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A competência para instruir e julgar crimes militares e crimes contra a segurança nacional

Agenda 12/02/2017 às 10:45

A partir de um olhar crítico sobre o movimento grevista de policiais militares sobre o enfoque do direito penal militar e do processo penal, entenda a quem compete a instrução e julgamento dos crimes militares e contra Segurança Nacional, no Brasil.

Acentua o Código Penal militar em seu artigo 149: 
Motim. Art. 149. Reunirem-se militares ou assemelhados: I – agindo contra a ordem recebida de superior, ou negando-se a cumpri-la; II – recusando obediência a superior, quando estejam agindo sem ordem ou praticando violência; III - assentindo em recusa conjunta de obediência, ou em resistência ou violência, em comum, contra superior; IV - ocupando quartel, fortaleza, arsenal, fábrica ou estabelecimento militar, ou dependência de qualquer deles, hangar, aeródromo ou aeronave, navio ou viatura militar, o utilizando-se de qualquer daqueles locais ou meios de transporte, para ação militar, ou prática de violência, em desobediência a ordem superior ou em detrimento da ordem ou da disciplina militar: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito), com aumento de 1/3 (um terço) para os cabeças. Revolta. Parágrafo único. Se os agentes estavam armados: Pena – reclusão, de 8 (oito) a 20 (vinte) anos, com aumento de 1/3 para os cabeças.

A diferença básica do crime de motim (artigo 149, caput do CPM) para o crime de revolta (artigo 149, paragrafo único[9], do CPM), é que no crime de revolta, os agentes por ocasião da ordem recebida, encontram-se armados sendo o perigo oferecido por conta desta conduta rechaçada de um maior grau de reprovabilidade.

Para primeira modalidade do crime de motim, os militares dispõe a manifestação clara de não cumprir uma ordem recebida de superior hierárquico, é forma comissiva – agindo contra a ordem de superior (inciso I,1ª parte).

Na segunda modalidade, os subordinados permanecem estáticos quando recebem a ordem de superiores, nada fazem, é forma omissiva – negando-se a cumprí-la (inciso I, 2ª parte).

Já na terceira modalidade os amotinados ao receberem a ordem de superior recusam-se a cumpri-la, por exemplo, trocar peças de fardamento para uma ação de policiamento tático, lembrando que nesta modalidade ocorre simultaneamente com estarem “agindo sem ordem” – recusando obediência a superior quando estejam agindo sem ordem (inciso II -1ª parte).

Nas lições de Célio Lobão (Direito Penal Militar, 1999), o agir sem ordem ”significa qualquer comportamento diferente daquele que o militar deve ter em público ou lugar sob a administração militar”.  Na quarta modalidade, que é a 2ª parte do inciso II – praticando violência, esta violência é de forma genérica, portanto, tanto faz se a violência é contra os próprios amotinados, contra bens móveis e imóveis (coisa) ou dirigida à terceiros, sendo que após individualizado a conduta do agente, este responderá cumulativamente com as penas de outros crimes que cometera (crime de dano, lesão corporal, etc).

No inciso III, 1ª parte – assentindo em recusa conjunta de obediência, agora a quinta modalidade, os agentes que estão amotinados conjuntamente aderem a ideia de recusar em obedecer a ordem de superior hierárquico – resistência passiva. Na sexta modalidade (inciso III – 2ª parte) – ou em resistência ou violência, que é a resistência ativa. Na sétima modalidade, do mesmo Inciso, porém, na sua parte final – contra superior – que decorre da violência praticada contra o superior.

Para o Inciso IV – 1ª parte, tem-se a oitava modalidade – ocupando quartel, fortaleza, arsenal, fábrica ou estabelecimento militar, ou dependência de qualquer deles, hangar, aeródromo ou aeronave, navio ou viatura militar. O verbo é ocupar que é o mesmo que instalar-se, tomar conta, invadir, bens estes que estão sob a administração militar, de forma ilegal em detrimento a ordem superior ou da disciplina militar.

E, finalmente, a nona modalidade de motim, que é a 2ª parte do mesmo inciso – utilizando-se de qualquer daqueles locais ou meios de transporte, para ação militar, ou prática de violência, em desobediência a ordem superior ou em detrimento da ordem ou da disciplina militar. Como o próprio verbo formaliza, há a utilização daqueles aparatos institucionais em detrimento da ordem e da disciplina militar.

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A revolta é o motim armado, sendo a existência de armas o único e essencial ponto de distinção entre os dois crimes.

Não será suficiente a mera reunião de militares, pois é preciso que os sujeitos ativos do crime ajam contra a ordem recebida de superior ou neguem o seu cumprimento. Assim a conduta envolva o fato de que os que praticam o crime agem em desfavor da ordem, fazendo o oposto do que lhes foi devidamente ordenado ou ainda criem obstáculos à execução.

Há ainda conduta criminosa quando os agentes optam por deixar de cumprir a tarefa que lhes foi atribuída pelo superior hierárquico. 
O motim é crime formal e de perigo. Trata-se de crime de ação múltipla. 

