Introdução
Ao analisar o Código de Processo Penal percebe-se claramente que esse é omisso ao não tratar sobre a antecipação dos efeitos da tutela penal, ou seja, há um silêncio do legislador ordinário com relação à possibilidade de se antecipar determinados efeitos da tutela penal. Assim, não existe previsão legal proibitiva ou permissiva da antecipação dos efeitos da tutela penal condenatória.
Diante desse fato, tem-se que nos casos onde o Código de Processo Penal for omisso é necessária a aplicação de princípios saneadores, normas gerais que preencheriam as lacunas deixadas pelo legislador. Dessa forma, foi nesse intuito que o legislador criou o dispositivo normativo legal do art. 3º do diploma processual penal, norma que visa justamente o preenchimento de tais lacunas. Tal dispositivo poderá ser utilizado de modo a interpretar extensivamente as normas, podendo haver a aplicação da analogia, como suplemento dos princípios gerais de direito.
Haja vista a possibilidade de aplicação do disposto no art. 3° do Código de Processo Penal, onde houver omissão, deve necessariamente ser sanada pela aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. E sendo uma das omissões do diploma processual penal a possibilidade ou não da antecipação dos efeitos da tutela penal, discute-se se é possível a antecipação de determinados efeitos da condenação por aplicação subsidiária do diploma processual civil, no tocante à tutela antecipatória.
Diante disso, questiona-se sobre a admissibilidade, em nosso ordenamento jurídico, sobre a requisição por umas das partes do processo penal ao juízo, da antecipação de alguns efeitos da sentença para que se produzissem desde aquele momento processual penal. Obrigando o réu a se submeter a tal efeito a partir do deferimento da tutela antecipatória.
O instituto da antecipação dos efeitos da tutela, em sede de processo civil, é conhecido como a concessão dos efeitos da sentença buscados pela parte, antes do julgamento do próprio pleito, ou seja, antes que a lide seja decidida pelo juízo. Portanto, a pergunta que se faz em seguida, quando a questão é relativa aos efeitos da tutela penal, é se existe a possibilidade de aplicação desse instituto de processo civil em um processo penal, por exemplo, obrigando a indenizar a vítima desde já.
Assim, se preenchidos todos os requisitos da antecipação de tutela, quais são a priori, a prova inequívoca e a verossimilhança das alegações, é possível aplicação deste instituto de direito processual civil em sede de processo penal com o intuito de melhor atender os interesses da vítima.
Das Lacunas por Omissão do Código de Processo Penal
Diante da disposição normativa legal contida no art. 3º do Código de Processo Penal[1], encontra-se exposto que se deve aplicar nos casos de omissão do referido diploma processual uma interpretação extensiva, a aplicação analógica e suplementos dos princípios gerais de direito. Dessa forma, é que se percebe a possibilidade jurídica de aplicação subsidiaria do Código de Processo Civil.
Assim, haja vista a aplicação da analogia, diferentemente do que ocorre no diploma penal, onde não é possível criar tipos penais, existe a possibilidade de disposições do Código de Processo Civil venham à regular situações que a princípio não poderiam ser reguladas em um processo criminal, como é o caso do instituto da Antecipação dos Efeitos da Tutela, como veremos em momento oportuno.
Frise-se já existem casos onde o STJ julgou pela aplicação subsidiaria do Código de Processo Civil, quando discorria sobre a possibilidade de de decisão monocrática a cerca do conflito de competência, como é o caso do julgamento do Habeas Corpus 27003/RO[2], dessa forma, tem-se o seguinte trecho:
“Em se tratando de matéria já pacificada pelo Plenário do Tribunal a quo, nada impede que, para o julgamento monocrático de conflito de competência em matéria criminal, se invoque o art. 3º ('A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito'), do CPP, e se aplique o art. 120, do CPC, já que as normas do CPP (arts. 113 a 117) não tratam do assunto.”
