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A responsabilidade tributária dos sócios gerentes nas sociedades de cotas por responsabilidade limitada à luz do art. 135 do Código Tributário

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Agenda 05/08/2004 às 00:00

Não se trata de uma responsabilidade objetiva, sendo imprescindível à demonstração do dolo do sócio-gerente em fraudar o fisco e praticar os atos previstos no artigo 135 do Código Tributário Nacional.

INTRODUÇÃO

A responsabilidade tributária reveste-se de grandes divergências, pois além de ser exceção ao princípio da autonomia patrimonial vigente no direito privado brasileiro, foi instituída de forma genérica, dando uma grande margem para discussões e interpretações.

A grande dificuldade que existe em torno da compreensão da responsabilidade tributária, reside no escasso tratamento que é dado pela doutrina ao assunto, bem como pela variação de entendimentos pelos tribunais pátrios.

Alguns autores que tratam do assunto em seus discursos impõem entraves para a atribuição da responsabilidade dos tributos aos sócios da sociedade devedora, enquanto outros defendem sua aplicação sem qualquer análise acurada.

Ressalta-se que o instituto da responsabilidade tributária é de suma importância para o Estado, na medida em que coíbe a condução de forma fraudulenta das sociedades.

Este trabalho busca apresentar as diversas hipóteses de atribuição da responsabilidade tributária, analisando os diversos entendimentos construídos em torno do instituto.

Para isso, o trabalho foi divido em quatro partes, sendo a primeira dedicada a mostrar as peculiaridades das sociedades por cotas de responsabilidade limitada, a qual foi escolhida para analisar as possibilidades de atribuição de responsabilidade aos seus sócios-gerentes.

Na segunda parte terá como objeto à explicação de algumas noções sobre o Direito Tributário Brasileiro, e em seguida, tratar-se-á dos sujeitos passivos enumerados pelo Código Tributário Nacional.

E por fim, uma análise doutrinária sobre a responsabilidade tributária, bem como, a evolução do posicionamento jurisprudencial.


CAPÍTULO I

1 AS SOCIEDADES POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADAS

1.1 EXÊGESE DAS SOCIEDADES POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADAS

Com traços característicos das sociedades anônimas, surgiram as sociedades por cotas de responsabilidade limitada.

Mostra-se muito controvertido o assunto acerca da origem das sociedades limitadas, como podem ser chamadas. O autor RUBENS REQUIÃO [1] ensina que "uns consideram-nas de origem britânica e outros alemã". Já FÁBIO ULHOA COELHO [2], mostra-se convencido de sua origem alemã ao dizer que "a sociedade limitada foi criada, na Alemanha, no fim do século XIX".

Sua criação foi decorrente de reivindicações de pequenos e médios comerciantes, que se viam em enorme desvantagem em relação aos grandes comerciantes que diante da complexidade e onerosidade, eram os únicos com condições de optar pelas constituições de sociedades anônimas.

Neste sentido ensina o autor FÁBIO ULHOA COELHO [3]:

Sua criação é, em relação às demais sociedades, recente, e decorre da iniciativa de parlamentares, para atender ao interesse de pequenos e médios empreendedores, que queriam beneficiar-se, na exploração de atividade econômica, da limitação da responsabilidade, típica das anônimas, mas sem atender às complexas formalidades destas, nem se sujeitar à prévia autorização governamental.

Os pequenos e médios comerciantes almejavam a criação de uma sociedade ao qual poderiam limitar suas responsabilidades, diminuindo os riscos de verem seus patrimônios particulares esvair-se por conta da quebra ou dificuldades financeiras da sociedade.

Essas limitações de responsabilidades já eram características das sociedades anônimas, mas precisavam os pequenos e médios comerciantes que o novo tipo societário fosse mais simplificado quanto às formalidades exigidas.

A mesma idéia filia-se ANTONIO CARLOS DINIZ MURTA [4]:

[...] pelo fato de não serem portadores de vultosos capitais, nem de querer correr os riscos da responsabilidade ilimitada, aos alemães não convinha adotar a forma de sociedade anônima, de difícil constituição e de dependente autorização, dispendiosa e extremamente burocratizada.

Surgia então, as sociedades por cotas de responsabilidade limitada, que restringia a responsabilidade dos sócios, bem como não exigiam as complexas formalidades das sociedades anônimas.

O surgimento desse tipo societário foi adotado por inúmeros países do mundo, e teve sua propagação rápida, conforme afirma RUBENS REQUIÃO [5].

