Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

O conflito entre o direito à vida e à liberdade na prisão civil por inadimplemento da prestação de alimentos

O CONFLITO ENTRE O DIREITO À VIDA E À LIBERDADE NA PRISÃO CIVIL.

RESUMO

Sendo a única forma de prisão civil por dívida ainda prevista em nosso ordenamento jurídico, a prisão por inadimplência da prestação de alimentos traz consigo um embargo de clamor e controvérsia sociais bastante relevantes. Posto que se trate de conflito entre dois importantíssimos princípios de Direitos e Garantias Fundamentais, sendo eles, o Direito à Vida e o Direito à Liberdade, sendo o primeiro entendido pela jurisprudência como prevalecente sobre o último. Nossa Constituição Federal de 1988, bem como a Convenção Americana de Direitos Humanos, reconhecem como lícito o procedimento da prisão por débitos alimentícios. Dito isto, afastamos de nosso ensejo a discussão sobre a constitucionalidade da referida prisão.  Nossa intenção é trazer à tona uma indagação sobre a real efetividade e uma possível contradição jurídico-processual no encarceramento do devedor. Além disto, buscaremos evidencias para estabelecer nosso posicionamento acerca do fato, bem como apontar sugestões doutrinárias a resolução da questão.

Palavras-Chave: Prisão. Alimentos. Dignidade. Devedor. Credor.

ABSTRACT

Being the only form of civil imprisonment for debt also planned in our legal system, prison for default of payment of maintenance carries a embrago of crying and very relevant social controversy. Since the case of conflict between two very important principles of Underling Rights and Guarantees, namely, the Right to Life and the Right to Freedom, the first being, as understood by the law prevailing on the last. Our Federal Constitution of 1988 and the American Convention on Human Rights recognize as lawful the procedure of imprisonment for debts food. That said, our opportunity to move away from discussion of the constitutionality of that prison. Our opportunity is to bring to the fore a question about the actual effectiveness and possible contradiction Legal and Procedural incarceration of the debtor. In addition, we will seek evidence our position on the case, as well as suggestions doctrinal point of fact the resolution.

Key words: Prison. Food. Dignity. Debtor. Creditor

  1. INTRODUÇÃO

    É indubitável que uma das questões mais angustiantes presentes na esfera cível, especificamente no Direito de Família, é a questão da Prisão Civil por inadimplência do prestador de alimentos.

     Geralmente associado à ideia de punição por ato criminoso tipificado em nosso Código Penal, a prisão nem sempre é imposta somente com este fundamento, o de sanção penal. Existem no Brasil quatro tipos distintos de prisões aplicadas de acordo com o ato praticado ou com o tipo de processo em que se encontra vinculado o réu. São elas: prisão penal, administrativa, a disciplinar, geralmente atribuída na esfera militar, e ainda a civil. Concentraremos nossos esforços nesta última, tentando de alguma maneira esclarecer a real efetividade, ou não, da prisão civil por inadimplência da prestação de alimentos. Vale ressaltar, ainda, que também no âmbito civil, a prisão por dívida, como por exemplo, a do depositário infiel, deixou de ser válida em território brasileiro por ocasião de novos entendimentos jurisprudenciais, bem como o advento de nossa Carta Magna em 1988 juntamente com a posterior junção da Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, que, no entanto, reconhece a prisão civil por falta de prestação de alimentos, assim como faz nossa Norma Maior. Sobre isto, decidiu o Supremo Tribunal Federal, na súmula vinculante 25. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes especifica: “Se não existem maiores controvérsias sobre a legitimidade constitucional da prisão civil do devedor de alimentos, assim não ocorre em relação à prisão do depositário infiel. As legislações mais avançadas em matérias de direitos humanos proíbem expressamente qualquer tipo de prisão civil decorrente do descumprimento de obrigações contratuais, excepcionando apenas o caso do alimentante inadimplente.”.

           Este presente artigo de produção acadêmica discente tem por finalidade não questionar a constitucionalidade da previsão legal de prisão para o devedor de alimentos que se encontra inadimplente com o credor determinado em processo de prestação de alimentos. O Assunto já foi amplamente discutido e considerado recheado de teor constitucional pelo Supremo Tribunal Federal e também recepcionado pelo Pacto de San José da Costa Rica, o mais conhecido e difundido tratado que traz consigo essenciais direitos e garantias fundamentais a dignidade da pessoa humana. Queremos sim levantar questionamentos sobre a real eficácia do procedimento jurídico processual definido para o referido caso. Vale ressaltar que nossos entendimentos não vão de encontro ao efetivo direito que o alimentando possui muito menos menorizar a responsabilidade que tem o credor de alimentos em executar de forma responsável e plena os créditos ao qual aquele efetivamente precisa para viver.

