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Direito Constitucional e a flexibilização do Direito do Trabalho

Agenda 07/07/2004 às 00:00

Falando sobre as origens do conflito existente entre os dois pólos de uma relação de trabalho, ou seja, entre quem presta o serviço e a quem o serviço aproveita, o Juiz do Trabalho Alexandre Medeiros [1], do TRT da 24ª Região – Mato Grosso do Sul, se refere ao livro de Gênesis, onde se encontra a primeira remissão ao trabalho, no mundo cristão, quando Deus impõe a Adão, castigo por ter comido do fruto proibido: "... por causa do que você fez, a terra será maldita. Você terá de trabalhar duramente a vida inteira a fim de que a terra produza alimento suficiente para você...".

Assim, é certo, o homem sempre trabalhou; inicialmente, para obter seus alimentos, já que não tinha outras necessidades, em face do primitivismo de sua vida. Depois, como lembra Segadas Vianna [2], quando começou a sentir a necessidade de se defender dos animais ferozes e de outros homens, iniciou-se na fabricação de armas e instrumentos de defesa. Dessa forma, desde os mais remotos tempos, o trabalho esteve vinculado às lutas pela sobrevivência da espécie.

A partir de então, e através dos séculos, testemunhamos a dominação dos mais fracos pelos mais fortes, eis que a escravidão é a única forma de propiciar aos mais ricos a felicidade, pois, como afirmado por Aristóteles, para conseguir-se cultura, é necessário ser rico e ocioso e que isso "não seria possível sem a escravidão" [3].

O marco histórico da resistência a exploração determinada pelas condições de desigualdade existentes no campo das relações de trabalho, foi a famigerada Questão Social provocada pela Revolução Industrial, e que empurrou o homem para a modernidade, quando os trabalhadores, excessivamente explorados, começaram a se organizar e a reivindicar melhores condições de vida e de trabalho, resultando uma série de conquistas para a sociedade e, sobretudo, para os trabalhadores. Deu-se nascimento ao Direito do Trabalho. Toma corpo a doutrina intervencionista, segundo a qual, em nome da solidariedade substitui-se a igualdade pura pela igualdade jurídica, como regra de direito que impõe o interesse geral sobre o particular sem que, entretanto, se anule o indivíduo.

De fato, fortalece-se a nova concepção da sociedade e surge, com delineamentos precisos, o "Estado polícia" ou o "Estado providência". Desse modo, observado que a liberdade econômica e, pois, a livre concorrência, não consegue harmonizar os interesses individuais e que, ao contrário dessa harmonia, a diversidade econômica criada entre os indivíduos pela liberdade é causa da existência de classes sociais que se opõem e ameaçam a existência do próprio Estado, este, para corrigir a desigualdade, amplia suas atribuições, como anota Segadas Vianna [4]. Nesse aspecto intervencionista a ação do Estado faz-se sentir de maneiras diversas, seja regulamentando a iniciativa privada, seja fomentando-a e vigiando-a, seja, substituindo-se a ela em benefício do interesse coletivo.

Em oposição ao avanço invencível das idéias socialistas, de então, a Igreja procurou tomar a direção do movimento e não deixar, por mais tempo, nas mãos dos partidos revolucionários o monopólio da suas reivindicações econômicas e políticas. O Papa LEÃO XIII já havia resolvido [5] atuar de modo a não se deixar ultrapassar pelo movimento social, procurando, acima de tudo, estabelecer a paz nas relações entre patrões e empregados, relações essas que eram, pelo lucro exagerado dos primeiros em detrimento do mínimo de dignidade dos segundos, o sustentáculo da doutrina marxista que fomentava a luta de classes como modo de se implantar, pela ditadura do proletariado, o socialismo.

Condena o Papa, então, o socialismo científico, ou comunismo. Afirma o direito natural a propriedade privada, embora acentuando o seu caráter social. Defende a concepção jusprivatista de um Estado limitado, cujo fim único é a prosperidade dos particulares e da comunidade, e sujeito a um direito prévio do indivíduo e da família, considerados mais antigos que o Estado.