Ainda nesse sentido se tem os seguintes casos julgados onde se foi aplicado, em caráter subsidiário o Código de Processo Civil. Citando como exemplo os seguintes casos julgados pelo STJ: HC-59245/RS[3]; HC-71614/SP[4]; HC-63720/DF[5];. Tem-se ainda os julgados do STF, tais como: HC- 72671/SP[6]; HC-89849/MG[7]. Junta-se a isso ainda alguns exemplos citados por Mirabete[8], em seu livro, tais como: a permissão para oferecimento de contra-razoes em recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Publico de decisão que rejeita a denúncia. Bem como, a representação processual de pessoa jurídica por quem estava à frente dos negócios, sem apresentação dos respectivos estatutos, por analogia com a jurisprudência cível.
Dessa forma, é possível a aplicação do instituto da antecipação de tutela cível em sede de processo penal, uma vez que o próprio Código de Processo Penal é omisso com relação aos efeitos da tutela penal e por força normativa do art. 3º, deve-se aplicar analogicamente as normas do Código de Processo Civil, relativas a tal instituto.
Da Antecipação dos Efeitos da Tutela
Diante da omissão do Código de Processo Penal, em tratar a respeito da possibilidade ou não de antecipar os efeitos da tutela penal, e visto que a solução para tal é a aplicação do art. 3º do Código de Processo Penal. Ter-se-ia necessariamente que aplicar a norma contida no art. 273 do Código de Processo Civil[9], que prever que o juízo poderá, desde que a parte requeira, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida, desde que, existindo a prova inequívoca, e ainda se convença da verossimilhança da alegação.
A antecipação dos efeitos da tutela, em sede de direito processual civil, é a antecipação de determinados efeitos secundários da sentença cível, seja ela constitutiva, declaratória ou condenatória, para que seja satisfeitos determinados interesses do requerente. Como por exemplo, a retirada do nome do inadimplente das Agências de Proteção ao Crédito, enquanto se discute a dívida.
Antes de adentrar no tema própriamente, imperioso se faz a diferenciação entre antecipação dos efeitos da tutela e medidas cautelares. Assim, nos dizeres de Paulo Afonso Brum Vaz[10], a primeira se refere execução para a segurança, enquanto que a segunda é tocante à segurança para a execução. Em outras palavras tem-se que a medida antecipatória visa adiantar determinados efeitos que a sentença civil iria causar para que não haja danos materiais ou morais ao requerente no decorrer da lide. Já nas medidas cautelares visa-se impedir que a execução de todos os efeitos da sentença seja frustrada, por exemplo, porque houve a perda do objeto da lide.
Assim, percebe-se que o intuito do requerente, ao querer antecipar os efeitos da tutela, é somente evitar que haja um dano para ele, ou que tal dano cesse. Dessa forma, pode-se concluir que os requisitos da antecipação da tutela não são somente a prova inequívoca e a verossimilhança das alegações, é necessário também que haja ainda fundado receio de dano, ou que esse dano possa a vir a ser irreparável ou de difícil reparação, ou ainda que fique caracterizado o abuso de direito de defesa, ou, ainda, que se tenha demonstração de manifesto propósito protelatório do réu.
Com base nisso, é importante descorrer sobre as várias espécies de antecipação dos efeitos da tutela. Essas podem ser determinadas como assecuratória, punitiva e sobre o pedido ou parte do pedido, ou sobre o pedido incontroverso. Dessa forma, tem-se que a medida de antecipação dos efeitos da tutela assecuratória seria caracterizada propriamente como a execução para a segurança, em outras palavras significa dizer que tem por objetivo evitar um dano maior para o requerente.
Diferente da tutela antecipada punitiva que vem como uma espécie de sanção ao requerido, uma vez que demonstre o manifesto desejo protelatório. E por fim, tem-se a possibilidade de antecipar os efeitos da tutela desde que o pedido do requerente seja incontroverso, em outras palavras, significa dizer que se não houver oposição do réu sobre o pedido do autor e, portanto, pode-se antecipar o deferimento de tal pedido.
Entretanto se deve fazer determinada observação, uma vez que a última espécie não pode ser considerada como uma antecipação de tutela e sim como um julgamento antecipado da lide, conforme a determinação legal do art. 330 do Código de Processo Civil[11], onde se encontra disposto que o juízo conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência e quando ocorrer a revelia.