A legislação brasileira incorporou a sociedade limitada através do Decreto 3.708 de 1919, e atualmente é disciplinada pela Lei 10.406/02, ou seja, o Código Civil que entrou em vigor em 11/01/2003.

1.2 CONCEITO

A lei que primitivamente regulamentou as sociedades por cotas de responsabilidade limitada não trouxe conceito, ficando a cargo da doutrina fazê-lo.

Na concepção de P. R. TAVARES PAES [6] a sociedade por cotas de responsabilidade limitada é:

[...] a constituída por duas ou mais pessoas, assumindo cada uma a obrigação pela integralização do capital social. A responsabilidade limitada é do sócio e não da sociedade. Esta responde ilimitadamente por todas as dívidas e obrigações que houver assumido.

Suficientemente esclarecedor o conceito concebido pelo autor em relação às peculiaridades das sociedades limitadas.

Veja-se que a sociedade responde integralmente pelas suas obrigações, ficando os sócios sujeitos a perder apenas os valores aplicados na sociedade, em razão da formação do capital social pactuado no contrato social.

Observa-se então, que a única garantia dos credores da sociedade, em regra, é o valor do capital social pelo qual a mesma foi constituída, e ainda demonstra que este mesmo valor do capital social é um limitador da responsabilidade dos sócios constituintes.

O Decreto 3.708/19 foi o responsável pela inserção do modelo societário em comento no direito brasileiro. Atualmente o Código Civil de 2002, regulamenta este tipo societário, no Livro II, Título II.

Muito se discutiu durante a vigência do Decreto 3.708/19, sobre a aplicação subsidiaria da Lei das Sociedades Anônimas, diante do laconismo existente no Decreto instituidor das sociedades limitadas.

Mas observa-se que esse problema não foi superado com a entrada em vigor do Código Civil de 2002. Observa-se nitidamente ainda a possibilidade de aplicação das Leis das Sociedades Anônimas as sociedades por cotas de responsabilidade limitada.

O Código Civil de 2002 é condizente com o exposto, o qual dispõe em seu artigo 1053 que:

Art. 1053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples.

Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima.

Nesse diapasão, FÁBIO ULHOA COELHO [7], ensina que:

A sociedade limitada, quando a matéria não está regulada no capítulo específico a este tipo societário do Código Civil, fica sujeito à disciplina da sociedade simples ou, se previsto expressamente no contrato social, à da Lei das Sociedades Anônimas. Esta última se aplica, de forma supletiva, quando a matéria é negociável entre os sócios, e, de forma analógica, quando os sócios não podem dispor sobre o assunto. O Código Civil é sempre o diploma aplicável na constituição e dissolução da sociedade limitada, mesmo que o contrato social eleja a lei das sociedades anônimas para a regência supletiva.

Não resta dúvidas, que em relação a assuntos de maior relevância sempre prevalecerá o disposto no Código Civil, tais como, disposições que regem a constituição, a dissolução, a integralização, a responsabilidade dos sócios, bem como a dos administradores. Restando assuntos que podem ser deliberados pelos sócios, poderá então, ser supletivamente aplicados a Lei das Sociedades Anônimas em virtude a ausência de previsão no contrato social, e desde que não contrarie o disposto no Código Civil.

1.3 PERSONALIZAÇÃO DAS SOCIEDADES

O ordenamento jurídico brasileiro admite duas espécies de pessoas: as naturais e as jurídicas. Ambas são tidas como sujeitos de direitos, ao qual lhes são conferidas direitos e deveres.

Inúmeras são as teorias que explicam o fenômeno da atribuição da personalidade à pessoa jurídica, mas para evitar longas discussões teóricas, visto não ser este o objeto principal deste trabalho, traz-se apenas o entendimento do autor WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO [8], que ensina:

A personalidade jurídica não é, pois, ficção, mas uma forma, uma investidura, um atributo, que o Estado defere a certos entes, havidos como merecedores dessa situação [...] a pessoa jurídica tem assim realidade, não a realidade física (peculiar às ciências naturais), mas a realidade jurídica ideal, a realidade das instituições jurídicas.

Unidas duas ou mais pessoas, em torno de um fim comum, pode-se considerar uma sociedade, mas ainda sem o instituto conferido pelo direito brasileiro, ou seja, a personalidade jurídica, e que transforma a sociedade em um sujeito de direitos.

Trata-se do nascimento de uma pessoa para o direito, não com atributos físicos, mas com atribuição social e como tal sujeito a deveres e possuidor de direitos.