Quanto à questão social, propriamente dita, defende a idéia e o dever, que também tem o Estado, de, em nome da justiça, intervir na regulamentação do trabalho, PROTEGENDO OS TRABALHADORES, santificando os dias de descanso, limitando a duração do trabalho, restringindo o das mulheres e crianças, e, sobretudo, velando pela justiça dos salários.

Cria-se, pois, o dogma da Justiça Social que aos Estados cumpre ter por fim.

A Revolução Russa, de outubro de 1.917, no entanto, precipita a formação da nova concepção socialista e marxista a respeito do Estado, e a consciência do mundo é despertada para a necessidade de se assegurar aos trabalhadores um nível de vida compatível com a dignidade humana, esta colocada no cerne de todos os direitos naturais, e os meios pelos quais, sem prejudicar a liberdade do indivíduo, possam efetivamente ser protegidos aqueles que outros direitos não têm a conservar a não ser os de sua própria subsistência.

A crise de 1929-30 desencadeou-se no mundo todo. A situação econômica e social suscita problemas cuja solução parece cada vez mais difícil. O número de empreendedores falidos aumenta. Cresce também o desemprego tecnológico. A calamidade é mundial. O então Papa PIO XI, em 15 de maio de 1931, em comemoração aos 40 anos da encíclica de LEÃO XIII, publica sua Encíclica "Quadragésimo Anno", um harmonioso prolongamento daquela anterior. A nova encíclica estipula então que, na determinação do justo salário, se deve levar em conta, concomitantemente as necessidades do trabalhador, a situação particular da empresa a qual pertença, bem como as "necessidades da economia em geral". Recomendação judiciosa que, no início dessa grave crise, lembra a solidariedade existente entre TRABALHADOR, CAPITALISTA E EMPREENDEDOR, conforme salientado por PAUL HUGON [6].


O DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL.

Nessa época estava em plena gestação o Direito do Trabalho no Brasil. É evidente que durante o Brasil Colônia e o Império vivíamos uma situação cujas características eram de inexistência de lutas, sem que isso indicasse a ausência de uma questão social, então latente; falta de associações profissionais; grupos sociais ainda inorgânicos e ausência de atividades econômicas que exigiam massas proletárias densas.

As atividades agrícolas eram realizadas por escravos e estes nem ao menos se sentiam capazes de ser possuidores de qualquer direito (suas lutas, quando existentes, eram apenas de natureza libertária). A industria era incipiente, de instalação e métodos primitivos e assentados em um artesanato incapaz de se organizar.

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A legislação trabalhista, propriamente dita, começou, decididamente, a ser elaborada a partir da Revolução de 1.930, quando o Governo Provisório, sob a chefia do Presidente Getúlio Vargas, criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e por Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, promulgou a Consolidação das Leis do Trabalho.

A partir de então, como ressalta Oswaldo Henrique P. Mesquita [7], "o caráter protetor e intervencionista do Estado nesta matéria, fruto da pressão coletiva dos trabalhadores, se manteve como uma reivindicação constante nas distintas modificações dos ordenamentos internos, e finalmente das normas comunitárias".

Mas, a "vida material de uma sociedade, em seus distintos níveis, está regida por incitações, pulsações, modelos, formas e obrigações de atuar que, com freqüência, remontam a tempos muito anteriores" e, mais, todo ordenamento jurídico é produto de uma certa evolução histórica, das ideologias e das tradições sociais imperantes em uma dada sociedade, das circunstâncias econômicas e das projeções da própria história política", acrescenta o ilustre magistrado acima mencionado.

Por isso, recentemente, na Organização Internacional do Trabalho (OIT), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi enfático ao afirmar que "o mundo precisa de um sindicalismo diferente do que se praticava há 20 ou 30 anos", conclamando dirigentes sindicais a abandonar práticas que visam aos interesses de grupos em favor de políticas que atendam a toda sociedade. Ao mesmo tempo, empregados e empregadores estão sendo chamados a integrar o Fórum Nacional do Trabalho para, com o governo, propor a modernização das leis do trabalho.

