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Da ilegalidade da cobrança da "assinatura mensal" dos telefones

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Agenda 16/09/2004 às 00:00

VII – DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO

De tudo quanto foi exposto dúvida não resta de que a cobrança da ‘assinatura mensal’ de telefonia é ilegal, emergindo de tal fato o direito líquido e certo, para todos os usuários, de repetição de tudo quanto possa ter sido pago a este título.Como estamos diante de uma relação de consumo, tal repetição há que se dar em dobro (CDC, art. 42, § único)

A repetição do indébito já se encontrava previsto no vetusto Código Civil de 1916, que em seu art. 964 previa que aquele que recebesse o que não lhe era devido, ficava obrigado a restituir a quantia. Por certo que o texto legal em comento, simplesmente zelava pelo princípio da boa-fé objetiva, vez que a ninguém é dado o direito de enriquecer-se ilicitamente, filosofia que é seguida pelo novo Código Civil. Aliás, neste particular aspecto o Código Civil de 2002, em seu art. 884, manteve a determinação de obrigar a restituição àqueles que tenham enriquecido indevidamente à custa de outrem.

Nesse diapasão a Lei Consumerista prescreve que aquele que for cobrado por quantia indevida, tem direito de repetir o indébito e em dobro (art. 42, § único).

No presente caso, a ilegalidade é manifesta. Logo, se há ilegalidade na cobrança da chamada ‘assinatura mensal’ dúvidas não podem pairar quanto ao direito líquido e certo dos usuários dos serviços de telefonia de receberem a devolução de tudo quanto foi pago a este título, em dobro, conforme preconizado no Código de Defesa do Consumidor, sem prejuízo dos juros, atualização e demais consecutários.

Assim, cabe ao Estado-Juiz declarar a abusividade e ilegalidade da cobrança da ‘tarifa de assinatura’, cujos efeitos da sentença, conforme os ensinamentos de Nelson Nery Junior, há de ser "ex tunc, pois desde a conclusão do negócio jurídico de consumo já preexistia essa situação de invalidade, de sorte que o magistrado somente faz reconhecer essa circunstância fática anterior à propositura da ação" (op. cit. p. 341).

Assim, é de rigor considerar que as empresas concessionárias de telefonia devem devolver tudo o que cobraram indevidamente dos usuários, pelo período de utilização da linha telefônica, desde a data da primeira cobrança, não devendo ser considerado nenhuma forma de prescrição, porquanto estamos diante de uma nulidade absoluta e, como tal imprescritível.

Nesse norte, é importante registrar que estamos diante de uma nulidade em face de cláusula abusiva que, sendo matéria de ordem pública (art. 1°, CDC), o que nos leva a considerar que a nulidade de pleno direito das cláusulas abusivas nos contratos de consumo não é atingida pela preclusão, de modo que pode ser alegada no processo a qualquer tempo e, de outro lado, como o Código de Defesa do Consumidor não fixou prazo para o exercício do direito de pleitear a nulidade das cláusulas abusivas, temos como conseqüência que a ação é imprescritível. Da mesma forma o novo Código Civil, em seu art. 169, estabeleceu que "o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo".

Acrescente-se ainda, que tal devolução deverá se dar em dobro e devidamente corrigido monetariamente e com juros legais, contados desde a data inaugural do ato ilícito, conforme expressamente autorizado pelo art.42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.


VIII – CONCLUSÕES

Em face dos argumentos aqui esposados, fica claro que não há embasamento legal que forneça suporte para a cobrança da ‘assinatura mensal’. Além da falta de suporte legal, não se pode esquecer que todos os serviços prestados pelas empresas de telefonia são tarifados, ou seja, os usuários pagam pelos pulsos utilizados e também por outros serviços adicionais, não havendo nenhuma lógica para a manutenção da cobrança fixa mensal, a título de assinatura.

Ademais, a impossibilidade de informação detalhada em conta quanto aos pulsos efetivamente utilizados em cada terminal telefônico, coloca o consumidor numa flagrante posição de hipossuficiência na exata medida da impossibilidade de aferição quanto a totalização dos serviços utilizados.