Acerca do assunto, entende RUBENS REQUIÃO [9] que:

A sociedade transforma-se em novo ser, estranho à individualidade das pessoas que participam de sua constituição, dominando um patrimônio próprio, possuidor de órgãos de deliberação e execução que ditam e fazem cumprir a sua vontade.

A atribuição de personalidade a sociedade, a torna distinta de seus membros constituintes. Investida de personalidade, a sociedade está apta a contratar em nome próprio, constituir patrimônio, assumir compromissos e exigir direitos tendo legitimidade para qualquer ato que não haja proibição expressa, denominadas por FÁBIO ULHOA COELHO [10], como "conseqüências da personalização".

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O mesmo autor [11] divide em três as conseqüências da personalização: "titularidade negocial, titularidade processual e responsabilidade patrimonial".

A titularidade negocial está diretamente ligada a possibilidade de realização de negócios, constituição de obrigações e celebração de contratos. Atos inerentes e essenciais à atividade do comércio.

Em relação à titularidade processual, trata-se da legitimidade de demandar ou ser demando em juízo. A capacidade de ser parte é da sociedade, e não de seus sócios ou administradores que em nome dela realizam atos do comércio.

E por fim à responsabilidade patrimonial de maior repercussão e considerada a mais importante conseqüência da personalização. Ela é consagrada pelo princípio da autonomia patrimonial, ao qual há uma separação de patrimônio dos sócios e da sociedade personalizada, e conseqüentemente, a não responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade.

Deve-se mencionar que nenhuma responsabilidade recairá sobre os sócios, considerando que a constituição da sociedade se operou ordinariamente, com a devida integralização do capital social.

O princípio da autonomia patrimonial é regra no direito societário, mas que suporta exceções.

Alguns autores entendem que a personalidade conferida as pessoas jurídicas, estimulam a economia, posto que o patrimônio dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, o que incentiva os empreendedores a investirem em atividades comerciais de risco.

Não há que se negar a enorme importância para o desenvolvimento econômico do país o fato da atribuição da personalidade para as sociedades comerciais, com a finalidade de estimular novos empreendimentos. Mas não se pode olvidar, de pessoas inescrupulosas que desvirtuam a finalidade da sociedade, lesando não apenas outros empresários, mas a própria sociedade.

Razão pela qual, o princípio da autonomia patrimonial reinante nas sociedades por cotas de responsabilidade limitada admite exceção, seja através da teoria da desconsideração da personalidade jurídica [12], ou mesmo através de normas jurídicas que estabelecem a responsabilidade direta de pessoas ligadas às sociedades.

Neste esteio, FÁBIO ULHOA COELHO [13] leciona que:

O princípio da autonomia patrimonial tem sua aplicação limitada, atualmente, às obrigações da sociedade perante outros empresários. Se o credor é empregado, consumidor ou estado, o princípio não tem sido prestigiado pela lei ou pelo juiz.

Para melhor ilustração do ensinamento, o autor distingue a obrigação das sociedades em negociáveis e não negociáveis.

A primeira diz respeito às obrigações em que o credor tem a possibilidade de avaliar os riscos de contratar com a sociedade, flexibilizando a negociação conforme a possibilidade de solvência do crédito. É uma maneira do credor defender seu crédito, acoplando a negociação eventuais taxas de risco.

São comuns essas situações em transações de títulos cambiais e em contratos mercantis.

Todavia, as obrigações não negociáveis são vistas pelo autor FÁBIO ULHOA COELHO [14] com "a sua existência e extensão definidas em lei, ou não são, por outros motivos objetos de pactuação entre o credor e a sociedade devedora". Exemplificando, têm-se os débitos tributários em que são iguais para todas as sociedades, não sendo possível a flexibilização nas negociações.

Fica mais cristalino com essa distinção das obrigações, o porquê da aplicação do princípio da autonomia patrimonial somente perante outros empresários.

Insta vislumbrar o ensinamento do autor FÁBIO ULHOA COELHO [15] de que "a personalidade jurídica da sociedade empresária começa com o registro de seus atos constitutivos na Junta Comercial".

Depreende-se desse entendimento, que o registro torna pública a formação do novo sujeito de direito, possibilitando o controle dos demais agentes econômicos e do próprio Estado quanto à existência e extensão das obrigações que o envolvem.

Em relação ao término da personalidade atribuída a sociedade, esta se dá com o procedimento dissolutório, seja judicial ou extrajudicial e que deve seguir aos preceitos do direito societário, que se divide em dissolução, liquidação e partilha.