Comentando esse fato, Armando Monteiro Neto, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) [8], pergunta: Se Lula diz estar ultrapassado o discurso dos sindicalistas de 20 anos atrás, o que dizer da CLT que tem 60 anos?

E acrescenta:

"[...] Os integrantes do Forum Nacional do Trabalho terão grande desafio pela frente – o de substituir uma lei que ficou estática durante 60 anos por outra que terá de ser dinâmica pelo resto do século. O Fórum terá de propor instituições que permitam a adaptação rápida das relações de trabalho aos avanços das tecnologias e dos meios de produção que marcarão o futuro. O Brasil não precisa de mais leis, mas de leis de boa qualidade. Não é possível ser a favor do emprego e contra a empresa. Isso não funciona. Da mesma maneira, não é possível querer empresa produtiva sem a formação adequada dos trabalhadores[...]".

DA MODERNIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO

Assim posta a questão podemos afirmar, sem medo de errar, que NÃO NECESSITAMOS DE UMA REFORMA NA CLT, ou de uma NOVA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, mas sim,

PRECISAMOS APRENDER A LER E INTERPRETAR A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, para FAZÊ-LA cumprir corretamente.

A respeito da Constituição de 1.946, costumava afirmar, em minhas aulas que se tratava de uma carta constitucional precocemente social-democrática, inspirada naquela de Weimar, mas que, infelizmente, jamais chegou a entrar efetivamente em vigor, pois suas disposições pertinentes à ordem social ficaram dependentes de regulamentações que nunca foram concretizadas. De qualquer forma ASSEGURAVA OS DIREITOS INSCRITOS NA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, de 1.943.

ASSIM, A par das garantias dos direitos individuais, decorrentes da Declaração dos Direitos Humanos, dos movimentos libertários do século XVIII, as constituiçÕES passadaS incorporARAM em seu bojo um capítulo da Ordem Econômica e Social, disciplinador das relações entre o capital e o trabalho. Por isso, em seu art. 160, a CF dE 1996-9 declarava qUe A "ordem econômica e social tem por fim realizar o desenvolvimento nacional e a justiça social", com base nos princípios que enumerava, dentre os quais a liberdade de iniciativa e a valorização do trabalho como condição da dignidade humana e, em relação aos direitos trabalhistas, assegurava, através do art. 165, aqueles que são indispensáveis à consecução da mencionada justiça social.

A atual Constituição Federal, de 05 de outubro de 1.988, INOVOU a respeito, marcando um avanço significativo em termos de Carta Política moderna, dando destaque aos direitos trabalhistas e ELEVANDO-OS À CONDIÇÃO DE DIREITOS INALIENÁVEIS DO TRABALHADOR, eis que independentes da vontade do Estado, ou do legislador ordinário, sob o título "DOS DIREITOS SOCIAIS", e, em apartado, pela DISCIPLINA DA ORDEM ECONÔMICA E DA ORDEM SOCIAL.

DENTRO DESSA NOVA DISPOSIÇÃO, DEVE-SE ENTENDER POR DIREITO SOCIAL O CONJUNTO DE PRINCÍPIOS, NORMAS E INSTITUIÇÕES QUE, INCIDINDO SOBRE AS RELAÇÕES DE TRABALHO, VISAM A PROTEÇÃO DO TRABALHADOR E A MELHORIA DE SUA CONDIÇÃO SOCIAL.

Portanto, após afirmar ser FUNDAMENTAL o DIREITO AO TRABALHO (art. 6º), garante AOS TRABALHADORES URBANOS E RURAIS OS DIREITOS QUE RELACIONA (art. 7º), além de outros que visem à melhoria de sua condição social.

Assim dispondo, a Constituição Federal, ao contrário de muitos críticos, estendeu a todos os trabalhadores direitos que, até sua promulgação, eram exclusivos dos trabalhadores empregados, tais como salário mínimo, 13º salário, férias remuneradas, fundo de garantia de tempo de serviço e outros. Não se diga que salário é um direito exclusivo do empregado, pois, segundo os doutrinadores é a paga devida pelo trabalho prestado por alguém, sendo considerado pela economia capitalista como o preço do trabalho. É considerado a mais importante contraprestação do trabalho, fator de produção e está diretamente ligado à produção. São sinônimos: ordenado, vencimento, soldo, honorários, etc.