            Após a promulgação da nossa Constituição Federal em 1988, houve a ampla e disseminada propagação das ideias de direitos e garantias fundamentais, essenciais sem sobra de dúvidas, em um país de viés democrático e livre. Elencados desde o seu preâmbulo e esmiuçados em seu artigo 5º, tais direitos e garantias fazem realmente jus a sua importância.

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...”. (grifos nossos).

            O embasamento jurídico e doutrinário da prisão por inadimplência da prestação de alimentos dá-se justamente por este ato por em xeque o direito à vida do credor, que necessita dos alimentos para a sua subsistência. No entanto, em contrapartida, confronta-se o direito à liberdade do devedor, considerado no caso concreto, secundário ao direito à vida. Bem verdade tal entendimento. A hermenêutica no caso, certamente nos possibilita vislumbrar, no confronto dessas duas garantias fundamentais, a superioridade do direito à vida. Há, no entanto, a necessidade de levarmos em consideração a Dignidade da Pessoa Humana do devedor mais a fundo.

          Bem como citamos antes, nosso intuito é trazer à tona a real efetividade da adimplência da dívida de alimentos pela prisão do devedor. Neste ensejo abordaremos durante toda a nossa discussão as questões geradas pela prisão do devedor de alimentos.

          Considerando primeiramente o caso de inadimplência de devedor que se encontra empregado regularmente e registrado com sua carteira profissional conseguimos analisar o seguinte fato: Ao completar 90 dias de atraso, sem justa motivação e de forma voluntária e inescusável por parte do devedor, previsto na lei, o trabalhador será, a pedido da parte, executado com sua prisão. A prisão, que será de no máximo três meses, segundo o código processual competente, acarretará, agora de maneira plena e absoluta a falta de prestação ao alimentando. Uma vez que se encontre preso, este não receberá seus proventos mensais que deveriam ser, em parte, destinados ao seu credor de alimentos e para sua própria subsistência, além de acarretar, pelo mesmo motivo, um fundamento para uma futura demissão do empregado junto à empresa, o prejudicando e tornando a solvência da responsabilidade ainda mais difícil, prejudicando ambas as partes do processo.

        Ao analisarmos posteriormente o caso de um trabalhado autônomo, sua situação é ainda pior. Este depende de sua liberdade para a feitura de seu labor. Tomando como exemplo um taxista, caso este seja encarcerado pela inadimplência do crédito alimentar, perderá totalmente a condição de trabalho, além de tornar também a prestação absolutamente impossível.

       Segundo o referendado doutrinador Fredie Didier Junior, a prisão civil trata-se de meio coercitivo para a satisfação da prestação para com o credor. Esta deve agir de maneira psicológica drástica no réu, fazendo com que este, voluntariamente consiga meios de adimplir a dívida. Em nosso entendimento o termo coercitivo não se atrela bem com a ideia de voluntariedade. Visto isto cabe ainda o levantamento de mais uma indagação de bastante relevância em nosso entender, qual seja: Caso não esteja o devedor inadimplente, por simples razão de má-fé, de forma voluntária e inescusável como preconiza nossa Constituição, que este realmente esteja nesta condição por razões alheias a sua vontade, não se estaria repassando a outrem a responsabilidade do adimplemento da dívida, uma vez que estando preso o devedor, recairá a família, parente ou amigo a adimplência da dívida, por razões de afetividade, ensejando estes que seja encerrada a prisão daquele? Isto feriria de alguma forma o Princípio da individualização da pena, ao passo em que o devedor cerrado às grades, pouco poderá fazer para o adimplemento da dívida.