A lei das sociedades simples prevê as fases da dissolução da sociedade, que será iniciada pela dissolução em sentido estrito, quando ocorrer qualquer das situações enumeradas no artigo 1033 [16] do Código Civil.

Em seguida será providenciada a liquidação, que trata de realizar o cumprimento de todas às obrigações da sociedade.

E por fim a partilha, em que ao finalizar a liquidação restarem bens, serão divididos entre os sócios.

1.4 A FIGURA DO SÓCIO-GERENTE

O gerente da sociedade, também chamado de diretor ou administrador, é o responsável por gerir a sociedade. Ele será o representante legal da sociedade, externando as vontades e necessidades da mesma.

Trata-se do elemento principal da empresa. O gerente é o que se encontra no ápice da posição hierárquica, de onde emanam as ordens.

Sua escolha deve constar no contrato social, sob pena de não o fazendo, considerar-se todos os sócios como gerentes, conforme ensina RUBENS REQUIÃO [17].

Nada obsta que seja incumbida da gerência pessoa que não seja sócio da sociedade limitada, desde que observe o disposto no artigo 1061 do Código Civil:

Art. 1061. Se o contrato permitir administradores não sócios, a designação deles dependerá de aprovação da unanimidade dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e de 2/3 (dois terços), no mínimo após a integralização.

Mas para este trabalho, o que importa é a pessoa do sócio-gerente, e que por questões legais e éticas deve conduzir os negócios da sociedade, com a devida prudência, visto tratar-se de administração de bens de alheios. Medidas tomadas sem a devida precaução podem responsabilizá-lo pelos prejuízos causados.

Assim, o objetivo deste trabalho é discutir a responsabilidade dos sócios-gerentes, perante o direito tributário diante das atitudes enumeradas no artigo 135, inciso III do Código Tributário Nacional, demonstrando as hipóteses de incidência da referida responsabilidade.


CAPÍTULO II

2 NOÇÕES GERAIS DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

Depois de exposto em linhas gerais as peculiaridades das sociedades por cotas de responsabilidade limitada, instam trazer, ainda que sucintamente, noções inerentes ao estudo do Direito Tributário, ligados ao tema ora debatido, visto que dentro da doutrina tributária, encontra-se a responsabilidade tributária, como último elo de uma corrente, que tem como primeiro momento o conceito de fato jurídico tributário.

2.1 O SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO

A Constituição Federal estabelece no artigo 145 ao 162 o sistema constitucional tributário.

O autor ROQUE ANTONIO CARRAZZA [18] afirma que "a Constituição Federal, no Brasil, é a lei tributária fundamental, por conter as diretrizes básicas aplicáveis a todos os tributos."

Dos artigos referidos pode-se extrair um perfil constitucional dos tributos, bem como as possibilidades em que são facultadas aos entes federados cobrá-los. Encontra-se ainda a competência tributária, que trata da partilha aos entes federados da aptidão para criar tributos.

Por assim dizer, a Constituição tem dado competências para que as pessoas políticas criem "in abstracto" tributos, tendo classificado os mesmo e apontado à regra-matriz de incidência, limitando, especialmente em seus artigos 150 a 152, a ação estatal de tributar, com uma série de princípios e de regras.

Depara-se ainda pelo exposto na Constituição Federal, com as formalidades que os entes federativos devem observar para legislar acerca de suas competência tributárias, e não pode esquecer-se dos princípios regedores do Direito Tributário disposto no artigo 150.

2.2 TRIBUTO

A forma mais usual de explicar o Tributo é conforme leciona LUCIANO AMARO [19]:

Os tributos apresentam-se como receitas derivadas (por oposição às receitas originárias, produzidas pelo patrimônio público), arrecadadas pelo Estado para financiar as despesas públicas.

Tem-se então, a receita do Estado, ou seja, tudo que ele recebe para sua manutenção, dividida em receita originária, que provem do próprio patrimônio, e a receita derivada temos quando o particular transfere sua riqueza ao Estado. A receita originária pode ser exemplificada, como a receita obtida através de empresas pública, visto tratar-se de rendimento obtido através do próprio patrimônio do Estado, enquanto, receita derivada, tem-se o pagamento do tributo pelo particular, em que é transferido seu patrimônio para o Estado.

