. 75.  

Sobre o autor
Francisco Washington Sales de Araújo

Bacharel em Direito, Delegado de Polícia Civil, especialista em Direito Proc. Penal (UFC)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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