        Aos nos reportamos a questões de afetividade, também nos deparamos com mais um prejuízo causado pela prisão civil resultante da inadimplência da prestação de alimentos. Esta ocasiona o rompimento da relação paternal ou maternal, caso exista, durante a vigência da prisão do devedor. Trata-se de prejuízo real ao convívio entre as partes. Por se tratar de execução processual requerida pela parte credora, desde que o devedor encontra-se inadimplente nos requisitos previstos na lei, esta execução pode certamente em alguns casos ensejar motivos de vingança de uma parte para com a outra. Neste sentido, há uma divergência doutrinária acerca dos fatos de quem é legítimo à feitura da requisição da execução da dívida de alimentos com a prisão civil. Os doutrinadores divergem sobre a quem recairá tal responsabilidade, se a parte credora ou se de ofício, pelo juiz de direito do caso. Gonçalves (2009, p. 231), afirma que por ser a relação entre credor e devedor de alimentos, uma relação de direito de família, não cabe à decretação da prisão de ofício e a conivência e oportunidade da medida coercitiva devem ficar a critério do credor. O Doutrinador vai além ao afirmar que nem mesmo o Ministério Público poderá decretar a referida prisão. Na mesma linha, Teodoro Junior (2007, p. 419) “é o credor que sempre estará em melhores condições que o juiz para avaliar a sua eficácia e oportunidade”.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

      Para Marinoni (2009, p. 388) caso o juiz não aceite a justificativa do devedor do crédito ou ainda no caso deste não se manifestar, o magistrado deverá intimar o autor e reiterar com ele sobre seu desejo em executar a dívida com a prisão do devedor. Ainda segundo o doutrinador o processo é sobrecarregado e embargado de carga emocional e poderá ensejar motivo de litigância vingativa. Parece-nos razoável o posicionamento do referido autor. Em nosso entendimento deverá haver, por parte do magistrado, uma ponderação de razão junto ao autor do processo sobre a real efetividade para resolução do mérito concreto do caso com a prisão do devedor do crédito alimentar.

     

  1. FUNDAMENTAÇÃO LEGAL PARA PRISÃO POR INADINPLÊNCIA DA PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS

      A prisão civil por inadimplemento da pensão alimentícia trata-se de medida excepcional permitida pela Constituição Federal de 1988 bem como pela Convenção Americana de Direitos Humanos, incorporada em nosso Ordenamento Jurídico Positivo pelo Decreto n. 678/92. Sua função recíproca não é a de punir a falta da prestação obrigatória imposta ao devedor, mas sim a, de certo modo, força-lo a pagar o crédito devido. Este deverá de forma voluntária, apresentar meios para adimplemento da dívida contraída. Desde o Código de Hamurabi encontramos a admissão da prisão como garantia de um pagamento determinado. Na Roma antiga, em sua famosa Lei das XII Tábuas, a prisão por dívida também era permitida, indo além, determinando a reclusão do devedor por 60 dias e prevendo sua morte, determinando que seu corpo fosse cortado em tantos pedaços quantos fossem seus credores. Inconcebível em nossos dias. Legal outrora.

            Vê-se em nossa Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;

     Percebemos ainda no artigo 7º, item sete da Convenção Americana de Direitos Humanos, recepcionada por nossa Constituição:

7. Ninguém deve ser detido por dívida. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.

Nota-se que a regra é que não haverá prisão civil por dívida, sendo a prisão por débitos alimentares vencidos uma exceção a regra. Percebemos ainda que nossa Constituição cuidou em enaltecer em seu inciso LXVII do artigo 5º que o inadimplemento deva ser voluntário e inescusável para que se tipifique causa para a prisão civil. No que tange a prisão do depositário infiel que esteja em falta com a Fazenda Pública, no Recurso Extraordinário nº 466343/SP, o Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF), de forma unânime, decidiu não ser possível, no Brasil, a prisão do depositário infiel (em qualquer modalidade de depósito), diante da interpretação da Constituição em relação ao Artigo 7.7 da Convenção Americana de Direitos Humanos.

A execução do rito de prisão do devedor se dá pelo Código Processual Civil onde encontramos o seguinte:

Art. 528.  No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo.

§ 1o Caso o executado, no prazo referido no caput, não efetue o pagamento, não prove que o efetuou ou não apresente justificativa da impossibilidade de efetuá-lo, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 517.

§ 2o Somente a comprovação de fato que gere a impossibilidade absoluta de pagar justificará o inadimplemento.

§ 3o Se o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1o, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

§ 4o A prisão será cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.

§ 5o O cumprimento da pena não exime o executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas.

§ 6o Paga a prestação alimentícia, o juiz suspenderá o cumprimento da ordem de prisão.

§ 7o O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.  

            Vale dizer que o Superior Tribunal de Justiça do país, em seus entendimentos, emitiu decisão especificando que o adimplemento da dívida deve se dar de forma integral para que não haja previsão de execução com prisão. O Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, no pedido de habeas corpus (HC 167164 STJ) para devedor que teria pagado parte da dívida, denegou o pedido, visto que a dívida deve ser adimplida de forma integral.     