Ocorre que pela explicação apresentada, evidencia a finalidade do Tributo, que para o Direito Tributário não interessa, sendo seu objeto tão-somente a forma de sua obtenção, conforme ensina GELSON AMARO DE SOUZA [20], razão pela qual encontra-se no Código Tributário Nacional um conceito técnico de tributo, extraído do seu artigo 3º:

Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Analisando tecnicamente o conceito de tributo [21] trazido pelo Código Tributário Nacional, extraí-se que este tem:

1.caráter pecuniário, devendo ser a prestação realizada em moeda corrente do país. Com relação à palavra prestação utilizada, deve-se compreendê-la como objeto de obrigação, assim, tem-se que o Tributo é uma obrigação que deve ser prestada em dinheiro;

2 .caráter compulsório, sendo assim irrelevante a vontade do devedor, observando que quem der causa ao nascimento do Tributo está a ele vinculado sem perquirir sua vontade ou intenção;

3. caráter lícito, não sendo Tributo as prestações originadas de sanções por atos ilícitos;

4.natureza legal, sendo Tributo apenas quando instituído previamente em lei. Diante dessa natureza legal, RENATO LOPES BECHO [22], ensina:

[...] os contribuintes (administrados com a nomenclatura ajustada para o Direito Tributário) possuem o direito subjetivo público de só serem sujeitos passivos daqueles tributos autorizados na Constituição. E mais, todos os demais administrados têm o direito subjetivo público de não serem sujeitos passivos de tributos autorizados na Constituição quando não realizarem os fatos imponíveis descritos na própria Carta.

5. natureza vinculada, não podendo o Estado agir com discricionariedade, ou seja, não pode o Estado, através de seus agentes, analisar qualquer espécie de conveniência de se exigir ou não o Tributo.

Não se pode olvidar que para o Tributo ser instituído, o ato em que incidirá a norma jurídica tributária, deverá ter cunho econômico.

2.3 CONSIDERAÇÕES SOBRE HIPÓTESE TRIBUTÁRIA E FATO JURÍDICO TRIBUTÁRIO

Antes de iniciarem-se os comentários sobre o título proposto, deve-se informar que em muito diverge a doutrina acerca das expressões utilizadas para designar a descrição legislativa do fato que faz nascer à relação jurídica tributária e o próprio acontecimento do fato.

Cumpre, então informar, que no presente trabalho foram adotadas as terminologias utilizadas pelo autor PAULO DE BARROS CARVALHO, que para a descrição normativa do fato, utiliza-se da expressão hipótese tributária, e para o acontecimento do fato, denomina-se fato jurídico tributário.

Assim, a princípio, deve-se entender que a norma jurídica considera determinados fatos relevantes e os descreve em conformidade com os seus aspectos mais importantes, o que resulta em uma qualificação normativa do fato.

Ensina WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO [23] que:

Todos os direitos, seja qual for sua natureza, procedem de algum fato, [...], esses acontecimentos, de que decorrem o nascimento, a subsistência e a perda dos direitos, contemplados em lei, denominam-se fatos jurídicos.

Tem-se então, que o mundo do direito nasce da incidência da norma sobre um fato do mundo, os quais são por ela previstos, tendo como primeiro momento à criação do fato jurídico, e que essa incidência da norma sobre o seu suporte fático concreto, tem efeitos importantes, principalmente o de tornar jurídico o que era apenas fático.

Toda a norma há de ter, em sua estrutura, a descrição de um fato e conseqüências a ela imputadas.

De conseguinte, a norma é constituída de duas partes: uma em que se descrevem os fatos selecionados pelo Ordenamento Jurídico, o qual é chamado de descritor (hipótese de incidência, hipótese tributária); e outra em que o ordenamento prescreve efeitos jurídicos aos fatos descritos (fato jurídico, depois da incidência da norma), a qual é chamado de prescritor (conseqüente).

Neste sentido ensina o autor PAULO DE BARROS CARVALHO [24]:

A hipótese alude a um fato e a conseqüência prescreve os efeitos jurídicos que o acontecimento irá propagar, razão pela qual se fala em descritor e prescritor, o primeiro para designar o antecedente normativo e o segundo para indicar seu conseqüente.

A estrutura normativa tributária adota o sistema exposto, concluindo então, que toda relação jurídico-tributária nasce de uma norma de comportamento.

No tocante às normas tributárias, deve-se ainda observar as diretrizes básicas apresentadas pela Constituição Federal, e que diante delas alguns doutrinadores lançam a idéia de existência da regra matriz tributária, que trata de todos os elementos da relação tributária.