Condicionar o fornecimento do serviço ao pagamento de uma ‘taxa’ mínima mensal, independente de uso, tão somente para que se tenha disponibilizado o serviço de telefonia, revela-se prática ilegal, imoral e atentatória aos direitos basilares dos consumidores, independentemente da inexistência de previsão legal para a cobrança da referida ‘assinatura mensal’, residencial ou comercial.

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Não bastasse tudo quanto já exposto, a referida cobrança ofende aos princípios da boa-fé e da equidade, pois estabelece uma relação de visível desigualdade econômica entre usuário e fornecedor ao estabelecer cláusula de excessiva onerosidade para o consumidor. Não se esqueça que, sistemática atualmente adotada, o usuário paga pelos serviços disponibilizados, independentemente de sua efetiva utilização, enquanto que a fornecedora dos serviços tem assegurado um faturamento líquido e certo, independentemente da prestação dos serviços. Evidencia-se assim, um prejuízo efetivo para o consumidor e um enriquecimento sem causa para a concessionária do serviço de telefonia situação esta que é repudiada pelo ordenamento jurídico vigente.

Cabe finalmente rememorar, que o princípio da boa-fé objetiva impõe deveres às partes, dentre estes, o de agirem de conformidade com a economia e a finalidade do contrato, de tal sorte a preservar o equilíbrio entre as obrigações, impedindo que somente uma das partes fixe, arbitrariamente, as cláusulas e condições que lhes favoreça no contrato.

Por tudo quanto exposto e, sem a pretensão de ter esgotado o tema, esperamos ter ofertado nossa modesta contribuição para uma melhor compreensão de tão intricado problema.


IX – BIBLIOGRAFIA

Benjamin, Antonio Herman de Vasconcelos e outros. Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, 4ª. edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996.

Cretella Junior, José. Curso de Direito Administrativo, 17ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

Marques, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 4ª. edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 4ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981.


AGRADECIMENTOS

Agradecimento especial, pela colaboração, aos colegas Dra. Silvana Lorenzetti e Dr. Alex Sandro Ribeiro.

Sobre o autor
Nehemias Domingos de Melo

Advogado em São Paulo, palestrante e conferencista. Professor de Direito Civil, Processual Civil e Direitos Difusos nos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito na Universidade Paulista (UNIP). Professor convidado nos cursos de Pós-Graduação em Direito na Universidade Metropolitanas Unidas (FMU), Escola Superior da Advocacia (ESA), Escola Paulista de Direito (EPD), Complexo Jurídico Damásio de Jesus, Faculdade de Direito de SBCampo, Instituo Jamil Sales (Belém) e de diversos outros cursos de Pós-Graduação. Cursou Doutorado em Direito Civil e Mestrado em Direitos Difusos e Coletivos, É Pós-Graduado em Direito Civil, Direito Processual Civil e Direitos do Consumidor. Tem atuação destacada na Ordem dos Advogados Seccional de São Paulo (OAB/SP) onde, além de palestrante, já ocupou os cargos membro da Comissão de Defesa do Consumidor; Assessor da Comissão de Seleção e Inscrição; Comissão da Criança e do Adolescente; e, Examinador da Comissão de Exame da Ordem. É membro do Conselho Editorial da Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil (Ed.IOB – São Paulo) e também foi do Conselho Editorial da extinta Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor (ed. Magister – Porto Alegre). Autor de 18 livros jurídicos publicados pelas Editoras Saraiva, Atlas, Juarez de Oliveira e Rumo Legal e, dentre os quais, cabe destacar que o seu livro “Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum”, foi adotada pela The University of Texas School of Law (Austin,Texas/USA) e encontra-se disponível na Tarlton Law Library, como referência bibliográfica indicada para o estudo do “dano moral” no Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Nehemias Domingos. Da ilegalidade da cobrança da "assinatura mensal" dos telefones. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 436, 16 set. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5699. Acesso em: 22 nov. 2024.

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