Vivemos a era da informação, caracterizada por uma massa insana de dados que recebemos e emitimos o tempo todo, seja no relacionamento direto com as outras pessoas, seja, sobretudo, pelo computador – ambiente hoje ampliado para aparelhos celulares, “tablets” etc. Nesse contexto, parece não haver tempo para ler tudo o que nos chega às mãos, ou aos olhos.
Essa constatação, por evidente, vale também – e principalmente – para aqueles agentes públicos destinatários finais da produção dos advogados, quais sejam, os juízes. Que são seres que, por dever de ofício, são obrigados a ler calhamaços de textos em forma de petições judiciais – calhamaços cada vez mais virtuais, mas ainda físicos em sua maioria.
Prestes a completar 29 anos de experiência na advocacia, aos quais hão de ser somados os dezessete meses em que atuei como escrevente em Piracicaba, ainda me pergunto se os juízes têm tempo de ler o tanto que nós, advogados, escrevemos. Por vezes, chego à conclusão de que simplesmente não leem...
O prazeroso exercício da advocacia exige capacidade de persuasão. Exige talento para convencer dos nossos argumentos alguém que, em princípio, tem um invejável preparo intelectual e cultural. E que, portanto, estará atento a cada vírgula mal posta, a cada crase indevida, a cada desnecessária repetição de palavras, a cada adjetivo que possa caracterizar excesso de linguagem.
Penso que seja válido, portanto, lançar mão da minha longeva experiência para sugerir aos colegas, sobretudo aos mais jovens, que sejam concisos na produção das petições.
Não tenho a pretensão de trazer ensinamentos jurídicos, ou de qualquer ordem, a profissionais cujo preparo certamente os dispensa. Portanto, aqui trago apenas sugestões.
A primeira sugestão diz respeito já ao endereçamento da petição. Pergunto: que espécie de juiz ou juíza é esse ou essa que parece exigir do advogado ou advogada tanto salamaleque como estamos acostumados a ver? Qual magistrado ou magistrada, especialmente os mais moços e moças, ficará feliz em ser tratado ou tratada como “senhor” ou “senhora”? Portanto, para que desperdiçar palavras como “Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz” - ou “Doutora Juíza...”? Não basta uma simples e respeitosa alocução “Excelentíssimo Juiz” ou “Excelentíssima Juíza”?
Fica aqui, pois, minha primeira sugestão: reduzir o endereçamento para a fórmula “Excelentíssimo Juiz de Direito da ... Vara .... da comarca de ....” Penso que seja válido indicar se se trata de juiz ou juíza, desde que possível, indicando atenção à questão de gênero e respeito à pessoa do ou da titular da Vara, cujo nome, via de regra, figura na página do processo no portal do tribunal correspondente, ao menos no Estado de São Paulo, no âmbito da justiça comum. A mim, passados esses anos todos de estrada, ainda soa estranho ver a fórmula “unissex” “Excelentíssimo(a)” – cujo uso será inevitável quando se tratar de petição inicial a ser distribuída para foro em relação ao qual não se tem prévia certeza de quem será o magistrado ou magistrada titular. Claro, não vamos chegar ao extremo de nos preocupar com juízes substitutos...
Feito o endereçamento, com singeleza, porém mantido o respeito devido, segue-se o número dos autos do processo em destaque.
Na primeira linha seguinte, o advogado indica, primeiro, o nome do seu cliente, por extenso, acrescentando “e outros”, se houver mais de um, bem como o da parte contrária (idem, quanto ao “e outros”, se o caso). Neste passo, também me incomoda muito o excesso de reverências, já não bastasse o do endereçamento. Por que, afinal, fazer uso da surrada fórmula “FULANO DE TAL, nos autos de processo em epígrafe, vem respeitosamente à d. presença de Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado que esta subscreve...”
Minha sugestão: vamos direto ao assunto! Fulano, nos autos tais, por seu advogado, vem a V.Exª expor e requerer... e pronto!
Passa-se, então, ao conteúdo específico da petição, em que o advogado tem obrigação de ser escorreito na gramática, comedido na linguagem, e exercer da melhor maneira possível seu natural talento à persuasão - o que passa longe de ser teatral, dramático, circunstância que incomoda muitos magistrados. E quanto mais seu texto estiver livre de penduricalhos, sobretudo das “muletas” (aquelas palavras ou expressões que iniciam orações, como “portanto”, “sendo assim”, “de mais a mais” etc.), mais chances terá de efetivamente ser compreendido e de convencer o juiz, destinatário final de seus argumentos. Neste ponto, a regra é clara, simples e bastante: use e abuse da velha sintaxe “sujeito – verbo – predicado”. E lembre-se, entre o sujeito e o verbo, via de regra, não há vírgula. E também não há vírgula, ressalvadas diversas hipóteses, entre o verbo e o predicado.
Isso dito, uma peça enxuta poderá ter a seguinte estruturação, sem perda – repito – do respeito devido ao magistrado destinatário e, assim, ter ampliadas as chances de o colega ser melhor compreendido, para que, ao fim e ao cabo, seu cliente tenha satisfeita sua pretensão, objetivo de toda petição:
“Excelentíssimo Juiz de Direito da ...ª Vara .... da comarca de .....
(espaço)
Autos de nº 0000000...
(espaço)
FULANO DE TAL, nos autos do processo em epígrafe, em que figura no polo oposto BELTRANO DE TAL, vem a V.Exª, por seu advogado, expor e requerer o quanto segue:
1. (...)
2. (...)
Termos em que,
p. deferimento.”
Ah, sim. Ia me esquecendo. A abreviatura de “Vossa Excelência” não é “V.Excia.”, mas apenas e tão somente “V.Exª”, com o “a” sobrescrito – da mesma forma que o numeral ordinal “1ª”, por exemplo –, sem ponto.
Valeu?