O autor ROQUE ANTONIO CARRAZZA [25] ensina que:

A Constituição, ao discriminar as competências tributárias, estabeleceu – ainda que, por vezes, de modo implícito e com uma certa margem de liberdade para o legislador – a norma padrão de incidência (o arquétipo genérico, a regra matriz) de cada exação. Noutros termos, ela apontou a hipótese de incidência possível, o sujeito ativo possível, o sujeito passivo possível, a base de cálculo possível e alíquota possível, das varias espécies e subespécies de tributos. Em síntese, o legislador, ao exercitar a competência tributária, deverá ser fiel a norma padrão de incidência do tributo pré-traçada na Constituição.

Sintetizando, a Constituição guarda a regra-matriz tributária, a qual dá azo para legislar sobre o Direito Tributário.

Trata-se de uma norma padrão, que deve servir de exemplo para legislar sobre o assunto. Entende-se que a regra-matriz de incidência guarda todos os elementos configuradores para nascimento da relação jurídica tributária.

No Direito Tributário existe a incidência de tributo conforme ensina LUCIANO AMARO [26] "quando determinado fato, por enquadrar-se no modelo abstratamente previsto pela lei, se juridiciza e irradia o efeito, também legalmente previsto, de dar nascimento a uma obrigação tributária".

Vislumbrando um raciocínio pratico acerca do exposto, pode-se dizer que quando ocorrer uma situação fática (fato jurídico tributário) descrita na lei tributária (hipótese tributária), o direito, que era puramente objetivo faz nascer outro direito e agora concreto e individualizado.

A hipótese tributária é a previsão na norma de que se ocorrido determinado fato, este irá gerar conseqüências jurídicas. Ela vai descrever a relação tributária, aquela relação jurídica que se dá entre o contribuinte e o Estado.

Conseqüentemente, inexistindo lei que tenha erigido algum fato como passível de tributação, ou seja, inexistindo hipótese tributária, não haverá tributo; outrossim, mesmo existindo lei prevendo determinada hipótese tributária, não ocorrendo o fato descrito, da mesma forma não haverá tributo.

A ocorrência do fato que se encontra descrito na norma, chama-se de fato jurídico tributário.

HUGO DE BRITO MACHADO [27] esclarece que:

A expressão hipótese de incidência designa com maior propriedade a descrição, contida na lei, da situação necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, enquanto a expressão fato gerador fez da ocorrência, no mundo dos fatos, daquilo que está descrito na lei. A hipótese é simples descrição, é simples previsão, enquanto o fato é a concretização da hipótese, é o acontecimento do que fora previsto.

Este doutrinador utiliza a expressão hipótese de incidência, para designar a expressão hipótese tributária, bem como fato gerador para designar a expressão fato jurídica tributário utilizada neste trabalho.

Por assim dizer, a concretização da hipótese tributária através da ocorrência do fato jurídico tributário, pode ser entendido como um enquadramento do fato à norma, o qual é chamado de subsunção. Para a subsunção ocorrer, o fato deve-se amoldar a todos os critérios descritivos da hipótese tributária.

Reforça a idéia, o ensinamento do autor PAULO DE BARROS CARVALHO [28]:

Para que seja tido como fato jurídico tributário, a ocorrência da vida real, descrita no suposto da norma individual e concreta expedida pelo órgão competente, tem que satisfazer a todos os critérios identificadores tipificados na hipótese da norma geral e abstrata.

Assim devem ser observados minuciosamente os critérios exigidos e apresentados pela hipótese tributária, para que a subsunção ocorra. Requer que o fato jurídico tributário porte todos os critérios da hipótese tributária.

Ditos critérios encontrados na hipótese tributária são elementos que o legislador julgou importantes no fato, para o fim de configurá-lo como criadores da relação jurídica tributária.

A hipótese tributária vai descrever o ato que gerará o nascimento da obrigação tributária, o valor desta, quais o sujeitos envolvidos, onde e em que momento surgirá e onde será realizada a prestação.

Na hipótese tributária encontra-se o critério material, temporal, espacial, pessoal e quantitativo. Essa divisão é utilizada apenas para fins didáticos, tendo em vista ser impossível à subsunção do fato à norma, considerando separadamente os elementos da hipótese tributária.

2.3.1 Critério material

Trata-se do núcleo da hipótese tributária, descrevendo uma ação ou situação que realizada dará nascimento à obrigação tributária.

Ensina PAULO DE BARROS CARVALHO [29]:

O comportamento de uma pessoa, consistência material lingüisticamente representada por um verbo e seu complemento, há de estar delimitado por condições espaciais e temporais, para que o perfil típico esteja perfeito e acabado, como descrição normativa de um fato.