Portanto, sob o ângulo da legislação infraconstitucional, podemos dizer que existe um Direito do Trabalho ainda não legislado, ou aquele prestado por TRABALHADORES NÃO EMPREGADOS [9], a par do Direito do Trabalho legislado, e definido como sendo

"o ramo da ciência do direito que tem por objeto as normas jurídicas que disciplinam as relações de trabalho subordinado, determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho, em sua estrutura e atividade" [10]

A esse Direito "não legislado", eu denomino DIREITO DO TRABALHO IN-SUBORDINADO.

Nesse passo, portanto, posso concluir que a Constituição Federal de 1.988 consolidou um DIREITO CONSTITUCIONAL DO TRABALHO, de que o Direito do Trabalho, que disciplina as relações de trabalho subordinado, é espécie. A par disso, existe um outro Direito do Trabalho, relativamente às relações de trabalho considerado não subordinado, mas que, em realidade, são objeto de contratos outros que devem ser melhor estudados e compreendidos, para que se dê efetivo cumprimento ao Direito Social

Está claro, também, que se deve modernizar as próprias normas jurídicas que compõem o Direito do Trabalho propriamente dito, com uma nova Consolidação das Leis do Trabalho, nelas incluindo o trabalho hoje considerado não subordinado.


DA FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO.

De qualquer forma, enquanto essa normatização infraconstitucional do Direito do Trabalho, globalmente considerado, não vem, e não se processa a flexibilização por via legislativa, vejamos qual é a flexibilização possível.

José Eduardo de Resende Chaves Júnior [11], em trabalho classificado em 2º lugar no 2º Concurso de Monografia do TRT/2ª região, aborda o assunto do dilema entre o negociado eo legislado, a que na prática se reduziu o tema, de maneira clara e convincente, sob o título "A Flexibilização e o Direito Dúctil do Trabalho" [12].

Afirma ser falsa a dualidade convencionado X legislado, ressaltando que "privilegiar essa perspectiva dual vai sem dúvida nos conduzir a um enfrentamento, dilema que não será fácil superar de uma forma convincente, se considerarmos que estamos operando a partir de uma lógica determinada e situada: a lógica da sociedade capitalista", e imagina um remédio homeopático para fugir do labirinto sem saída que essa perspectiva parece sugerir. Homeopático porque segue o princípio basilar da homeopatia que é similia, similibus curantur – ou, semelhantes curam-se com semelhantes.

Segundo o articulista, a "regulação estatalista, a partir de uma ótica dilemática, funciona como aparelho de intervenção alopática". Nessa concepção "se privilegia o poder vertical do Estado em detrimento do súdito".

Numa atuação homeopática, "a regulação do direito dúctil do trabalho dar-se-ia através do poder vertical para horizontalizar e multiplicar as bases dialógicas da negociação". Nesse entendimento, prossegue, "o Estado, ao invés de preocupar-se com a fixação de limites rígidos das necessidades dos trabalhadores –necessidades essas que não podem e não devem ser apriorísticamente fixadas – ele deveria se voltar principalmente para a efetivação dos mecanismos legais necessários à garantia da existência de um diálogo igualitário entre as partes".

O Estado, portanto, deve atuar prioritariamente de uma forma supletiva, porque, em geral, a fixação de mínimos tem sempre dois efeitos colaterais perversos: congelar esse mínimo e transformá-lo na prática em teto.

Essa atuação minimalista do Estado, pois, tende a garantir e propagar a efetivação do diálogo entre trabalho e capital, permitindo a criação de condições mais propícias à multiplicação de direitos coletivos específicos. Segundo o autor em causa, não resta dúvida de que "a conquista de novos direitos sociais pela via legal, além de mais complexa, é bem mais lenta".