       Por mais que se trate de prisão civil, lembramos que a prisão do devedor dar-se-á pelo contingente policial. O devedor será encarcerado em unidade prisional juntamente com presos comuns, condenados por crimes tipificados em nosso Código Penal.

        Ainda sobre o assunto temos a lei específica, qual seja a Lei n. 5478/68, intitulada Lei de Alimentos: “Art. 19. O juiz, para instrução da causa ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias.”. Devemos ressaltar que os artigos que antecedem o artigo supracitado preveem uma sequência de mecanismos que devam ser adotados antes que seja decretada a prisão, sempre fundamentada, do faltoso. Notadamente percebemos que há uma divergência quanto à temporização do tempo de prisão quando citamos o artigo 528, § 3º do Código Processual competente e no Artigo 19 da Lei de Alimentos, onde uma prevê de 1 a 3 meses de prisão e na outra a previsão é de no máximo 60 dias. Dito isto, o que prevalece, para os doutrinadores, é o prazo da lei específica, não somente pelo fato da especificidade, mas por se tratar de norma restritiva de liberdade adota-se então a mais benéfica ao réu. Já para a jurisprudência irá prevalecer o prazo processual.

       Já nos parece ser bem drástico o dano à dignidade da pessoa humana do devedor passar até três meses preso. No entanto, se tomarmos em comparação o ordenamento jurídico espanhol, encontramos uma pena ainda maior ao devedor. Estabelecida no seu Código Penal, a justiça espanhola traz a previsão da prisão civil por falta de prestação de alimentos no capítulo três do código, intitulado: dos delitos contra os direitos e deveres familiares, na seção três do capítulo. Esta trata do abandono à família, aos menores e incapazes. Vemos no artigo 226 da norma supracitada, in verbis:

“Artículo 226: 1. El que dejare de cumplir los deberes legales de asistencia inherentes a la patria potestad, tutela, guarda o acogimiento familiar o de prestar la asistencia necesaria legalmente establecida para el sustento de sus descendientes, ascendientes o cónyuge, que se hallen necesitados, será castigado con la pena de prisión de três meses a um ano o multa de seis a 24 meses.”[3]

 Percebemos que a previsão é de até um ano de prisão. Porém, esta poderá ser substituída por pena de multa, o que nos parece mais relevante.

       Tomando como referência, desta vez o código alemão, este prevê que o alimentando não pode esperar até que seu alimento seja garantido em processo judicial. Tratado como alimento mínimo, o Estado, através de um órgão específico denominado Jugemdant, presta este apoio ao filho, adiantando e concedendo-lhe os alimentos necessários e posteriormente tentando a execução do título com o pai devedor. Em Portugal encontramos a mesma previsão e procedimento de atenção aos credores de alimentos.

       A doutrina brasileira possui uma corrente majoritária acerca da prisão por pensão alimentícia e sobre quais débitos poderão ser cobrados com a execução de prisão. Podemos citar como referência Gonçalves (2008, p. 230), “somente as três últimas parcelas devidas e as que vencerem no curso do processo pode ser cobrado pelo rito processual da prisão. O débito alimentar acumulado por período superior a três meses perde seu caráter alimentar”. No mesmo sentido O Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a Súmula 309:

Débito Alimentar - Prisão Civil - Prestações Anteriores ao Ajuizamento da Execução e no Curso do Processo: O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.

       A previsão legal é que o executado, posto em liberdade depois de cumprir o prazo máximo de prisão, não seja mais encarcerado pelas mesmas prestações já cobradas. Isto traz certa segurança jurídica ao devedor, caso mantenha-se inadimplente.

       Não poderíamos deixar de citar, ainda, a previsão da prisão civil pela falta de prestação de alimentos gravídicos pelo suposto pai.  Com o advento da lei 11.804/08, que usa o código processual civil supletivamente, nosso legislador deixou resguardados os direitos alimentares do nascituro. Tendo o juiz percebido indícios suficientes sobre a paternidade em questão, este deverá fixar os alimentos gravídicos que posteriormente, com o nascimento com vida, serão convertidos em pensão alimentícia.