Neste ponto agora é importante comentar os requisitos da tutela antecipada, que a priori são a verossimilhança das alegações, a prova inequívoca e a ausência de dano irreparável ou de difícil reparação. Assim, primeiramente, tem-se que a verossimilhança das alegações, conforme ensinamento de Athos Gusmão[12], é mais que o fumus boni iuris¸ contudo, não é necessário que leve a uma conclusão indiscutível, entre outras palavras, significa dizer que não se trata de uma mera expectativa que venha a acontecer, como também não é um fato comprovado e incontestável, seria mais precisamente um meio termo entre a fumaça do bom direito e a conclusão incontroversa
Tendo analisado o requisito da verossimilhança das alegações, passa agora ao exame da prova inequívoca. A referida prova pode ser definida como aquela que tem elevado grau de convencimento, ou aquela que se presume ser verdadeira. Frisando que até mesmo uma escritura pública pode ser alvo de uma ação anulatória de registro público, assim, tem-se que a prova inequívoca é aquela que pode ser realmente a verdade dos fatos até que haja prova em contrário.
Por fim, o último requisito para a concessão da antecipação de tutela é a ausência de dano irreparável ou de difícil reparação. O pressuposto da ausência de dano, conforme esclarece Paulo Afonso Brum Vaz[13], é necessário, caso contrario faria com que o processo inteiro perde-se sua razão de ser, bastaria apenas que a parte autora propusesse a ação, e logo em seguida, requere-se a antecipação dos efeitos da tutela para ter sua lide satisfeita, essa é a razão de ser de tal requisito, pois como impõe o mandamento constitucional do art. 5º, inciso LIV[14], que ninguém poderá ser privado de sua liberdade ou de seus bens sem que haja o devido processo legal
Assim a medida antecipatória só pode ser concedida se não existir o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação para o requerido. E para a melhor compreensão segue o seguinte exemplo, onde duas partes estão em litígio por um saco de arroz, e durante o curso do processo tem-se que a parte autora requer a antecipação dos efeitos da tutela, para que possa se alimentar e assim, apresenta os requisitos da verossimilhança das alegações e a prova inequívoca. Quando do deferimento pelo juízo, esse ao conceder a tutela antecipatória para a parte autora, deve analisar se a parte ré irá sofrer um algum dano de difícil reparação uma vez que o arroz era destinado à subsistência. Caso o juízo conceda a tutela antecipatória a parte ré irá sofrer um dano irreparável ou de difícil reparação e assim, o juízo não deve conceder a ordem de antecipação.
Para concluir sobre todos os requisitos da antecipação da tutela, deve-se ainda discorrer sobre o requisito do abuso de direito de defesa e manifesto desejo protelatório. Primeiramente, é importante dizer que referido requisito é desassociado dos demais, ou seja, para a concessão da tutela antecipatória é necessário a demonstração dos três requisitos anteriores ou somente a demonstração do abuso de direito de defesa ou do manifesto desejo protelatório.
Assim, basta que a parte autora demonstre que a outra parte está abusando de direito próprio ou que referida parte tenha interesse em apenas protelar o feito, atrasando ao máximo a resolução da lide. Tem-se, dessa forma, que o abuso de direito de defesa está configurado quando o titular do direito o exerce além dos limites necessários, como ensina Calmon de Passos[15]. Seria o caso onde o credor vai cobrar uma dívida por meio de ameaças, importunando o devedor em horários impróprios, assediando vizinhos e familiares, assim, se está se discutindo a dívida em juízo, esse pode deferir a antecipação dos efeitos da sentença.
Já o manifesto desejo protelatório é definido, no entender de do já mencionado autor, Calmon de Passos[16], como sendo a provocação de incidentes manifestamente infundados. Dessa forma, tem-se que aquela parte que postula sem fundamento sério, abusa do direito de demandar; inclusive quem, no curso da demanda, provoca incidentes infundados, além do abuso de direito, revela propósito manifestamente protelatório.