A segundo forma aventada para a regulação do direito do trabalho é pelo Mercado. Essa via, contudo, não é a mais apropriada, pelo fato de o trabalho humano não poder ser equiparado a coisa, para fins de negociação.

Mas, dir-se-á, como não coisificar o trabalho numa negociação coletiva, por exemplo? Como não torná-lo uma mercadoria? Para que se tenha um razoável sucesso na negociação, há, portanto, que se cercar a dialógica da negociação de condições jurídicas para que o diálogo entre os parceiros da produção se verifique da forma mais democrática possível.

Por terceiro, há a via da regulação comunitarista, sendo esta fundada no conceito da participação. Mas, quando se fala em participação em sede trabalhista, "o importante é não limitá-la ao conceito de participação nos lucros e resultados", ou sob o aspecto remuneratório. A participação comunitarista é um conceito bem mais abrangente. Envolve a participação no estabelecimento e na empresa. Essa participação no estabelecimento envolve os fatores ligados à produção, enquanto a participação na empresa envolve os aspectos estratégicos do empreendimento.

Portanto, quando se fala em reforçar os vínculos de solidariedade, não se está a defender uma proposta romântica ou de moralismo autocomplacente. Fala-se, sim, em "politização do espaço empresarial", no sentido de enfatizar a função social da empresa e da propriedade.

Em conclusão, a respeito das três formas de regulação, defende o autor mencionado a interação combinatória entre os três tipos, de modo a interagi-las com o pilar da emancipação social do trabalhador, via art. 7º, caput, in fine, da CF, ou a locução "além de outros direitos que visem à sua melhoria da condição social", pois não se pode consagrar o trabalho subordinado como direito fundamental, mas, sim, o trabalho emancipatório é que deve ser alçado a tal categoria.

Complementa Chaves Júnior que, para "se proceder ao resgate da emancipação, a teoria jurídica deve passar por adaptações necessárias, uma vez que ela é construída, de uma forma hegemônica, a partir de pressupostos regulatórios, com excessiva preocupação sistemática" e, "não estivesse o termo flexibilizar tão dominado pelo discurso neoliberal, e tão jungido à polarização Estado-mercado, poderíamos tomá-lo emprestado como metáfora da releitura do direito revisitado pelos ideais de emancipação"

Finalizando, diz o mesmo autor:

"A idéia de "ductibilidade constitucional" utilizada por Zabrebelsky é muito atraente. Partindo da hoje recorrente distinção entre regras e princípios, o constitucionalista afirma que enquanto o direito legislativo é baseado em regras, AS NORMAS CONSTITUCIONAIS SÃO, PREPONDERANTEMENTE, PRINCÍPIOS. As regras se esgotam em si mesmas, NÃO TÊM NENHUMA FORÇA CONSTITUTIVA FORA DO QUE ELAS MESMAS ESTATUEM. A elas se obedece, aos PRINCÍPIOS SE ADERE.

Considerando que os princípios carecem de base positivada – segue Zabrebelsky concluindo – seu significado não pode ser determinado de forma abstrata, mas, apenas em casos concretos. Para ele a idéia de que somente as estruturas normativas assentadas em pressupostos poderiam configurar, tecnicamente, a aplicação dos direitos, faz com que se confunda o constitucionalismo contemporâneo com alguma forma de jusnaturalismo ou mesmo com um juízo estritamente político.

Se concebermos [...] os direitos, a partir de uma validade prática e não somente a partir de uma validade lógica, a idéia de direito por princípios pode ser explicar em tons de razoabilidade ou prudência..

A pluralidade de princípios e de valores objetivados na Constituição justifica o tratamento não formalista ou não-hierárquico dos fenômenos jurídicos."


DO NOVO DIREITO DO TRABALHO

De tudo, pois, que dissemos até aqui já podemos concluir que a Constituição Federal de 1.988, ao contrário de, como afirmam alguns, ter apenas incorporado ao seu texto normas do Direito do Trabalho tradicional, positivo, transformou as conquistas trabalhistas obtidas através dos anos EM PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, de um Direito Dúctil do Trabalho, a que se reporta o ilustre magistrado José Eduardo de Resende Chaves Júnior, em seu premiado trabalho a que nos referimos atrás.