3 PERSPECTIVAS ALTERNATIVAS À PRISÃO CIVIL POR ALIMENTOS

      A todo o momento estamos procurando nos informar acerca de mudanças e avanços político-jurídicos no cenário mundial. O doutrinador em Direito Eleitoral Marcos Ramayana traz em sua última obra uma referência muitíssima interessante sobre ritos processuais da seara eleitoral no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos. Lá podemos encontrar o brilhante Recall Californiano. Em uma tradução não livre e bastante distante do nosso senso comum, recall quer dizer: Revogar, demitir. Em suma, tal rito prevê a revogação de uma lei positiva que tenha sido incorporada ao ordenamento do estado por meio do Veto Popular. A população percebendo que a lei deixou de ser interessante ao convívio e ao interesse popular pode entrar com o pedido de revogação da norma determinada. Pode ainda o mesmo rito, estabelecer a demissão do político que proceda contra a ordem pública local e que não cumpra com suas promessas de campanha a determinado tempo. No entanto, para nossa realidade brasileira, seria este um sonho utópico.

      Dito isto e nos reportando à nossa realidade nos cabe, somente, fazer apontamentos e dar sugestões alternativas através de trabalhos e produções acadêmicas aos nossos legisladores. O certo é que devemos buscar meios que não sejam tão vilipendiadores a dignidade da pessoa humana do devedor de alimentos.

      A primeira sugestão que trazemos é uma medida simples, porém ainda não prevista em nosso ordenamento jurídico, que seria a imposição de astreintes, ou seja, a imposição da pena de multa por cada dia de atraso. Entendemos que desta forma, o legislador também agiria de forma coercitiva psicológica para com o devedor, sem, no entanto, afrontar sua dignidade.  Esta poderia ser estipulada a partir do primeiro dia após completar-se o prazo de 90 dias previsto pela lei. Certamente esta seria uma alternativa ao encarceramento do prestador de alimentos em débito.

     Uma segunda, porém menos inovadora e já prevista no nosso ordenamento seria a expropriação de bens móveis e imóveis, com penhora online, para que com estes sejam quitados os débitos do inadimplente. Seguindo o rito de que trata os artigos 536 e seguintes do novo Código Processual Civil in verbis:

Art. 536.  No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.

§ 1o Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.

§ 2o O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1o a 4o, se houver necessidade de arrombamento.

§ 3o O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência.

§ 4o No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, aplica-se o art. 525, no que couber.

§ 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

Art. 538.  Não cumprida a obrigação de entregar coisa no prazo estabelecido na sentença, será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

§ 1o A existência de benfeitorias deve ser alegada na fase de conhecimento, em contestação, de forma discriminada e com atribuição, sempre que possível e justificadamente, do respectivo valor.

§ 2o O direito de retenção por benfeitorias deve ser exercido na contestação, na fase de conhecimento.

§ 3o Aplicam-se ao procedimento previsto neste artigo, no que couber, as disposições sobre o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer.

      

O problema ao qual nos remota tal procedimento é o fato da morosidade do sistema judiciário nacional. Este poderia de alguma forma, por conta da mazela já citada, prejudicar o credor que necessita com urgência de seus alimentos. Uma vez que o entendimento jurisprudencial cita que acima de três meses, o débito perde o caráter alimentar, desta forma certamente trazendo prejuízo ao alimentando. Exposto o fato nos encaminhamos à próxima sugestão, também prevista em nosso ordenamento, porém não adotado ainda na seara familiar.

       A penhora de bens móveis e imóveis seguida da alienação por iniciativa particular é, talvez, a saída à morosidade do sistema. Nesta encontramos o seguinte mecanismo de adimplemento da dívida: Após a expropriação do bem do executado feita pelo juiz do caso, este os penhora, podendo o exequente ou um profissional do setor, que pode ser um corretor de imóveis, por exemplo, como preconiza o artigo 880 do Novo Código de Processo Civil, ser responsável por tornar o bem em valor líquido para que com este seja executada a dívida do devedor. Caso haja pecúnia sobressalente, esta será devolvida ao juízo da execução. Assim reconhece Câmara (2009, p. 320) como sendo esta uma solução alternativa à prisão do devedor e à morosidade do sistema. A nosso ver, é sim, esta, uma excelente saída ao caso e uma forma ágil de prestar os alimentos ao credor que os necessita.

      Nós pudemos encontrar essas sugestões supracitadas por todo o tempo em que estudamos e pesquisamos para a feitura desde artigo. No entanto, ainda há uma que desejamos trazer. Esta certamente, bastante polêmica e muito inovadora ao nosso país. Não encontramos nenhuma referência dos nossos principais doutrinadores de Direito Civil acerca do caso. Trata-se da prisão domiciliar ao devedor de alimentos. Já prevista nos Estados Unidos, esta prisão seria a que menos feriria a dignidade da pessoa humana do devedor e ainda permitira ao devedor que continuasse com sua rotina diurna de labor para que seja possível o adimplemento da dívida. Esta da mesma forma que a outra, prevista no nosso ordenamento, também agiria no psicológico do devedor de maneira coercitiva, sendo muito mais efetiva em seu sentido, que é a prestação devida e essencial ao alimentante. 

