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Direito a sucessão de filhos havidos por inseminação artificial post mortem

Agenda 09/11/2016 às 19:01

O objetivo deste trabalho é demonstrar os institutos jurídicos concernentes a sucessão e visualizar através da doutrina e de julgamentos, a possibilidade do filho proveniente de inseminação “post mortem” ter direito a sucessão.

INTRODUÇÃO

O Direito nasce para que a sociedade conviva harmonicamente, sendo assim, o direito sucessório, tem o condão de fazer a partilha dos herdeiros de forma justa e equilibrada. Sendo assim, o direito sucessório cria regras e regulamentos para serem seguidos nas partilhas de bens.

Com a evolução da humanidade e da tecnologia, nasce o instituto cientifico chamado de inseminação artificial, que é uma técnica de reprodução assistida, no intuito de gerar filhos em cônjuges que tenham problemas de saúde.

Mas o problema nasce quando o casal faz todo o procedimento para inseminação artificial, e antes de concluir um dos cônjuges chega a falecer, ai questiona-se se o cônjuge fizer essa inseminação artificial, o filho proveniente dela tem direito a sucessão?

O objetivo deste trabalho é demonstrar os institutos jurídicos concernentes a sucessão e visualizar através da doutrina e de julgamentos, a possibilidade do filho proveniente de inseminação “post mortem” ter direito a sucessão.

DIREITO A SUCESSÃO DE FILHOS HAVIDOS POR ISEMINAÇÃO ARTIFICIAL “POST MORTEM”

Fazendo uma análise pormenorizada sobre a sucessão de filhos advindos de inseminação artificial “post mortem”, vislumbra-se uma situação excepcional para o ordenamento jurídico pátrio, pois não há legislação em vigor que discipline a inseminação artificial “Post mortem” do genitor. Dessa forma há ainda uma lacuna jurídica para tal situação, cabendo fazer uma interpretação ética, moral e doutrinária resolução da problemática.

Analisando de premissa as palavras da ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz que sobre o tema leciona:

“Não há como aplicar a presunção de paternidade, uma vez que o casamento se extingue com a morte, nem como conferir direitos sucessórios ao que nascer por inseminação post mortem, já que não estava gerado por ocasião da morte de seu pai genético. “Filho” póstumo não possui legitimação para suceder, visto que foi concebido após o óbito de seu “pai” genético e por isso é afastado da sucessão legítima ou ab intestato. Poderia ser herdeiro por via testamentária, se inequívoca for a vontade do doador de sêmen de transmitir herança ao filho ainda não concebido, manifestada em testamento” (in DINIZ, Maria Helena. O atual estado do biodireito. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 617.)

A doutrinadora está certíssima em suas palavras, mas apesar de haver uma lacuna legislativa, o código civil reza minimamente sobre o tema em seu art. 1597.

“Art. 1.597 - Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

(...)

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;” (grifo nosso).”

. Washington de Barros Monteiro explica tal artigo:

A fecundação ou inseminação homóloga é realizada com sêmen originário do marido. Neste caso, o óvulo e o sêmen pertencem à mulher e ao homem, respectivamente, pressupondo – se, in casu, o consentimento de ambos. A fecundação ou inseminação artificial post mortem é realizada com embrião ou sêmen conservado, após a morte do doador, por meio de técnicas especiais ( in MONTEIRO, Washington de Barros. Direito Civil. 38ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 307.

Dessa forma, se por um lado se tem a dissolução da união estável com a morte do cônjuge e a não sucessão “post mortem”, do outro tem o direito da mulher de usar o semem de seu falecido esposo, haja vista, que por anuência (verbal ou escrita) é propriedade de ambos os cônjuges.

Não se pode fazer uma análise apenas legal sobre o tema, é preciso vislumbrar a situação em um caso concreto. Se o código civil, mesmo que seja minimamente a informação trazida, fala que é possível a “fecundação artificial homologa”, é porque era vontade do legislador disciplinar sobre o tema na época de promulgação do presente código.

Dessa forma a intenção do legislador ao legislar sobre tal tema no art. 1597, inciso III, do código civil é que a mulher pudesse utilizar o material (semem) do esposo para ter filhos, como se esse filho tivesse sido gerado na constância do casamento, apesar de ter sido extinto o vinculo conjugal com a morte do esposo.

Há também de se notar que há princípios constitucionais sendo feridos caso não legitimem a sucessão dos filhos concebidos por inseminação artificial “post mortem”, visto que, a constituição de 1988 reza que deve haver igualdade entre os filhos. Então mesmo que este tenha sido concebido “post mortem” nada ele tem culpa por erro de terceiros ou pela não regulamentação de procedimento de reprodução assistida, então seria ir e desencontro com o principio da dignidade da pessoa humana se esse filho não fosse herdeiro necessário.