Para melhor entendimento, o seguinte exemplo caracteriza bastante o desejo manifestamente protelatório, assim, a parte que interpõe recurso sem que seja possível a interposição por lhe faltar um dos requisitos de interposição, deseja apenas adiar a execução da sentença, dessa forma o juízo pode antecipar os efeitos da sentença.
Cumpre ainda ressaltar que conforme esclarece Humberto Teodoro Junior[17], que a antecipação dos efeitos da tutela constitui verdadeira inovação no ordenamento jurídico criando e possibilitando a satisfação da lide antes do provimento jurisdicional. E como é de notório conhecimento, existem diversas causas em nossos tribunais o que faz que o julgamento das lides seja postergado.
Dos Efeitos da Sentença Penal Condenatória e Sua Antecipação
Tendo analisado o instituto da antecipação da tutela, passa-se agora a avaliar os efeitos de uma sentença penal. Dessa forma, tem-se que a sentença penal condenatória produz, como efeito principal, a imposição da sanção penal ao
condenado, seja esta uma pena privativa de liberdade, uma pena restritiva de direitos ou a imposição de multa, podendo até mesmo ser uma imposição de medida de segurança, conforme for o caso.
Contudo, este não somente o único efeito que a sentença penal condenatória produz. Existem, em nosso diploma penal como no diploma processual penal, disposições acerca dos efeitos secundários do decisium penal. Assim, com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória o principal efeito gerado é o início do cumprimento da pena exposta, conforme já mencionado. Os demais efeitos se encontram expostos no Código Penal nos artigos 91 e 92, e outros efeitos do decisium estão dispostos no art. 393 do Código de Processo Penal.
Antes de analisar a possibilidade jurídica de antecipação dos efeitos da sentença penal condenatória, vale ressaltar que nem todos os efeitos extrapenais são aplicáveis imediatamente. Tal fato dar-se em decorrência de que necessitam declaração expressa na decisão, com o intuito de dizer quais são e a partir de que momento começam a produzir seus efeitos. Percebe-se assim, que existem duas classes de efeitos extrapenais, os genéricos que são comuns a toda condenação criminal e os específicos, que são em conseqüência do crime cometido.
Os efeitos dispostos nos arts. 91 e 92 do Código Penal[18], podem ser classificados como pena acessória ou efeitos secundários da sentença penal condenatória. Pode-se dizer ainda que são classificados em automáticos, ou seja, aqueles que não precisam de nenhuma disposição na sentença; ou não automáticos, que são aqueles que necessitam de disposição na sentença penal; de eficácia plena, que com o trânsito em julgado já vigoram seus efeitos; e de os de eficácia contida, aqueles que além da disposição necessitam do juízo a especificação de seus limites.
Passando a análise do art. 91 encontramos que o primeiro efeito da sentença penal condenatória é a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime. Tal obrigação é um efeito de automático e é de eficácia plena, em outras palavras, significa dizer que a vítima não precisará de um processo de conhecimento para ter seu patrimônio material ou moral restabelecido, e com a reforma do Código de Processo Penal pela Lei 11.719/08[19], que alterou o art. 387, dando oportunidade ao juízo de estipular um quantum mínimo de perdas e danos tem-se que tal efeito pode ser antecipado.
Percebe-se que o mencionado efeito da sentença penal pode ser antecipado, obrigando o réu a indenizar a vítima, assim, apresentado ao juízo a prova inequívoca, bem como a verossimilhança das alegações, e visto ainda que não há nenhum perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, não existe nenhum perigo jurídico, muito menos nenhuma ofensa ao preceito constitucional do art. 5º, inciso LIV. Assim, o juízo criminal pode antecipar os efeitos da sentença penal condenatória para indenizar a vítima.
O próximo efeito encontra-se disposto no art. 91, inciso II, e se divide em duas alienas, tratando a respeito da perda em favor da União, desde que ressalvado o direito do lesado ou de terceiros de boa-fé, dos instrumentos do crime, contanto que esses consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito (aliena “a”); e ainda do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso (aliena “b”). Devendo tal efeito constar na decisão condenatória, haja vista não ser automático, porém, de eficácia plena.