Constitui-se, dessa forma, em um NOVO DIREITO DO TRABALHO que nos cumpre estudar mais detidamente e fazer aplicar em sua plenitude, para que não se torne letra morta a intenção do Constituinte.

A partir dessa constatação realista, mais que teorética, podemos dizer, com Jorge Luiz Souto Maior [13] que o direito é um instrumento de realização da justiça social, que tem como meios de atuação a "constitucionalidade democrática das normas, a sistematização do direito, pela utilização da noção de princípios, e a normatização interpretativa da regra positivada", e que, o direito do trabalho, por sua vez, é o "instrumento de equilíbrio entre as forças do capital e do trabalho".

Por esse motivo, o Direito do Trabalho deve se confundir e consolidar, através do que o sociólogo Boaventura Souza Santos, referido por Chaves Júnior [13] chamou de a modernidade, assentada em dois pilares: o da emancipação e o da regulação. Nas relações de trabalho, sob o novo enfoque da flexibilização, a lei se flexibiliza para atender, não ao mercado, ou à Constituição, mas aos fins culturais do trabalho humano, de modo que a autonomia privada coletiva só iria desconstruir direitos, para reconstruir soluções mais eficazes em termos de emancipação social do trabalhador.

Na busca dessa emancipação do trabalhador, teremos de desconstruir o Direito do Trabalho tradicional e reconstruir o que Chave Jr. chama de Direito Dúctil do Trabalho, que seria o ramo da ciência do direito que tem por objeto as normas jurídicas que disciplinam as relações de trabalho (e não mais, apenas, subordinado), determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho, em sua estrutura e atividade.

Estariam incluídas, desde já, as relações de trabalho autônomo, de trabalho avulso, de trabalho cooperativo e tantas mais que passariam a ser objeto de uma regulação multiplista, "que privilegia as várias combinações possíveis entre os meios de regulação do conflito" (do Estado, de Mercado e Comunitarista).

Tomando-se como exemplo o Trabalho Cooperativo, através das Cooperativas de Trabalho, além de integrar-se nos direitos dos cooperados aqueles elencados pela Constituição, mediante negociação e regulação comunitarista, deveria ser preocupação dos órgãos de Estado, na fiscalização de seu cumprimento, não a exclusão social do cooperado da "proteção" do Direito do Trabalho, mas, antes, a sua inclusão como sujeito da proteção do Direito Dúctil, ou do Trabalho em Geral.


Notas

1 "O trabalhador entre o neoliberalismo e o garantismo", Revista da AMATRA II, Jan/2003, pg. 30.

2 "Instituições de Direito do Trabalho", Cap. I – Antecedentes Históricos, Liv. Freitas Bastos, pg. 25.

3 Segadas Vianna, ob. cit., pg. 26.

4 Ob. cit., pg. 35.

5 Encíclica RERUM NOVARUM, 15 de maio de 1.891.

"História das Doutrinas Econcômicas", Ed. Atlas, 6ª ed., pg. 367.

6 "Flexibilização negociada como política de crescimento na União Européia", Revista AMATRA II, Maio/2003, pg. 36.

7 Jornal "O ESTADO", 22;/06/03, B2.

8 Normalmente chamado de TRABALHO INFORMAL.

9 Amauri Mascaro Nascimento, Curso de Direito do Trabalho, 11ª Edição, São Paulo, Saraiva, p. 107.

10 Juiz Titular da 21ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte - MG

11 ista da AMATRA II, Janeiro/2003, pg. 42.

12 "O Direito do Trabalho como instrumento de JustiçaSsocial", LTr 2000.

13 Obra citada.

Sobre o autor
Genesio Vivanco

Juiz do Trabalho (aposentado) da 15ª Região, Professor Universitário e Advogado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOLANO SOBRINHO, Genesio Vivanco. Direito Constitucional e a flexibilização do Direito do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 365, 7 jul. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5378. Acesso em: 19 nov. 2024.

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