  1. METODOLOGIA

Sempre com o intuito de se chegar a uma conclusão e um entendimento pacífico sobre a prisão civil, o que encontramos na realidade são conflitos de doutrina e entendimentos. Pesquisando os mais bem referendados doutrinadores no âmbito do Direito Civil, em especial, no Direito de Família, adentramos nas obras de autores como Alexandre Câmara, Fredie Didier, Humberto Theodoro, Luiz Guilherme Marinoni entre outros, além de nossas normas vigentes e os tomando como base doutrinária e jurisprudencial conseguimos de maneira clara e objetiva esclarecer e apontar os principais acertos e erros da prisão civil vigente em nosso país. Ainda, o mais importante, conseguimos esclarecer nossas ideias sobre os fatos e de uma maneira concisa e objetiva estabelecer um entendimento e um posicionamento diante da causa. Sem sombra de dúvida houve uma absorção relevante de conhecimentos acadêmicos e doutrinários importantíssimos à formação acadêmica.

 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

       Durante a feitura deste artigo pudemos refletir bastante sobre o conflito de dois importantíssimos Direitos Fundamentais. Vários anos e muitas vidas foram os custos, caríssimos, para que hoje pudéssemos usufruir tão importantes garantias. A vida e a Liberdade são primordiais a uma existência digna. Desde sempre deixamos claro que em momento algum nossa intenção seria a pormenorização da responsabilidade do devedor, tão pouco, do direito do credor em receber o que lhe é devido para sua subsistência. Longe disso. No entanto, não nos parece justo, antes que sejam adotados todos quantos sejam possíveis, mecanismos alternativos a prisão e encarceramento do devedor às grades. Encarceramento este feito em unidades prisionais comuns, destinadas a presos penalmente condenados. Nosso intuito foi trazer meios alternativos à prisão civil e principalmente trazer a indagação sobre uma real efetividade sobre o determinado caso.

       Concluímos então que o modo como nosso ordenamento jurídico se vale para a satisfação do litígio de débitos alimentares pode sim ter alguma efetividade, porém com bastante prejuízo a parte ré. E é exatamente isto que, com todas as sugestões trazidas por este trabalho, tentamos minimizar tal prejuízo. Meios certamente existem, nos falta, talvez, uma real modernização sobre o assunto e uma sobrecarga de boa vontade política. Só assim poderemos de alguma forma tornar eficaz o adimplemento de dívidas alimentares, fazendo com que o credor possa ser suprimido de passar por necessidades tão básicas e ter o seu direito efetivado. Ao mesmo passo, o devedor não seja tão vilipendiado em seu direito à liberdade. 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código de processo civil, 16 de Março de 2015.

BRASIL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO BRASIL, 1988.

BRASIL. Lei 5478/68, de 25 de julho de 1968.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n.º 309.

CÂMARA, Alexandre. Lições de Direito Processual Civil. 17ª ed. Rio de janeiro, Editora Lúmen Júris, 2009.

Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. 2 de novembro de 1969. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm>. Acesso em 28 de Julho de 2016.

DIDIER JR, Fredie & Outros. Curso de Direito Processual Civil. 2º ed. Bahia: Editora JusPODIVM, 2010.

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de Direito Processual Civil. Volume 3. São Paulo, Editora Saraiva, 2008.

MARINONI, Luiz Guilherme & ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Execução. Volume 3. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2007.

TEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 42º ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008.


[3] Artigo 226: 1. Qualquer um que não cumprir com os deveres legais inerentes ao poder paternal, tutela, guarda ou pátria assistência social ou de prestar a assistência necessária legalmente estabelecida para sustentar seus filhos, pais ou prestar assistência a cônjuge, deve ser punido com prisão de três meses a um ano, ou multa de seis a vinte e quatro meses.

Sobre os autores
Leydson Ribeiro Braga

Acadêmico do 10 semestre de Direito Assessor político

Antonio Nilson de Sousa

Bacharel em Contabilidade na Universidade Vale do Acaraú ;Acadêmico de Direito na Faculdade Luciano Feijão

Dalyanne Aragão

Advogada, Pós Graduanda em Direito Previdenciário e Trabalhista.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!