Importante mencionar que a perda em favor da União é de qualquer objeto que esteja relacionado ao crime, conforme os requisitos dispostos nas alíneas. Ou seja, desde que a sua propriedade não constitua outro fato ilícito ou que o objeto fora adquirido por meios ilícitos. Assim, tem-se o exemplo clássico da doutrina do agente que usa seu carro para cometer um crime, assim, não há nada que justifique a perda da propriedade do referido veículo automotor, pois sua propriedade não constitui outro fato ilícito e não foi adquirido por meio de outro crime. E mesmo que o carro de propriedade de outro, tem-se ainda a impossibilidade da perda, por imposição do referido inciso, caput, que o Estado deve respeitar o direito do lesado.
Esclarecido as limitações de tal efeito tem-se a possibilidade de antecipação de tal efeito. Apresentado ao juízo a prova inequívoca e a verossimilhança das alegações e a ausência de dano irreparável ou de difícil reparação, requisitos do art. 273 e seguintes do Código de Processo Civil. E visto que o réu não tem nenhum motivo aparente para continuar proprietário de tais objetos, há de se considerar bastante plausível a antecipação de tal efeito, até mesmo por uma questão de justiça.
No tocante, a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo previsto no art. 92 do Código Penal, e apesar de estar elencado como um dos efeitos da condenação, tem-se que, segundo entendimento de Rogério Greco[20], trata-se mais de uma pena acessória que propriamente de um efeito da sentença propriamente dita. Tem-se ainda que tal efeito se divide em duas situações: a) quando for aplicada uma pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, desde que o crime seja praticado com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública, ou; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a quatro anos nos demais casos.
Tal efeito não pode ser antecipado, por se tratar mais de uma questão de pena acessória, que de um efeito da sentença penal. Assim, não é possível antecipação de tal efeito, até mesmo em face do requisito da ausência de dano irreparável ou de difícil reparação, uma vez que tal perda irá, com absoluta certeza, gerar ao réu, um dano de difícil reparação, ou até mesmo um dano irreparável.
Quanto à análise do efeito da incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado, tem-se que tal efeito também não pode ser antecipado. A perda do pátrio poder, da tutela ou da curatela é algo definitivo e não pode, uma vez perdida, ser retornada ao status anterior, assim, tal efeito não pode ser antecipado em razão da existência de dano irreparável e por se tratar também de uma pena acessória.
No que se refere ao efeito da inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso, a antecipação desse efeito, pelas mesmas razões acima ditas, não pode ser antecipado. Como foi dito, trata da perda de uma concessão dada ao cidadão para que esse possa dirigir veículo automotor. Assim, se tal efeito for antecipado, irá gerar ao réu um dano irreparável ou de difícil reparação, e dessa forma, não cumpre o requisito da ausência de dano, ou seja, sempre aparentará um dano de difícil reparação ao réu. Junta-se ao fato ainda de ser considerado pela doutrina como uma pena acessória e não de um efeito da sentença penal condenatória.
Assim, pode-se concluir que os efeitos constantes no art. 91 podem ser antecipados sem problemas, por se tratarem realmente de efeitos da sentença penal condenatória. Já os constantes no art. 92, por terem natureza jurídica de pena acessória e não de efeitos da sentença penal, apesar da denominação dada pelo legislador ordinário, não podem ser antecipados, visto que violariam o princípio constitucional da presunção de inocência, ou conhecido também como princípio de não culpabilidade e o mencionado art. 5, inciso LIV da Carta Magna.
Além dos efeitos elencados nos art. 91 e 92 do Código Penal Brasileiro, tem ainda os dispostos no art. 393 do Código de Processo Penal[21], que enumera como efeitos da sentença penal condenatória, os seguintes efeitos: a) ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança e; b) ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.
Tais efeitos são aplicáveis imediatamente após o trânsito em julgado sentença. Assim, se o réu interpõe recurso cabível contra a sentença que o condenou, e se tal recurso produzir os efeitos devolutivo e o suspensivo, os efeitos deveram ser suspensos até que se torne efetiva o trânsito em julgado do decisium.