Observa-se que a ação ou situação descrita pela hipótese tributária é representada por um verbo e seu complemento: importar mercadoria estrangeira, auferir renda, possuir propriedade rural, etc.

Tome-se como exemplo o ITR (Imposto Territorial Rural), em que terá como critério ou aspecto material, o fato de ser o contribuinte possuidor de uma propriedade rural, emergindo a obrigação tributária.

Ocorre que pelo simples fato de ser possuidor de propriedade rural, pode-se notar a ausência de elementos passíveis para ocorrência da subsunção. Faltam os elementos delimitadores que PAULO DE BARROS CARVALHO defende, ou seja, os elementos temporais e espaciais que será visto adiante.

2.3.2 Critério temporal

Tem-se o critério temporal com a definição pela lei, do momento em que se considera ocorrida à hipótese tributária.

Nas palavras de PAULO DE BARROS CARVALHO [30] tem-se:

[...] o critério temporal da hipótese tributária como o grupo de indicações, contidas no suposto da regra, e que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra devedor e credo, em função de um objeto – o pagamento de certa prestação pecuniária.

Assim, o critério temporal da hipótese tributária do ITR é o estabelecido pelo legislador na Lei 9393/96 em seu artigo 1º, ou seja, em 1º de janeiro de cada ano. Esclarecendo, tem-se que, quem for possuidor de propriedade rural (critério material), em 1º de janeiro da cada ano, estará obrigado ao pagamento de imposto.

2.3.3 Critério espacial

O critério espacial da hipótese tributária descreve o local em que o fato jurídico tributário deve ocorrer, ou põem em evidência o local do nascimento da obrigação tributária.

Segundo GERALDO ATALIBA [31], o critério ou por ele chamado aspecto espacial designa:

[...] a indicação de circunstâncias de lugar – contidas explicita ou implicitamente na hipótese de incidência – relevantes para a configuração do fato imponível.

Os fatos imponíveis – como fatos concretos da vida real, inseridos no mundo fenomênico – acontecem num determinado lugar.

Assim, para o exemplo já utilizado, ter-se-á o critério espacial da hipótese tributária do ITR descrito no artigo 29 do Código de Tributário Nacional, sendo todo o local fora da zona urbana do Município. Este critério espacial alude que somente ocorrerá a hipótese tributária dentro dos limites geograficamente delimitados.

2.3.4 Critério pessoal

Diante da eclosão da hipótese tributária, observa-se, além do nascimento da obrigação tributária, um vínculo entre o particular e o Estado, que recebe o nome de relação jurídica tributária.

Os sujeitos dessa relação jurídica tributária são apontados pelo critério pessoal ou subjetivo da hipótese tributária.

Encontra-se nesta relação jurídica tributária, o sujeito ativo que é credor da obrigação, e o sujeito passivo que é devedor desta obrigação.

No exemplo discutido, tem-se como sujeito ativo a União, diante de sua competência tributária para instituir imposto sobre propriedade territorial rural. E tem-se como sujeito passivo o proprietário ou possuidor do imóvel rural. Não se deve olvidar que será o sujeito passivo da obrigação quem for o proprietário ou possuidor no dia 1º de janeiro da cada ano, conforme estabelece o critério temporal da hipótese tributária.

2.3.5 Critério quantitativo

Este critério contido na hipótese tributária tem o condão de externar o quantum da obrigação tributária.

Ele encontra-se dividido em base de cálculo e alíquota.

LUCIANO AMARO [32] explica que "chama-se base de cálculo a medida legal da grandeza do fato gerador", lendo-se fato gerador como hipótese tributária.

A base de cálculo da hipótese tributária considera no fato jurídico tributário o seu aspecto econômico, estabelecendo um parâmetro ou referência sobre o qual será cobrado o tributo.

Segundo PAULO DE BARROS CARVALHO [33], a base de calculo é:

[...] a grandeza instituída na conseqüência da regra-matriz tributária, e que se destina, primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária.

No exemplo da ITR (Imposto Territorial Rural), sua base de cálculo é estabelecida pelo Código Tributário Nacional, em seu artigo 30:

Art. 30. A base do cálculo do imposto é o valor fundiário.

A lei tributária estabelece como base de cálculo do ITR (Imposto Territorial Rural) o seu valor fundiário que equivale ao valor da terra nua, segundo ensina VITTORIO CASSONE [34], devendo ainda ser observado os aspectos trazidos pelo artigo 10 da Lei 9393/96.