A disciplina militar é, segundo o art. 14, § 2º do Estatuto dos Militares, “a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento regular e harmônico, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes deste organismo”.

O motim é crime militar próprio, em que o sujeito ativo é o militar. 
Militar é “qualquer pessoa que, em tempo de paz ou de guerra, seja incorporada às forças armadas, para nelas servir em posto, graduação, ou sujeição à disciplina militar. 

Motim é um crime que só militares e seus assemelhados podem cometer. O dolo, elemento do tipo, é o genérico, não existindo a modalidade culposa no motim. Tanto o motim como a revolta são crimes de ação penal pública incondicionada.

Fala-se que o pessoal da polícia militar do Espírito Santo, envolvido em movimento ilegal e inconstitucional de paralisação, pode ser enquadrado na lei de segurança nacional. Na hipótese devem ser ainda analisados crimes de motim e revolta, previstos no Código Penal Militar.

Prevê a lei segurança nacional: 
Art. 1º - Esta Lei prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão:

I - a integridade territorial e a soberania nacional;

Il - o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito;

Ill - a pessoa dos chefes dos Poderes da União.

Art. 2º - Quando o fato estiver também previsto como crime no Código Penal, no Código Penal Militar ou em leis especiais, levar-se-ão em conta, para a aplicação desta Lei:

I - a motivação e os objetivos do agente;

II - a lesão real ou potencial aos bens jurídicos mencionados no artigo anterior.

De toda sorte deverá ser comprovada a aplicação do artigo 109, IV, da Constituição Federal.

Observe-se o artigo 23, I, da Lei de Segurança Nacional:

Art. 23 - Incitar:

I - à subversão da ordem política ou social;


A propósito, trago a seguinte jurisprudência sobre a definição da competência:

STJ - CONFLITO DE COMPETÊNCIA : CC 124133 BA 2012/0179810-4

Publicado por Superior Tribunal de Justiça

Processo

CC 124133 BA 2012/0179810-4

Orgão Julgador

S3 - TERCEIRA SEÇÃO

Publicação

DJe 17/04/2013

Julgamento

10 de Abril de 2013

Relator

Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE

Ementa

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. GREVE DOS POLICIAIS MILITARES DABAHIA. CARACTERIZAÇÃO DE CRIMES DE MOTIM, REVOLTA E CONSPIRAÇÃO.COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR. POSSÍVEL OCORRÊNCIA DE DELITOSPREVISTOS NA LEI DE SEGURANÇA NACIONAL (LEI N. 7.170/1983).INQUÉRITO POLICIAL JÁ INSTAURADO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL (ART. 109, INCISO IV, DA CF/88). UNIDADE DOS PROCESSOS.IMPOSSIBILIDADE. ART. 79, I, DO CPP E ART. 102, A, DO CPPM.

1. Constatada a prática, em tese, de crimes de motim, revolta econspiração, previstos no art. 149, parágrafo único, e art. 152, ambos do CPM, capitulados na denúncia oferecida contra 84policiais militares que participaram da greve ocorrida na Bahia, nosmeses de janeiro e fevereiro de 2012, a competência para processar ejulgar tais delitos é da Justiça Militar.

2. Na eventualidade de se comprovar a ocorrência de crimes previstosna Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983)- valendo ressaltarque já existe inquérito policial instaurado para esse fim -, nostermos do que dispõe o art. 109, inciso IV, da CF/88, a competênciaserá da Justiça Federal. Precedentes do STJ e do STF.

3. Não se mostra possível o julgamento de todas as condutasdelitivas no Juízo Federal, em razão do que dispõem os arts. 79, I,do CPP, e 102, alínea a, do CPPM. A conexão e a continência importamna unidade de processo e julgamento, salvo no concurso entre ajurisdição comum e a militar.

4. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Auditor daAuditoria Militar da Bahia, o suscitado, para processar e julgar oscrimes militares capitulados na denúncia, consistentes em motim,revolta e conspiração, reservando-se a competência da JustiçaFederal para o processamento de possíveis crimes tipificados na Leide Segurança Nacional, eventualmente praticados pelos denunciados oupor terceiros.

Acordão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Suscitado, Juízo Auditor da Auditoria Militar da Bahia para processar e julgar os crimes militares capitulados na denúncia, consistentes em motim, revolta e conspiração, reservando-se a competência da Justiça Federal para o processamento de possíveis crimes tipificados na Lei de Segurança Nacional, eventualmente praticados pelos denunciados ou por terceiros, nos termos do voto do Senhor Ministro Relator. As Sras. Ministras Assusete Magalhães e Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJ/PE) e os Srs. Ministros Campos Marques (Desembargador convocado do TJ/PR), Marilza Maynard (Desembargadora Convocada do TJ/SE), Laurita Vaz, Og Fernandes e Sebastião Reis Júnior votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Jorge Mussi. Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

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