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O uso das técnicas de reprodução assistida é um direito fundamental, consequência do direito ao planejamento familiar que decorre do princípio da liberdade. Impensável cercear este direito pelo advento da morte de quem manifestou a vontade de ter filhos ao se submeter às técnicas de reprodução assistida. Na concepção homóloga, não se pode simplesmente reconhecer que a morte opere a revogação do consentimento e impõe a destruição do material genético que se encontra armazenado. O projeto parental iniciou-se durante a vida, o que legaliza e legitima a inseminação post mortem. A norma constitucional que consagra a igualdade da filiação não traz qualquer exceção. Assim, presume-se a paternidade do filho biológico depois do falecimento de um dos genitores. Ao nascer, ocupa a primeira classe dos herdeiros necessários. [...] Vedar reconhecimento e direito sucessório a quem foi concebido mediante fecundação artificial post mortem pune, em última análise, o afeto, a intenção de ter um filho com a pessoa amada. Pune-se o desejo de realizar um sonho. (in DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011., p. 123-124) (grifos nosso)

Nesse mesmo sentido o Juiz da 22ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP prolatou sentença:

A questão é de estranha à legislação em vigor, o que, por si, não desincumbe o Juiz de solucioná-la, pois nestes casos, deverá a decisão valer-se da analogia dos costumes e dos princípios gerais do direito, atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (artigos 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil). No caso, verifica-se que a autora e seu marido tinham por objetivo comum a formação de família, que somente não se concretizou por dificuldades na concepção por meios naturais. [...] Mesmo sem estar concebido de fato, este filho já estava concebido de alma pelo casal, pois, de certa forma, conviviam diariamente com a expectativa de sua concepção. A reprodução assistida se deu por consentimento livre e esclarecido do casal e está formalizada por instrumento particular. A intenção de Y sempre foi de se tonar pai, tanto que se submeteu à coleta de seu sêmen, para fins de engravidar sua mulher. [...] Seu sêmen tinha destinatária certa com fins definidos. Por certo, com a morte do doador ou depositante, os gametas devem ser descartados a menos que haja autorização dos respectivos fornecedores, para autorização “post motem”. No caso, Y morreu prematuramente de forma abrupta, sem que tivesse, ao menos, tempo para autorizar o uso de seu sêmen na reprodução assistida que X se submetia. [...] Com a continuidade à reprodução assistida estará se respeitando a dignidade da pessoa humana. Se eventualmente X obtiver êxito em seu tratamento e engravidar, a vontade do casal será respeitada, nos termos do preceito constitucional de se ter, como base da sociedade, a família, assegurando o planejamento familiar como livre decisão do casal (art. 226, § 7º, da Constituição Federal) [...]É evidente o reconhecimento do vínculo familiar, relativamente à eventual êxito em concepção de X. Aliás, a Lei nº 8.069, de 13 de junho de 1990, em seu art. 26, parágrafo único, garante o reconhecimento do filho após o falecimento do pai. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prescreve o direito à filiação é indispensável e imprescritível. A criança tem o direito de conhecer seus pais, o que não ocorre com relação à criança nascida por meio da inseminação póstuma, muito embora ela saiba que foi desejada e venha a integrar uma família. Entretanto esta situação não será solucionada pela legislação. Poderia, no caso, X estar grávida e Y quando ele sofreu o acidente e, do mesmo modo, o filho do casal também não conheceria o pai. Entendo que a viúva tem o direito de tentar gerar um filho de seu falecido marido, quando este era manifestamente o desejo do casal, interrompido por uma morte precoce. Estas questões se deparam com a Ética e o Direito. Inaceitável é o descompasso entre o Direito e a Ciência, pois a tecnologia avança a passos largos, não podendo o Direito acompanhá-la e muito menos atravancá-la. [...] Assim, inegável que a inseminação póstuma necessita de regras disciplinadoras temporais, éticas e protetivas, sem abandono do direito do pretenso pai de expressar sua vontade quanto a uma possível paternidade póstuma, respeitando a vontade da mãe e o objetivo do casal. Isto posto, defiro o alvará pretendido, para autorizar a autora, X, a utilizar no tratamento de reprodução assistida, o sêmen criopreservado de Y, seu falecido marido, armazenado na Clínica W, pelo prazo de um ano a contar da retirada deste alvará.” (BRASIL. São Paulo. Sentença da 22ª Vara Cível do Foro Central Civil João Mendes Júnior, no Estado de São Paulo, prolatada em 30.04.2008, pela MM. Juíza Dra Carla Themis Largotta Germano, referente à reprodução humana assistida. )

Não se pode de forma alguma ferir o principio da dignidade da pessoa humana, pois este é baliza para o direito de família e sucessório, sendo uma afronta a ele, proibir ou impedir a sucessão do filho havido “post mortem”, pois este deve integrar a linha de herdeiros necessários.

CONCLUSÃO

Conforme explicado, é direito do filho havido de inseminação “post mortem” ter todo os direitos concernente a sucessão, pois quando há uma situação dessa foi porque ambos os cônjuges concordavam com isso. E mesmo que assim não fosse não se pode culpa uma criança por erros dos pais. 

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