A alíquota é o outro componente do critério quantitativo da hipótese tributária.

Ela também será estabelecida pela lei, e determinará um percentual, o qual incidirá sobre a base de cálculo, apurando o valor real da obrigação tributária.

No caso do ITR (Imposto Territorial Rural), a alíquota aplicável é diferenciada, obedecendo à área do imóvel, combinado com sua área produtiva, devendo ser observado os percentuais estabelecidos pela Lei 9393/96.

2.4 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Nas palavras de SILVIO DE SALVO VENOSA [35], define-se obrigação como:

[...] uma relação jurídica transitória de cunho pecuniário, unindo duas (ou mais) pessoas, devendo uma (o devedor) realizar uma prestação à outra (o credor).

O vínculo que o Direito Tributário faz nascer entre o particular e o Estado recebe o nome de relação jurídica. E como pode observar-se pelo conceito de Tributo, esta relação jurídica mantida entre o indivíduo e o Estado tem cunho econômico, podendo desta forma ser chamada de obrigação, cujo seu objeto apresenta-se através de uma prestação.

Toda a obrigação, principalmente no Direito Tributário, é estabelecida por uma norma jurídica, que prevê um dever para o devedor e um direito para o credor, assim podendo dizer que obrigação também pode ser utilizada para designar a relação jurídica, expressando o vinculo entre credor e devedor.

Para que haja, de fato, a ocorrência da relação jurídico-tributária, se faz necessário a presença de lei instituidora de um tributo, apontando a hipótese tributária e seus critérios, e a ocorrência do fato descrito na norma.

Ensina LUCIANO AMARO [36] que:

Vale dizer, não se requer que o sujeito passivo queira obrigar-se; o vínculo obrigacional tributário abstrai a vontade e até o conhecimento do obrigado: ainda que o devedor ignore ter nascido à obrigação tributária, esta o vincula e o submete ao cumprimento da prestação que corresponde ao seu objeto.

Mostrando insofismavelmente a origem legal da obrigação tributária, que bastando à ocorrência do fato descrito na lei para que surja a obrigação.

Uma vez realizado o fato, tal como previsto na hipótese tributária, a lei incide juridicizando-o, dando origem à relação jurídica tributária, ou seja, criando o vínculo entre o seu causador e o Estado que descreveu a conduta.

Nesse sentido ensina PAULO DE BARROS CARVALHO [37]:

Ao preceituar a conduta, fazendo irromper direitos subjetivos e deveres jurídicos correlatos, o conseqüente normativo desenha a previsão de uma relação jurídica, que se instala, automaticamente e infalivelmente, assim que se concretize o fato.

O conseqüente normativo que o autor faz uso trata-se do prescritor da norma jurídica, que traz os efeitos e conseqüência do fato descrito.

Assim, pode-se dizer que obrigação tributária nasce, sem qualquer sombra de dúvida, da ocorrência ou realização da situação fática descrita na norma jurídica tributária. Realização esta que pode ser por meio de uma ação ou omissão e independentemente da vontade das partes.

Ainda no raciocínio acerca da obrigação tributária, se faz necessário ressaltar a diferença existente entre obrigação tributária e crédito tributário.

Faz-se uso do ensinamento de HUGO DE BRITO MACHADO [38] para esta tarefa:

O CTN distinguiu a obrigação (art. 113) do crédito (art. 139). A obrigação é um primeiro momento na relação tributária. Seu conteúdo ainda não é determinado e o seu objeto passivo ainda não esta formalmente identificado. Por isto mesmo a prestação respectiva ainda não é exigível. Já o crédito tributário é um segundo momento na relação de tributação. No dizer do CTN, ele decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta (art. 139). Surge com o lançamento, que confere à relação tributária liquidez e certeza.

A obrigação tributária nasce com a ocorrência do fato jurídico tributário descrito pela norma, enquanto o crédito tributário, dependente da obrigação tributária, e se formalizando com a prática do lançamento.

Não há que se negar à dependência do crédito tributário ao nascimento da obrigação tributária, mas essa também depende do lançamento para se tornar exigível.

Sobre o autor
Enéias dos Santos Coelho

Acadêmico do curso de Direito em Umuarama- PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COELHO, Enéias Santos. A responsabilidade tributária dos sócios gerentes nas sociedades de cotas por responsabilidade limitada à luz do art. 135 do Código Tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 394, 5 ago. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5522. Acesso em: 25 dez. 2024.

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