RESUMO:A Administração Pública tem, na atual crise por que passa o Brasil, uma oportunidade ímpar de desenvolver ações e medidas que permitam a busca da concretização do princípio da eficiência na atuação da máquina governamental no país.
A origem da atual crise no Brasil
Do final da década de 90 até o início de 2012 houve um aumento substancial no preço das commodities no mercado internacional devido à crescente demanda da potência asiática China. Esse foi um período bastante positivo para a economia brasileira, historicamente dependente da exportação de produtos agrícolas e matérias-primas.
O Brasil aproveitava a onda dos altos preços das commodities e o consequente crescimento de sua economia gerou euforia. O modelo econômico vigente à época implementou políticas de distribuição de renda e apostou na expansão do consumo. Como consequência, programas sociais foram expandidos e o salário mínimo aumentou 72,31% de 2003 a 2014.
Durante esse período, mais de 40 milhões de brasileiros deixaram a pobreza e ascenderam à “nova classe média”, passando a consumir bens duráveis de alto valor agregado, tais como: celulares de última geração, automóveis, televisores, refrigeradores, ar condicionado etc.
Contudo, a partir de 2014 o cenário começou a mudar com a desaceleração da economia chinesa e a queda brusca no preço das commodities internacionais. Naquele ano, pouco depois da reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff, houve, ainda, a revelação dos primeiros resultados da Operação Lava Jato, realizada pela Polícia Federal. Essa operação, a maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro já realizada no Brasil, expôs uma rede criminosa formada por políticos, servidores públicos, empresários e doleiros que desviou bilhões de reais dos cofres públicos.
Esses acontecimentos, tanto a crise financeira quanto o desdobramento das investigações da Polícia Federal e do Ministério Público no âmbito da Operação Lava Jato, levaram a uma enorme instabilidade política que culminou com o impeachment de Dilma Rousseff em 31 de agosto de 2016, bem como a deterioração das contas públicas do país e a paralisação da economia brasileira.
Nesse contexto, a atual situação econômica do Brasil é reflexo da pior crise da história do país, que já conta com mais de 12 milhões de desempregados e uma queda vertiginosa nos níveis de investimentos públicos como consequência da grave crise fiscal que atinge todo o setor público.
O impacto da crise no setor público
Nos últimos anos, o Estado brasileiro (União, estados, DF e municípios) tem sofrido com uma intensa queda na arrecadação de tributos, devido aos baixos índices de atividade econômica verificados no país. Com as contas em vermelho, e com dificuldades para aumentar a arrecadação – pois a população e o setor produtivo também sofrem com os efeitos da atual crise econômica e não têm aceitado que o Estado aumente ainda mais a carga tributária que, diga-se de passagem, é uma das maiores do mundo - os governantes têm adotado, de uma forma geral, uma postura de austeridade, tentando reduzir as despesas do Estado, por meio de vários expedientes, tais como: suspensão e cancelamento de reajustes nos salários do funcionalismo público, redução na oferta de programas sociais, suspensão e cancelamento de obras públicas previstas e paralização das já em andamento, atraso no pagamento a fornecedores, dentre outros. Em suma, sem dinheiro em caixa, e com problemas para aumentar as receitas, os entes federativos têm adotado políticas de redução das despesas públicas, diminuindo a oferta de serviços públicos e tornando precário o funcionamento dos que ainda são oferecidos à população.
Todo esse cenário escancarou as vísceras dos gastos públicos governamentais no Brasil, em todos os níveis federativos (União, estados, DF e municípios), e pôs em xeque a ineficiência do setor público no país, sobretudo com os absurdos revelados no custeio da máquina pública.
A crise como oportunidade de aprimoramento da máquina pública
Mas, assim como toda crise, há nessa uma oportunidade: o desenvolvimento de uma cultura de eficiência no setor público. Com menos recursos, para que não haja prejuízos no oferecimento de serviços públicos à população, há necessidade de uma atuação mais eficiente do Estado, que deve buscar meios e desenvolver políticas para elevar a produtividade no setor público – fazer mais com menos -, de modo a otimizar o funcionamento da máquina pública. Há, dessa forma, no atual momento por que passa o Brasil, uma oportunidade sem precedentes de busca pela concretização do princípio constitucional da eficiência na Administração Pública do país, em atendimento ao que preconiza o caput do artigo 37 da Carta Magna de 1988, senão vejamos:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”.