E visto que os efeitos elencados no diploma processual penal são os principais efeitos de uma sentença penal condenatória, ou seja, com o trânsito em julgado de tais efeitos se operam, tendo início ao cumprimento da pena, bem como a inclusão do nome do acusado no rol dos culpados. Pode-se concluir que a antecipação de tais efeitos além de não cumprirem o requisito da ausência de dano irreparável ou de difícil reparação, também ferem o princípio constitucional da presunção de inocência e o art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal mencionados anteriormente.
Percebe-se claramente, com a exposição de todos os efeitos de uma sentença penal condenatória, que determinados efeitos podem ser antecipados sem prejuízo ao regular prosseguimento do processo, enquanto que outros não poderão ser, em razão do não cumprimento do requisito da ausência de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como, por violarem o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade e o disposto no art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal.
Assim, desde que cumpridos os requisitos da antecipação dos efeitos da tutela, previstos no diploma processual civil, aplicados em um processo criminal, determinados efeitos da sentença penal condenatória podem ser antecipados, sem maiores problemas ou que hajam incidentes que impossibilitem o regular prosseguimento do feito.
[1] Código de Processo Penal, disponível em http://www.planalto.gov.br/legislacao/Decreto-Lei/Del3689.htm, acessado em 23 de setembro de 2008.
[2] Acórdão proferido em sede de Habeas Corpus, disponível em http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=27003&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1, acessado em 24/09/2008.
[3] Acórdão proferido em sede de habeas corpus, disponível em http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=59245&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1, acessado em 24/09/2008.
[4] Acórdão proferido em sede de habeas corpus, disponível em http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=71614&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1, acessado em 24/09/2008.
[5] Acórdão proferido em sede de habeas corpus, disponível em http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=63720&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1, acessado em 24/09/2008.
[6] Acórdão proferido em sede de habeas corpus, disponível em http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(HC$.SCLA.%20E%2072671.NUME.)%20OU%20(HC.ACMS.%20ADJ2%2072671.ACMS.)&base=baseAcordaos, acessado em 24/09/2008.
[7] Acórdão proferido em sede de habeas corpus, disponível em http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(HC$.SCLA.%20E%2089849.NUME.)%20OU%20(HC.ACMS.%20ADJ2%2089849.ACMS.)&base=baseAcordaos, acessado em 24/09/2008.
[8] Mirabete, Julio Fabbrini. Processo penal - 16° Ed. rev. atual. até janeiro de 2004. São Paulo. Atlas 2004. pg. 59
[9] Código de Processo Civil, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5869.htm, acessado em 16 de maio de 2008.
[10] Vaz, Paulo Afonso Brum, Manual da tutela antecipada: doutrina e jurisprudência. Porto Alegre. Editora Livraria do Advogado. 2002. Pg.125-126
[11] Código de Processo Civil, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5869.htm, acessado em 16 de maio de 2008
[12] Carneiro, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela. Rio de Janeiro. 5° Edição. Editora Forense. 2004. pg. 23-26
[13] Vaz, Paulo Afonso Brum, Manual da tutela antecipada: doutrina e jurisprudência. Porto Alegre. Editora Livraria do Advogado. 2002. Pg.139
[14] Constituição da República Federativa do Brasil, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm, acessado em 17 de novembro de 2008.
[15] Calmon de Passos, José Joaquim. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro, Forense, 1974, vol. 3. Pg. 18-19
[16] Idem. Pg. 20.
[17] Theodoro Junior, Humberto. Curso de direito processual civil, 40º Edição, Rio de Janeiro, Forense, 2003. Pg. 332.
[18] Código Penal, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm, acessado em 16 de maio de 2008.
[19] Lei 11.719 de 20 de junho de 2008¸ disponível em http://www.planalto.gov.br/legislacao/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11719.htm#art1, acessado em 23 de setembro de 2008.
[20] Greco, Rogério. Curso de direito penal. 8° Edição, Rio de Janeiro: 2007. pg. , Impetus 661-671
[21] Código de Processo Penal, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm, acessado em 16 de maio de 2008.