O ilustre HELY LOPES MEIRELLES definiu o princípio da eficiência como “o que se impõe a todo o agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento profissional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros”, e acrescenta que “o dever da eficiência corresponde ao dever da boa administração”.
Para MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, “o princípio apresenta-se sob dois aspectos, podendo tanto ser considerado em relação à forma de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atuações e atribuições, para lograr os melhores resultados, como também em relação ao modo racional de se organizar, estruturar, disciplinar a administração pública, e também com o intuito de alcance de resultados na prestação do serviço público”.
A ineficiência no uso dos recursos materiais e humanos do Estado explica boa parte da falta de qualidade dos serviços públicos no Brasil. Entre economistas e empresários, é praticamente unânime o diagnóstico de que aumentar a produtividade é uma necessidade em quase todas as áreas do país, no serviço público essa é uma tarefa ainda mais urgente. Para muitos especialistas, a recessão econômica, que escancarou o rombo nas contas públicas, também abriu a oportunidade de repensar a Gestão Pública no Brasil, otimizando o funcionamento do Estado e corrigindo equívocos e absurdos na sua atuação.
Nesse sentido estão surgindo diversas ideias e propostas que buscam tornar mais eficiente o funcionamento da máquina pública no Brasil. Uma que merece destaque é a intenção do Governo Federal de oferecer todos os serviços públicos em uma plataforma online. A medida faz parte de uma ampla reforma da gestão pública para melhorar o atendimento da população e buscar reduzir custos com a máquina governamental, incluindo gastos com pessoal. A meta é buscar economia semelhante à resultante da prática de digitalização em outros países. O custo pode cair a 5% do que é desembolsado hoje. Estudos apontam que a média do gasto em quatro países (Canadá, Reino Unido, Noruega e Austrália) caiu de US$ 14,09 em cada atendimento presencial para US$ 0,39 no serviço online. A ideia é que, numa única plataforma online, o cidadão possa encontrar todos os serviços do Governo Federal, uma espécie de Poupatempo digital. Essa medida, por si só, tem potencial para gerar uma economia que poderá chegar a bilhões de reais para os cofres públicos. Em média, o custo do atendimento online é 20 vezes menor que o presencial.
Para o cidadão, a economia é ainda maior. Segundo estudo da experiência na Espanha, a digitalização desses serviços proporcionou para a população uma economia 8,5 vezes superior à do governo. O cálculo levou em conta que, para pedir um documento ou requerer outro serviço, o trabalhador perde um dia de trabalho, precisa se locomover para a agência, gasta tempo na fila etc.
Outras medidas que merecem ser mencionadas são as que propõem uma “racionalização” nas compras da União. Uma ideia é que o governo passe a comprar energia no mercado livre – em que o preço é fechado diretamente com o gerador ou com a comercializadora – em vez de pagar para a distribuidora, gerando assim uma economia estimada em 20% do valor atualmente gasto com energia elétrica pela União. Outra medida é a que propõe o uso de um aplicativo para o transporte de servidores, ao invés de cada órgão ter veículos próprios é contratada uma frota terceirizada única.
Diante disso, conclui-se que a Constituição Federal enunciou expressamente alguns princípios para a Administração Pública, encontrando-se consubstanciados em regras de observância permanente e obrigatória para o bom administrador. A inserção, por meio da Emenda Constitucional nº 19, da eficiência como princípio constitucional da Administração Pública significa que o administrador deve buscar o constante aprimoramento dos serviços públicos e permitir o exercício pleno da cidadania através da garantia de acesso às informações de interesse público a toda coletividade de modo célere, econômico e eficiente.
Outrossim, embora elidido à categoria de princípio constitucional expresso da Administração Pública na Constituição Federal de 1988 por meio da Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, o princípio da eficiência tem, na atual crise econômica e fiscal, uma oportunidade ímpar de ser melhor observado e tido como parâmetro a ser considerado na reinvenção do modo de operação de toda a máquina pública no Brasil.
BIBLIOGRAFIA.
1 – MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002.
2 – PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2002.
3 – Constituição Federativa Brasileira. 1988